“Um legado da Copa é a percepção da corrupção nas prioridades; outro é descobrir que os candidatos estão sendo incapazes de perceber essa novidade”
Ainda é cedo para saber qual legado da Copa ficará entre
todos os que foram prometidos, mas é possível saber que um ficará: a percepção
popular da corrupção nas prioridades. Faz anos, descobrimos a corrupção no
comportamento dos políticos, mas ainda não tínhamos consciência da corrupção
nas prioridades da política.
Horrorizamos-nos com o roubo de dinheiro público levado para
o bolso de políticos, mas ainda não nos horrorizávamos com o desperdício de
prioridades que desviam dinheiro sacrificando os interesses da população e do
futuro.
É muito possível que seja descoberto roubo de dinheiro
público durante as obras da Copa, mas desde já é possível perceber que houve
desvio de outras finalidades mais úteis ao futuro do país e ao bem-estar da
população de hoje. Um exemplo é o estádio de cerca de R$ 2 bilhões em Brasília.
Foi preciso fazermos a Copa para descobrirmos que desviar
dinheiro para prioridades menos importantes é também roubo: mesmo se não houver
apropriação privada do dinheiro público.
A população brasileira — tolerante com a desigualdade
social, com forte preferência pelo presente, habituada ao uso do artifício
histórico da inflação para financiar os gastos, e submetida à manipulação
facilitada pela pouca educação, mesmo entre aqueles com nível de instrução
superior — não costumava fazer as contas de quanto custava cada obra, nem o que
poderia ter sido feito de diferente.
Cristovam Buarque é senador (PDT-DF)
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