segunda-feira, 19 de maio de 2025

O que se passa com os rapazes?

“Boys will be boys” diz a famosa expressão condescendente em língua inglesa… e agora os rapazes preferem a extrema-direita.

No relatório "From Provider to Precarious: How Young Men’s Economic Decline Fuels the Antifeminist Backlash", publicado há dias pelo European Policy Center, vemos que, em Portugal, por cada rapariga (com menos de 25 anos) que vota num partido de extrema-direita, 4,9 rapazes fazem o mesmo. O número é tão alto que só a Croácia nos ultrapassa.

Outro estudo, de que um artigo no site do European Consortium for Political Research dá conta, mostra que, em 2024, 21% dos jovens rapazes europeus (com idades entre 18 e 29 anos) apoiavam partidos de extrema-direita, enquanto as raparigas se ficavam pelos 14%. O que se passa aqui?


Estávamos habituados a que o clássico voto de protesto antissistema, tão caro à juventude, se situasse na extrema-esquerda. Mais liberais do que os seus pais conservadores, radicais e revolucionários, os jovens pendiam para um extremo político antes de se “aburguesarem”, com a meia-idade, no colo do centrão. O voto antissistema foi capturado pela extrema-direita. Com uma grave distinção: se o sistema que a extrema-esquerda combate é o capitalismo, o sistema que a extrema-direita repudia é a democracia.

Para Đorđe Milosav, um dos autores do segundo estudo acima mencionado, a questão dos rapazes vai muito além do simples “boys will be boys”, no sentido em que o voto masculino jovem reflete a idade da exploração da identidade, do testar de limites, do correr riscos, atitudes mais acentuadas do que no sexo feminino. Se assim fosse, esclarece o investigador de Ciência Política, essa realidade estaria refletida em toda a juventude de décadas passadas. Mas não está. “Esta diferença de género do voto na extrema-direita por parte dos jovens é muito mais pronunciada agora, na Geração Z (nascidos entre 1997 e 2012), do que foi nas gerações passadas. Mas também vemos isso, embora em menor grau, nos Millennials (1981-1996)”, escreve.

“Muitos homens jovens veem o crescente sucesso das mulheres na educação e no trabalho como uma ameaça. Isto alimenta o ressentimento e o desejo de controlo”, acrescenta Đorđe Milosav, alertando para o facto de o voto na extrema-direita lhes dar um sentido de propósito e validação. Pior: “Os partidos de extrema-direita movem-se das franjas para o mainstream. Já não se trata só de um voto de provocação contra pais e professores – à medida que estes partidos se normalizam, a tendência é a de que o voto dos jovens neles não cesse à medida que vão envelhecendo.”

“Há uma crescente divisão ideológica entre os géneros”, diz, por seu lado, Javier Carbonell, autor do relatório do European Policy Center, “em que as mulheres são mais progressistas e os homens mais conservadores. Esta divisão mostra o poder eleitoral das forças antifeministas”. Mas a ascensão do feminismo não explica tudo.

“A deterioração das condições económicas tem levado a que os rapazes sejam menos escolarizados, ganhem menos e se debatam para estar à altura do que tradicionalmente é esperado do papel masculino: ser o sustento das suas famílias. A extrema-direita tem sabido explorar isto, oferecendo uma visão regressiva da masculinidade”, continua Javier Carbonell.

A ideia tradicional de masculinidade está ultrapassada e entrou em crise. O problema é quando são os próprios jovens a preferir olhar para trás em vez de seguir em frente.

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