Os tiros de Roberto Jefferson atravessaram a Mantiqueira e, como previsto, acertaram o eleitor paulista. Se este eleitor, em defesa da polícia, estava disposto até mesmo a votar em quem quer tirar as câmeras dos uniformes, não aceitaria aliados dessa gente que atira em policial. Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Haddad crescem em São Paulo, a reboque de Jefferson.
Ainda está por ser explicado por que seis agentes, sem colete à prova de bala ou equipamento adequado, se dirigiram à casa de um apenado em regime domiciliar que acumulava armas e munições.
Mas o fato é que, depois de tanto explorar os votos de presidiários em seu adversário, eis que o presidente Jair Bolsonaro chegou à reta final da eleição atingido por um deles.
O fracasso da armação levou a esta cartada final do “radiolão”. A engenharia das inserções pode até demonstrar que falta fiscalização na divulgação, principalmente nas rádios. É uma lacuna que prejudica a todos e não apenas ao reclamante a quem, mais do que propaganda, falta credibilidade.
O tiros em Levy Gasparian (RJ) já foram suficientes para mostrar que a reprise tupiniquim do Capitólio é uma ópera bufa do bolsonarismo, mas a campanha governista resolveu dobrar a aposta com esta manifestação convocada para o sábado em Brasília. Como não conseguiram melar a eleição com as urnas eletrônicas, apelam agora para as inserções.
Os fatos derradeiros da campanha estão a mostrar a dramaticidade da renovação do governo em curso. O que parece faltar em votos para o bolsonarismo sobra em poderes constituídos que se levantam contra seus arroubos.
A frente ampla chegou ao Vaticano. Além do ódio, da intolerância e da violência, o papa ainda acrescentou Nossa Senhora de Aparecida para pedir passagem. Mais explícito, impossível.
É o poder que se move na reta final. E nunca está sozinho. O bolsonarismo gira a manivela do voto antissistema com seus chiliques, mas este 2 turno está a mostrar que tudo tem um limite. A reação dos poderes oferece um eixo contra o rumo desgovernado que tomou a campanha de Jair Bolsonaro.
A reação da Igreja Católica, que tomou corpo depois do tumulto em Aparecida, dá à maioria religiosa um norte para se contrapor ao apelo obscurantista do presidente que grassa, majoritariamente, entre evangélicos.
O Judiciário mostrou unidade seja no respaldo do Supremo Tribunal Federal aos superpoderes do Tribunal Superior Eleitoral seja na garantia ao passe livre nas capitais.
Não foi a exoneração do servidor do TSE que mostrou os excessos de Alexandre de Moraes. Todos já o conhecem, mas é como se o Judiciário depois de contribuir para corroer a democracia pelo lavajatismo, não visse outra forma de remediá-lo senão investindo outro juiz de plenos poderes. Ante o monstro que se transformou o bolsonarismo, parece não haver saída.
Foi Bolsonaro quem deu liga a esta unidade ao esticar a corda nas ameaças contra o STF. Já o tinha feito antes, mas sua reiteração na campanha foi sinal de que perdeu o tino. Se o arroubo foi tolerado até aqui é porque seu mandato tem fim. A perspectiva de sua renovação deu ruim.
Um togado do Supremo chegou a dizer esta semana a um ministro do governo, engajado na reeleição presidencial, que estava na hora de ele buscar um advogado criminal.
Até o ex-presidente José Sarney, que só se pronuncia em anos bissextos, resolveu falar. Reverenciou o Supremo como ponto de equilíbrio, seja em relação à “autocracia” do atual governo, seja em relação aos “interesses excusos” do Legislativo na gestão do orçamento secreto. A declaração de voto no ex-presidente Lula seguiu como decorrência.
O cerco é tamanho que os donos dos feudos do orçamento secreto partiram para a guerrilha antes mesmo da batalha final.
A tomada de posição de Sarney acabou por emudecer outro ex-presidente, Michel Temer, que voltara a atuar na intermediação entre Bolsonaro e o Supremo. Um sinal disso foi a decisão do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, aliado de Temer, de se antecipar à justiça e decretar o passe livre contra o qual havia se insurgido no primeiro turno.
Tratou-se de mais uma cartada do Judiciário a movimentar o tabuleiro. Ao respaldar a catraca livre, levou todas as capitais a adotar a medida que, no primeiro turno, enfrentou forte resistência do bolsonarismo.
Junte-se aí o Tribunal de Contas da União que, depois do rigor com o qual tratou a gestão da Caixa Econômica Federal no impeachment de Dilma, corria o risco de deixar passar batido o uso eleitoreiro do banco público. Ao mandar suspender o consignado do Auxílio Brasil, ganhou tempo.
Os poderes não se movem apenas por obra e graça de suas cúpulas mas pela força da burocracia. O que não foi o vazamento de estudos do Ministério da Economia sobre a desindexação do Orçamento, notadamente do salário mínimo, senão a reação de técnicos à perspectiva de mais quatro anos do chefe de Paulo Guedes?
A reação da burocracia econômica é posterior àquela capitaneada por nichos importantes do empresariado e da finança nacional.
De todos os sistemas de poder do país, aquele que comanda o PIB industrial e financeiro foi um dos primeiros a reagir. Uma demonstração de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se apercebeu do peso desta precedência foi o espaço aberto para Simone Tebet e Marina Silva na sua campanha, arrematado pela reiteração de que seu governo não será do PT.
Até a ciência mundial, representada por sua principal publicação, a “Nature”, publicou editorial em que diz que “só há uma escolha na eleição do Brasil - para o país e para o mundo”.
Ainda restam o debate e três dias até a eleição, o que é uma eternidade quando Bolsonaro está em campo. Há 8,5 milhões de votos a serem consolidados nesta reta final. Ao contrário de 2018, quando ficaram a esperar no que ia dar, os poderes tomaram partido antes que sumam do mapa. Oferecem uma carona ao eleitor. Resta aguardar se sua excelência vai aceitar.
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