No dia 7 de abril de 2019, uma patrulha do Exército, com quatro soldados, um cabo, um sargento e um tenente, suspeitou de um carro em Guadalupe, Zona Norte do Rio, e não conversou. Disparou 82 tiros de fuzil e pistola, dos quais 62 atingiram o veículo e nove acertaram o motorista, que morreu na hora. Dentro do carro, além do homem, estavam sua mulher, dois filhos e um idoso, seu sogro, que também foi ferido. Um transeunte tentou socorrer o homem, foi alvejado e também morreu, 11 dias depois.
Nenhum deles era bandido. O motorista era um músico, a caminho do trabalho num aniversário de bebê. O rapaz que tentou ajudá-lo, um catador de latas. Os militares não precisavam de grande esforço intelectual para chegar a essa conclusão. Bastar-lhes-ia olhar. Ao ver a bordo uma mulher, duas crianças e um velho, talvez identificassem uma família. Mas preferiram atirar e perguntar depois. Ou não enxergaram direito ou tremeram diante do que poderia vir do carro. Míopes, covardes ou as duas coisas?
Dias depois, Jair Bolsonaro, sempre atracado aos baixos meridianos de algum militar, classificou a chacina como “um incidente”. Ali, aos quatro meses de mandato, ele oferecia ao país uma das primeiras demonstrações de sua incapacidade de compaixão. Claro que, na pandemia, essa incapacidade seria escancarada —sua resposta às pilhas de brasileiros mortos e sendo enterrados em vala comum foram os passeios de lancha, o não-tou-nem-aí, o esgar de deboche. E aquilo era só o começo.
A Justiça Militar acaba de condenar os membros da patrulha assassina a até 31 anos de prisão. Se eles chegarão a cumprir a pena ou se, bem à brasileira, logo estarão de volta às ruas, armados e rindo da Justiça, é algo a ver.
Só me pergunto se o crime desses homens, por mais hediondo, não empalidece diante dos cometidos por Bolsonaro —que parecem impossíveis de caber em qualquer contabilidade conhecida pela lei.
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