Estamos aqui para afirmar que nosso país é parte importante não só dos problemas que ameaçam o futuro do planeta e de seus habitantes, mas também das melhores soluções para enfrentá-los. O Brasil pode e deve assumir compromissos claros, firmes e fortes no espírito do Acordo de Paris. Pode se
comprometer com Contribuições Nacionalmente Determinadas mais ambiciosas e à altura das necessidades presentes.
Somos a favor de acordos internacionais que beneficiem o conjunto dos brasileiros, apresentem metas e métricas claras, cujas tratativas possam ser acompanhadas pela sociedade, submetidas ao crivo do Congresso Nacional e, quando necessário, ao poder Judiciário.
Considerando que nosso país tem um vasto território, grandes metrópoles e 9.200 km de costa, sabemos que a proteção de nossa floresta amazônica não esgota os desafios de uma agenda de sustentabilidade. Mas sabemos, também, que essa é, hoje, a questão que mais preocupa a opinião pública no Brasil e no exterior, incluindo grandes líderes mundiais. Por essa razão, este documento aborda exclusivamente esse tema.
O Brasil, assim como outros países amazônicos, tem condições para proteger a floresta amazônica, seu estoque de carbono e sua imensa biodiversidade, com soberania – sem desconhecer a profunda interdependência entre nações –, com base na ciência e com apoio de parcerias internacionais. Para tanto, conta com uma legislação avançada, experiência acumulada em políticas ambientais e amparo interno significativo dos povos da floresta, da sociedade civil organizada, da comunidade científica, de lideranças empresariais destacadas, dos meios de comunicação e da opinião pública.
Da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO 92), realizada no Rio de Janeiro, até o Acordo de Paris, o Brasil se engajou na causa ambiental, participando da formação do regime internacional de mudanças climáticas e construindo internamente um arcabouço jurídico e
administrativo de monitoramento para enfrentar a devastação de nosso patrimônio florestal, causada por agentes legais e ilegais, públicos e privados.
Nos referimos a produtores rurais – grandes e pequenos – que expandem ilegalmente plantações e pastos, e a um conjunto de agentes criminosos, dedicados a invasões de terras indígenas e de unidades de conservação ambiental, à mineração ilegal, à venda ilegal de madeira, ao tráfico ilegal de espécies e de drogas.
O poder público pode ser incluído nesse rol, quando abre estradas sem planejamento, constrói barragens, usinas hidrelétricas e linhas de transmissão de energia que cortam irracionalmente a floresta.
Desde 1988, as iniciativas de redução do desmatamento caminharam entrelaçadas com a legislação que estabeleceu áreas de floresta protegidas. A Constituição Federal reconheceu o direito originário dos povos indígenas a seus territórios tradicionalmente ocupados – populações que são defensoras
importantes da floresta.
Os avanços vêm sendo revertidos sob o governo do Sr. Jair Bolsonaro, que, por palavras e atos, estimula os agentes da devastação. No plano da retórica, em mais de uma ocasião, ele e alguns de seus ministros colocaram em dúvida a realidade da mudança climática, ameaçaram com a retirada do país do Acordo de Paris, questionaram as evidências científicas, demonizaram ambientalistas e ativistas de direitos humanos, desdenharam das tradições culturais dos povos indígenas falando em “integrá-los à civilização” e confraternizaram publicamente com praticantes de diferentes ilícitos.
Em reunião da equipe de governo, em abril de 2020, o ministro do Meio Ambiente propôs que se aproveitasse o fato de as atenções estarem dirigidas à pandemia da Covid-19 para flexibilizar medidas de proteção ambiental. Em sua linguagem peculiar, sugeriu que o governo fosse “passando a boiada”, ou seja, mudando as normas infralegais que não demandam aprovação do Congresso Nacional.
No plano da ação, o governo vem enfraquecendo sistematicamente os órgãos de gestão ambiental. Revisou regulamentos, flexibilizou normas, revogou dispositivos legais, alterou a composição de órgãos públicos encarregados de monitoramento e aplicação de multas, substituiu chefias competentes por pessoas sem qualificação apropriada – quando não, por sócios da devastação–, perseguiu funcionários, reduziu o orçamento destinado ao meio ambiente. Em 2021, o ministério do Meio Ambiente terá o menor orçamento em duas décadas. O Fundo Amazônia, constituído com recursos dos governos da Alemanha e da Noruega, foi paralisado em 2019.
Entre os projetos de lei em tramitação no Congresso que o governo considera prioritários, quatro enfraquecem, de diferentes maneiras, a proteção ao meio ambiente, com graves consequências para a Amazônia e para o modo de vida das populações indígenas. As propostas afrouxam regras de licenciamento ambiental, concessão de florestas, regularização fundiária, mineração em terras indígenas e impactam até o Estatuto do Índio.
Em lugar de expandir e robustecer as capacidades estatais, o governo, diante das críticas reiteradas, faz promessas vãs e toma medidas ineficazes. Apresentou o Plano Nacional para o Controle do Desmatamento Ilegal e Recuperação da Vegetação Nativa, documento sem metas claras, prazos ou ações definidas, que nunca saiu do papel. Criou o programa Verde Brasil, mobilizando militares sem experiência no combate a crimes ambientais, arriscando suas vidas e desperdiçando recursos públicos já escassos.
Diante de pressões internacionais e da sociedade brasileira, o governo Bolsonaro vem mudando de discurso, mas não de política.
Os inimigos do meio ambiente e da Floresta Amazônica são muitos e difíceis de combater. Mas não são maioria. Porém, hoje eles têm, no governo federal, um aliado ativo. Isso precisa mudar, pelo bem do Brasil e do planeta.
Ao cobrar dos representantes do país nesta conferência compromissos claros, prazos definidos, metas precisas e métricas para aferir resultados, os participantes desta reunião ajudarão os brasileiros que querem a floresta de pé, os povos indígenas protegidos, as populações amazônicas assistidas e
um mundo mais sustentável.
José Carlos Dias, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns
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