quarta-feira, 3 de março de 2021

Agora governo e Congresso estão passando a boiada de verdade

Em maio passado, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, sugeriu em uma reunião de gabinete que a pandemia deveria ser usada pelo governo para mudar o maior número possível de leis ambientais, enquanto o país estivesse distraído com a crise em torno do coronavírus.

É exatamente isso que está sendo feito agora no Congresso, onde, há três semanas, foram instalados dois presidentes alinhados ao governo.


Enquanto o Brasil vive um novo pico no número de infectados e mortos pelo coronavírus, projetos de lei complicados, preparados durante muito tempo, aparecem de repente, do nada. E o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, quer agora submetê-los a uma votação rápida – antes mesmo que tenham sido instaladas as comissões que deveriam debatê-los primeiro.


Trata-se de decisões fundamentais para a política e a economia do Brasil.

A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial visa emendar a Constituição para que os gastos sociais possam ser elevados acima do teto para uma emergência como a pandemia. Isso sem que o governo seja responsabilizado posteriormente, como foi o caso recentemente da ex-presidente Dilma Rousseff em seu impeachment.

A PEC não terá qualquer concessão ao Legislativo: ela vai avançar aparentemente sem nenhuma mudança no campo dos gastos. Os cortes planejados nos salários dos funcionários públicos não aparecem mais. O governo quer eliminar os gastos mínimos estabelecidos para educação e saúde nos três níveis federais, para que governo federal, governador e prefeito possam usar o dinheiro como acharem melhor.

Já com a chamada "PEC da Impunidade", os deputados querem acima de tudo se proteger do Judiciário. Por exemplo, no futuro, eles devem decidir por si mesmos se um de seus próprios deve permanecer em prisão preventiva, mesmo que o STF tenha assim ordenado.

Além disso, um grande número de delitos não deve mais ser passível de punição: no futuro, deverá ser possível novamente empregar parentes, e quem não prestar contas de suas campanhas eleitorais com transparência não estará mais em risco. O ônus da prova é invertido: qualquer pessoa que trapacear em licitações públicas ou obtiver privilégios como deputado só poderá ser processada se houver "prejuízo ao erário" ou "dolo".

Também deve ser abolida a lei da Ficha Limpa, segundo a qual os deputados com antecedentes criminais não podem mais concorrer em eleições. Isso após a Lava Jato ter sido recentemente desmantelada pelo Ministério Público.

Mesmo que a PEC da Impunidade vá agora ser discutida por uma comissão, a tendência é clara: governo e Congresso querem se livrar rapidamente de uma maior transparência e dos controles democráticos e de corrupção cuidadosamente incorporados ao sistema legal nos últimos dez anos.

Para garantir o bom funcionamento de tudo isso, o presidente Bolsonaro colocou a Petrobras como isca para os deputados e senadores, instalando ali um general que cumprirá suas ordens. O mesmo acontecerá no Banco do Brasil.

O cálculo de Bolsonaro provavelmente vai funcionar: dentro de um ano e meio, a campanha eleitoral terá início. Os deputados e senadores vão querer subsídios, contratos e cargos para aliados. Eles votarão esmagadoramente a favor dos projetos de lei. Se não fora agora, vai ser dentro de algumas semanas.

Para a democracia brasileira, este é um amargo passo para trás
Alexander Busch

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