É claro que eventuais simpatias pelo presidente ou por seus adversários podem naturalmente exercer alguma influência sobre o eleitorado, mas, no frigir dos ovos, nenhum deles estará na Prefeitura ou na Câmara dos Vereadores para enfrentar os desafios municipais – particularmente imensos em cidades como São Paulo.
As pesquisas indicam que várias candidaturas apoiadas explicitamente pelo presidente Bolsonaro serão repudiadas nas urnas em várias partes do País – a rejeição ao presidente chega a 50% na capital paulista. O mesmo ocorre com algumas candidaturas petistas que receberam a atenção do ex-presidente Lula da Silva – que tentou transformá-las em veículos para sua campanha particular de descrédito da Justiça em meio aos muitos processos que enfrenta.
Quem se dispuser a ir às urnas hoje, tomando os cuidados sanitários necessários em razão da pandemia de covid-19, tem mais do que o vírus com que se preocupar. De um modo geral, as cidades enfrentam problemas bem semelhantes aos dos governos estaduais e federal – orçamento apertado, dívida crescente, queda brutal de receita em razão da pandemia e carência de investimentos para estimular a retomada, com a agravante de que, ao contrário da União, o município não pode emitir títulos.
Não é um cenário para amadores. Não se pode eleger o futuro prefeito com os mesmos critérios que nortearam a escolha dos finalistas da eleição presidencial de 2018, que opôs um deputado reacionário do baixo clero e o preposto de um presidiário. A esta altura, com quase dois anos de mandato do sr. Jair Bolsonaro, o eleitorado já tem informações suficientes para saber que escolhas mal feitas na hora do voto têm efeitos negativos duradouros sobre a vida de todos, em especial dos mais pobres.
Se São Paulo fosse um país, estaria entre os 50 mais ricos do mundo. Assim, governar uma megalópole como essa, responsável por 10% do PIB nacional, é quase tão desafiador quanto governar um país, ainda mais em tempos de grave crise como o atual. Demanda uma soma de criatividade com responsabilidade que poucos têm condições de oferecer.
Mas a maior qualidade do futuro prefeito, que os eleitores devem procurar nos que se apresentam para a vaga, é o espírito público. É justamente quando o País mergulha em debates estéreis promovidos pelo bolsonarismo, para desviar a atenção do governo medíocre de seu líder, que se torna imperativo buscar, entre os candidatos, aqueles que manifestam deferência pelas instituições republicanas e pelo cargo que almejam.
Não se trata de um respeito protocolar. A estima pelos valores republicanos se revela quando o eleito faz jus ao mandato recebido, buscando conciliar os diversos anseios da sociedade que lhe coube governar por meio da valorização da política, fazendo valer a plataforma vencedora da eleição, mas entabulando diálogo civilizado com todos, especialmente com a oposição. Não há outra maneira de alcançar a plena legitimidade, fulcro da aceitação das decisões emanadas do governo e passo indispensável para a superação dos desafios.
O desastre das eleições de 2018 deve servir como exemplo do que acontece quando se entrega o poder a quem é despreparado não apenas no nível da cognição básica, mas, sobretudo, no nível do entendimento de como funciona uma democracia e do papel que cabe aos homens públicos.
Por isso tudo, não merecem o voto aqueles candidatos que se apresentam como meros veículos das pretensões eleitorais de terceiros ou que representam projetos antirrepublicanos de poder. São Paulo é grande demais para isso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário