Jair Bolsonaro é um completo irresponsável com a saúde pública, a sua atitude diante da pandemia é a de um sociopata, mas a pior notícia é outra: ele diz exatamente o que a maioria dos brasileiros pensa a respeito de distanciamento social e uso de máscara. Pensa e age. Passados sete meses desde o início da quarentena à la Brasil, um número crescente de cidadãos vem passando a viver como se nada houvesse — nem quase 4,5 milhões de pessoas que já foram infectadas, nem mais de 135 mil mortos. Como previsto, estamos gradativamente abolindo a pandemia por decreto e pensamento mágico infantil.
Bolsonaro é instintivo, mas no caso da pandemia ele agora também se manifesta por cálculo eleitoral. Foi o cálculo eleitoral que o levou a soltar a frase de hoje, em Mato Grosso, na entrega de títulos de propriedade rural: “Vocês não entraram naquela conversinha mole de ‘fique em casa e a economia a gente vê depois’. Isso é para os fracos. O vírus, eu sempre disse, era uma realidade e tínhamos que enfrentá-lo. Nada de se acovardar perante aquilo que a gente não pode fugir dele.”
Enfrentar a pandemia com sacrifícios pessoais e profissionais está mais para ato de coragem, não de covardia, se fosse o caso de atribuir firmeza ou fraqueza de espírito ao que é meramente contingência. Não é, à exceção dos profissionais de saúde, cujo trabalho a contingência requer, não raro, boa dose de coragem. O truque do discurso do presidente é justamente falsear a realidade, emprestando-lhe moldura incompatível com o quadro.
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