sexta-feira, 20 de março de 2020

As jabuticabas que vão agravar a crise do coronavírus no Brasil

Nem mesmo os otimistas de plantão – como chefes de torcida e alguns ministros de finanças – conseguem esconder que o mundo terá um ano de forte redução no nível de atividade econômica. Em alguns casos poderemos ver até algumas nações (das grandes) voltarem a encolher de novo.

Nesta altura do campeonato, é difícil fazer projeções muito objetivas: qual será o impacto total da pandemia do coronavírus sobre a economia global? Qual país sofrerá a maior perda de dinamismo econômico? Quem vai conseguir se reabilitar mais rapidamente? Qual o fundo do poço para os mercados financeiros?

Alguns fatores, entretanto, permitem apontar quais países podem viver situações mais agudas da atual crise econômica, de proporções tão gigantescas quanto às registras na grande recessão de 2008.



O Brasil, infelizmente, desponta como integrante da lista das nações onde o ruim pode ficar pior. Tudo isso por conta de algumas jabuticabas.

A primeira delas é a tão comentada lenta recuperação da economia brasileira.

Depois do governo Dilma Rousseff ter produzido a maior retração da atividade econômica nacional registrada na história recente – um mergulho de praticamente 9 pontos percentuais do conjunto de riquezas produzidas pelo país – o Brasil vem escalando o poço como se não houvesse pressa alguma para alcançar o cume.

Mesmo considerando os números revisados do IBGE, a produção de bens e serviços do país – que atende pela sigla de PIB – avançou 1,3% no primeiro ano pós-Dilma. Andou na mesma velocidade no ano seguinte, o segundo do mandato tampão de Michel Temer. E apesar de todo o discurso “anima torcida” do atual ministro da Economia, Paulo Guedes, durante a campanha eleitoral, os primeiros dozes meses da nova administração federal produziram uma taxa de crescimento ainda menor do que a registrada nos dois anos anteriores.

Se a pandemia pode fazer com que a economia dos Estados Unidos, que vinha em forte recuperação, amargue uma retração de até 14% no segundo trimestre deste ano, como estima o banco JP Morgan, imagine o que acontecerá com um país que praticamente se arrasta há três anos?

A segunda jabuticaba é o comportamento do governo Jair Bolsonaro frente à pandemia e suas consequências conhecidas até agora. O presidente tratou com desdém, até muito pouco tempo, a crise de saúde. Não faz dez dias que o presidente, num evento nos Estados Unidos, disse que a “questão do coronavírus” não era “isso tudo” e, na prática, representava uma “fantasia” propagada pela mídia mundial. Só ontem, a Itália registrou 475 mortos da fantasia bolsonariana. A lista de vítimas fatais no Brasil começou a ganhar nomes nesta semana.

Para fechar a equação, o deputado Eduardo Bolsonaro, um dos filhos do inquilino do terceiro andar do Palácio do Planalto, abriu ontem uma crise diplomática com o maior parceiro comercial do país, ao responsabilizar a China pela pandemia de coronavírus.

Escrevendo numa rede social, o parlamentar e aspirante a chanceler fez a acusação usando como paralelo uma série de TV sobre ao acidente nuclear de Chernobyl.

A provocação pode custar caro, na hora em que a China voltar a produzir no ritmo pré-coronavírus. O governo pode fingir não saber, mas muitas empresas grandes no país afundariam se o gigante asiático resolvesse fazer compras em outros lugares do mundo.

Todas essas jabuticabas podem fazer com que os efeitos do coronavírus sobre a economia local sejam mais profundos e duradouros. Não há como estimar, neste momento, o tamanho do estrago. Mas que ele irá acontecer, infelizmente, isso já dá para cravar.

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