O que alguns analistas disseram logo após a eleição era que Bolsonaro conseguira, com a força da onda em seu favor, eleger a segunda maior bancada. A primeira é a do PT, com um deputado a mais. A partir daí, seria razoável supor que ele conduziria negociações para uma fusão com um ou vários partidos da direita e aumentaria a sua bancada. Que ele, por ter passado 27 anos no parlamento, saberia construir um diálogo com o Congresso, necessário para o seu projeto de governo.
Contudo, seu partido não cresceu, não recebeu adesões, entrou em várias guerras de falanges que ele jamais soube arbitrar. Ontem, no áudio vazado da reunião do PSL, o que fica claro, em meio aos inúmeros palavrões, é que muitos têm a mesma queixa: o presidente não os ouve, não dialoga, não demonstra que eles fazem parte da estrutura de poder.
Se Bolsonaro escanteia seus correligionários, o que dirá dos outros partidos que poderia ter atraído para uma coalizão. Desde o início da administração, ele fez críticas indiretas e genéricas ao Congresso ao afirmar que não faria a “velha política”. Ontem, nomeou um senador do MDB para líder do governo.
Ele jamais foi a nova política, se é que a categoria existe. Quem passou por oito partidos e ficou mais de uma década no PP de Paulo Maluf não representa renovação. Ele inventou essa fantasia porque cabia na demanda do eleitorado de 2018. Para continuar dentro do figurino criado para a ocasião, Jair Bolsonaro disse que não negociaria a formação de alianças, porque não repetiria os erros do passado. A explicação era inverossímil. Seu governo enfraqueceu órgãos de controle do combate à corrupção. O desmonte do Coaf foi apenas um exemplo. O nepotismo o levou a querer o filho na embaixada nos Estados Unidos, pretensão da qual teve que desistir. Ele não construiu uma coalizão porque tem temperamento autoritário. Só telefona para deputados do seu próprio partido quando é para perseguir alguém, como foi dito na reunião da bancada com outras palavras. Ouve apenas os filhos e alguns áulicos.
Para tornar tudo ainda mais complicado, o PSL, que tinha parte pequena do rateio do dinheiro público, ficou rico. Pela lei que distribui os recursos dos fundos partidário e eleitoral, o partido, por ter uma das duas maiores bancadas, passou a ter o controle sobre verba gorda. De novo, os analistas consideraram que Bolsonaro aproveitaria a abundância para tentar dar capilaridade ao partido nas eleições municipais. Em vez disso, ele jogou uma bomba em seu próprio partido.
O que o fez dar aquela declaração contra o PSL e Luciano Bivar, dias antes da operação da Polícia Federal no Recife? Uma coincidência impressionante, dado que a notícia de que o presidente do PSL teria montado um laranjal em Pernambuco foi publicada pela “Folha de S. Paulo” em fevereiro. O presidente demorou oito meses para dizer que ele estava “queimado”. Curioso é que não acha que o laranjal de Minas queima o ministro Marcelo Álvaro Antônio. Uma coisa é certa: na guerra intestina, partiu de Bolsonaro o primeiro tiro.
No Brasil, presidentes constroem coalizões não por opção ou gosto, mas por uma decorrência natural do pluripartidarismo. Nenhum governo desde a redemocratização conseguiu ter a maioria das cadeiras contando só com a própria legenda. O PSL, quando unido, representa 10% da Câmara. Com isso não se governa, mas sem isso fica difícil entender como o presidente pretende garantir governabilidade pelos próximos três anos, dois meses e 14 dias que restam ao seu mandato.
Até hoje, a maioria das crises do governo foi criada pelo próprio governo. O presidente ataca as forças políticas, ofende as instituições, frita ministros, descarta aliados e atira contra seu próprio partido. Segue à risca o manual do isolamento.
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