Em 1950, por exemplo, os dados levavam em conta nossos gastos com o feijão, o ônibus, o cigarro, o lápis do caçula, a ida semanal ao cinema e, talvez, uma fezinha no bicho. Éramos um país simples, mas feliz, segundo os antigos. Em 1970, com a modernização, o cálculo trocou alguns daqueles itens pelo estrogonofe, o carro do ano, as escapadas aos motéis, a TV em cores e as aplicações na Bolsa. Essas opções nos conduziram, respectivamente, ao colesterol, à angústia, ao desquite, ao emburrecimento e à falência, mas fomos levando.
Em 1990, a cesta básica incluía quilos de cocaína, estoques de camisinha, pizza pelo telefone, férias em Cancun e aplicações no overnight --um esquema de investimento em que você pensava que o seu dinheiro dobrava enquanto você dormia, embora ele só estivesse se defendendo da inflação de 1.000% ao ano. Em 2010, o cálculo passou a considerar as despesas com TV a cabo, curso de mandarim, cirurgia bariátrica, passeador de cachorro, aplicação de botox e propina de deputado.
Para o próximo ano, o IBGE vai ampliar o espectro e pesquisar nossos gastos com streaming, branqueamento dentário, aluguel de bicicleta, conserto de celular e serviços de sobrancelha e depilação. Infelizmente, alguns itens serão abolidos da análise por obsoletos: aparelhos de rádio, relógios, máquinas fotográficas, CDs, DVDs.
Não por mim. Minha cesta básica continuará incluindo vários itens condenados e que ainda me servem muito bem. Aboli-los seria como eu próprio me abolir como obsoleto.Ruy Castro
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