domingo, 8 de setembro de 2019

Independência ou submissão?

Um presidente casmurro para em frente ao Palácio da Alvorada para sua já tradicional prosa diária. Ele pensa se tratar de uma entrevista, um favor que presta a jornalistas que se amontoam no calor seco de Brasília à espera de palavras para guiar suas reportagens. Trata-se, isso sim, da tentativa cotidiana de Jair Bolsonaro de impor sua visão de mundo não só à imprensa, mas ao público.

Conta, na intermediação, com os acólitos que filmam e transmitem ao vivo nas redes sociais, e com a claque disposta a apoiar com gargalhadas e apupos encorajadores o que quer que ele diga. O presidente dita a pauta e o que pode, ou não ser perguntado. Se estiver de ovo virado, dá as costas e vai embora sem responder.

Na última semana, uma nova arma de “comunicação” foi introduzida no ritual: o mimimi choroso. Visivelmente assustado com a reação furiosa de seus apoiadores das redes sociais à indicação de Augusto Aras para a Procuradoria-Geral da República, Bolsonaro se pôs a filosofar sobre política. Se as pessoas não apoiarem suas decisões, como a indicação de Aras, ele vai “cair” e o PT, uma espécie de bicho-papão que brande perante um eleitor infantilizado como a vovó diante da criança malcriada, vai voltar.

Isso no dia do aniversário de um ano de seu “renascimento”, outra mistificação perigosa que Bolsonaro faz de um incidente grave, hediondo, o do atentado a faca de que foi vítima em Juiz de Fora, que de fato quase o vitimou, pelo qual sofre consequências físicas até hoje – como a cirurgia a que será submetido neste domingo – e que certamente influenciou o resultado das eleições.

E na véspera de outro evento simbólico, o Sete de Setembro, no qual o presidente se cercou da família e de políticos, mas não só: estavam lá, em posição de destaque, dois dos principais homens de mídia do Brasil, Silvio Santos e Edir Macedo, concorrentes irmanados em sorrisos em jantares e palanques. Uma semana antes, Bolsonaro se ajoelhou aos pés do primeiro e foi visitar o segundo.


O que se quer com essa parceria amplamente fotografada não tem sutileza nem se tenta esconder: Bolsonaro deseja fomentar uma mídia favorável ao governo, para se contrapor ao inimigo-mor, a Globo, e aos demais veículos que enxerga como adversários. Não é sequer novo o expediente: foi usado fartamente por Lula, sem nem variação dos personagens.

No fundo, o que Bolsonaro espera da imprensa, do público que trata como criança e das instituições como o Ministério Público, cujo chefe acaba de designar, é a mesma coisa: submissão.

Não passava pela cabeça do capitão que seus seguidores sempre tão inflamados, dispostos a postar emojis de bandeirinhas do Brasil e arminhas, trocar suas fotos por cafonas avatares vaporwave e aceitar qualquer narrativa fake fossem ficar enfurecidos com a escolha de Aras.

A fragilidade no olhar e a hesitação na fala de Bolsonaro na live de quinta-feira, quando inacreditavelmente instruiu as pessoas a apagarem comentários contra ele, e no dia seguinte, ao contar a história da carochinha da volta do PT-papão, são provas disso: ele foi convencido pelos acólitos de que aquele terreno era impermeável a críticas.

Nem a internet é controlável, presidente. Que dizer de instituições republicanas, como a imprensa e o Ministério Público? O senhor pode até encontrar puxa-sacos influentes para tirar fotos risonhas para acalmar as redes revoltas, mas a sociedade brasileira evoluiu, se institucionalizou e não se submeterá.

“Independência ou morte!”, teria proclamado Dom Pedro I às margens do Ipiranga, segundo a história. Que o mote anime jornalistas, eleitores, procuradores e o resto da sociedade a não se deixarem intimidar com muxoxos, ameaças e acenos à adesão condescendente.

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