A primeira parte foi cumprida: Bolsonaro completou seu ministério sem o toma-lá-dá-cá. Nomeou políticos eleitos e não eleitos, mas sem qualquer acordo com partidos, nem mesmo com o seu. Como ficou?
Admitindo-se que as duas pautas principais são as reformas econômicas e o combate à corrupção, o governo saiu bem arrumado e com boas chances. Paulo Guedes, o futuro super-ministro da economia, montou um time coeso e aparelhado. E, na outra área, Sérgio Moro, ele mesmo uma indicação acertadíssima, também escalou nomes credenciados e treinados no ambiente da Lava Jato.
Então, qual o problema?
Há mais de um. Começa que tanto a pauta econômica quanto a de combate à corrupção passam necessariamente pelo Congresso. A mais importante reforma, a da previdência, exige a votação de emenda constitucional, cuja aprovação requer o voto de 3/5 dos deputados e senadores, em dois turnos. Privatizações são mais simples, mas ainda assim dependem vários projetos de lei. Não esquecer que ainda está em vigor uma liminar do ministro Lewandowski determinando que cada privatização precisa de uma lei específica.
Moro também já disse que vai propor uma ampla agenda legislativa que avança direto sobre as formas antigas de fazer política – e de financiar partidos e seus líderes.
Como obter maiorias para isso tudo?
Apelando diretamente às baes via redes sociais – essa foi a clara indicação de Bolsonaro no discurso de diplomação. Ou seja, em vez de oferecer cargos e dinheiro aos parlamentares, o presidente eleito acena (ameaça?) com pressão exercida de fora.
Vai funcionar? – já perguntaram a Bolsonaro. A resposta dele foi interessante. Mais ou menos assim, em livre interpretação: ainda não sabemos, mas sabemos que o jeito antigo de fazer política não funcionou.
Observando a cena do lado dos deputados e senadores, a questão prática será a seguinte: aceitar a pressão e aprovar a agenda do governo ou resistir, emparedar o presidente e obrigá-lo a sair no varejo negociando votos?
Políticos experientes sempre tratam de adivinhar para que lado o vento sopra. E neste momento, e por um bom tempo, sopra a favor de Bolsonaro. Além dos recentes milhões de votos, sua popularidade melhorou das eleições para cá e uma boa maioria acha que ele fará um bom governo.
Tudo considerado, não é bom negócio – para usar a linguagem adequada – tentar emparedar o presidente. Melhor para a sobrevivência política, ao menos por ora, é votar a agenda do presidente, deixando claro que é agenda dele nos casos de temas mais controvertidos. Algo assim: olha pessoal, a gente não gosta muito dessas reformas, mas o presidente está pedindo . . .
Vai daí que Bolsonaro começa em boas condições para aplicar suas propostas. Mas não tem o tempo todo. Se demorar a definir suas prioridades, se ficar enrolando em debates internos, enfim, se não entregar algo concreto logo de saída, a popularidade e a força eleitoral vão se diluindo. E, na proporção inversa, aumenta o poder da velha política.
É por isso que muitos integrantes do novo governo falam, por exemplo, em votar a reforma da previdência, ou melhor, em começar a votar ainda no primeiro semestre, na Câmara. Também precisam mostrar rapidamente alguma coisa nas privatizações, item que atrai a atenção dos investidores locais e internacionais. Moro também parece estar apressando seus projetos.
Esse é o jogo que está em andamento.
O outro lado da história está nas bases de Bolsonaro. Por exemplo: os militares querem aumento de salário, quando, lá na equipe econômica, todo mundo sabe que o segundo maior problema das contas públicas está justamente nos gastos com a folha salarial.
O maior problema, na União, nos estados e municípios, está na despesa com pensões e aposentadorias, inclusive nas aposentadorias especiais de policiais e militares, entre outras categorias. Como mexer nas aposentadorias de todo mundo menos naquelas de poucos grupos?
O presidente vai precisar usar com os seus a mesma autoridade com a qual pretende ganhar votos no Congresso.
Tem muita coisa em jogo nos primeiros meses.
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