quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Os donos do incêndio

A notícia continua a causar espanto: um incêndio destruiu no domingo passado a mais antiga instituição científica do País, o Museu Nacional, que, no semestre passado, comemorou seu bicentenário. Diante da tragédia absolutamente inadmissível, é preciso tentar entender as causas e as devidas responsabilidades. Tal descalabro com o patrimônio histórico e cultural não pode passar em branco, também para que não se repita com outras instituições.


O Museu Nacional está vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que por sua vez recebe recursos da União e tem autonomia para administrá-los como bem entender. A responsabilidade pela manutenção e conservação do Museu Nacional cabe, portanto, à UFRJ. Autonomia universitária implica responsabilidade e transparência – a população tem direito de saber como os recursos públicos são geridos e como o patrimônio público sob sua administração é preservado.

Houve quem tenha se apressado em culpar o ajuste fiscal do governo Temer pelas más condições do Museu Nacional. No entanto, não existe tal relação de causa e efeito. Por exemplo, entre 2014 e 2017, houve um aumento dos recursos da União destinados à UFRJ. Em 2014, a universidade recebeu R$ 2,6 bilhões. Em 2017, foram R$ 3,1 bilhões. O problema é que, nesse período, o valor gasto pela UFRJ com pagamento de pessoal saltou de R$ 2,1 bilhões para R$ 2,6 bilhões. O aumento de R$ 500 milhões foi para o funcionalismo.

Além da gestão no mínimo temerária do patrimônio público, chama a atenção na atual reitoria da UFRJ o seu aparelhamento político. O reitor da UFRJ, Roberto Leher, é filiado ao PSOL. A vice-reitora, Denise Fernandes Lopez Nascimento, também é filiada ao PSOL, assim como a pró-reitora de Extensão, Maria Mello de Malta, e o pró-reitor de Pessoal, Agnaldo Fernandes. Há também outros dois pró-reitores filiados ao PCdoB: o pró-reitor de Graduação, Eduardo Gonçalves, e o pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças, Roberto Antonio Gambine Moreira.

É um acinte que a administração da maior universidade federal do País seja controlada por dois partidos políticos que, como se sabe, difundem uma ideologia excludente, avessa ao diálogo e tantas vezes inimiga das liberdades e garantias fundamentais. Só num ambiente de pluralismo e de respeito à liberdade de pensamento e de expressão é que a universidade pode cumprir sua relevante função social. Ao mesmo tempo, não é mera casualidade que a tragédia do Museu Nacional tenha ocorrido na gestão dessas duas legendas, tão críticas da responsabilidade fiscal e de uma gestão profissional dos recursos públicos.

O incêndio do Museu Nacional deve ser um chamado à responsabilidade fiscal e administrativa. Certamente, há modos desastrosos de realizar um corte de gastos públicos, como, por exemplo, diminuir igualmente todos os valores do orçamento, sem distinguir entre o que é prioritário e o que é acessório. Isso não revoga urgente necessidade de um profundo ajuste fiscal. Basta ver que houve um aumento nas receitas gerais da UFRJ e, ao mesmo tempo, nos últimos anos, houve uma diminuição das verbas que a universidade, em sua autonomia administrativa, destinou para o Museu Nacional.

É preciso aprender a lição do Museu Nacional. Não é a austeridade na gestão dos gastos públicos que põe em risco a preservação do patrimônio histórico e cultural do País. O que produz graves perigos é antes a ideia de que os cofres públicos são copiosos a ponto de dispensar uma eficiente gestão dos recursos.

É politicamente fácil culpar o governo federal pelo incêndio ocorrido na Quinta da Boa Vista. Mas, além de não encontrar respaldo na realidade, essa atitude abre caminho para novas tragédias, já que não enfrenta as verdadeiras causas da lamentável situação do Museu Nacional e de tantos outros equipamentos públicos. O incêndio de domingo passado deixou uma mensagem clara: a irresponsabilidade com o dinheiro público sempre causa graves danos ao País.

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