Dizem os jornais que “Temer retoma plano nuclear e governo prevê várias usinas” (Folha de S.Paulo, 25/7). Além do abastecimento interno, prevê-se “aumentar a exportação”. O Comitê de Desenvolvimento do Programa Nuclear Brasileiro estaria encarregado de um “programa para ampliar no País a geração de energia a partir do urânio e dinamizar a mineração no setor”. Mas é um tema que divide especialistas e enfrenta a oposição de ambientalistas internos e externos.
O projeto foi produzido pelo Comitê de Desenvolvimento do Programa Nuclear Brasileiro, vinculado ao Palácio do Planalto e integrado por representantes de 11 ministérios, aos quais tem sido dito que o governo pretenderia construir usinas nucleares em várias partes do País e retomar a construção da usina Angra 3, paralisada desde a Operação Lava Jato.
O panorama na área anda agitado com a notícia de que a estatal russa de energia nuclear já tem uma frota de quatro quebra-gelos a propulsão nuclear, únicos no mundo, e uma unidade de processamento de lixo atômico, com dois reatores de 35 MW cada, abastecidos com combustível nuclear. Após testes no início de 2019, eles deverão ser rebocados para 5 mil quilômetros de distância, no extremo leste do Ártico, onde poderão abastecer 100 mil pessoas. Segundo o Greenpeace, é “um risco sem igual de acidente”, já que a barcaça de transporte tem seu fundo achatado e seria mais vulnerável no mar bravio da região. E também precisa de rebocador – outro risco. Mas a Rússia e a Agência Internacional de Energia Atômica aprovam o projeto, que substituirá outro mais antigo, com reator semelhante ao que explodiu em Chernobyl em 1986. O novo o substituirá com menor impacto ambiental no Ártico, em região que em 2012 teve a menor cobertura de gelo polar da história. O combustível, após 40 anos de uso, irá para aterro de lixo atômico.
Ambientalistas têm dito que o Brasil não precisa deste tipo de projetos com tanto risco. Segundo representante do Greenpeace (22/7), foram gastos R$ 300 bilhões para cobrir danos provocados pelos acidentes em Fukushima, em 2011, e R$ 1,5 trilhão em Chernobyl (1986) – sem falar em gastos para receber o lixo atômico e para desmontar as usinas a serem desativadas quando não mais produtivas. Por essas e outras, Francisco Whitaker, que em 2006 recebeu o Prêmio Nobel Alternativo do Parlamento sueco, diz que a atual proposta do governo brasileiro significa “remar contra a maré e a História”. E lembrou que diversos países estão abandonando a opção nuclear, entre eles a Alemanha, que até 2022 desligará todas as suas usinas nucleares.
Há quem discorde de certos pontos. Por exemplo, o professor do programa nuclear da Coppe/UFRJ Alberto Luiz Coimbra Reis, segundo quem a energia nuclear pode ser considerada “limpa”, pela baixa emissão de gases do efeito estufa. E embora o País tenha tecnologia e matéria-prima indispensáveis, além da sexta maior reserva de urânio do mundo. Mas também ele critica o momento da elaboração da nova política de governo, a apenas seis meses do fim da atual gestão federal.
O Comitê de Desenvolvimento do Programa Nuclear Brasileiro, reinstituído no ano passado, elabora uma proposta de Política Nuclear Brasileira, que deverá ser capaz de nortear o desenvolvimento futuro do programa nuclear. Mas ele não tem tratado de questões como a construção de usinas nucleares.
No âmbito mundial, prossegue a discussão acirrada. O próprio papa Francisco afirmou durante viagem ao Chile que “teme” o risco de uma guerra nuclear. Segundo ele, o mundo está “no limite de uma guerra nuclear” (Estado, 15/1/2018). E acrescentou: “Estou realmente com medo disso. Um acidente é o suficiente para precipitar as coisas”. Ele também tem endurecido suas falas contra as armas nucleares. Acha que os países não devem estocá-las, mesmo para dissuasão.
Nem todos se convencem. A Rússia, por exemplo, inaugurou há pouco tempo uma usina nuclear marítima, com reatores nucleares flutuantes, que vai bombear energia para cidades portuárias e plataformas de perfuração em busca de petróleo. Segundo a empresa estatal russa de energia nuclear, a usina tem “uma grande margem de segurança”, pois é “resistente a tsunamis e desastres naturais”. Segundo grupos ambientais, o projeto deveria chamar-se “Titanic Nuclear” ou “Chernobyl Flutuante”.
Nos últimos meses, as esperanças maiores recaíram nos encontros entre o presidente Donald Trump, dos Estados Unidos, e dirigentes da Coreia do Norte, como Kim Jong-un, nos quais foram tratados temas que preveem a desnuclearização coreana, apoiado até pela China.
À margem de tudo isso, no Brasil ganha força um movimento em favor da ampliação do parque nacional de energia eólica, já que a energia dos ventos responde por 8,5% da potência instalada no País e deve ultrapassar a biomassa (Estado, 5/8) em 2019, para transformar-se na segunda maior fonte geradora de energia, após a eletricidade. A energia dos ventos tem ganhado maior força principalmente nas Regiões Nordeste e Sul do País, “onde giram hoje 6,6 mil cataventos, espalhados por 534 parques eólicos”. A energia solar também tem avançado em algumas regiões.
Seja como for, não é difícil de prever que os próximos tempos trarão notícias importantes sobre o panorama energético brasileiro. E que deverão tratar basicamente da diversificação das nossas fontes de energia – um avanço decisivo para o País. Porque não faz sentido continuarmos presos a poucos mananciais, sem considerar a possibilidade de avanços na diversificação e de ganhos nas estratégias de implantação e de preços, com muitos benefícios para o consumidor. E sem falar, também, que será possível rever a estratégia de grandes barragens, com os problemas que as envolvem (e que afetam recursos hídricos), inclusive o de lobbies e de corrupção.
Washington Novaes
Nenhum comentário:
Postar um comentário