Ao ouvir tais palavras, ele atalhou o interlocutor:
– Esse não é o meu serviço. O meu trabalho é aplicar a lei. (Em inglês, a fala é mais saborosa: “That is not my job. My job is to play the game according to the rules”.)
Não seria ruim se os magistrados do Brasil se lembrassem dessa lição elementar, ao menos de vez em quando. Seria uma boa maneira de variar a cena judiciária a que temos de assistir o tempo todo, com jurisconsultos que se dão ares de estadistas e outros que se veem como salvadores da pátria. Em lugar de aplicar a lei, em lugar de abrir mão de estrelismos, preferem livrar o país dos dragões que o espreitam.
Não seria ruim se os magistrados do Brasil se lembrassem dessa lição elementar, ao menos de vez em quando. Seria uma boa maneira de variar a cena judiciária a que temos de assistir o tempo todo, com jurisconsultos que se dão ares de estadistas e outros que se veem como salvadores da pátria. Em lugar de aplicar a lei, em lugar de abrir mão de estrelismos, preferem livrar o país dos dragões que o espreitam.
Basta ver o que disseram dois dos togados que participaram do julgamento no TSE, Luiz Fux e Gilmar Mendes. Não são dois juízes quaisquer. Tanto Fux quanto Mendes integram também o Supremo Tribunal Federal, que é a Suprema Corte brasileira, ou seja, o que eles pensam sobre Direito e sobre aplicação da lei é matéria da maior relevância para todos os cidadãos brasileiros, sem exceção.
Comecemos pelo que disse Luiz Fux. Como você bem sabe, ele votou pela condenação da chapa Dilma-Temer, mas sua posição foi derrotada por 4 a 3. Pois bem. No dia 12 de junho, segunda-feira passada – depois do julgamento, portanto –, ele compareceu a um seminário para empresários e representantes do mercado financeiro, em São Paulo, e resolveu falar sobre as razões que o levaram a votar como votou. Ao microfone, Fux se abriu:
– Não disputei vaidades. Pensei no que era melhor para o país.
Então está ótimo. Fiquemos com isso. Antes de qualquer outra consideração, porém, mudemos de ministro. Passemos para o que declarou Gilmar Mendes, que fez parte do mesmo julgamento. Na mesma segunda-feira, em entrevista à jornalista Mônica Bergamo, do jornal Folha de S.Paulo, Mendes emitiu um enunciado análogo ao de Fux, mas com o propósito oposto (para ele, Dilma e Temer são inocentes e, graças a seu voto, de desempate, a chapa terminou absolvida):
– Queriam que o tribunal decidisse essa questão política, lançando o país em um quadro de incógnita.
Não precisamos de nenhuma hermenêutica mais mirabolante para verificar que os dois magistrados, Luiz Fux e Gilmar Mendes, alegam ter pensado no bem do Brasil, mas há uma diferença entre eles. O primeiro acredita que condenar a chapa Dilma-
Temer seria o melhor para o Brasil. O segundo alega que esse veredicto lançaria o Brasil “em um quadro de incógnita”.
Notemos como é pitoresca nossa triste situação. Os dois ministros dizem praticamente a mesma coisa, mas os dois dizem coisas antagônicas. Dizem a mesma coisa porque os dois parecem estar convencidos de que a função do juiz é “fazer o que é melhor para o país”, ou, em outros termos, proteger o Brasil porque, sem a proteção das mais altas autoridades do Poder Judiciário, o pobre Brasil pode ser “lançado num quadro de incógnita”. E dizem o oposto um do outro porque, para um, Luiz Fux, a cassação de Dilma Rousseff e de Michel Temer seria o melhor para o Brasil, enquanto para o outro, Gilmar Mendes, a absolvição de Dilma Rousseff e de Michel Temer é que é ótimo para o país. Entendeu bem agora como são paradoxais os desígnios da Justiça?
Em tempo, juízes fazem, sim, justiça – desde que apliquem a lei com sabedoria. Fora isso, algum juiz se lembrou de dizer que, numa democracia, quem resolve o que é melhor para o país são os eleitores e que tribunais não são palanques? Data venia, Excelências, data a máxima venia.
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