O espaço público está se modificando fundamentalmente na Alemanha: aquilo que se inicia como tuíte ou post é capaz de desencadear violência concreta, tem efeito imediato sobre a coesão social no país e também sobre os resultados eleitorais.
Já há abundantes exemplos disso em 2016: as agressões direcionadas na comemoração da Reunificação Alemã em Dresden, em 3 de outubro, o incêndio de uma mesquita na mesma cidade, apenas uma semana antes, a necessidade de proteção policial para deputados críticos à Turquia, o acréscimo mensurável dos crimes de motivação política, a quintuplicação dos ataques a alojamentos de requerentes de asilo.
A campanha para as eleições legislativas de 2017 mostrará: estamos diante de uma transformação radical do espaço público na Alemanha. Qual foi a última vez que um editorial jornalístico desencadeou debate por todo o país? E os debates fundamentais, que dão orientação política e influenciam as decisões eleitorais: eles ainda transcorrem nos parlamentos ou nas associações partidárias locais? Ou será que tudo se desloca para a internet, onde muitas vezes o debate é travado de forma desconsiderada, desumana, sem fatos, como mero embate de opiniões?
Não se trata nem de opiniões equivocadas de uma minoria na rede nem de discussões entre supostos excluídos da sociedade. Quem crê nisso, está no caminho errado. Pois os diferentes movimentos estão em conexão estreita na internet, do movimento xenófobo de protesto Pegida, passando pelos extremistas de direita e o Movimento Identitário (na Alemanha, sob observação dos órgãos de segurança interna), até a agência de notícias russa Sputnik ou as diversas ramificações regionais do partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD).
Eles se fortalecem reciprocamente, para além das fronteiras nacionais, e expandem sua influência constante e mensuravelmente através das mais diferentes plataformas. A rede transforma suas posições políticas em histórias, aglutina seus motivos e conceitos.
Tais campanhas online criam heróis – grandes vencedores políticos como, por exemplo, Donald Trump. Mas também informam os adeptos fundamentalistas na rede sobre os devastadores "atos heroicos" dos autores de atentados jihadistas.
E as campanhas dão aos milhões de seguidores e membros de grupos que compartilham essas histórias a certeza de terem encontrado correligionários e de finalmente ter alguém que os escute. Assim, eles têm a boa sensação de ser porta-vozes em suas comunidades virtuais, determinantes de agenda nos grupos do Facebook, no Twitter, nos comentários dos usuários dos grandes sites de notícias.
Da agenda desses protagonistas ultradireitistas e populistas de direita da rede constam temas centrais para todos: censura e liberdade de opinião, como tramitam os processos democráticos, quanta justiça há na Alemanha? E aí é colocada em questão, em diversos momentos, a credibilidade e capacidade de ação de nossos processos e instituições democráticas, assim como os valores de uma sociedade aberta e tolerante.
Nunca é demais enfatizar, pois na campanha eleitoral de 2017 será decisiva a forma como os partidos e a mídia da Alemanha vão se posicionar quanto a esses temas altamente sensíveis. Quem achar que pode se esquivar deles em seu programa eleitoral, está no caminho errado.
Aprender com Trump significa aprender como vencer – isso é algo que os representantes da AfD não tentam esconder em suas aparições públicas. A convicção de Trump é, sabidamente: "Não preciso de partido, nem de mídia. Eu sou um movimento!"
O mesmo, aliás, também vale para antidemocratas como os presidentes turco, Erdogan, e russo, Putin. Todos eles apostam na rede e na forma como ela funciona, em sua comunicação direta, sua interconexão e na maciça multiplicação dos conteúdos.
"É preciso poder dizer isso", tem reivindicado o AfD regularmente em suas declarações. Linguagem simples e um conjunto reduzido de mensagens claras contribuem para o sucesso da legenda. Termos de luta centrais se consolidam na internet, sendo, então transferidos para a discussão política: "imprensa da mentira", "canalha migrante", "traidores do povo", "islamização", "inversão étnica", "clube de swingers político" – em 2017 a lista seguramente continuará se estendendo. Essa linguagem é um fator de êxito decisivo para a AfD.
Qual é a reação adequada? Para a política como para a mídia: manter a credibilidade – o que inclui nem ignorar os temas e emoções na internet, nem minimizá-los. Compreender que política e mídia existem para abordar os temas que movimentam as pessoas, e que ambas lhes devem contas; que a fidelidade aos fatos é o que fará a diferença, o mais tardar depois das eleições.
E que a corrida já está perdida se nos furtarmos a esses debates – difíceis, mas tão importantes para nosso futuro social e político – e simplesmente contornarmos esses assuntos: isso não vai funcionar!
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