Ferreira e Mackenzie comandam as maiores empresas de mineração do mundo, Vale e BHP Billiton, somando vendas anuais de US$ 60 bilhões. São os principais executivos por trás da mineradora Samarco, subsidiária Vale-BHP, responsável pela mutação da paisagem e da vida numa área de 70 mil quilômetros quadrados, entre Minas Gerais e Espírito Santo, com graves sequelas para três milhões de pessoas às margens da bacia do Rio Doce.
Trinta e seis semanas depois da tragédia, Ferreira e Mackenzie permanecem inertes, atolados no rio de 34 milhões de metros cúbicos de lama de rejeitos despejado pela Samarco.
Desde o desastre, em novembro, resguardaram-se sob a camuflagem da responsabilidade jurídica da subsidiária. Ferreira (Vale) foi explícito, por exemplo, em entrevista à repórter Míriam Leitão: “A Samarco tem toda a responsabilidade. A Vale e a BHP, como acionistas da Samarco, são responsáveis em decorrência do que houve com a Samarco. Não diria que são corresponsáveis, elas são responsáveis como acionistas.”
Na sequência, ele e Mackenzie resgataram um encardido manual de procedimentos para contenção de danos à imagem dos grupos controladores — o mesmo que a BHP Billiton usou em Papua Nova Guiné, nos anos 80, quando inundou com rejeitos os rios Ok Tedi e Fly.
Em abril viram uma oportunidade no mercado político, onde Vale, BHP e Samarco consolidaram vasta “clientela”, inclusive com doações às campanhas de 166 dos 513 deputados federais e 14 dos 81 senadores. Ferreira e Mackenzie acertaram com a presidente Dilma Rousseff e os governadores Fernando Pimentel (Minas Gerais) e Paulo Hartung (Espírito Santo) o desembolso de U$S 2 bilhões em indenizações. Tropeçaram no Ministério Público, que foi à Justiça lutar pela reparação dos danos em valor 23 vezes maior (US$ 46 bilhões).
O acordo político foi suspenso pela Justiça. Restaram incertezas, destruição e mortes (a última das 19 vítimas foi localizada em março, quatro meses depois, sob a lama). O legado nas 230 cidades atingidas é o aumento da pobreza e do desemprego — alcançou um terço da força de trabalho na área onde a mineração é a principal atividade desde a Colônia.
Sobra ceticismo sobre o futuro da bilionária joint venture da Vale de Ferreira com a BHP de Mackenzie. Múltiplos processos no Brasil e nos EUA lançam “dúvidas substanciais sobre a continuidade operacional da companhia”, ressaltaram auditores da Pricewaterhouse no mais recente balanço.
Os executivos, agora, parecem inclinados apostar na “solução” mais fácil, a via burocrática judicial. Ela prevê um cipoal de recursos legítimos, com potencial protelatório suficiente para não atrapalhar planos e bônus de aposentadoria — eventualmente, embalados no ritmo lírico de obras como “A flor e a náusea”, onde se lê: “Crimes da terra, como perdoá-los?/ Tomei parte em muitos, outros escondi.”
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