sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

A alma do outro mundo

Décadas atrás, para assustar as criancinhas, os mais velhos ameaçavam com a aparição das “almas do outro mundo”. Tratava-se de forma mais amena do que lembrar da existência de lobisomens, vampiros, mulas-sem-cabeça, cucas, zumbis e penduricalhos.

Pois acaba de aparecer outro tipo de alma, até prova em contrário, deste mundo mesmo. É a “viva alma que neste país não tem mais honesta do que a dele”. Assim definiu-se o Lula em encontro com blogueiros, quarta-feira. Pretensão igual só no almanaque dos santos. Situou-se no mesmo patamar da Polícia Federal, do Ministério Público, dos Sindicatos e das Igrejas Católica e Evangélica. Sua alma, motivo de orgulho, equivale ao grande prêmio nas delações premiadas. Ganha o delator que conseguir citá-lo mais vezes.

O Lula saiu em defesa dos companheiros processados, condenados e presos, ainda que referidos tenham sido apenas João Vaccari Neto e José Dirceu. Há ansiedade na longa fila formada atrás deles, também ávidos de uma solidariedade até agora invisível.

Direito de defender-se, e aos condenados, o ex-presidente possui. Como também de processar jornalistas, mesmo tornando-se agressão atacar nossa dignidade profissional. Até de comparar a roubalheira verificada no PT com a de outros partidos. O que não dá para aceitar é a ausência de alma mais honesta do que a dele. Afinal, sua performance na presidência da República, e depois, vem sendo objeto de referências nas delações premiadas. Apartamentos milionários, sítios, viagens, negócios e palestras subsidiadas por empreiteiras e governos estrangeiros, filhos endinheirados sem explicação da origem, amigos privilegiados, auxiliares na cadeia – tudo merece ser examinado à luz da honestidade da alma, se não for do outro mundo.

Vai ficando claro que o Lula se defende mais do que devia ou podia. Suas observações beiram a incerteza, ao acentuar que “perdemos a nossa gente”, junto com reprimendas à sucessora. Trocar Joaquim Levy por Nelson Barbosa, para ele, dá a impressão de substituir seis por meia dúzia. E sua candidatura em 2018 parece a única saída para o PT.

Nos anos setenta a propaganda do regime militar contagiava os Estados através do “milagre brasileiro”. Os governadores, mesmo impotentes e subservientes, buscavam imitar o modelo nacional. No Paraná desenvolveu-se intensa campanha que começava na fronteira com Santa Catarina. O motorista que chegava deparava-se com imensa placa de promoção onde se lia: VOCÊ ESTÁ ENTRANDO NO PARANÁ. AQUI SE TRABALHA!

Os catarinas não gostaram e dias depois apareceu outra placa, maior e em sentido contrário: VOCÊ ESTÁ ENTRANDO EM SANTA CATARINA. AQUI SEMPRE SE TRABALHOU…

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