sábado, 18 de julho de 2015

O strip-tease da República

A crise política agrava-se e transcende as que a precederam. Não há paralelo possível entre a queda de Collor ou o Mensalão e o que se passa agora. Há uma crise de credibilidade nas instituições, que dificulta a construção de uma saída pacífica ou previsível.

Nenhum dos poderes está sendo poupado na guerra institucional que está sendo travada. Nenhum escapa à decepção popular. Na raiz do problema, está a promiscuidade que marca as relações entre eles. A Constituição fala em poderes independentes e harmônicos, mas harmonia não é promiscuidade.

O encontro secreto, em Portugal, entre a presidente Dilma e o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, para discutir a operação Lava-Jato e o impeachment – temas que chegarão àquela corte –, foi, por exemplo, promiscuidade institucional pura.

Maculou sobretudo o Judiciário, sobre o qual recai, ainda por cima, a desconfiança da opinião pública quanto à isenção de alguns ministros com recente passado partidário.

O Executivo, cuja titular será alvo de processo de impeachment, já confirmado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, o elenco de acusados e suspeitos começa no seu entorno: seu chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e seu ministro da Comunicação Social (e ex-tesoureiro de campanha), Edinho Silva, foram citados na delação de Ricardo Pessoa, na Lava-Jato.

Lavajato-no-congresso

No Congresso, o mais aberto dos poderes, a bagunça (para dizer o mínimo) é geral. Não bastasse haver ali 29 partidos – a maioria representando coisa nenhuma -, nenhum se apresenta de maneira unívoca quanto ao que acontece.

Os presidentes da Câmara e Senado, Eduardo Cunha e Renan Calheiros, têm em comum o incômodo da Lava-Jato, que os transfigurou em oposicionistas, depois de mais de uma década como aliados incontestes do petismo.

O PSDB, maior partido de oposição – ou por outra, o segundo maior, já que o PMDB deve migrar para a mesma trincheira – diverge internamente quanto ao desfecho da crise.

Aécio Neves sonha com a cassação da chapa Dilma-Temer, o que provocaria novas eleições, em que as pesquisas o mostram como franco favorito. Já o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, também postulante à presidência, quer manter Dilma sangrando até 2018, período de que carece para firmar sua candidatura presidencial em âmbito nacional.

O PMDB, que, independentemente de crises, é um saco de gatos, também tem sonho duplo: ou o impeachment de Dilma, que lhe daria o comando do país, com Michel Temer, ou o parlamentarismo, segundo propõe Eduardo Cunha.


O problema do parlamentarismo, um sistema efetivamente mais funcional, é a credibilidade do presente Parlamento, que as pesquisas, em que algumas dezenas de integrantes andam às voltas com o Código Penal.

O Tribunal de Contas da União (TCU), órgão de apoio ao Legislativo – e que irá julgar as contas do governo Dilma em agosto -, teve sua credibilidade abalada pela denúncia de tráfico de influência do filho de seu presidente, Augusto Nardes, acusado por Ricardo Pessoa de fornecer informações reservadas sobre processos que lá tramitam. Acusação séria e documentada. Questionam-se (expressão moderada) suas condições de continuar onde está.

Não há, em suma, um projeto para o país, mas tão somente para cada qual dos protagonistas, que não percebem – ou pelo menos parece – que esta crise, diferentemente das outras, tem povo, que promete voltar às ruas no dia 16 de agosto e já se manifesta com veemência nas redes sociais.

Nenhuma das propostas até aqui conhecidas tem consenso – e nenhuma é indolor. Qualquer delas provocará reações das facções derrotadas, não se devendo subestimar a tropa de choque do PT, que perdeu popularidade, mas não organicidade.

O “exército do Stédile” promete entrar em cena e a militância já convoca os black blocs, assumindo, num ato falho (ou de desespero) sua paternidade, antes negada.

Supondo que, em vez de impeachment, haja a cassação da chapa eleitoral, alvo das denúncias da Lava-Jato, a linha sucessória está contaminada: Eduardo Cunha e Renan Calheiros podem até já não estar ocupando as respectivas cadeiras naquela ocasião.

Para complicar, já se anunciam as CPIs do BNDES, da Eletrobras e dos fundos de pensão. Nada menos. Sabe-se que irão mexer em vespeiros assemelhados aos da Petrobras, com os mesmos métodos e personagens em ação.

Como pano de fundo, a crise econômica, que se retroalimenta da crise política e não dá sinais de melhora.

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