Há um notório sentimento popular de cansaço, de enfado, de identificação do voto como um ato inútil, que nada muda
A
proximidade das eleições permite uma breve reflexão sobre o processo de
formação de uma cultura política democrática no Brasil. A República nasceu de
um golpe militar. A participação popular nos acontecimentos de 15 de novembro
de 1889 foi nula. O novo regime nasceu velho. Acabou interrompendo a
possibilidade de um Terceiro Reinado reformista e modernizador, tendo à frente
Isabel como rainha e chefe de Estado e com os amplos poderes concedidos pela
Constituição de 1824.
A nova
ordem foi edificada para impedir o reformismo advogado por Joaquim Nabuco,
Visconde de Taunay e André Rebouças, que incluía, inclusive, uma alteração no
regime de propriedade da terra. Os republicanos da propaganda — aqueles que
entre 1870, data do Manifesto, e 1889, divulgaram a ideia republicana em atos
públicos, jornais, panfletos e livros — acabaram excluídos do novo regime.
Júlio Ribeiro, Silva Jardim e Lopes Trovão, só para recordar alguns nomes,
foram relegados a plano secundário, considerados meros agitadores.
O vazio
no poder foi imediatamente preenchido por uma elite política que durante
decênios excluiu a participação popular. As sucessões regulares dos presidentes
durante a Primeira República (1889-1930) foram marcadas por eleições
fraudulentas e pela violência contra aqueles que denunciavam a manipulação do
voto.
O processo eleitoral reforça este quadro de hostilidade à política. A mera realização das eleições — que é importante — não desperta grande interesse. Há um notório sentimento popular de cansaço, de enfado, de identificação do voto como um ato inútil, que nada muda. De que toda eleição é sempre igual, recheada de ataques pessoais e alianças absurdas. Da ausência de discussões programáticas. De promessas que são descumpridas nos primeiros dias de governo. De políticos sabidamente corruptos e que permanecem eternamente como candidatos — e muitos deles eleitos e reeleitos. Da transformação da eleição em comércio muito rendoso, onde não há política no sentido clássico.
Leia mais "Os desiludidos da República", de Marco Antonio Villa
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