Multiplique-se esse valor por milhões de pessoas e não admira que estejamos a viver uma catástrofe climática (ora que os termos “aquecimento global” ou “alterações climáticas” nos parecem eufemismos, quando diariamente nos chega mais uma notícia de uma inundação de proporções bíblicas ou de um glaciar que colapsou sobre uma aldeia nos Alpes).
Este consumo de energia está agora à beira de aumentar exponencialmente em resultado da Inteligência Artificial e, de acordo com a informação mais recente, não será com energia limpa. Estima-se que alimentar os data centers ‒ onde são treinados os modelos de LLM (Large Language Models) e processados os pedidos dos utilizadores – implicará, até 2028, um aumento de 20% do consumo de energia, só nos Estados Unidos da América. Embora as Big Tech anunciem o seu compromisso com a neutralidade carbónica nas próximas décadas, tal não é coerente com os projetos de construção de centrais de gás natural em marcha, para garantir uma utilização 24 horas, 7 dias por semana. E sendo certo que em média tais centrais têm uma vida útil de 30 anos, irão certamente manter-se em funcionamento, mesmo que no entretanto as centrais nucleares planeadas sejam efetivamente construídas. Curiosamente, a energia nuclear é agora apresentada como “limpa” e “segura”, não obstante os problemas conhecidos com o tratamento dos resíduos em Fukushima e Chernobyl serem acontecimentos relativamente recentes, cujas regiões continuarão, para sempre, como zonas interditas, dado os níveis de radiação.
Mas é inevitável que assim seja? Na verdade, não. É um tema de planeamento de fontes de produção e regras de utilização. A produção elétrica encontra-se dimensionada para os picos de utilização e, em média, apenas 53% da energia produzida é efetivamente utilizada. Igualmente os picos de grande intensidade de utilização não representam mais de 80 a 90 horas ao longo do ano (dados do Electric Power Research Institute – um centro de investigação norte-americano).
Um estudo recente, da Duke University, demonstra que uma utilização mais flexível da energia pelos data centers permitiria absorver o aumento do consumo, sem aumentar significativamente a capacidade de produção. Mas para tal será necessário os reguladores intervirem, pois as Big Tech insistem em poder oferecer os seus serviços 24 horas, 7 dias por semana, sem flutuações, interrupções ou limitações. Mas sendo a segurança energética e a sustentabilidade climática um problema de todos, é razoável que as políticas de produção energética sejam determinadas por um número restrito de empresas, apostadas apenas em maximizar o lucro?
A Europa prepara-se para investir na sua própria infraestrutura de data centers, de forma a treinar os seus modelos LLM (assegurando autonomia estratégica), e as Big Tech norte-americanas já anunciaram investimentos nos seus data centers localizados na Europa. É, por isso, fundamental assegurar que tal não implicará um aumento do consumo de energia fóssil que ponha em causa os compromissos de descarbonização. Igualmente importa compreender como será determinada a tarifa aplicável às Big Tech. Nos EUA, as Big Tech estão a celebrar contratos privados de forma a garantir tarifas especiais, na prática, transferindo para o retalho o custo das novas estruturas. Importa exigir transparência na efetiva energia consumida (a treinar modelos, a responder a questões, a gerar fotos e vídeos) e regular as fontes de energia, de forma a planear adequadamente; agora que a utilização da Inteligência Artificial se torna cada vez mais presente e o seu uso impossível de evitar.

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