quarta-feira, 10 de abril de 2024

Para onde vai Israel?

O chef espanhol José Andrés, fundador da World Central Kitchen (WCK), especializada em distribuir ajuda alimentar a vítimas de conflitos armados, acusou o Exército israelense de ter assassinado deliberadamente sete funcionários da organização. Segundo Andrés, o atual governo de Israel trava uma guerra contra a Humanidade.

Andrés não é a única pessoa a pensar assim. Um pouco por todo o mundo cresce a percepção de que Israel está em vias de se transformar num estado terrorista.

Nos últimos dias, além do assassinato dos funcionários da WCK, Israel atacou a embaixada iraniana em Damasco, causando 11 mortes. Por outro lado, em mais uma manobra que confirma a deriva totalitária em curso, o Knesset, parlamento israelense, aprovou legislação que visa a silenciar a Al-Jazeera e outros canais noticiosos internacionais críticos do regime. Tudo isto enquanto prossegue a matança em Gaza.


Mais tarde ou mais cedo, a pressão interna e externa culminará no afastamento de Benjamin Netanyahu e do seu governo extremista. A grande questão não é saber se o primeiro-ministro cairá, mas quando. Muito mais importante: quem o substituirá?

Dezenas de milhares de judeus israelenses que vêm exigindo nas ruas a saída de Netanyahu não parecem muito incomodados com o dramático destino da população palestina. Os judeus israelenses estão zangados com o atual governo porque este não foi capaz de prever e de se antecipar ao ataque terrorista do Hamas, a 7 de outubro de 2023. Estão zangados porque Netanyahu é indiferente ao destino dos reféns. Estão zangados com a incompetência política, diplomática e militar dos seus governantes, que não conseguem nem eliminar o Hamas, nem contrariar o processo de isolamento do país.

A crueldade e a arrogância dos dirigentes israelenses — muitos dos quais defendem, sem o menor vestígio de vergonha, a expulsão dos palestinos de Gaza — horrorizam o mundo, e uma larga parte das comunidades judaicas fora de Israel. Contudo, dentro das fronteiras do país são raras as vozes judias que se erguem para se solidarizar com o sofrimento do povo palestino.

Aprendi a amar Israel através da sua literatura, lendo as obras de escritores lúcidos e corajosos, capazes de olhar o outro, como quem se olha ao espelho, e de erguer pontes de afeto e de empatia entre as diferentes comunidades. Não sei onde estão agora esses escritores. Não sei onde estão as pessoas, os movimentos, as instituições, que possam servir de referência moral, em meio à tempestade de ódio e de bruta irracionalidade que varre o país.

Sim, Netanyahu cairá. Já está caindo. Cairão com ele, muito provavelmente, algumas das personalidades mais repugnantes que constituem o atual governo israelense. Nessa altura, ficaremos a conhecer todo o horror em curso na Faixa de Gaza. O pouco que sabemos hoje já nos permite intuir a imensidão do desastre. Israel levará gerações para reconquistar a simpatia do mundo.

Este é o vaticínio otimista. Implicaria uma insurgência pacifista, um amplo movimento de reflexão da sociedade civil israelense, que se atrevesse a colocar em causa muitos dos fundamentos do próprio estado de Israel. Infelizmente, não vejo sinais de que essa insurgência venha algum dia a emergir.

Nenhum comentário:

Postar um comentário