Planejado, o movimento de campanha envolvendo evangélicos é contínuo. Na sexta-feira, Bolsonaro usou a 43ª Assembleia Geral das Assembleias de Deus do Ministério de Madureira para voltar a Juiz de Fora, 1.408 dias depois do atentado que sofreu na cidade. Procurou sem sucesso desviar o foco do assassinato brutal do tesoureiro do PT de Foz de Iguaçu, que comemorava seu aniversário quando foi morto a tiros por um bolsonarista. Visitou também a Santa Casa que prestou a ele o primeiro atendimento após a facada. Antes, em clima de euforia, nada parecido com a comoção ensaiada que apresentou mais tarde, havia curtido uma motociata com apoiadores. Tudo em dia de batente, custeado pelos impostos dos brasileiros.
E nada acontece, nem mesmo um puxãozinho de orelha. Assim como fez com o Senado e a Câmara no episódio de aprovação da PEC kamikaze, no qual usou os pobres para constranger os parlamentares, Bolsonaro desafia a Justiça com ameaças golpistas, inibindo iniciativas de processos, multas e de impedimento de sua candidatura por desrespeito à legislação eleitoral. Instiga o temor da ruptura democrática para minar a democracia.
De meados de abril para cá, essa foi a 15ª participação de Bolsonaro em cerimônias evangélicas, sete delas em dia de semana, sem qualquer preocupação de casar a agenda religiosa-eleitoral com compromissos formais de governo.
Além da presença, que confere prestígio aos eventos e aos pastores que os lideram, Bolsonaro tem feito o diabo para garantir o apoio irrestrito de representações evangélicas. Anulou dívidas e promulgou isenções de impostos, em um movimento de engana-bobo grotesco – primeiro vetou o perdão de mais de R$ 1 bilhão devido pelas igrejas e depois fez de tudo para que o Congresso derrubasse o veto. Nomeou um ministro “terrivelmente evangélico” para o STF e abriu as portas do Palácio do Planalto para pastores lobistas flagrados em relações nada republicanas entre o Ministério da Educação e prefeituras. Mais: no dia 12, editou um decreto que modifica o Código Nacional de Telecomunicações, permitindo que emissoras de rádio e televisão possam vender até 100% de seu tempo, antiga reivindicação das igrejas. Pai como este, nem nos céus.
Bolsonaro é originalmente católico, evangélico por influência da mulher Michelle e conveniência eleitoral. Batizou-se no Rio Jordão e passou a ter como queridinho o pastor Silas Malafaia, que parece atrelar a fidelidade não a Deus, mas ao bolso. Em 2012 apoiou o candidato José Serra do PSDB, mesmo partido do presidente Fernando Henrique Cardoso, que Bolsonaro sugeriu ser “fuzilado” por cometer o crime de privatizar estatais. Agora, o mesmo Bolsonaro diz querer privatizar a Petrobras para baixar o preço dos combustíveis, como se o investidor privado fosse abrir mão de políticas de mercado. Algo de fazer até Deus gargalhar.
Para agradar aos evangélicos e à turba conservadora, nas pautas comportamentais Bolsonaro também deu uma guinada incrível: afirma ser radicalmente contra o aborto. Bem diferente de 2000, quando assegurava que essa deveria ser “uma decisão do casal”. Ou seja, suas crenças são de mentira, do jeito que o capeta gosta.
Apesar da ação intensa para assegurar a preferência dos evangélicos – único público em que Bolsonaro detém intenção de votos superior à do adversário Luiz Inácio Lula da Silva -, o embate continua duro. De acordo com o último Datafolha, entre os fiéis, Bolsonaro detém a preferência de 40%. Outros 35% optam por Lula.
Os números refletem um cenário que vai muito além da religiosidade. A maioria dos evangélicos é pobre e a maioria dos pobres rejeita Bolsonaro. São os dados que a campanha de reeleição do presidente tenta inverter com bondades temporárias – aumento no Auxílio Brasil, bolsa-gás, bolsa-caminhoneiro autônomo, troco para taxistas, caixas-d’água, tratores… – e com abuso sem limites da fé.
Mas há um consolo: Deus tudo vê.
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