É preciso um “revogaço” dos atos inconstitucionais que, em vários órgãos, decretam sigilo de até cem anos em toda sorte de informação relevante que, por ser pública, tem de estar acessível.
O Gabinete de Segurança Institucional (GSI), chefiado pelo general Augusto Heleno, tem sido a casa das máquinas da tentativa de Bolsonaro de evitar que atos seus, dos filhos e de auxiliares ganhem a luz.
Nada melhor para garantir transparência a um regime opaco como o de Bolsonaro que aumentar a carga dos holofotes. Diante da publicação das justificativas inacreditáveis para a recusa em fornecer ao GLOBO a lista com todas as vezes em que os pastores lobistas do MEC, Gilmar Santos e Arilton Moura, foram ao Planalto, Heleno teve de retroceder e entregar ao jornal aquilo que é do público por lei.
Mas esse não era um episódio isolado de tentativa de sonegar informações. Desde os gastos com cartão de crédito da Presidência, passando pelo cartão de vacina de Bolsonaro (!), a ordem nessa gestão é manter tudo o possível trancafiado nos porões, se der por até cem anos, para que nem a História possa fazer o justo registro de uma das épocas mais pródigas em retrocessos que o país já viveu.
Não é só o gosto pela escuridão que dita esta política. Claramente existe muito a esconder. Agora que o jogo de esconde-esconde acabou, descobrimos que um dos pastores esteve nada menos que 35 vezes no Planalto, enquanto o outro por lá passou em dez ocasiões. Segundo o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, havia um “pedido especial” de Bolsonaro para atender prioritariamente aos dois chefes religiosos na liberação de verbas na pasta.
O acesso regular de Carlos e Jair Renan Bolsonaro ao palácio, que o general Heleno também se prontifica a manter longe da vista do público, não se deve a saudades do papai, mas à necessidade de construir a partir do Planalto a rede da campanha à reeleição dele, no caso do filho Zero Dois, e de tráfico de influência junto a empresários, no caso do Zero Quatro.
Essas informações são relevantes e urgentes, pois delas dependerá uma série de iniciativas para investigações já requeridas — algumas andando a passos lentos, a contragosto do procurador-geral da República, outras simplesmente abafadas, por obra e graça deste ou do Congresso.
A Lei de Acesso à Informação (LAI), um marco na transparência de dados no Brasil, completou dez anos em novembro de 2021. Ela faculta a qualquer cidadão o direito de solicitar informações aos três Poderes e exige destes a prestação ágil e objetiva dessas informações.
Desde que assumiu, Bolsonaro investe de forma calculada na redução da transparência alcançada com esse e outros institutos legais. Em recente viagem presidencial à Rússia e à Hungria, o governo alugou trituradoras de documentos. Para quê? Quem regulamenta o tipo de papéis que podem ser destruídos numa viagem oficial? A opacidade vai se tornando regra, de forma que esses episódios passem batidos.
As desculpas para decretar sigilo de cem anos a informações que têm de estar ao alcance de todos são as mais estapafúrdias. Tanto que nem Heleno conseguiu segurar o rojão.
Cabe ao Supremo julgar de forma sistemática as várias representações que há contra medidas dessa natureza, reiterar o princípio constitucional da publicidade e que a LAI continua em pleno vigor.
Não pode ficar para depois da eleição, pois o escrutínio do eleitor em outubro tem de se dar de posse de todas as informações sobre o que se praticou nos gabinetes do poder com o dinheiro público.
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