A pandemia decuplicou o problema. Se eu caminho por 15 minutos, da rua onde moro até o largo do Machado, para buscar uma encomenda nos Correios, sou parado de três a quatro vezes com pedidos de dinheiro. "Para comprar comida" —é a explicação de homens ou de mulheres com filhos agarrados às pernas. Quando não tocam o interfone do meu prédio, a qualquer hora, com a mesma solicitação.
Quem recebe algum tipo de auxílio sonha em ver carne no prato em primeiro lugar e depois ovo, arroz, feijão. Passar algum tempo, enquanto o dinheiro durar, longe dos ultraprocessados —macarrão instantâneo, biscoitos, salgadinhos—, que fazem mal à saúde e têm sido um engana-barriga na adversidade.
Um ano depois do primeiro caso de Covid, o país passou a discutir um conceito, o da insegurança alimentar, antes restrito aos pesquisadores. Os estudos registram números alarmantes: 59,3% dos brasileiros —125,6 milhões— não comeram em quantidade e qualidade ideais desde a chegada do vírus. Para 44% das pessoas, a carne sumiu.
O governo atual nunca se interessou em combater a desigualdade --nem antes nem durante a pandemia. E, como também jamais enfrentou a crise sanitária, tornou-se o principal agente da fome. Um sabotador da vida por cálculo político.
Não à toa Bolsonaro vive antevendo saques, desordens e convulsões sociais. "O Brasil está no limite. Parece um barril de pólvora", comemora o presidente que se alimenta no bandejão do caos.
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