Mas será necessário que os pregadores da prosperidade venham a público reconhecer o erro e pedir perdão às pessoas por pregarem um evangelho distorcido, para que os cristãos abram os olhos? Que dificuldade haverá em discernir que esta teologia é geograficamente localizada tratando-se de mais um produto religioso “Made in USA”, tal como algumas vertentes religiosas bem conhecidas?
A teologia da prosperidade é uma aberração capitalista. A ideia de que Deus tem casas com piscina, aviões particulares e outras mordomias para distribuir a granel é um insulto ao evangelho, que é centrado no Ser e não no Ter, essa tara dos nossos dias. É sobretudo um insulto aos pobres, os quais Jesus declarou que sempre existirão: “Porque os pobres sempre os tendes convosco, mas a mim nem sempre me tendes” (João 12:8).
Aliás, este episódio ilustra exactamente o contrário. Maria de Betânia decidiu ir buscar um frasco de perfume caro, que representava uma espécie de reserva financeira para o caso de alguma eventualidade inesperada, e derramou o líquido sobre os pés de Jesus, ungindo-os em atitude de adoração. Judas Iscariotes, o tesoureiro do colégio apostólico, apressou-se a censurar o acto, dizendo que seria preferível tê-lo vendido e dar o dinheiro aos pobres. Mas o evangelho é muito claro: “Ora, ele disse isto, não pelo cuidado que tivesse dos pobres, mas porque era ladrão e tinha a bolsa, e tirava o que ali se lançava” (João 12:6). A versão moderna do chico-esperto.
De facto sempre existiram e existirão grandes contrastes sociais e pobreza nas sociedades, uma vez que as ideologias políticas nunca conseguiram criar relações sociais justas, equitativas e com igualdade de oportunidades em ambiente de liberdade. O ideal comunista falhou rotundamente em toda a parte do mundo onde foi tentado. É por isso que se torna tão irresponsável criar a ilusão de que qualquer um pode ser abastado apenas em resultado dum acto de fé, como que por magia.
Mas o sistema capitalista também está ferido de imensas injustiças e não passa de outra forma de vender ilusões. Uma teologia que vende a ideia de que se tivermos muita fé podemos ser ricos não passa duma tradução do liberalismo levado ao extremo e de uma aberração capitalista. De facto, o princípio bíblico “No suor do teu rosto comerás o teu pão” (Génesis 3:19) parece omitir toda a sorte de especulação, em especial a dos lucros derivados dos mercados financeiros.
Paul Collier dizia, em entrevista ao Expresso: “O capitalismo está eticamente nu e será destruído se não mudar”. Este economista e professor da Universidade de Oxford, pensa que a pandemia de covid-19 pode agravar ainda mais a crise capitalista, já que se torna necessário “enfrentar a ascensão do individualismo e a destruição do sentido de comunidade, bem como o desvio das empresas de cumprirem objectivos sociais para apenas buscarem o lucro”.
Ora, é aqui que bate o ponto. O sistema capitalista, que por influência calvinista inicialmente apresentava um rosto humano, tornou-se um sistema sem rosto e sem coração, completamente cego e surdo ao clamor dos pobres. Do princípio protestante do esforço, do trabalho sério e do investimento derivava uma vida frugal, em que os lucros obtidos eram canalizados para o apoio social aos mais pobres e para reinvestir, criando assim mais riqueza e oportunidades de trabalho.
A ética protestante não reservava aos investidores vidas de nababo, improdutivas, totalmente à custa da força do trabalho alheio. Mas tudo isso se perdeu. Pelo contrário, pensava-se que Deus não só abençoava como recompensava o esforço individual, o que constituía um signo de salvação.
Assim, a malfadada teologia da prosperidade não passa dum subproduto deste capitalismo selvagem que temos hoje, e que passou a “adorar” um Deus que substituiu o lema “No suor do teu rosto comerás o teu pão” pela tentação do deus Mamom: “Tudo isto te darei se, prostrado, me adorares” (Mateus 4:9).
José Brissos-Lino
A teologia da prosperidade é uma aberração capitalista. A ideia de que Deus tem casas com piscina, aviões particulares e outras mordomias para distribuir a granel é um insulto ao evangelho, que é centrado no Ser e não no Ter, essa tara dos nossos dias. É sobretudo um insulto aos pobres, os quais Jesus declarou que sempre existirão: “Porque os pobres sempre os tendes convosco, mas a mim nem sempre me tendes” (João 12:8).
Aliás, este episódio ilustra exactamente o contrário. Maria de Betânia decidiu ir buscar um frasco de perfume caro, que representava uma espécie de reserva financeira para o caso de alguma eventualidade inesperada, e derramou o líquido sobre os pés de Jesus, ungindo-os em atitude de adoração. Judas Iscariotes, o tesoureiro do colégio apostólico, apressou-se a censurar o acto, dizendo que seria preferível tê-lo vendido e dar o dinheiro aos pobres. Mas o evangelho é muito claro: “Ora, ele disse isto, não pelo cuidado que tivesse dos pobres, mas porque era ladrão e tinha a bolsa, e tirava o que ali se lançava” (João 12:6). A versão moderna do chico-esperto.
De facto sempre existiram e existirão grandes contrastes sociais e pobreza nas sociedades, uma vez que as ideologias políticas nunca conseguiram criar relações sociais justas, equitativas e com igualdade de oportunidades em ambiente de liberdade. O ideal comunista falhou rotundamente em toda a parte do mundo onde foi tentado. É por isso que se torna tão irresponsável criar a ilusão de que qualquer um pode ser abastado apenas em resultado dum acto de fé, como que por magia.
Mas o sistema capitalista também está ferido de imensas injustiças e não passa de outra forma de vender ilusões. Uma teologia que vende a ideia de que se tivermos muita fé podemos ser ricos não passa duma tradução do liberalismo levado ao extremo e de uma aberração capitalista. De facto, o princípio bíblico “No suor do teu rosto comerás o teu pão” (Génesis 3:19) parece omitir toda a sorte de especulação, em especial a dos lucros derivados dos mercados financeiros.
Paul Collier dizia, em entrevista ao Expresso: “O capitalismo está eticamente nu e será destruído se não mudar”. Este economista e professor da Universidade de Oxford, pensa que a pandemia de covid-19 pode agravar ainda mais a crise capitalista, já que se torna necessário “enfrentar a ascensão do individualismo e a destruição do sentido de comunidade, bem como o desvio das empresas de cumprirem objectivos sociais para apenas buscarem o lucro”.
Ora, é aqui que bate o ponto. O sistema capitalista, que por influência calvinista inicialmente apresentava um rosto humano, tornou-se um sistema sem rosto e sem coração, completamente cego e surdo ao clamor dos pobres. Do princípio protestante do esforço, do trabalho sério e do investimento derivava uma vida frugal, em que os lucros obtidos eram canalizados para o apoio social aos mais pobres e para reinvestir, criando assim mais riqueza e oportunidades de trabalho.
A ética protestante não reservava aos investidores vidas de nababo, improdutivas, totalmente à custa da força do trabalho alheio. Mas tudo isso se perdeu. Pelo contrário, pensava-se que Deus não só abençoava como recompensava o esforço individual, o que constituía um signo de salvação.
Assim, a malfadada teologia da prosperidade não passa dum subproduto deste capitalismo selvagem que temos hoje, e que passou a “adorar” um Deus que substituiu o lema “No suor do teu rosto comerás o teu pão” pela tentação do deus Mamom: “Tudo isto te darei se, prostrado, me adorares” (Mateus 4:9).
José Brissos-Lino
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