Ainda mais importância tem a figura presidencial durante graves crises como a que ora o País atravessa, a confluência de crises econômica, política e social com a maior emergência sanitária deste século, o que eviscerou mazelas há muito intratadas. Nesta hora grave, aos aspectos formais da liderança se soma o valor intangível do reconhecimento dos cidadãos na plena capacidade de seu presidente para uni-los e liderá-los durante um momento tão difícil.
Desde o início do mandato, o presidente Jair Bolsonaro tem se mostrado muito distante dessas duas dimensões da Presidência da República. Até aqui, parece alheio à sua responsabilidade de governar o País, voltado que está para questões menores que dizem respeito aos grupos setoriais que lhe dão apoio e à família. Um interino segue à frente do Ministério da Saúde há mais de 50 dias, a despeito do fato de o Brasil ser um dos países mais duramente atingidos pela pandemia de covid-19. Nada mais distante de um esboço de governo do que este fato.
Para o bem dos brasileiros, o Congresso não tem faltado ao País. Nove em cada dez medidas para enfrentamento da pandemia foram de iniciativa do Poder Legislativo, uma das principais delas a aprovação do pagamento do auxílio emergencial de R$ 600 aos milhões de trabalhadores informais que de uma hora para outra viram sua renda sumir. Pela proposta do Poder Executivo, convém lembrar, o auxílio seria de apenas R$ 200, um terço do valor aprovado pelos parlamentares. Também foram do Congresso as iniciativas de autorizar a prática da telemedicina como mais uma medida para facilitar o isolamento social e frear a disseminação do novo coronavírus e a destinação de uma ajuda financeira aos Estados e municípios no valor de R$ 60 bilhões.
Como essas, a esmagadora maioria das medidas de combate à pandemia no Brasil é fruto da iniciativa do Congresso, não do Palácio do Planalto. O governo federal só conseguiu aprovar um projeto de lei de sua iniciativa, o que autorizou medidas de isolamento e dispensa de licitações públicas durante a vigência do estado de calamidade pública. O levantamento foi feito pelo Estado.
O presidente Jair Bolsonaro editou 49 medidas provisórias (MPs) no período da pandemia, mas apenas 3 foram avalizadas pelos parlamentares: a MP 931, que concedeu mais prazo para as empresas realizarem suas assembleias ordinárias; a MP 932, que cortou pela metade a contribuição empresarial para manutenção do Sistema S; e a MP 936, que permitiu redução de jornada e salários no setor privado no curso da pandemia – medida que foi prorrogada.
O vácuo de ação do governo federal é corolário do descaso do presidente Bolsonaro pela gravidade da doença desde a primeira hora. Some-se a isto a sua inapetência para governar, o que se pôde observar já nos primeiros meses de mandato. “Na pandemia, (o desgoverno) ficou mais evidente, mas já não era diferente antes”, disse ao Estado o relator do projeto de ajuda financeira aos entes federativos, deputado Pedro Paulo (DEM-RJ).
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), lembrou que até agora o Planalto não enviou à Casa propostas para o Brasil do pós-pandemia, período que será ainda mais desafiador do que a atual fase. Jair Bolsonaro parece fazer uma clara opção por se abster da responsabilidade de governar o Brasil de todos e de lançar as bases do que virá a ser o Brasil do futuro. Ao agir assim, não faz outra coisa a não ser degradar o valor da Presidência.
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