terça-feira, 14 de julho de 2020

Hora do toque de retirada

Pode-se criticar o tom do comentário, mas o juiz Gilmar Mendes tem razão na essência da crítica ao envolvimento das Forças Armadas, sobretudo o Exército, na anarquia governamental de Jair Bolsonaro. 

O erro original foi cometido na campanha de 2018, quando o então deputado, ex-capitão paraquedista, informou ao Forte Apache — o QG do Exército em Brasília— sobre o plano de saltar da planície política para o topo do poder no Planalto. 


Um dia, talvez, seja resgatada a memória das conversas e a extensão do respaldo do comando do Exército ao candidato. Sabe-se que nem tudo obedeceu ao protocolo, mas há reconhecimento da eterna gratidão do beneficiário em discurso: “Obrigado, comandante (Eduardo) Villas Bôas. O que nós já conversamos morrerá entre nós. O senhor é um dos responsáveis por (eu) estar aqui.” 

O generalato sabe o que fez nas quatro estações eleitorais de 2018 ao abstrair o passado do ex-capitão, preso e processado por anarquia pelo Exército 33 anos antes, por um plano de bombas na Vila Militar, no Rio. 

O projeto era reescrever o passado, a história do regime militar de 1964, numa nova hegemonia fardada, com aumento do orçamento total (de 1,5% para 2% do PIB). Permitiu-se a Bolsonaro enquadrar o governo numa moldura militarista e transformar as Forças Armadas em peças do seu jogo predileto, a confusão institucional. É eloquente a imagem do comício no portão do Forte Apache, com o presidente incitando aliados que pediam o fechamento do Congresso e do Supremo.

O resultado está na ocupação da Saúde, com laboratórios militares (R$ 520 milhões para produzir 1,2 milhão de doses de cloroquina) engajados na politização de um vírus, moldada para a campanha de reeleição. 

Pode-se ver exagero do juiz Gilmar Mendes ao dizer que “o Exército está se associando a esse genocídio” (o desgoverno na pandemia). Se há crime — no caso, gravíssimo — será revelado em breve. Nada oculta o óbvio: as Forças Armadas se meteram numa confusão institucional com Bolsonaro. É hora do toque de retirada.

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