Com as novas regras, quem vai às compras agora são os caciques partidários, que controlam o fundo eleitoral de cada legenda. Em vez de dirigir esses recursos para a renovação de quadros e a eleição de nomes novos, eles estão investindo sobretudo nos deputados que já têm mandato, apostando em sua reeleição.
Afinal, as novas (velhas) regras, com o encurtamento das campanhas e as restrições ao financiamento privado, tendem a privilegiar o status quo, ou seja, quem já é conhecido – e, preferencialmente, rico ou com acesso aos fundos partidários. As previsões são de baixo índice de renovação no Congresso, apesar do claro repúdio do eleitorado aos políticos – ou, quem sabe, até por causa da apatia gerada por ele.
Nesse raciocínio, partidos médios, como DEM, PP e PR, trabalham freneticamente para tirar deputados de legendas maiores como o MDB, o PSDB e o PT, que têm mais dinheiro no caixa para as campanhas mas precisam dividi-lo entre mais candidatos Brasil afora, incluindo postulantes aos governos estaduais e à presidência.
Os consumistas do mercado partidário esperam, com as compras, ter bancadas mais gordas no ano que vem, com tudo o que representam: poder, dentro e fora do parlamento. O DEM do presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, por exemplo, já se articula para crescer e fazer de antemão as alianças para mantê-lo no posto. Nos tapetes verdes da Casa, todo mundo sabe que sua pré-candidatura à presidência da República é manobra diversionista e busca, na verdade, garantir esse objetivo qualquer que seja o ocupante do Planalto.
Este é só um exemplo, mas ilustrativo do jogo que está em curso há tempos, mas que ficou mais explícito e pesado depois do impeachment da presidente Dilma Rousseff. No presidencialismo à brasileira, não basta eleger o principal mandatário do país, com 50 ou 60 milhões de votos e muitos sonhos do eleitorado nas costas. Só governa quem tem – ou conquista – o Congresso.
De certa forma, isso não é novidade. Tem sido assim desde a redemocratização pós-regime militar. Mas em grau menor e de forma menos escancarada. Houve tempo em que a base parlamentar era necessariamente, ou majoritariamente, identificada com os interesses de quem a elegeu. E, fazendo contraponto ao Executivo, ajudava a governar mas não governava.
Nos últimos anos, contudo, representantes e representados foram se distanciando cada vez mais e os interesses de uns e outros se distanciaram. A atividade parlamentar virou negócio explícito e as eleições legislativas, sobretudo as proporcionais, foram se realizando sob regras cada vez mais voltadas à sobrevivência dos políticos – e não à garantia da fidelidade da representação.
Chegamos aqui, a um passo de constatar que toda essa ansiedade em relação à eleição do novo presidente da República poderá ser desnecessária. Afinal, quem vai continuar dando as cartas – numa rotina de votação de impeachments e de arquivamento de denúncias a seu bel-prazer – é aquela turma do outro lado da rua.
Diga-se o que se disser, mas numa coisa o nosso sistema político é eficientíssimo: na aprovação de regras para assegurar sua própria sobrevivência e reprodução, na linha de mudar para ficar tudo igual.
Helena Chagas
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