O frenesi dos embates recentes pode ser transitório, mas o assunto está na pauta pelo menos desde o Junho de 2013. A guerra cultural é no mínimo sintoma. Do quê? De conversões maciças ao conservadorismo? Dos desertos que se formaram na política?
Mas a guerra cultural não é só a política por outros meios.
Pouco antes do fechamento da exposição Queermuseu, o Datafolha publicava nova rodada da pesquisa que tenta medir a adesão a ideias de direita e esquerda. A esquerda cresceu desde 2014, voltando a empatar com a direita, parte da qual lidera a guerra ao homem nu. Embora irônico, o resultado não diz muito.
Outra vez, nota-se na pesquisa que as pessoas podem se definir com ideias daqui ou dali, de resto mais tolerantes do que as tigradas de redes sociais.
Três de cada quatro brasileiros acham que a sociedade deve aceitar a homossexualidade. A maioria é contra pena de morte, armas e aborto. Para 80%, crer em Deus melhora as pessoas e drogas devem ser proibidas. Mais da metade acha que sindicatos são meros politiqueiros. Imigrantes pobres são bem-vindos para 70%.
Dos que votariam em Lula e Alckmin para presidente, 31% caem na categoria de esquerda comportamental, assim como 19% dos eleitores de Bolsonaro e 39% dos adeptos de Marina Silva. Quando se juntam as respostas a questões econômicas, a esquerda perfaz 44% do eleitorado de Lula, 37% de Alckmin, 50% de Marina e 29% de Bolsonaro (no total do país, 41%).
Parece difícil dizer que andem por aí massas de indivíduos conservadores ou com identidades unívocas de qualquer tipo.
Isto posto, há, sim, apelos a massas com certas (mas nem todas) ideias conservadoras. Organizações de direita, uma novidade, procuram mobilizar esse público em seu ataque decisivo à ruína do PT e a grupos identificados à esquerda ("intelectuais", "artistas", sindicatos). O conservadorismo se tornou um mercado político grande também porque a esquerda oficial cometeu um atentado suicida contra o país.
A desarticulação dos partidos com a sociedade e a penúria de organizações sociais intermediárias leva pré-candidatos a presidente a buscar bases em grupos fora da política, organizados e sensíveis a certas ideias conservadoras, como os neopentecostais, 21% do eleitorado.
Falta algum tipo de organização para repropor confrontos em outros termos. Há interesse em esvaziar o debate da crise econômica: quem paga o talho maciço do Estado ou mais impostos?
Por 20 anos, mal e mal, PT e PSDB deram alguma ossatura ao confronto. Antes de se tornarem pelegos do PT, movimentos sociais davam costelas à política. Organizações empresariais fraquejam. A guerra cultural ocupa o corpo da política desossada.
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