A analista foi imediatamente demitida. O cartão vermelho do governo demoraria ainda dois anos para lhe ser exibido. Também no Brasil, e há bom tempo, técnicos sensatos, comentaristas esclarecidos, economistas experientes alertavam sobre as consequências da irresponsabilidade fiscal. A gastança criminosa promovida pelos sucessivos governos petistas nos conduzia ao inevitável estouro das contas públicas. A história registrará, entre os grandes infortúnios de nossa vida administrativa, a infeliz coincidência de termos vivido o ciclo mais favorável da economia mundial em muitas décadas sob gestão simultânea de uma organização criminosa e do mais destrambelhado dentre todos os nossos governos. Os tempos pródigos ampliaram largamente a voracidade e perpetuaram os danos causados nesse prolongado ataque por dois flancos. Agora são tempos de zelo com as contas públicas. Como é insensível o coração do caixa!
No entanto, esse necessário zelo não vem acompanhado do devido desprendimento. Parece tratar-se de algo que se exige "dos outros" para que as situações particulares permaneçam inalteradas. Todos querem responsabilidade fiscal para que a situação melhore e ninguém mexa no seu queijo (como no bom livro de Spencer Johnson). Imagino essa preocupação povoando, nestes dias, muitas reflexões sobre a situação do país. Deve pensar assim o ministro, viajando em jatinho da FAB. Também o deputado, cujo queijo se chama emenda parlamentar ou verba de gabinete. Não há de querer diferente o beneficiado pelo queijo da isenção fiscal ou do juro privilegiado. São perfumados os queijos especiais havidos por cargo ou função, por vaga nos superpovoados gabinetes políticos e por aposentadorias precoces. Há tantos queijos em busca de proteção! Eles se chamam, ainda, cartão corporativo e bolsa-empresário. E se chamam mordomias, têm carro oficial, motorista, garçom, copeiro e segurança. Imagino a multidão de seus usufrutuários a sonhar com um Brasil onde a austeridade geral permita que nada mude.
O exercício dos poderes de Estado não pode ocorrer na ausência do mais elementar senso de justiça. O Brasil precisa que seus cidadãos submetam às suas próprias consciências uma PEC das boas condutas e dos bons exemplos. Quando o avião sacode, balança inteiro, da primeira classe ao porão de carga.
Percival Puggina
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