quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Ações da má-fé de representantes do povo

Quando fui deputada estadual, aqui, em Minas, fui avisada, diversas vezes, anonimamente, sobre alguma maracutaia embutida em projeto a ser votado.

Não havia telefone celular nem internet. Eu costumava descer para o plenário mais cedo para dar uma espiada nos projetos empilhados na mesa da presidência. Algumas vezes, ao fazer isso, ouvia tocar o telefone que ficava na bancada de assessores atrás da cadeira do presidente. Eu atendia.

Lembro-me muito claramente de dois momentos desses: no primeiro, alguém me pediu que prestasse bastante atenção em determinado projeto que estava para ser votado. Corri a vê-lo. No meio de providências sem grande importância havia uma doação de terreno público valioso do Estado para determinado município...

Doutra feita, a coisa foi mais grave: votava-se em Brasília, na Assembleia Constituinte, a vedação de se efetivar sem concurso servidor comissionado (isto é, de livre indicação de político). Da mesma maneira que já descrevi, fui avisada de que havia a efetivação de mais de 200 servidores nomeados por ex-deputados embutida em outro projeto qualquer.

Pus a boca no trombone com a ajuda de outros deputados.
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Na Câmara dos Deputados, dia desses, houve o misterioso caso do projeto de criminalização do caixa 2, cuja autoria ninguém sabe, ninguém viu, e que também foi incluído na pauta de votação sem que vivalma tenha sido o responsável por esse feito. Felizmente, a gritaria de parlamentares de alguns partidos impediu a falcatrua.

E sabem o que teria sido o estrago? Atualmente, não existe lei que considere crime o uso do caixa 2. Quem recebe os recursos e é pego é considerado pelos juízes alguém que incidiu em “falsidade ideológica” de documento particular, ou seja, afirmou algo que não corresponde à verdade. A pena é ridícula: reclusão de um a três anos. Basta o leitor estar acompanhando o desenrolar da Lava Jato ou lembrar-se do mensalão e da “contabilidade não registrada” de Delúbio Soares para imaginar os rios de dinheiro que correm por aí mediante o tal caixa 2. Quanto a quem faz a doação, nada! Quem achava ser bobagem proibir o financiamento empresarial para campanhas pode medir agora, em sentido contrário, como andam quase todas as candidaturas a prefeitos ou vereadores: um grande número de candidatos no vermelho. Coisa impossível ou muito difícil de acontecer quando era livre a contribuição empresarial...

Pois bem, os espertalhões que queriam aprovar o projeto de criar o crime de caixa 2 apenas pretendiam, na verdade, inocentar todos os que, antes da aprovação de tal projeto, tivessem sido acusados de ter praticado tal conduta. É que, na Constituição Federal, há um dispositivo de proteção do indivíduo que afirma que “nada pode ser considerado crime sem lei anterior que o defina”. Como a lei seria nova, estariam livres tantos quantos andam ou andaram atribuindo ao caixa 2 o recebimento de propina da Petrobras, da Eletrobras ou do esquema dito mensalão.

Olhem só o estrago que seria feito!

Sandra Starling

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