Claro que o narcisismo que incomoda nunca é o nosso: é sempre o dos outros. Mesmo assim, o narcisismo dos outros é como um daqueles muros cravados de vidros partidos: é um obstáculo, é uma chatice, é um desperdício de tempo e de latim, mas arranja-se sempre maneira de transpô-lo.
A generalização da vaidade, depois de séculos de insegurança geral, é uma espécie de triunfo. Não é fácil convencer uma população inteira de que é fantástica. Não é fácil convencer toda a gente de que, para conseguir o impossível, basta ter um sonho e a vontade para o tornar realidade.
Mas o que é melhor: começar inseguro e, ao longo da vida, ir acumulando provas de que não se é mau de todo, ou começar convencido e ir desbastando na vaidade, à medida que se vai revelando um tanto ou quanto exagerada?
Para já, o narcisismo tem a grande vantagem de ajudar os jovens a defender-se das manipulações dos mais sabidos. O narcisista é saudavelmente céptico e difícil de convencer. Põe logo à cabeça a pergunta fundamental, que é: “O que este quer?” E parte logo da conclusão correcta: que aquilo que ele quer é diferente daquilo que quero, mesmo que eu não saiba o que é.
Queixam-se os velhos de todo o mundo que os jovens sofrem de entitlement, de achar que têm direito a tudo e mais alguma coisa, só pelo facto de existirem.
Ora, há milénios que isto é assim, sendo apenas mais uma variante do “eles não querem é trabalhar” e do “eles não sabem o que custa” e do “cresce e aparece”.
É difícil traduzir entitlement e entitled. Proponho os reivindinhos.
Os jovens de hoje em dia portam-se como reizinhos muito bem-vindos que reivindicam logo, sem ter de levantar uma palha, mordomias e vassalagens – como se fosse um direito natural, concedido à nascença aos nobérrimos bebezinhos.
Mas como são todos reivindinhos a concorrência é ferocíssima.
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