O Instituto Socioambiental, a Comissão Arns e a Conectas Direitos Humanos prepararam um relatório que “detalha o processo de desmantelamento das políticas ambientais e indigenistas por parte deste Governo” que, liderado por Jair Bolsonaro, tomou posse há quase 14 meses. Desde a campanha eleitoral, o militar reformado anunciou sua intenção de permitir a exploração econômica das terras indígenas —o projeto de lei está no Congresso—e enfraquecer a política ambiental. O líder indígena David Kopenawa Yanomami ficará encarregado de apresentar o estudo ao Conselho de Direitos Humanos da ONU em 3 de março, em Genebra (Suíça). O Brasil é o país com mais povos indígenas isolados. Está confirmada a presença de 28 comunidades e a existência de outras 86 está em estudo, segundo o relatório do ISA, da Comissão Arns e da Conectas, que mencionam cifras oficiais.
Uma das medidas que melhor representa a guinada radical impulsionada por Bolsonaro é a nomeação de um ex-missionário evangélico para comandar o órgão dedicado à proteção de índios isolados e de recente contato. As doenças dos não índios e os evangelizadores são duas das grandes ameaças a esses grupos desde o desembarque dos jesuítas com a conquista portuguesa em 1500. Ricardo Lopes Dias, o indicado pelo presidente para a área, trabalhou por muitos anos com uma organização norte-americana chamada Missão Novas Tribos do Brasil, um culto focado em povos indígenas e com táticas agressivas de assimilação. Segundo a ONG Survival, eles proclamam que pretendem chegar até a última etnia, porque só então Cristo voltará.
Essa espécie de SOS que querem lançar à ONU tem por base os alarmantes balanços do ano passado. “Mais de 21.000 hectares foram destruídos somente em 2019 em terras com índios isolados, o que representa um aumento de 113%. É um incremento muito superior aos valores médios na Amazônia e nas áreas protegidas (por lei) em geral, o que indica o aumento de ilegalidades e invasões e a gravidade do problema.” As ONGs apontam quatro casos de perigo iminente: a presença constante de missionários no Vale do Javari, a terra indígena com mais povos isolados, bem como o assassinato de um ex-funcionário da Fundação Nacional do Índio (Funai) e o ataque a tiros contra uma de suas bases. Nas terras Yanomami a ameaça são os 20.000 garimpeiros que degradaram 300.000 hectares e que, com seu mercúrio, poluem os rios; os 60 indígenas isolados Awá, filmados recentemente e que vivem em uma reserva onde madeireiros ilegais já construíram mais de 1.000 quilômetros de estradas para extrair seu minério e onde um indígena de uma patrulha de vigilância da flora foi assassinado; o quarto grupo em grave perigo foi avistado pela última vez quando fugia dos incêndios na ilha do Bananal.
Na mesma linha das conclusões de uma cúpula de líderes indígenas realizada na Amazônia brasileira em janeiro, o trio de ONGs alerta para o crescente risco de etnocídio e de genocídio, embora nenhum dos dois termos apareça no documento que será apresentado à ONU. As ONGs pedem que a ONU exija que o Governo brasileiro fortaleça os órgãos oficiais de proteção dos povos indígenas (a Funai), do meio ambiente (o Ibama), da biodiversidade (o Instituto Chico Mendes) e os encarregados da fiscalização, notavelmente enfraquecidos nos últimos meses por uma série de medidas que levaram todos os ex-ministros do Meio Ambiente vivos do Brasil a expressar juntos sua preocupação. Eles também pedem um maior investimento para localizar povos indígenas isolados e que os processos de demarcação de terras indígenas (que lhes dão proteção legal) sejam retomados.
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