sexta-feira, 21 de abril de 2023

Pedagogia como prática de segurança

Fazia poucos anos que Paulo Freire havia retornado do exílio quando, em um almoço de família na casa de minha sogra, o próprio professor nos disse que gostaria de ter dado mais ênfase, em sua pedagogia, aos aspectos da educação relacionados com geração de renda e inclusão econômica.

Considerando a importância que o problema da segurança pública alcançou ultimamente no Brasil, não seria exagero imaginar que, se aquele almoço acontecesse hoje, Paulo falaria, quem sabe, do seu interesse em associar uma ‘pedagogia da paz’ ao seu método educativo.

Por coincidência, Paulo Freire era filho de um policial militar de Pernambuco, o capitão Joaquim Temístocles. Ainda assim as influências da infância pobre e do testemunho da vida nordestina difícil pesaram mais na sua ‘educação como prática de liberdade’.


Por isso mesmo, é possível imaginar uma reflexão sobre a promoção da paz nas áreas urbanas sob a ótica do educador pernambucano. A ideia de que “as pessoas se educam entre si mediadas pelo mundo” coincide com a visão do urbanismo social de que a convivência humana diária nos espaços públicos é um pilar de uma sociedade segura.

Afinal, o mundo é cada vez mais urbano. No Brasil 85% da população vivem nas mais de 5.500 cidades. Imagine a intensidade dos contatos, relações, laços, conflitos, enfim, da convivência entre esses cento e setenta milhões de pessoas nas cidades.

Ao longo dos dias e noites, encontros e desencontros servem para formar condutas, princípios, personalidades, cultura, negócios e política. Nesse cenário, para ‘se educarem entre si’, as pessoas contam com a mediação de um mundo no qual a oferta de espaços públicos e de serviços pelo Estado é determinante do nível de segurança cidadã que se consegue obter.

As cidades brasileiras são multiplicadoras de desigualdade social, mesmo nas regiões metropolitanas que contam com melhor infraestrutura, mobilidade e segurança do que os municípios remotos. Prevalecem os espaços de convivência degradados, feios, escuros, quer sejam praças, calçadas, escolas, paradas de ônibus, quadras esportivas, postos de saúde, hospitais ou ruas (indutores do medo, rejeição e distanciamento social, favorecendo a vulnerabilidade ao crime).

Em outras palavras, os espaços públicos decadentes provocam uma sensação de insegurança nos cidadãos que inibe o seu exercício de direitos e liberdades. Ao mesmo tempo, esses vazios urbanos favorecem a perspectiva de êxito e impunidade para a prática de delitos e abusos.

Ao contrário, uma bela praça, conservada e iluminada, serviria como um ambiente mediador de relacionamentos pacíficos, que estimulem a solidariedade e a segurança. Já existem diversas experiências de espaços públicos que Paulo Freire certamente consideraria bons mediadores da educação recíproca entre seus habitantes.

No Brasil, temos exemplos que seriam aprovados pelo professor, como o COMPAZ, as Usinas da Paz, o CEU das Artes, as Praças de Esportes e a Rede de Bibliotecas Pela Paz. Mundo afora há os exemplos colombianos de Medellín e Bogotá e as Utopias em Iztapalapa, México.

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