Sem o repasto PMDB-PSDB, a convenção peemedebista de sábado e as manifestações de domingo seriam condições necessárias mas insuficientes para deixar no ponto o fim da era petista. Por uma razão simplória: não há impeachment sem que haja acordo prévio sobre a sucessão do poder. Não se apeia um presidente sem que esteja combinado quem passará a dar as ordens. A questão transcende a pessoa que vai vestir a faixa e sentar na cadeira.
Na mesma quarta-feira, a mil quilômetros dali e ao nível do mar, o menu era a mesmo. Cacique do PMDB fluminense, pai e avalista do líder do partido na Câmara, Jorge Picciani disse a peemedebistas que o governo Dilma duraria mais três meses. Foi no particular, mas alguém vazou, e o jornal Extra divulgou. Filho de Jorge, Leonardo Picciani é o maior aliado de Dilma no PMDB, depois de Renan. Se seu pai pensa assim, ele pensa também.
O que fez Renan e Picciani selarem um acordo com os oposicionistas do PMDB e se dedicarem a pensar o pós-Dilma? Novas delações na Lava Jato.
Empreiteiros da Andrade Gutierrez e o senador Delcídio Amaral contaram histórias distintas, mas com final igual: recursos de caixa dois pagaram a campanha de Dilma à reeleição em 2014. Um dos dois declarou ter documentos para sustentar suas palavras.
Se essa versão é comprovada, importa pouco para a Realpolitik que comanda Brasília. Talvez pensando no que acontece em suas próprias contabilidades eleitorais, quem precisava acreditar acreditou. E logo concluiu que a cassação da chapa Dilma/Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral seria mera questão de tempo. Assim, melhor se antecipar e trocar cassação por impeachment – ou renúncia, se conseguirem colocar o guizo no pescoço de Dilma.
Seja como for, assumiria Michel Temer. Ele convocaria todos os partidos para montar um governo de – perdão – “união nacional”. A gestão Frankenstein comandada pelo PMDB – qualquer semelhança com o governo Sarney não é mera coincidência – seria transitória e teria a missão de fazer o impopular ajuste fiscal que Dilma tanto falou que faria e não fez. Desse modo, quem se elegesse em 2018 estaria dispensado do trabalho sujo. Esse é o acordão.
Ficou tão bem costurado quanto o monstro criado por Mary Shelley. Ponta solta é o que não falta. Só para lembrar duas.
O impeachment/renúncia não impede o TSE de prosseguir com a cassação. Mas, como ministros da corte demonstraram em outros processos, dá para protelar o julgamento. Seria uma espada de Dâmocles pendurada sobre o pescoço de Temer, uma garantia para o caso de ele se acostumar ao cargo e tentar disputar 2018. A depender das provas nas delações, porém, será difícil convencer a opinião pública a deixar de lado o processo de cassação.
Em outra ponta, muitos dos avalistas do acordão PMDB-PSDB são alvo da Lava Jato. Alguns já foram denunciados. Se condenados, o novo governo começaria em crise, apenas mudariam (alguns) nomes. Ou procuradores e ministros do Supremo foram consultados sobre o acordo? Concordaram? Só se a criatura de Frankenstein escapou da ficção, fugiu para o Brasil e está amarrando suas pontas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário