Já vi muito caos no país, desde o suicídio de Getúlio até o porre de Jânio Quadros largando o poder. Vi a morte de Tancredo na hora de tomar posse, vi o país entregue ao Sarney, amante dos militares, vi o fracasso do Plano Cruzado, vi o escândalo do governo Collor, como uma maquete suja de nossos erros tradicionais, já vi a inflação a 80% num só mês, vi coisas que sempre nos deram a sensação fatalista de que a vaca iria docemente para o brejo, de que o Brasil “sempre” seria um país do futuro. Eu já senti aquele vento mórbido do atraso, o miasma que nos acompanha desde a Colônia, mas nunca vi o país assim.
A genialidade de Marx me fascinava. Um companheiro me disse uma vez: “Marx estudou economia, história e filosofia, e, um dia, sentou-se à mesa e escreveu um programa racional para reorganizar a humanidade”. Era a invencível beleza da Razão, o poder das ideias “justas”, que me estimulava a largar qualquer profissão “burguesa”. Entrei para o PCB e, nas primeiras reuniões de base, para meu desespero, me decepcionei. O pensamento político e existencial deles era simplista, partindo sempre de uma ideia para depois chegar a ela de novo. Nas reuniões e assembleias, surgia sempre essa voz rombuda da burrice ideológica.
Em vez do charme infinito dos cubanos, comecei a ver o erro, plantado em duas raízes: ou o erro de uma patética estratégia inócua ou a incompetência, a mais granítica, imaculada incompetência que vi na vida. O ponto de partida da incompetência é se sentir competente. O homem “bom” do partido não precisa estudar nem Marx nem nada, apenas derramar sua “missão” para o povo. Administrar é coisa de burguês, de capitalista. Para eles, o Estado é o pai de tudo. Logo, o dinheiro público é deles, a empresa pública é deles, roubar é “desapropriar” a grana da burguesia.
A incompetência do comuna típico é o despreparo, sem dúvidas, é a burrice alçada a condição de certeza absoluta. É um ridículo silogismo: “Eu sou a favor do bem, logo, não posso errar e, logo, não preciso estudar nem pesquisar”. A verdade é que odeiam o que têm de governar: um país capitalista. Como pode um comuna administrar o capitalismo? Todos os erros e as burrices que eu via nas reuniões do PC eram de arrepiar os cabelos. Eu pensei, horrorizado, quando vi o PT no poder: vão fornicar com tudo. Fornicaram.
Assim, se organiza a burrice, a adoção só de ideias gerais, o desejo de fazer o mundo caber num ideário superado. Daí a desconfiança no mercado, nos empreendedores, contra todos os que trabalham no centro da sociedade civil, que comunas veem como uma anomalia atrapalhando o Estado. Vivíamos assediados por lugares comuns. O imperialismo era a “contradição principal” de tudo. As discussões intermináveis, os diagnósticos mal lidos da Academia da URSS sempre despencavam, esfarinhavam-se diante do enigma eterno: “o que fazer?”. E ninguém sabia.
O que aconteceu com este governo foi mais um equívoco na história das trapalhadas que a esquerda leninista comete sempre. Erraram com tanta obviedade, com tanto desprezo pelas evidências de perigo, que a única explicação é o desejo de serem flagrados. O fracasso é o grande orgulho dos revolucionários masoquistas. Pelo fracasso constrói-se uma espécie de “martírio enobrecedor”, já que socialismo hoje é impossível. A história de nossa “esquerda” é uma sucessão de derrotas. Derrota em 35, derrota em 64, derrota em 68, derrota na luta armada, derrotas sem fim.
Até que surgiu, nos anos 70, um homem novo: Lula, diante de um mar de metalúrgicos no ABC. Aí, começou a romaria em volta da súbita aparição do messias operário. Tive pavor de que a velha incompetência administrativa e política do “janguismo” se repetisse no Brasil, que fora saneado pelo governo de FHC. Não deu outra. O retrocesso foi terrível, porque estava tudo pronto para a modernização do país; mas o avião foi detido na hora da decolagem. Hoje, vemos mais uma “revolução” fracassada; não uma revolução com armas ou com o povo, mas uma revolução feita de malas pretas, de dinheiro subtraído de estatais, da desmoralização das instituições republicanas.
Hoje, vemos o final dessa epopeia burra, vemos que a estratégia de Dirceu e seus comparsas era a tomada do poder pelo apodrecimento das instituições burguesas. Uma espécie de “stalinismo de resultados”. Os quadrilheiros do governo não são de esquerda, não; são de direita, autoritários. O incrível é que os intelectuais catequizados ainda pensam: “o PT desmoralizado ainda é um mal menor que o inimigo principal – os tucanos neoliberais”. O PT ainda é o ópio dos intelectuais. Se continuar assim, o atraso do país será perpetuado em nome da burrice “progressista”. O diabo é que burrice no poder chama-se “fascismo”.
Há nove sites falsos em meu nome no ar. O verdadeiro agora é www.arnaldojabor.com.br. Nas mídias sociais, é “Jabor Real”. Me critiquem no lugar certo.
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