Praticamente todos os componentes do PIB, seja pelo lado da oferta ou da demanda, sofreram quedas históricas, jamais registradas. A indústria e os serviços colapsaram. O consumo das famílias sofreu queda de 12,5% comparada ao trimestre anterior, que já havia sido ruim. A retração do consumo das famílias foi especialmente alarmante pois durante o segundo trimestre estava em vigor o auxílio emergencial que, apesar de suas falhas de execução – e relatos de fraudes –, deu algum sustento à economia. Imaginem o que não teria ocorrido caso o Congresso não tivesse aprovado o auxílio em abril, quando o governo ainda se mostrava refratário à medida. Esses resultados deixam à mostra que economia e saúde estão intimamente interligadas e, não, não adianta dizer que o problema foram as medidas de saúde pública.
O Brasil jamais teve uma quarentena séria, jamais passou por um estado de lockdown como ocorreu em alguns Estados e localidades nos EUA e como fizeram vários países europeus e asiáticos. O descontrole da epidemia é responsável por esse resultado, assim como é o atraso do governo em enfrentar a crise, lembrando que no dia 16 de março o ministro Paulo Guedes ainda dizia que a economia brasileira iria crescer em 2020.
Como a epidemia continua descontrolada no Brasil, não há muito alento pela frente. É possível que o terceiro trimestre apresente alguma “melhora”, mas boa parte disso será puramente efeito estatístico dado o tamanho do tombo no início do ano. E, sempre há a possibilidade de recrudescimento da epidemia em localidades que hoje apresentam algum alívio. Segundas, terceiras, quartas ondas até são prováveis, já que o vírus é o que é: novo, imprevisível, uma fitinha de RNA com alto grau de mutabilidade. Arrisco dizer que, no momento, várias cidades e alguns Estados brasileiros estejam passando por alívio temporário. Sem medidas rígidas de controle, a epidemia voltará. É o que vemos mundo afora, afinal.
O que fazer diante disso? Apesar de toda a má gestão do governo Bolsonaro nessa crise, a prorrogação do auxílio emergencial é um alento. O benefício será agora pago até dezembro, como alguns de nós sempre defendemos, mantendo a coerência com a declaração de estado de calamidade, que vence no último dia do ano. O valor do benefício foi reduzido à metade, o que certamente removerá uma parte da sustentação econômica que diversos estudos já mostraram. Fica a dúvida sobre como as pessoas que mais necessitam do auxílio irão dar conta de suas necessidades com menos dinheiro. Contudo, é melhor ter algo do que não ter nada, possibilidade que há poucos meses era dada como a mais provável. Vi muitos argumentando que mantido o valor do auxílio emergencial, o Brasil poderia passar por tremendas dificuldades fiscais. Os mais extremados falaram em “quebra” do País.
O auxílio emergencial sempre foi uma medida cara para os cofres públicos – não à toa o caráter emergencial. No entanto, falar em crise fiscal a ele atrelada parece imenso exagero, sobretudo quando o ambiente internacional se revela cada dia menos hostil. O Fed, o banco central dos EUA, recentemente mudou o regime monetário de maneira que permitirá taxas de juros internacionais extremamente baixas por tempo ainda maior do que se supunha. Tal situação permite que o Brasil tenha mais tempo para atender às necessidades da pandemia sem deixar de lado a importância do ajuste fiscal futuro. A diferença é que há mais tempo para esse ajuste no ambiente de juros extraordinariamente baixos. PIB e pandemia são desafios que continuarão conosco por muito tempo.
A atuação mais importante do Estado continua a ser a preservação das vidas e da capacidade de sobrevivência econômica das pessoas mais vulneráveis. Críticas deveriam estar direcionadas não às propostas de renda básica e de auxílio emergencial, mas sim ao desperdício com os quais o governo flerta abertamente. Ponhamos o debate no lugar certo.