quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

Brasil sacrificado a 'deus'

 


Entre, a casa é sua (onde golpistas se abrigavam)

Os traços de Niemeyer, o plano espacial de Lúcio Costa e o paisagismo de Burle Marx, com nove jardins e a famosa Praça dos Cristais, dão ao QG do Exército em Brasília um ar futurístico que esconde por trás do cartão postal o aspecto doméstico comum às demais áreas residenciais militares, espalhadas pelo país.

Mas quem se der ao trabalho de uma visita ao Google, ou a bulas turísticas, poderá constatar que o QG do Exército, das fotos reducionistas, é uma Vila Militar, situada no Setor Militar Urbano (SMU), entre os bairros Sudoeste e Noroeste, um dos metros quadrados mais valorizados da Capital, com 635 casas destinadas a famílias de militares de diversas patentes e população de 2,5 mil pessoas (Wikipedia).


Reproduz o sistema de quadras de Brasília – QRO (Quadra Residencial dos Oficiais), QRS (dos Sargentos) – e QRG (dos Generais). A enorme área verde, com pomares e pequena fauna, a fez conhecida como Fazendinha entre os militares.

As quadras residenciais indicam a patente dos moradores das casas: Quadra Residencial dos Oficiais (QRO), Quadra Residencial de Sargentos (QRS), Quadra Residencial de Generais (QRG). Esta, com 14 casas de 210 metros cada, sete delas para generais e famílias e sete para oficiais assistentes, todos coronéis.


Possui ainda dois blocos de dois pavimentos com oito apartamentos para oficiais solteiros e dois hotéis de trânsito.

Foi esse ambiente familiar dos militares que serviu por dois meses ao acampamento dos “patriotas”, onde foram arquitetados atos de vandalismo que culminaram com a invasão dos prédios do Congresso, Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto.

Ali foram entregues as bombas para o terrorismo explícito, uma delas originalmente prevista para explodir dentro do aeroporto e que acabou plantada fora dele em um caminhão de combustível.

A severíssima vigilância para as famílias militares não detectou nenhuma anormalidade, segundo relatório oficial aceito pelo Superior Tribunal Militar. A proximidade física e ideológica entre moradores e manifestantes, no entanto, põe sob suspeita esse juízo e explica as presenças, algumas vezes registradas, de oficiais e familiares no acampamento.

É a esse fator que se atribui o empenho do comandante do Exército, General Júlio César de Arruda, em impedir prisões em flagrante na área após os atos do dia 8, o que lhe custou o cargo. A barreira de tanques e as ameaças verbais do general à Polícia Militar não terão sido apenas protocolares por ser a área de jurisdição do Exército.

“Você não vai fazer prisões aqui dentro”, disse ao ministro da Justiça, Flávio Dino, dedo em riste, como um chefe de família reagiria em defesa de sua própria casa protegendo de riscos os seus.

Sugeriu mais desespero que disciplina ou excesso de zelo legal. Seria preciso uma triagem seletiva, negligenciada no tempo, que poupasse eventuais moradores do mesmo destino de militantes extremistas.

Tinha suas razões o comandante para impedir o arrastão de segurança. Toda a área é uma extensão das casas e famílias militares, como as superquadras de Brasília funcionam como um quintal de cada domicílio.

O acampamento foi no quintal das famílias militares onde, assim como nos clubes da oficialidade, só entram paisanos avalizados por fardados.

Essa população militar e suas famílias têm atendimento do Hospital Militar de Área de Brasília (HMAB), duas escolas – uma pública (Escola Classe do SMU) e Soldadinho de Chumbo (particular, com creche), com ensino fundamental, o Clube dos Oficiais do Exército (onde civis são admitidos mediante abono de um militar) e o clube de Subtenentes e sargentos do Exército.

O complexo tem dois teatros – o Pedro Calmon, para 1.220 pessoas, com palco de 230 metros, e o Poupex, para 649 pessoas. Seriam excelentes e qualificadas alternativas ao Teatro Nacional, fechado há sete anos, não fosse a pauta de gestão exclusiva do Exército e de dificílimo acesso aos comuns.

É área sob jurisdição militar, mas não de segurança nacional, onde a circulação de público é livre. Mas ninguém passa despercebido ali ou deixa de ser notado pela vigilância permanente, mais severa nas áreas residenciais, principalmente na quadra dos generais, onde cercas, guaritas e sentinelas garantem segurança máxima.

Qualquer morador de Brasília sabe que não transita na área sem dezenas de olhos treinados para detectar suspeitos – e não suspeitos -, em circulação no local. Como não se entra nos jardins de uma casa sem permissão do proprietário.

Não obstante, aos militantes extremistas coube por parte do Exército anfitrião o gentil “entre, a casa é sua”. Às forças de segurança legais, o tratamento reservado aos hostis – “afastem-se daqui”, arma em punho.

O braço forte do slogan do Exército foi levantado contra a Polícia Militar. Já a mão amiga, aos militantes extremistas.

Não há do que reclamar.
João Bosco Rabello

Bolsonaro se vingou dos ianomâmis

Jair Bolsonaro vivia seu primeiro ano em Brasília quando o governo Fernando Collor demarcou a terra ianomâmi. Três dias depois, o jovem deputado subiu à tribuna para protestar. “Essa área é a mais rica do país. Por que instituir uma reserva indígena lá?”, reclamou.

Em tom conspiratório, ele sustentou que os ianomâmis seriam uma ameaça à segurança nacional. Da noite para o dia, poderiam iniciar um movimento separatista. “A curto prazo, essa área poderá tornar-se independente, e a perderemos definitivamente”, fantasiou. Começava ali, em novembro de 1991, sua cruzada contra a maior terra indígena da Amazônia.


Bolsonaro tentou convencer o Supremo Tribunal Federal a derrubar a demarcação. Sem sucesso na Corte, apresentou um projeto para anular o ato no Congresso. “Amanhã se dirá aí que estamos massacrando os ianomâmis. Em nome dos direitos humanos, quem garante que tropas estrangeiras não vão ocupar a Amazônia?”, discursou, em 1992.

Em meio ao palavrório, o deputado deixou escapar seu real objetivo: liberar a exploração predatória da floresta. “Como o homem perdeu o paraíso através de uma maçã, os brasileiros vão perder o paraíso que é esse atual território. Não através de uma maçã, é lógico, mas através do nióbio, da cassiterita, do diamante”, disse.

A Câmara arquivou a proposta naufragou, mas Bolsonaro insistiu em perseguir os ianomâmis. Ao longo de sete mandatos, ele testou diferentes argumentos para depreciar os indígenas. No governo Fernando Henrique, alegou que eles seriam fantoches de ONGs controladas pela Casa Branca.

Na era Lula, trocou de inimigo imaginário e passou a atacar a China. A potência asiática estaria interessada em colonizar “grandes espaços vazios” nos confins da Amazônia. “Vão lotar seus cargueiros e despejar esse excesso populacional”, delirou.

Em 1998, o deputado chamou o Exército de “incompetente” por não ter aniquilado os povos originários. “Competente, sim, foi a cavalaria norte-americana, que dizimou seus índios no passado e hoje em dia não tem esse problema em seu país”, disse.

O plano de extermínio não prosperou, mas o capitão nunca se deu por vencido. Eleito presidente, ele desmontou a Funai, incentivou o garimpo ilegal e deixou os indígenas morrerem de fome. Bolsonaro se vingou dos ianomâmis.

O relatório que apontava há 56 anos maus-tratos a indígenas e descaso de militares

A falta de assistência aos povos indígenas é a forma mais eficaz de matar sem deixar vestígios. É o que destacava em 1967 o procurador Jader de Figueiredo Correia em um relatório que descrevia violências praticadas contra povos indígenas no Brasil por militares, integrantes do Serviço de Proteção aos Índios (SPI), funcionários públicos, fazendeiros, garimpeiros, grileiros, madeireiros e empresários.

"A falta de assistência, porém, é a mais eficiente maneira de praticar o assassinato. A fome, a peste e os maus tratos, estão abatendo povos valentes e fortes. A Comissão viu cenas de fome, de miséria, de subnutrição, de peste, de parasitoses externa e interna, quadros esses de revoltar o indivíduo mais insensível", revelava o relatório escrito há 56 anos, em plena ditadura militar, que ficou conhecido como Relatório Figueiredo.

Ele mostrava o genocídio de comunidades inteiras, torturas, sevícias, roubo, violências e crueldades praticadas contra indígenas no Brasil nas décadas de 1940, 1950 e 1960. "O Serviço de Proteção ao Índio degenerou a ponto de persegui-los até ao extermínio", apontou o relatório, que ficou desaparecido por mais de 40 anos.

Muito do que se relata hoje sobre abandono, massacre, violência e falta de assistências a comunidades indígenas no Brasil, como os Yanomami, já estava documentado naquele relatório composto por 26 volumes e 5.492 páginas.

A investigação foi resultante de uma expedição que percorreu mais de 16 mil quilômetros. Foram entrevistados dezenas de agentes do SPI, além da visita a mais de 130 postos indígenas.

Foram denunciados 132 militares, outros servidores públicos, cidadãos comuns, homens e mulheres. Houve a recomendação de prisões, demissões ou a suspensão do trabalho, além de outras penalidades. O material foi entregue ao Poder Judiciário.


Ocorreu apenas o afastamento do pessoal do SPI e a abertura de processos administrativos. Com a promulgação do Ato Institucional nº 5 (AI-5), em dezembro de 1968, tudo foi esquecido. Parte dos afastados retomou seus postos na nova estrutura que substituiu o SPI, a Funai (Fundação Nacional do Índio, que passou depois a se chamar Fundação Nacional dos Povos Indígenas). Ninguém foi preso.

A Comissão Nacional da Verdade investigou casos de violência envolvendo dez etnias indígenas vítimas de graves violações de direitos humanos, ocorrida no Brasil durante o período da ditadura militar, entre 1964 e 1985

O relatório de 1967 identifica e reconhece as violências cometidas contra os povos indígenas. O Estado brasileiro aparece como autor direto dos crimes, através de seus servidores, ou de forma indireta, por omissão diante dos ataques contra essas populações originárias efetuados por fazendeiros, garimpeiros, madeireiros, grileiros, seringueiros que contavam com a conivência de políticos locais, estaduais e federais.

"Há repetição permanente desse problema. São 56 anos desde a denúncia do Relatório Figueiredo, e o problema do desrespeito ao direito constitucional indígena às suas terras e ao usufruto de seus territórios segue inalterado. Os povos são atacados em suas comunidades e aldeias, sem solução", reclama Marcelo Zelic, membro da Comissão Justiça e Paz de São Paulo e coordenador do Armazém Memória, responsável pelo resgate do Relatório Figueiredo nos arquivos do governo federal.

O procurador Jader de Figueiredo cita dificuldades para desenvolver o trabalho em campo e chama a situação de "o maior escândalo administrativo do Brasil".

Na enorme lista de delitos cometidos, o documento cita crimes contra pessoa e a propriedade do indígena, assassinatos individuais e coletivos, prostituição de indígenas, sevícias, trabalho escravo, usurpação do trabalho, apropriação e desvio de recursos oriundos do patrimônio indígena, dilapidação do patrimônio indígena como a venda de gado, arrendamento de terras, venda de madeira, exploração de minérios, venda de castanha e de outros produtos de atividades extrativas e de colheita, venda de produtos de artesanato, doação criminosa de terras, venda de veículos.

Tudo isso, ainda segundo Jader de Figueiredo, alcançou cifras incalculáveis. Não sendo "possível levantar com exatidão os valores subtraídos aos índios (sic) para exigir ressarcimento".

Nos crimes administrativos, os envolvidos praticaram a adulteração de documentos oficiais, fraudaram processos de comprovação de contas, desviaram verbas orçamentárias, aplicaram irregularmente dinheiro público. Eles acarretaram em omissões dolosas das autoridades e dos próprios servidores, admissões fraudulentas de funcionários e incúria administrativa.

Com relação à violência, o documento registra o genocídio dos Cinta-larga, no Mato Grosso, com lançamento de explosivos de avião sobre as ocas. Os sobreviventes eram envenenados ou mortos a tiros de metralhadora. Entre as cenas mais cruéis relatadas está a morte por facão, quando a pessoa era cortada ao meio.

"Mais recentemente, os Cintas-largas teriam sido exterminados a dinamite atirada de avião, e a estricnina (veneno) adicionada ao açúcar enquanto os mateiros os caçam a tiros de 'pi-ri-pi-pi' (metralhadora) e racham vivos, a facão, do púbis para a cabeça o sobrevivente", relatou Jader de Figueiredo. Esse povo vivia entre o noroeste do Mato Grosso e sudeste de Rondônia.

O caso do extermínio dos Cintas-largas ficou conhecido como o Massacre do Paralelo 11, promovido no Mato Grosso por pistoleiros contratados pela empresa seringalista Arruda Junqueira & Cia, em 1963. Depoimento de Ramis Bucair, servidor público, descreve a ação de pistoleiros chefiados por Chico Luiz, que metralharam um grupo Cinta-larga. Durante a ação, localizaram com vida uma indígena e seu filho de seis anos. O menino acabou morto com um tiro na cabeça. A mulher foi pendurada pelos pés, com as pernas abertas, e seu corpo partido ao meio com um golpe de facão.

A comissão chefiada por Jader de Figueiredo recebeu das mãos do próprio Ramos Bucair uma fita de áudio com a gravação da confissão do crime, com a voz de Ataíde Pereira dos Santos.

Também há registro sobre a extinção de um povo localizado em Itabuna, na Bahia, na reserva Caramuru-Paraguaçu dos Pataxó-Hãhãhãe, utilizando o envenenamento químico de doença. "A serem verdadeiras as acusações, é gravíssimo. Jamais foram apuradas a denúncia de que foi inoculado o vírus da varíola nos infelizes indígenas para que se pudessem distribuir suas terras entre figurões do governo".

"É preciso desarmar os mecanismos de repetição da história que existem. A não-repetição de violações de direitos humanos pressupõe a criação de mecanismos que modifiquem procedimentos cristalizados na gestão e ação do Estado brasileiro. Estes procedimentos se constituem em prática lesiva ao direito indígena, ocorrendo tanto no poder Executivo, como no Legislativo e Judiciário que, quando não são protagonistas, dão sustentação fundamental à repetição de graves violações de direitos humanos contra os povos indígenas, como ocorre hoje e ao longo de todo o governo Bolsonaro, conforme denúncias de genocídio e crimes de lesa-humanidade em análise no Tribunal Penal Internacional", afirma Marcelo Zelic.

Mais recentemente, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) investigou casos de violência envolvendo dez etnias indígenas vítimas de graves violações de direitos humanos, ocorridos no Brasil durante o período da ditadura militar, entre 1964 e 1985.

No relatório da CNV são apontadas as mortes de ao menos 8.350 indígenas em massacres, esbulho de terras, remoções forçadas de seus territórios, contágio por doenças infectocontagiosas, prisões, torturas e maus tratos.

No capítulo Violações de direitos humanos dos povos indígenas consta que o maior número de mortos está entre os Cinta-larga, com 3.500 casos, seguidos pelos Waimiri-Atroari (AM) - 2.650 mortos; Tapayuna (MT) - 1.180; Yanomami (AM/RR) - 354; Xetá (PR) - 192; Panará (MT) - 176; Parakanã (PA) - 118; Xavante Marãiwatsédé (MT) - 85; Araweté (PA) - 72 e Arara (PA) - 14 mortos.

Atualmente, a população brasileira é composta por aproximadamente 900 mil indígenas de 305 etnias diferentes, segundo a Funai.

Responsável pela saúde indígena na década de 1970, a Funai foi omissa e levou à morte muitos indivíduos acometidos por diversas epidemias de alta letalidade, segundo o relatório. Eram casos de sarampo, gripe, malária, caxumba, tuberculose, além da contaminação por infecções sexualmente transmissíveis.

O mesmo relatório da CNV denuncia que a abertura do trecho da Perimetral Norte (BR-210), entre o município de Caracaraí e o limite entre Roraima e Amazonas, também provocou as mortes de 354 Yanomami e impactou diretamente cerca de 250 pessoas das aldeias desta etnia no rio Ajarani e seus afluentes, além de 450 indígenas abrigados em malocas no rio Catrimani na década de 70.

"O Relatório Figueiredo elencava entre 'os crimes contra a pessoa e a propriedade do índio' práticas como, entre outras, 'sevícias, apropriação e desvio de recursos oriundos do patrimônio indígena e dilapidação do patrimônio indígena'. Agora, 56 anos depois, acompanhamos o flagelo dos Yanomami em tempo real e vimos as mesmas práticas, denunciando que o Estado brasileiro repete os mesmos erros, sem ter em consideração o reconhecimento de sua diversidade cultural, conforme consagrado em nossa Constituição, e colocando o Brasil, novamente, no centro de uma crise humanitária", diz Edilene Coffaci, antropóloga, professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

E Marcelo Zelic diz: "Os governos agem sob pressão. O Estado age para tirar o problema da frente, mas é uma situação cíclica. Tudo vem acontecendo como sempre. O problema é grave, vai para a imprensa, há uma ação da sociedade. Daqui a pouco tudo some do noticiário e as coisas voltam a ser como eram antes".

Esse ciclo de violência contra os povos indígenas não termina porque corresponde a uma cultura de índole colonial com a qual o Brasil nunca rompeu, segundo Alfredo Attié, presidente da Academia Paulista de Direito.

Attié afirma que os indígenas estão sendo expropriados de seus territórios e violentados desde a chegada europeia, no século 16. "Penso que essa expropriação sempre se deu de modo ilícito - foram construídas teorias jurídicas especificamente para justificar esse processo, conferindo àqueles que se apropriaram das terras indígenas títulos falsos, validados pela própria constituição do direito moderno, que subsiste até hoje".

Para superar esse ciclo, há necessidade de medidas que dizem respeito a políticas públicas, sobretudo as de reconhecimento dos territórios e de sua proteção efetiva contra invasores e exploradores, segundo especialistas.

"Igualmente, há necessidade de impedir que os assassinatos contra líderes indígenas permaneçam. A criação de um Ministério para os Povos Indígenas significa alçar as políticas da Funai e da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) a um patamar mais seguro e eficiente", diz Attié.

"Mas isso não basta, pois há necessidade de enfrentar corajosamente a revisão do que significa propriedade e restabelecer a propriedade indígena - são os verdadeiros donos do território brasileiro - e empreender uma política bastante radical na reatribuição de terras, o que afetará os donos do poder e os donos de extensas áreas, detentores ilegítimos do que não lhes pertence de direito", afirma Attié, ao apontar que "talvez auxilie na compreensão dessa política a consciência de que defender indígenas e o que lhes pertence signifique reconstituir o meio ambiente e proteger os biomas brasileiros, de que são guardiães."

Flávio de Leão Bastos Pereira, coordenador do Núcleo da Memória da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP, diz que a Funai repetiu no governo Bolsonaro o que fazia durante a ditadura. Também aponta que "nunca se investigou o Reformatório Krenak, que era um campo de concentração, quantas terras indígenas foram invadidas, quantas crianças indígenas foram levadas à força em aviões da FAB para outras regiões do país, quantos Guaranis foram mortos na construção da Usina de Itaipu, entre outros fatos envolvendo os povos indígenas".

Para garantir o direito e a vida dos povos indígenas, reafirma o professor do Mackenzie, é preciso demarcar as terras desses povos, conforme manda o artigo 231 da Constituição brasileira.

"A terra indígena é ancestral, essencial para a existência dessas culturas. Os povos indígenas não detêm a terra, eles são a própria terra. Também é necessário dar maior protagonismo a esses povos, com a criação do Ministério dos Povos Indígenas e a presidência da nova Funai com uma indígena, como começou a ser feito agora", diz Bastos.