terça-feira, 23 de janeiro de 2024
Presságios do fogo, da água, da terra e do ar
Um dia já distante, os magos voaram até a gruta da mãe do deus da guerra. A bruxa que levava oito séculos sem lavar-se, não sorriu nem cumprimentou. Aceitou, sem agradecer, as oferendas, mantas, peles, plumas, e escutou com uma careta as notícias. México, informaram os magos, é senhora e rainha, e todas as cidades estão aos seus mandados. A velha grunhiu seu único comentário: Os astecas derrubaram os outros, disse, e outros virão que derrubarão os astecas.
Passou o tempo.
Há dez anos, se sucedem os signos.
Uma fogueira esteve gotejando fogo, do centro do céu, durante toda uma noite.
Um súbito fogo de três caudas ergueu-se do horizonte e voou de encontro ao sol.
Se suicidou a casa do deus da guerra, se incendiou a si mesma: lhe arrojavam cântaros de água e a água avivava as chamas.
Outro templo foi queimado por um raio, uma tarde em que não havia tormenta.
A lagoa onde tem seu assento a cidade, se fez caldeira que fervia. As águas se levantaram, candentes, altas de fúria, e levaram as casas e arrancaram até os alicerces.
As redes dos pescadores ergueram um pássaro cor de cinza misturado aos peixes. Na cabeça do pássaro, havia um espelho redondo. O imperador Montezuma viu avançar, no espelho, um exército que corria sobre patas de veados e escutou os seus gritos de guerra. Depois, foram castigados os magos que não souberam ler o espelho nem tiveram olhos para ver os monstros de duas cabeças que acossavam, implacáveis, o sono e a vigília de Montezuma. O imperador encerrou os magos em jaulas e condenou-os a morrer de fome.
Cada noite, os alaridos de uma mulher invisível sobressaltam a todos os que dormem em Tenochtitlán e em Tlatelolco. Filhinhos meus, grita, pois já temos de ir-nos longe! Não há parede que não atravesse o pranto dessa mulher. Aonde iremos, filhinhos meus?
Eduardo Galeano, "Os Nascimentos"
Passou o tempo.
Há dez anos, se sucedem os signos.
Uma fogueira esteve gotejando fogo, do centro do céu, durante toda uma noite.
Um súbito fogo de três caudas ergueu-se do horizonte e voou de encontro ao sol.
Se suicidou a casa do deus da guerra, se incendiou a si mesma: lhe arrojavam cântaros de água e a água avivava as chamas.
Outro templo foi queimado por um raio, uma tarde em que não havia tormenta.
A lagoa onde tem seu assento a cidade, se fez caldeira que fervia. As águas se levantaram, candentes, altas de fúria, e levaram as casas e arrancaram até os alicerces.
As redes dos pescadores ergueram um pássaro cor de cinza misturado aos peixes. Na cabeça do pássaro, havia um espelho redondo. O imperador Montezuma viu avançar, no espelho, um exército que corria sobre patas de veados e escutou os seus gritos de guerra. Depois, foram castigados os magos que não souberam ler o espelho nem tiveram olhos para ver os monstros de duas cabeças que acossavam, implacáveis, o sono e a vigília de Montezuma. O imperador encerrou os magos em jaulas e condenou-os a morrer de fome.
Cada noite, os alaridos de uma mulher invisível sobressaltam a todos os que dormem em Tenochtitlán e em Tlatelolco. Filhinhos meus, grita, pois já temos de ir-nos longe! Não há parede que não atravesse o pranto dessa mulher. Aonde iremos, filhinhos meus?
Eduardo Galeano, "Os Nascimentos"
Ensino técnico, Pé-de-Meia e sonhos de Beneditos
Forte, alto e magro, José Benedito (nome fictício) tinha tudo para ser um zagueirão. Desde garoto, destacou-se entre os coleguinhas do bairro pela estatura, que hoje chega quase a 1,90m. Era um gigante intransponível na defesa em jogos de futebol no terrão.
O tempo foi passando e Benedito teve de abandonar os amiguinhos do bairro, enquanto alguns já faziam testes na base de grandes times de São Paulo. Tendo pai ausente, aos 9 anos começou a ajudar a mãe, empregada doméstica, a sustentar a família, com cinco irmãos menores. Vendeu picolés caseiros no farol e ao mesmo tempo carregou tijolos como servente de pedreiro.
O trabalho infantil, que envolve 1,9 milhão de crianças no país, destruiu dois sonhos do jovem Benedito: ser jogador de futebol e fazer engenharia civil. Mas ele conseguiu uma vaga no ensino técnico, o que hoje lhe garante um emprego na enfermagem em um grande hospital de São Paulo.
Já trabalhando na área médica, Benedito tentou realizar o sonho da engenharia, mas não deu certo. A faculdade era privada e ele não conseguiu bolsa, porque seu salário estava acima do limite para a concessão do benefício. Já com dois filhos, teve que optar entre sustentar a própria família e estudar engenharia. Abandonou a faculdade no segundo ano. (Entre parênteses, isso lembra o clássico “Pequeno Burguês”, de Martinho da Vila: “Felicidade, passei no vestibular/mas a faculdade é particular/”).
Não há, como já houve no passado, conflito ideológico sobre a importância dos cursos médios técnicos no país. Durante décadas, a educação profissional e tecnológica sofreu com o estigma de que seria apenas uma boa opção para pobres. E os jovens ricos iriam para a universidade. Talvez por isso e, consequentemente, por falta de investimento público, hoje apenas 10% dos alunos cursam o técnico, enquanto países ricos, líderes nas avaliações internacionais sobre educação, investem pesadamente para que os estudantes ingressem nos cursos técnicos e tecnológicos. Cerca de 84% dos jovens fazem ensino técnico na Suíça, 68% na Finlândia e 49% na Alemanha. Até na América Latina os números são desfavoráveis ao Brasil: 34% no México, 29% no Chile, 24% na Colômbia e 20% na Costa Rica.
Os resultados de 2022 do Pisa, a prova mais importante de educação no mundo, que avalia estudantes de 15 anos em 81 países, foram divulgados no fim de 2023. E mostraram que os seis países líderes do ranking são asiáticos: Cingapura, China, Taiwan, Hong Kong, Japão e Coreia do Sul. Não por coincidência, todos são entusiastas e incentivadores do ensino técnico. Também no Brasil, que está em posição vergonhosa no ranking do Pisa (65º lugar entre os 81 países), alunos de escolas técnicas são os que conseguem melhores notas nos vestibulares quando comparados com outros alunos de escolas públicas.
Pessoas que cursaram o ensino técnico no país têm uma remuneração profissional média 12% acima daqueles que fizeram apenas o ensino médio convencional. Há inúmeros estudos nacionais e internacionais sobre esse tema e alguns concluem que o aumento da remuneração chega a 32% em muitos casos, com efeito direto na redução da desigualdade de renda. Estudo divulgado recentemente pelo Itaú Educação e Trabalho e pelo Insper mostrou que, além dos benefícios para os estudantes, há ganhos macroeconômicos para o país. Quando o governo triplica o número de vagas no ensino técnico, ocorre um impacto positivo de 2,32% no PIB a longo prazo.
Em entrevista à imprensa, o pesquisador do Insper Vitor Fancio disse que a capacidade de produzir de uma empresa que tem mais funcionários com ensino médio técnico é maior: produz mais bens e mais serviços do que se tivesse empregados majoritariamente com o médio tradicional. É isso, segundo ele, que leva à elevação do PIB a longo prazo no país.
O sonho de entrar na universidade não conflita com a escolha do técnico no ensino médio. A educação profissional representa até um incentivo à continuidade dos estudos. Exatamente o que José Benedito tentou fazer, mas foi barrado pela falta de recursos e de financiamento estudantil.
Agora, todo seu empenho é para formar a filha mais velha, de 13 anos, que é um fenômeno na escola, segundo os professores da rede pública em que estudou. O novo sonho é colocá-la numa escola privada para fazer um bom ensino médio e depois conseguir ingressar em uma universidade pública.
Na semana passada, foi sancionada a lei que institui o “Programa Pé-de-Meia”, que dará incentivo financeiro para a permanência de estudantes de baixa renda no ensino médio. Talvez isso ajude os Beneditos a realizar seus sonhos. Talvez.
O tempo foi passando e Benedito teve de abandonar os amiguinhos do bairro, enquanto alguns já faziam testes na base de grandes times de São Paulo. Tendo pai ausente, aos 9 anos começou a ajudar a mãe, empregada doméstica, a sustentar a família, com cinco irmãos menores. Vendeu picolés caseiros no farol e ao mesmo tempo carregou tijolos como servente de pedreiro.
O trabalho infantil, que envolve 1,9 milhão de crianças no país, destruiu dois sonhos do jovem Benedito: ser jogador de futebol e fazer engenharia civil. Mas ele conseguiu uma vaga no ensino técnico, o que hoje lhe garante um emprego na enfermagem em um grande hospital de São Paulo.
Já trabalhando na área médica, Benedito tentou realizar o sonho da engenharia, mas não deu certo. A faculdade era privada e ele não conseguiu bolsa, porque seu salário estava acima do limite para a concessão do benefício. Já com dois filhos, teve que optar entre sustentar a própria família e estudar engenharia. Abandonou a faculdade no segundo ano. (Entre parênteses, isso lembra o clássico “Pequeno Burguês”, de Martinho da Vila: “Felicidade, passei no vestibular/mas a faculdade é particular/”).
Não há, como já houve no passado, conflito ideológico sobre a importância dos cursos médios técnicos no país. Durante décadas, a educação profissional e tecnológica sofreu com o estigma de que seria apenas uma boa opção para pobres. E os jovens ricos iriam para a universidade. Talvez por isso e, consequentemente, por falta de investimento público, hoje apenas 10% dos alunos cursam o técnico, enquanto países ricos, líderes nas avaliações internacionais sobre educação, investem pesadamente para que os estudantes ingressem nos cursos técnicos e tecnológicos. Cerca de 84% dos jovens fazem ensino técnico na Suíça, 68% na Finlândia e 49% na Alemanha. Até na América Latina os números são desfavoráveis ao Brasil: 34% no México, 29% no Chile, 24% na Colômbia e 20% na Costa Rica.
Os resultados de 2022 do Pisa, a prova mais importante de educação no mundo, que avalia estudantes de 15 anos em 81 países, foram divulgados no fim de 2023. E mostraram que os seis países líderes do ranking são asiáticos: Cingapura, China, Taiwan, Hong Kong, Japão e Coreia do Sul. Não por coincidência, todos são entusiastas e incentivadores do ensino técnico. Também no Brasil, que está em posição vergonhosa no ranking do Pisa (65º lugar entre os 81 países), alunos de escolas técnicas são os que conseguem melhores notas nos vestibulares quando comparados com outros alunos de escolas públicas.
Pessoas que cursaram o ensino técnico no país têm uma remuneração profissional média 12% acima daqueles que fizeram apenas o ensino médio convencional. Há inúmeros estudos nacionais e internacionais sobre esse tema e alguns concluem que o aumento da remuneração chega a 32% em muitos casos, com efeito direto na redução da desigualdade de renda. Estudo divulgado recentemente pelo Itaú Educação e Trabalho e pelo Insper mostrou que, além dos benefícios para os estudantes, há ganhos macroeconômicos para o país. Quando o governo triplica o número de vagas no ensino técnico, ocorre um impacto positivo de 2,32% no PIB a longo prazo.
Em entrevista à imprensa, o pesquisador do Insper Vitor Fancio disse que a capacidade de produzir de uma empresa que tem mais funcionários com ensino médio técnico é maior: produz mais bens e mais serviços do que se tivesse empregados majoritariamente com o médio tradicional. É isso, segundo ele, que leva à elevação do PIB a longo prazo no país.
O sonho de entrar na universidade não conflita com a escolha do técnico no ensino médio. A educação profissional representa até um incentivo à continuidade dos estudos. Exatamente o que José Benedito tentou fazer, mas foi barrado pela falta de recursos e de financiamento estudantil.
Agora, todo seu empenho é para formar a filha mais velha, de 13 anos, que é um fenômeno na escola, segundo os professores da rede pública em que estudou. O novo sonho é colocá-la numa escola privada para fazer um bom ensino médio e depois conseguir ingressar em uma universidade pública.
Na semana passada, foi sancionada a lei que institui o “Programa Pé-de-Meia”, que dará incentivo financeiro para a permanência de estudantes de baixa renda no ensino médio. Talvez isso ajude os Beneditos a realizar seus sonhos. Talvez.
Mercado de carbono: aliado ou concorrente?
Na expectativa de descobrir novas fontes de receita para amparar a economia, o governo brasileiro vem propagando um “futuro” baseado no ciclo comercial do carbono e na importância da bioenergia. Serve, no mínimo, de apoio para a discussão sobre “oneração” e “desoneração” fiscal tributária, pontos de inflexão política.
Para além disso, faz ressurgir das tais “memórias do esquecimento” uma das políticas públicas que mais alavancaram a economia brasileira nos anos 60 e 70: a Lei no 5.106, de 02.09.de 1966, que permitia investimentos em reflorestamento por parte de pessoas físicas e jurídicas, até o limite de 50% do imposto de renda devido. Tirou o Brasil de uma cultura extrativista, inconscientemente predatória, para criar milhares de empresas e empregos de base florestal no país.
Em pouco mais de dez anos, o setor passou a ser responsável por 4% das exportações brasileiras. Gerou mais de um milhão de empregos em todo o Brasil. Só a modesta indústria moveleira, que operava de maneira primitiva, abriu 255 mil empregos diretos e institucionalizou mais de 18 mil negócios, transformando-os em pessoas jurídicas cooperativas, e que, em 2021, tiveram um valor de produção estimado em aproximadamente R$ 78,1 bilhões (Abimovel, 2023).
Tornou-se no maior programa de reflorestamento do mundo. Reproduzia-se em sofisticados empreendimentos nas áreas da siderurgia, do papel, da celulose, dos laminados e aglomerados e da indústria moveleira, gerando fabricantes periféricos de pequenas máquinas, ferramentas, colas, tintas, vernizes, óleos, tacos, embalagens, chapas, parafusos, forrageiras, sementes e mudas selecionadas, designs originais, que atraíam italianos, ingleses, japoneses, norte-americanos, pela alta qualidade e beleza dos produtos. Eram três mil subprodutos derivados da floresta.
O reflorestamento oferecia alternativas de matérias primas naturais abundantes e de economicidade maior, ao mesmo tempo em que as espécies tropicais nativas, particularmente algumas madeiras duras, como o mogno, o cedro, o jacarandá, o jequitibá, a sucupira e outras que, por sua vez, demoravam 20 a 30 anos para viabilizar-se economicamente. Os brasileiros descobriram que, com 6 a 7 anos, a madeira de pinus (Pinus elliottii e Pinus taeda), introduzidas por meio de sementes importadas, apresentavam resultados similares. Centenas de experimentos feitos nas universidades e pelas empresas mostraram sua adaptação ao clima e ao solo tropical, inclusive os mais áridos. Brasília foi cercada para um cinturão florestal.
O programa ganhou maturidade, tornando-se um negócio como outro qualquer, incorporando, sem dúvida, também os males da corrupção e a ideia explícita da agressão à natureza pelos grandes desmatamentos, sem reposição, voltados para abrir espaços para a agricultura extensiva, que envolvia o cultivo de grandes áreas de terra, baixo uso de mão de obra e de tecnologia.
Os produtos e subprodutos florestais ocupavam o 5º. ou 6º. lugar entre as exportações brasileiras. As grandes indústrias florestais e periféricas juntaram-se em polos de desenvolvimento, ganhando configuração e mercado próprio. Concomitante, na área da agricultura, capitaneada pelo professor Alyson Paulinelli, desencadeara-se a “Revolução Verde”, gerando massa crítica profissional, pesquisas, altas tecnologias, a introdução de insumos, máquinas agrícolas, fertilizantes, que independiam do clima. Representado por um 1/3 das exportações, tornou-se um dos maiores produtores mundiais de alimentos.
Não é, entretanto, esta a imagem que ficou na história da economia brasileira. No início dos anos 80, a moralidade ambientalista chegara, combatendo, em nome da ciência, da qualidade de vida e da proteção dos recursos naturais, a revolução agrícola e os desmatamentos, sobretudo na Mata Atlântica, e as queimadas na Amazônia, que destruíam, de fato, solos férteis, a fauna, princípios biológicos ativos, e poluíam os rios. A indústria, inclusive a florestal, passou a ser acusada de produzir gases que agrediam a atmosfera e o ar que respiramos. A modernidade expulsava os trabalhadores do campo, engrossando a pobreza da vida urbana.
A política florestal tomaria outros rumos. O Brasil descobrira a sustentabilidade, e geraria visões novas sobre a proteção dos recursos naturais. Depois de revisar os incentivos, incrementaram-se programas compulsórios de reposição florestal e de preservação dos ecossistemas originais, bem como de cooperação entre pequenos produtores rurais, reunindo propriedades familiares (2011).
Contudo, havia alcançado a autossuficiência na produção florestal e incorporado ao sistema outros produtos da floresta que passaram a ser incluídos nas formulações acadêmicas da biotecnologia – essências silvestres para a indústria farmacêutica e perfumaria, frutos da floresta, como açaí, palmitos, cacau, castanhas, pimentas e forragens. O setor estava consolidado. A política florestal ganhara, entretanto, um novo perfil, associado agora fortemente às preocupações com o meio ambiente e, mais recentemente, também com as mudanças climáticas.
Caminhando para os oitenta, Lula está alheio a isso. Preocupa-se é com as novas oportunidades comerciais que estão desembarcando no setor, como o mercado de carbono e do hidrogênio verde. Sua mensagem vai ao encontro de quem dispõe de maciços de florestais naturais ou de reflorestamento: a venda, em toneladas, da captura do CO² pelas florestas. Essa pretensiosa intenção tende a ser concorrente forte para os segmentos industriais e extrativistas produtivos baseados na floresta.
Estaria ele no caminho certo? Na Itália acabaram de descobrir um grupo de ativistas profissionalizados formuladores e difusores de teorias conspiratórias pelo mundo.
Para além disso, faz ressurgir das tais “memórias do esquecimento” uma das políticas públicas que mais alavancaram a economia brasileira nos anos 60 e 70: a Lei no 5.106, de 02.09.de 1966, que permitia investimentos em reflorestamento por parte de pessoas físicas e jurídicas, até o limite de 50% do imposto de renda devido. Tirou o Brasil de uma cultura extrativista, inconscientemente predatória, para criar milhares de empresas e empregos de base florestal no país.
Em pouco mais de dez anos, o setor passou a ser responsável por 4% das exportações brasileiras. Gerou mais de um milhão de empregos em todo o Brasil. Só a modesta indústria moveleira, que operava de maneira primitiva, abriu 255 mil empregos diretos e institucionalizou mais de 18 mil negócios, transformando-os em pessoas jurídicas cooperativas, e que, em 2021, tiveram um valor de produção estimado em aproximadamente R$ 78,1 bilhões (Abimovel, 2023).
Tornou-se no maior programa de reflorestamento do mundo. Reproduzia-se em sofisticados empreendimentos nas áreas da siderurgia, do papel, da celulose, dos laminados e aglomerados e da indústria moveleira, gerando fabricantes periféricos de pequenas máquinas, ferramentas, colas, tintas, vernizes, óleos, tacos, embalagens, chapas, parafusos, forrageiras, sementes e mudas selecionadas, designs originais, que atraíam italianos, ingleses, japoneses, norte-americanos, pela alta qualidade e beleza dos produtos. Eram três mil subprodutos derivados da floresta.
O reflorestamento oferecia alternativas de matérias primas naturais abundantes e de economicidade maior, ao mesmo tempo em que as espécies tropicais nativas, particularmente algumas madeiras duras, como o mogno, o cedro, o jacarandá, o jequitibá, a sucupira e outras que, por sua vez, demoravam 20 a 30 anos para viabilizar-se economicamente. Os brasileiros descobriram que, com 6 a 7 anos, a madeira de pinus (Pinus elliottii e Pinus taeda), introduzidas por meio de sementes importadas, apresentavam resultados similares. Centenas de experimentos feitos nas universidades e pelas empresas mostraram sua adaptação ao clima e ao solo tropical, inclusive os mais áridos. Brasília foi cercada para um cinturão florestal.
O programa ganhou maturidade, tornando-se um negócio como outro qualquer, incorporando, sem dúvida, também os males da corrupção e a ideia explícita da agressão à natureza pelos grandes desmatamentos, sem reposição, voltados para abrir espaços para a agricultura extensiva, que envolvia o cultivo de grandes áreas de terra, baixo uso de mão de obra e de tecnologia.
Os produtos e subprodutos florestais ocupavam o 5º. ou 6º. lugar entre as exportações brasileiras. As grandes indústrias florestais e periféricas juntaram-se em polos de desenvolvimento, ganhando configuração e mercado próprio. Concomitante, na área da agricultura, capitaneada pelo professor Alyson Paulinelli, desencadeara-se a “Revolução Verde”, gerando massa crítica profissional, pesquisas, altas tecnologias, a introdução de insumos, máquinas agrícolas, fertilizantes, que independiam do clima. Representado por um 1/3 das exportações, tornou-se um dos maiores produtores mundiais de alimentos.
Não é, entretanto, esta a imagem que ficou na história da economia brasileira. No início dos anos 80, a moralidade ambientalista chegara, combatendo, em nome da ciência, da qualidade de vida e da proteção dos recursos naturais, a revolução agrícola e os desmatamentos, sobretudo na Mata Atlântica, e as queimadas na Amazônia, que destruíam, de fato, solos férteis, a fauna, princípios biológicos ativos, e poluíam os rios. A indústria, inclusive a florestal, passou a ser acusada de produzir gases que agrediam a atmosfera e o ar que respiramos. A modernidade expulsava os trabalhadores do campo, engrossando a pobreza da vida urbana.
A política florestal tomaria outros rumos. O Brasil descobrira a sustentabilidade, e geraria visões novas sobre a proteção dos recursos naturais. Depois de revisar os incentivos, incrementaram-se programas compulsórios de reposição florestal e de preservação dos ecossistemas originais, bem como de cooperação entre pequenos produtores rurais, reunindo propriedades familiares (2011).
Contudo, havia alcançado a autossuficiência na produção florestal e incorporado ao sistema outros produtos da floresta que passaram a ser incluídos nas formulações acadêmicas da biotecnologia – essências silvestres para a indústria farmacêutica e perfumaria, frutos da floresta, como açaí, palmitos, cacau, castanhas, pimentas e forragens. O setor estava consolidado. A política florestal ganhara, entretanto, um novo perfil, associado agora fortemente às preocupações com o meio ambiente e, mais recentemente, também com as mudanças climáticas.
Caminhando para os oitenta, Lula está alheio a isso. Preocupa-se é com as novas oportunidades comerciais que estão desembarcando no setor, como o mercado de carbono e do hidrogênio verde. Sua mensagem vai ao encontro de quem dispõe de maciços de florestais naturais ou de reflorestamento: a venda, em toneladas, da captura do CO² pelas florestas. Essa pretensiosa intenção tende a ser concorrente forte para os segmentos industriais e extrativistas produtivos baseados na floresta.
Estaria ele no caminho certo? Na Itália acabaram de descobrir um grupo de ativistas profissionalizados formuladores e difusores de teorias conspiratórias pelo mundo.
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