sexta-feira, 12 de abril de 2024

Pensamento do Dia

 


As carpideiras que choram por Bolsonaro querem provar que ele vive

As carpideiras que choram o fracasso do golpe de dezembro de 2022 planejado por Bolsonaro, e do seu refluxo em 8 de janeiro, valem-se de qualquer coisa para provar que seu líder continua vivinho da silva, bulindo e forte, e não à beira do precipício que parece cada vez mais próximo.

A mais recente pesquisa do instituto Quaest, divulgada ontem, mostra que os governadores de São Paulo (Tarcísio de Freitas), do Paraná (Ratinho Júnior), de Goiás (Ronaldo Caiado) e de Minas Gerais (Romeu Zema) estão mais bem avaliados nos seus Estados do que Lula.

Mas por que não deveriam estar? Dos quatro estados, Lula só venceu em um (Minas Gerais), e por um sopro. Salvo Tarcísio, os demais são governadores reeleitos. De onde se concluiu que devem ter feito uma boa ou razoável administração no seu primeiro mandato; elementar, meus caros.

Lula saiu direto da prisão por 580 dias para se eleger presidente. Embora desgastado, tinha a seu favor a memória dos governos Lula 1 e Lula 2, nem sempre lembrada pelos que votaram nele desta vez. No mais, oposição não ganha eleição, é o governo que perde, ensina a história.


De Fernando Henrique Cardoso para cá, todos os presidentes se reelegeram, menos Bolsonaro. É um feito inesquecível do capitão inativo, a levar-se em conta que seu governo gastou o que podia e o que não podia para vencer. Foi a eleição mais comprada desde o fim da ditadura militar de 64.

Zema, Ratinho e Caiado não devem sua reeleição a Bolsonaro como as carpideiras querem fazer crer. Zema nem apoiou Bolsonaro no primeiro turno, preferindo ser votado por bolsonaristas e petistas. Caiado fingiu que apoiou, mas manteve-se distante dele para não se contaminar.

Tarcísio, sim, deve sua eleição a Bolsonaro, de quem foi ministro. Não queria candidatar-se ao governo de São Paulo onde sequer tinha domicílio eleitoral, mas a senador. Foi Bolsonaro quem o convenceu a ser. A capital de São Paulo pode votar no PT como já fez, mas o estado não vota.

Presidente algum desde 1989 governou o país amparado por uma coligação tão ampla de partidos como Lula governou entre 2003 e 2010, quando cedeu o lugar a Dilma que, apesar dos pesares, se elegeu e se reelegeu. Lula, agora, enfrenta um Congresso majoritariamente hostil.

Nunca o Congresso foi tão conservador e de direita como este é. Jamais foi tão poderoso como este é. Pode dar-se ao luxo de governar junto com Lula sem o ônus de quem governa. É o tal do semipresidencialismo. Vinde a mim todos os bônus do exercício do poder; debite-se o ônus ao governo Lula.

Os brasileiros estão alarmados com a falta de segurança pública? Então o Congresso aprova uma lei que proíbe a saída temporária da cadeia de presos menos perigosos para visitar as famílias nos feriados ou em datas especiais. É um convite para que eles se rebelem, além de ferir a Constituição.

Lula vetou a proibição. O Congresso derrubará o veto, e quando o fizer, se dirá que Lula perdeu mais uma batalha, enfraquecendo-se. Diz-se desde já. Mas quem não sabe que Lula governa com o apoio da minoria do Congresso? Qual é a novidade? É chover no molhado. A culpa não é de Lula.

Assim como o Congresso nem sempre lhe diz sim, por que Lula haveria de dizer sim ao Congresso todas as vezes que os dois discordam? A direita terá seu candidato a presidente, ou os seus candidatos, para enfrentar Lula ou um preposto dele em 2026; acalmem-se, pois, as carpideiras.

O candidato, ou os candidatos, dizem, hoje, sonhar com o apoio de Bolsonaro. Mas não de um Bolsonaro preso e condenado por atentar contra a democracia, roubar joias dadas de presente ao Estado brasileiro por governos de outros países, falsificar certificados de vacina.

Sonham com o apoio de um Bolsonaro limpinho ou no máximo enodoado. Sabem que não terão. Isso faz com que Tarcísio pense em renovar seu mandato, Ratinho e Zema em se eleger senador. Caiado quer terminar a carreira disputando a presidência pela segunda vez. Perdeu feio a primeira.

Pensar dá trabalho

De fato, estou aqui matutando para ver se consigo passar pra vocês o que estou pensando. Essas últimas pesquisas da Quaest sobre o governo Lula e os governos estaduais de São Paulo, Goiás, Paraná e Minas Gerais me fizeram refletir. Ao mesmo tempo em que a avaliação do Governo Lula cresceu nesses estados, a avaliação dos governos estaduais foi muito acima do que eu imaginava. Lá o resultado das eleições foi extremamente favorável à direita. Venceu a ideologia da não ideologia, a demonização da política, a evangelização do pensamento. O resultado se vê. Mas foi o governo Lula que fez o salário durar mais, os preços ficarem mais acessíveis, a inflação diminuir a o ar mais respirável. Nada ideológico à primeira vista. A ideologia ficou com os governadores e só. Pouco foi feito nesses estados, mas muito foi dito e isso fica.

O caso de Maricá, aqui no estado do Rio, é um exemplo. Maricá sempre foi administrada pela esquerda. Lá você anda de ônibus gratuitamente, tem acesso aos livros, a educação e a saúde são exemplos de boa gestão. Em Maricá o Bolsonaro venceu. É a diferença entre o dia a dia, a administração da prefeitura que passa por atitudes, decisões concretas e surgem quase que como obrigações naturais e a ideologia da não ideologia que a eleição presidencial pregava.


Somos um rebanho com direito a transporte de graça? Acho que não. As pessoas não sabem que esse transporte de graça faz parte de uma política de esquerda que prioriza a população. A ideologia da esquerda é a que cria essas soluções. Por isso não existe em todo o Brasil.

As pesquisas mostram que Lula cresceu nesses rincões bolsonaristas porque faz um governo voltado e trabalhando pelo povo. Já os governos estaduais, que nada fazem de concreto além de reagirem com violência contra a população, dar apoio ao genocídio do Netanyahu, ou ignorar o meio ambiente como em Minas, recebe a chamada aprovação espontânea, quase religiosa, dogmática e automática.

É a população que não precisa refletir nem pensar para reagir. Recebe a informação e não questiona. Como tudo o que é comunicado hoje em dia. Com pressa, sem tempo para pensar. Ouve e vai em frente. Tarcísio, Zema, Ratinho Jr. e Caiado são dessa turma. Do mesmo jeito que temos que aprender a conviver com esta realidade dos estados eles também têm que aprender a conviver com as realizações do Governo Lula. Não temos que adotar a doutrinação deles, a linguagem impositiva e não reflexiva. Temos que continuar fazendo o que sabemos. Talvez comunicar melhor o que fizemos, mas nunca substituir a realização pela comunicação. Se não temos nada a dizer, acabamos mentindo e é isso o que eles fazem.os que adotar a doutrinação deles, a linguagem impositiva e não reflexiva. Temos que continuar fazendo o que sabemos. Talvez comunicar melhor o que fizemos, mas nunca substituir a realização pela comunicação. Se não temos nada a dizer, acabamos mentindo e é isso o que eles fazem.

'General' da direita


Nós daremos golpe em quem quisermos. Lide com isso
Elon Musk, durante crise que resultou na renúncia de Evo Morales, na Bolívia, de olho no lítio usado na fabricação de baterias da  sua empresa Tesla

A ameaça - ainda - sem nome

Nos anos 1930, o mundo tremia ao ouvir falar do Comintern, a Internacional Comunista. Hoje, sem nome, há uma Internacional da Extrema Direita, e o mundo ainda não se tocou. Ela já detém o governo na Itália, Polônia, Hungria e Holanda. Integra ou apoia o governo na Finlândia, Suécia e Grécia. Cresce a galope na França. Chegou perto nas eleições em Portugal e Espanha. Pândega ou trágica, venceu na Argentina. Promove o terror na Alemanha, no Canadá e na Nova Zelândia. E os EUA podem ter Trump de volta.

No Brasil, Bolsonaro tem processos e acusações suficientes para enjaulá-lo por 500 anos. Isso ainda não aconteceu porque a Justiça tem de seguir o seu curso "normal" —embora se trate de um anormal que, vitorioso na eleição ou no golpe, implantaria uma ditadura que nos faria sentir saudade dos militares. Daí, Bolsonaro continua à solta, arrotando ameaças e pautando a imprensa.

A extrema direita tem uma receita universal. Populismo, nacionalismo, discurso moral e religioso. Xenofobia, repúdio a imigrantes e racismo. Desprezo pelos partidos e pregação da antipolítica. Domesticação ou fechamento do Judiciário. População armada. Antiliberalismo. Negacionismo. Rejeição às teses identitárias e rancor contra artistas e intelectuais. E, com o apoio de seus zumbis nas redes sociais, disseminação de fake news, discurso de ódio com ameaças físicas e inversão de conceitos —falam de "liberdade", "democracia" e "eleições limpas" e, quando no poder, esses valores são os primeiros a serem cancelados.

Elon Musk, o Führer das plataformas digitais, encarna esse programa. Seu desacato ao Brasil poderia ter sido ditado por Bolsonaro. Mais cedo do que pensamos, o mundo pagará caro por essa tecnologia sem pátria e sem freios.

O Comintern fracassou em tudo e acabou em 1943. A Internacional da Extrema Direita apenas começou e, aos poucos, vai ganhando todas.

A amizade com o mandão é a chave que abre portas

É uma palavra afetuosa e uma importante categoria cultural, num sistema movido a oposições de classe, cor e poder político, graças a um complicado pacote hierárquico de prerrogativas e privilégios. Numa sociedade cuja vida doméstica reproduz quase literalmente uma velha e abominável servidão escravocrata, amigos e amizade são, como cargos públicos, diplomas e alianças matrimoniais, mecanismos capazes de eventualmente desbaratar os abismos de cor, instrução, residência, dinheiro e poder.

Amigo — esse sujeito e objeto da amizade —, um instrumento precioso num sistema em que se diz sem pensar que a gente faz tudo pelos amigos e despacha os inimigos e desconhecidos para a indigna desconsideração do anonimato e da impessoalidade dos infindáveis e barrocos processos legalísticos nem sempre legais...


Na sociedade que enlaça o universal e o pessoal e não enxerga a ambiguidade como sintoma de dúvida, mentira, má-fé ou dilema, a amizade é certeza, afeto e obrigação que muitas vezes perturba, porque implica fidelidades que ultrapassam o parentesco, a filiação partidária e ideológica e até o bom senso.

Ter a coragem para tudo, menos a coragem de resistir aos amigos é, como elabora magistralmente Oliveira Vianna em seu ignorado “Pequenos estudos de psychologia social” (publicado em 1923!), “talvez a síntese de toda nossa psicologia política: é a incapacidade moral de cada um de nós para resistir às sugestões da amizade e da gratidão, para sobrepor às contingências do personalismo os grandes interesses sociais, que caracterizam nossa índole cívica e definem as tendências mais íntimas da nossa conduta no poder”.

É justamente a amizade que, em seu personalismo, demanda a reciprocidade que obriga a inventar um castelo mal-assombrado de procedimentos e foros legais cuja ambiguidade tem a função de “acomodar” a ética relacional da “pessoa”, contrariando a impessoalidade e a universalidade igualitária da cidadania.

Caberia questionar tanto os limites da amizade quanto o rigor exagerado das leis, tendo como base não o pragmatismo elitista de nossa esfera jurídico-política, mas nosso real estilo de vida. Só assim seremos capazes de compreender o poder da amizade como instrumento de ascensão política e social e, muito especialmente, de corrupção estrutural como traço inevitável e funcional do sistema.

Dessa perspectiva, a popularidade do poema de Manuel Bandeira está no fato de, em Pasárgada, e sobretudo no Brasil, ser amigo do rei! Lá, como aqui, a amizade com o mandão é a chave que abre portas e promove todos os absurdos legais que nos revoltam neste maravilhoso, dilemático e, pelo visto, imutável Brasil.

Nada melhor, pois, do que ser amigo do supremo magistrado; do vingativo coroado — e do também generoso e misericordioso que perdoa e anistia os conhecidos.

Tal como nas ordenações Manuelinas e Filipinas em que a sentença de morte era abundante — ao lado das súplicas que perdoavam. Tal como ocorre até hoje na esfera da política mais densa (apelidada pelo vulgo de politicagem ou politicalha), vemos que os amigos de hoje foram os inimigos de ontem. Perderam o senso, como diz outro poeta? Nada disso, apenas complacentemente mudaram de lado, como faziam os homens quando as mulheres o tinham e ele era mais um véu de aprisionamento feminino.

Ter o rei como amigo é o máximo. Mas, e se o rei promete lhe foder? Fazer o quê? Sair de Pasárgada? Solicitar residência em Miami, esse santuário dos bem de vida?

Não sei o que pensar quando acompanho perplexo o destino da Operação Lava-Jato. Investigação comparada ao movimento tenentista, hoje ilegal e comandada por bandidos. Quem sabe se Pasárgada não é um xadrez que comanda o crime e, de lambuja, tornou-se uma eficiente pós-graduação do crime?