quinta-feira, 3 de outubro de 2024

Shalom ?


Pergunte a qualquer oficial israelense qual é o plano deles para a paz – você não receberá nada, Uma coisa que os israelenses odeiam são os árabes que realmente querem a paz
Ayman Safadi, ministro das Relações Exteriores da Jordânia na ONU

Brasil é uma 'mina de ouro' para casas de apostas

Entre as décadas de 1930 e 1940, o Brasil era como um paraíso dos cassinos. Mais de 70 casas funcionavam no país, e os jogos de azar faziam parte da cultura nacional. No dia 30 de abril de 1946, entretanto, essa realidade mudou abruptamente. Pelo menos de forma legal. Sob o argumento de que esse mercado feria a “tradição moral, jurídica e religiosa” do brasileiro, o então presidente Eurico Gaspar Dutra assinou um decreto proibindo a prática.

Quase 80 anos depois, o cenário é outro. Mesmo diante de um Congresso considerado conservador, o Brasil reabriu as portas para o mundo das apostas, legalizadas em 2018, com a Lei 13.756. Desde então, o país vive um novo “boom” desse mercado, agora de apostas online.

O setor deve ser regulamentado e fiscalizado a partir de janeiro de 2025. O Ministério da Fazenda já tem 182 pedidos de empresas interessadas em obter licença para operar no país, de acordo com o Sistema de Gestão de Apostas. Somente entre setembro e o primeiro dia de outubro, foram 70 novos pedidos.

O interesse é de empresas nacionais e multinacionais da área, como MGM Grand e Caesars Palace, que atuam no mercado de cassinos físicos em Las Vegas, nos Estados Unidos.

Na outra ponta, as apostas online estão fincando raízes na rotina da população. Uma pesquisa do Instituto DataSenado, publicada nesta terça-feira (01/10), mostra que 13% dos brasileiros com 16 anos ou mais, cerca de 22 milhões de pessoas, declararam ter participado de “bets” no último mês.

Outro levantamento da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) já havia mostrado que 63% de quem aposta no país compromete a renda para jogar. Já um levantamento do Banco Central (BC) revelou que inscritos no Bolsa Família teriam direcionado cerca de R$ 3 milhões para as bets apenas via Pix em agosto.

Esse último estudo vem sofrendo contestação, porém todos esses dados são termômetro da nova onda que já posiciona o Brasil, de acordo com a empresa especializada em análise de dados Comscore, como o terceiro mercado mundial em consumo de casas de apostas, atrás apenas dos Estados Unidos e do Reino Unido.

Pesquisadores e integrantes do setor creditam a atratividade do mercado de apostas brasileiro a uma série de fatores, entre eles o apelo a uma paixão nacional, o futebol; o atraso em regulamentar a área; a possibilidade turística para cassinos físicos; o tamanho da população economicamente ativa; e a desigualdade social existente no país.


“O Brasil não é só um mercado interessante, ele é considerado uma das joias da coroa do mercado de aposta mundial, principalmente se levarmos em consideração que o país está sem jogo legalizado há quase 80 anos”, defende Magno José, presidente do Instituto Brasileiro Jogo Legal (IJL).

Nesta terça-feira (01/10), o Ministério da Fazenda publicou uma lista com todas as empresas de bets e apostas aptas a operar no Brasil até dezembro. A lista inclui 89 empresas com respectivamente 193 bets (marcas) que vão continuar operando no país. O governo federal também solicitou informações aos estados, que registraram seis empresas com respectivamente seis bets.

Todos os outros sites que não foram incluídos na lista não poderão mais divulgar ofertas e serão proibidos no país. Eles permanecerão no ar por dez dias, para facilitar o pedido de devolução do dinheiro de apostadores. A partir de 11 de outubro, eles começarão a ser derrubados, com auxílio da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

Aqueles que não pediram autorização de licença ao ministério passarão a ser classificados como ilegais. Quem solicitou atuar no Brasil, mas não estava funcionando ainda, deverá aguardar até 2025. Até lá, a pasta analisará todos os pedidos de licenciamento.

"A medida proporciona mais segurança para a sociedade e para as empresas que querem operar adequadamente no Brasil. Com isso, protegemos a saúde mental e financeira dos jogadores", ressaltou Regis Dudena, secretário de Prêmios e Apostas do ministério, em nota.

A lei de 2018 previa uma regulamentação para o setor de apostas entre dois a no máximo quatro anos, mas apenas em fevereiro de 2023 o país começou a estabelecer as regras de funcionamento das bets esportivas e jogos similares.

Para tanto foi criada uma agenda regulatória, que incluiu a publicação de 11 portarias até setembro deste ano com normas para licenciamento, marketing, fiscalização, entre outras.

O governo federal havia estabelecido que a partir de janeiro iria banir as empresas que não tivessem a licença de operação concedida, mas pesquisas apontando o dano financeiro e de saúde na população, bem como investigações sobre lavagem de dinheiro envolvendo o mundo das bets e influenciadores digitais, anteciparam a medida.

Representantes do setor, Magno José, defendem que a ausência de regulamentação foi o que catapultou o Brasil no mercado internacional de jogos de azar. Ele estima que haja mais de 2 mil sites em funcionamento. Para José, os recursos que poderiam ter sido investidos na compra de outorgas e gerar tributos ao Estado acabaram direcionados para publicidade e marketing, o que tornou o mercado selvagem e nocivo, além de permeado por sites ilegais.

De acordo com o professor do Departamento de Sociologia e Metodologia e Ciências Sociais da Universidade Federal Fluminense (UFF) Marcelo Pereira de Mello, a ausência de regras no mínimo facilitou uma corrida para abrir empresas da área. “Uma regulamentação frouxa e a falta de experiência da gestão pública serviram como estímulo para a criação de muitas empresas de fundo de quintal”, afirma.

O Brasil vive historicamente uma relação de amor e ódio com os jogos de azar. Tanto que a proibição de Dutra, em 1946, não foi a única a ocorrer no país. Por outro lado, a inexistência dos cassinos online nunca limitou totalmente os jogos de azar, que permaneceram ocorrendo por vias lícitas ou ilícitas, seja na loteria federal ou com o jogo do bicho.

De acordo Mello, do ponto de vista sociocultural não há nada que faça o brasileiro ser mais propenso a jogar em comparação a outros mercados mundiais. “Aqui se joga como em qualquer outro país. Os jogos de aposta são uma tradição das sociedades humanas, de maneira geral”, diz.

Autor do livro Criminalização dos Jogos de Azar - A História Social dos Jogos de Azar no Rio de Janeiro, Mello ressalta inclusive que o Brasil sempre viu os jogos de azar pela perspectiva conservadora. Contudo, ele lembra também que esse tipo de negócio sempre esteve vinculado a políticos.

“Pode parecer um paradoxo, mas isso é explicado por outra característica da política brasileira, que é o fisiologismo. Houve uma intensa atuação de lobbies relacionados a apostas, com promessas de favorecimento a diversos grupos dentro do Congresso Nacional”, acrescenta.

Outro fator apontado como importante nessa equação é a paixão do brasileiro por futebol, já que as apostas em eventos esportivos representam parte significativa desse mercado. Empresas do setor começaram a realizar propaganda em diversos eventos desde 2018 e patrocinam pelo menos 30 clubes das séries A e B do Campeonato Brasileiro, incluindo Flamengo e Corinthians.

“É um mercado novo, que explora uma paixão nacional. As pessoas podem pensar que aquilo não é um jogo de azar, mas de conhecimento técnico sobre o esporte, o time, os jogadores”, afirma Mello. De acordo com José, 80% dos apostadores brasileiros são considerados recreativos, ou seja, que apostam em pequenas quantias. “É aquela coisa de mandar no grupo de amigos que apostei no time que ganhou”, diz.

Daniel Dias, professor da FGV Direito Rio de Janeiro, lembra, contudo, que faltam dados comparativos com outros países para cravar se a paixão do brasileiro por futebol move mais apostas do que em outros países onde acontece o mesmo fenômeno.

“Independentemente disso, é uma novidade, e tudo o que é novo atrai atenção. Além disso, o mundo das bets está entrando com muita publicidade agressiva”, diz Dias.

Com a regulamentação do mercado, as bets vão precisar ter sede no Brasil e licenciamento para seguir patrocinando os times de futebol e outros eventos esportivos. Em outros países, como no Reino Unido, o patrocínio das casas de apostas foi proibido de ser estampado nas camisas dos clubes a partir de 2026.

“A gente vê grandes jogadores de futebol, da seleção, vinculando suas imagens às apostas esportivas. Além disso, a gente tem anúncio em tudo quanto é canto, num ambiente sem categorização de idade”, afirma Rodrigo Machado, psiquiatra e coordenador do Grupo de Dependências Tecnológicas do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP).

Em 1920, o então presidente Epitácio Pessoa chegou a liberar os cassinos, mas só em balneários, para fomentar o turismo e custear o saneamento básico no interior. Mas tanto os estados quanto o Governo Federal fecharam vários dos hotéis-cassinos, que só voltaram a ser estimulados a partir de 1930, durante o governo de Getúlio Vargas.

Agora, com o mercado online efervescente, há a expectativa de que o país também volte a aceitar os espaços físicos de apostas. E ter um litoral vasto é considerado um ativo interessante para a eventual instalação de cassinos físicos.

O Congresso discute um projeto de lei para regulamentar o jogo do bicho, a corrida de cavalo e os cassinos. O texto do PL 2.234, de 2022, é uma versão do PL 442, que tramitava desde 1991 e foi aprovado na Câmara dos Deputados em 2022. O documento está em tramitação no Senado, com última movimentação no início de agosto deste ano.

Representantes de empresas com atuação em Las Vegas, como o presidente da Caesars Sportsbook no Brasil, André Feldman, têm realizado encontros com senadores e integrantes da Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda.

Segundo a ferramenta Agenda Transparente, da Agência Fiquem Sabendo, Feldman realizou pelo menos três encontros com representantes do Executivo e Legislativo desde 2023. A última delas no dia 4 de setembro, com o senador Rogério Carvalho (PT/SE) e integrantes do MF. Já Alex Pariente, vice-presidente sênior do Hard Rock International para hoteis e cassinos, encontrou-se em maio com representantes do MF.

“Estamos num país que tem muitas belezas naturais, então, se forem aprovados os cassinos presenciais, é um mercado fantástico para instalar resorts e cassinos e fomentar o jogo de azar presencialmente”, lamenta Machado.
Desigualdade social como pano de fundo

A pesquisa do DataSenado mostra que o perfil principal de apostadores no Brasil são pessoas do sexo masculino, entre 16 e 39 anos, que ganham até dois salários-mínimos. Entre as pessoas que apostaram, cerca de 58% estão com dívidas em atraso há mais de 90 dias.

Os dados corroboram as pesquisas já divulgadas pela SBCV e o Banco Central sobre o perfil de quem está se tornando consumidor nesse mercado. Para os pesquisadores entrevistados pela DW, são estatísticas que revelam o papel da desigualdade social na proliferação das bets.

“A camada social mais pobre é mais vulnerável a esse tipo de atividade, pois são pessoas que muitas vezes estão endividadas ou querendo fazer uma grana extra, que estão com a corda no pescoço”, afirma Dias.

Mello ressalta também as desigualdades educacionais como fato. “No Brasil, os mais pobres são também os que têm menos escolaridade formal. Essas empresas prometem enriquecimento, mudança de padrão de vida a uma população desesperançada. Então, a expectativa de ascensão social se dá por esse meio”, diz.
Alice de Souza 

O mundo se arma

As oscilações para cima ocorridas nos últimos dias nos preços do petróleo e do ouro são reações imediatas a eventos com potencial de imprimirem insegurança aos mercados. Eram previsíveis, pois não pode haver dúvida de que a escalada da guerra no Oriente Médio, com o envolvimento direto de Israel, do Líbano, do Irã e, indiretamente, dos Estados Unidos, acentua a gravidade de uma disputa que coloca em risco a estabilidade global. No entanto, nos bastidores que movimentam a geopolítica, há muito tempo os países relevantes preparam-se militarmente para enfrentar um cenário mundial de instabilidade crescente.

Os gastos militares mundiais aumentaram 6,8% em 2023, em termos reais (descontada a inflação). Foi a mais acentuada expansão anual observada ao longo de nove anos consecutivos, desde 2014, representando despesas no total de US$ 2,443 trilhões. Os Estados Unidos aparecem em primeiro lugar, com um total de despesas no setor militar de US$ 916 bilhões no ano passado (2,3% a mais sobre 2022), seguido da China com a estimativa de gastos da ordem de US$ 296 bilhões (6% acima do ano anterior).

Os números são do Stockholm International Peace Research Institute - Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo (Sipri) -, cujo banco de dados foi atualizado em abril deste ano. Trata-se de uma conceituada instituição independente dedicada a pesquisar informações relacionadas com a segurança global em 40 países.

A Rússia, com US$ 109 bilhões (24% de aumento sobre 2022) aparece em terceiro lugar, à frente da Índia, cujas despesas militares atingiram US$ 83,6 bilhões e da Arábia Saudita, com US$ 75,8 bilhões de gastos. A Ucrânia ampliou suas despesas militares em 51%, atingindo o total de US$ 64,8 bilhões em 2023.

No top 10, aparecem ainda o Reino Unido, a Alemanha, a França e o Japão, que decidiu voltar a investir em armamento. O Brasil é o 16º colocado, com gastos equivalentes a US$ 22,9 bilhões (3,1% a mais sobre 2022).

Obviamente, o incremento dos gastos militares foi estimulado pela invasão da Rússia na Ucrânia há cerca de dois anos e meio e pelo ataque do Hamas a Israel com a consequente resposta que há um ano tem envolvido o exército israelense na faixa de Gaza, na Cisjordânia e, mais recentemente, no Líbano. Os dados do Sipri apontam para um aumento real de 9% das despesas militares na região do Oriente Médio em 2023. Além da Arábia Saudita, destacam-se Israel com gasto de US$ 27,5 bilhões (24% a mais sobre 2022), a Turquia, que ampliou seus gastos em 37% para o total de US$ 15,8 bilhões, e o Irã, cujo aumento marginal de 0,6% envolveu US$ 10,3 bilhões no ano passado.

No que diz respeito às armas nucleares, também se observou inversão substancial, com destaque para a China. Como se sabe, são nove os países que detêm arsenal nuclear: Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, França, China, Índia, Paquistão, a República Popular Democrática da Coreia (Coreia do Norte) e Israel. O Sipri calcula que no início de 2024 o total de armas nucleares naqueles países somou cerca de 12.121, sendo que destes 9.585 são considerados potencialmente disponíveis do ponto de vista operacional.

Estados Unidos e Rússia são responsáveis, juntos, por cerca de 90% da totalidade do armamento nuclear no mundo e têm investido na substituição e modernização de ogivas, mísseis, aviões e em submarinos especializados. A grande novidade é a expansão do arsenal nuclear chinês. Com a ressalva de que as informações se baseiam em dados secundários, uma vez que a China não os divulga oficialmente, o Sipri estima em 500 ogivas nucleares o total existente naquele país em janeiro deste ano. Isto representaria 90 ogivas a mais do que a estimativa de 2023. O Instituto destaca a possibilidade de que, na próxima década, os chineses sejam capazes de manter posicionada a mesma quantidade de mísseis balísticos intercontinentais que a Rússia ou os Estados Unidos no mesmo período.

Enquanto o mundo se arma, as Nações Unidas, órgão responsável por manter a paz global, se enfraquece. Criada em julho de 1945, logo após o término da Segunda Guerra Mundial, em substituição à Liga das Nações que, por sua vez, havia surgido com o fim da Primeira Guerra, a ONU vem gradualmente perdendo poder de influência na mediação de conflitos. Paralisada em meio às discussões a respeito da formação atual e injustificável do Conselho de Segurança, a instituição ficou sem voz e sem vez.

De fato, há uma obsolescência em torno daquele Conselho. Seus membros permanentes com poder de veto - Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia e China - formam o grupo dos aliados, vencedores da guerra deflagrada por Hitler, com exceção da China que entrou, talvez, por oposição ao então inimigo Japão, apesar de representar na época apenas 2% do PIB mundial. Aliás, entrou como República da China (hoje Taiwan) e foi substituída em 1971 pela República Popular da China em manobra de Nixon, que se aproximou dos chineses com receio de que estes se aliassem à Rússia. Após quase 80 anos, vive-se hoje uma realidade geopolítica diferente com novas forças de influência, muitas informais, como o G-7, o G-20, os Brics, a Asean (do Sudeste Asiático mais China) e a AUKUS (Aliança de Defesa anti-China), entre outras.

A 79ª Assembleia Geral da ONU aprovou recentemente em Nova York o “Pacto do Futuro”, com o objetivo de reforçar a cooperação multilateral e reabilitar o poder político da própria instituição. Entre os objetivos está a reforma do Conselho de Segurança com relação à forma, ao tamanho e às atribuições, incluindo limites para o uso do poder de veto. O tal Pacto mais parece aquele tipo de decisão para inglês ver, como se diz. A ONU quer recuperar influência, mas sabe-se que dificilmente conseguirá grandes avanços enquanto as decisões continuarem a passar pelas mãos dos cinco países agraciados com o crivo do veto em meio ao universo de 193 países que fazem parte da organização.
Maria Clara R. M. do Prado 

Criariam a guerra se já não houvesse uma guerra criada para que lutem

Red ganha uma batalha entre frotas estelares no futuro distante do Filamento 2218. Enquanto a grande Gallumfry se inclina em direção ao planeta, lançando uma chuva de cápsulas de fuga, enquanto as estações de batalha murcham como flores lançadas ao fogo, enquanto as bandas de rádio chiam com triunfos e naves ligeiras mergulham para escapar de perseguições, enquanto armas ecoam seus últimos argumentos no espaço mudo, ela escapa. O triunfo parece rápido e sem graça. Ela costumava adorar esse fogo. Agora, só a lembra de quem não está lá.
Ela escala fio acima, se consolando no passado.

Red raramente procura a companhia de outros como ela. São todos esquisitos — decantados depois de terem sido considerados divergentes em algum ponto de seu desenvolvimento. Ou os mais divergentes de todos: aqueles que decantaram a si mesmos. Eles não ficam em paz, e continuam os jogos na rosa celestial. Eles se destrincham do resto, introduzem assimetria.

Eles criariam esta guerra se já não houvesse uma guerra criada para que lutem, ela pensa.


Mas ela busca companhia agora, em um dos lugares onde sempre encontra.
O sol castiga as ruas de Roma. Um homem com um rosto magro e um nariz fino e uma coroa de louros passa acompanhado pelo Teatro de Pompeia. Outros o interceptam, convidam-no a entrar. Uma multidão está esperando nas sombras: os senadores, seus servos, e outros.

— Você já sentiu que está sendo seguido? Que a Comandante está espionando você? — Red pergunta a um dos outros.

Um senador oferece a César uma petição.

— Seguido? — diz o homem com o nariz quebrado à sua esquerda. — Pelos inimigos, às vezes. Pela Agência? Se a Comandante quisesse nos espionar, poderia ler nossas mentes.

César desconsidera a petição, mas os senadores o rodeiam.

— Alguém está seguindo meus rastros, mas some assim que penso em pegá-lo — diz Red.

— Agente inimigo — diz a mulher à sua direita.

— Mas são em excursões minhas, viagens de pesquisa, não de contra-ataque. Como um agente inimigo saberia para onde eu vou?

Um senador puxa uma adaga. Ele tenta esfaquear César pelas costas, mas César segura sua mão.

— Se for a Comandante — diz o homem com o nariz quebrado —, por que se preocupar?

Ela franze a testa.

— Eu gostaria de saber se a minha lealdade está sendo testada.

O homem que teve a mão segurada grita por ajuda em grego. Adagas deslizam das bainhas dos senadores.

— Isso acabaria com o propósito do teste — observa a mulher. — Ah, deixe disso, nós vamos perder a diversão.

Ela tem um sorriso largo e uma lâmina longa.

César grita algumas palavras, mas elas se perdem no tumulto do ataque dos assassinos. Red dá de ombros e suspira e se junta a eles. A guerra oferece poucas chances de extravasamento, e ela não pode ser vista dispensando uma. O sangue gruda em suas mãos. Ela lava depois, em outro rio, bem longe.

Folhas esvoaçam nos bosques de Ohio quando os gansos pousam. Um deles se afasta dos demais gansos e se aproxima dela. Red pondera sobre o destino do último ganso a lhe trazer uma carta e sente um momento de culpa.
Há um barbante ao redor do pescoço do ganso, e do barbante pende uma bolsa de couro fino.

Suas mãos tremem ao abrirem a bolsa. Seis sementes repousam lá dentro, diminutas lágrimas carmesins com ainda mais diminutos números entalhados em suas superfícies, de um a seis. Sobre o couro, em uma tinta azul demais para aquele continente ou filamento, a caligrafia que ela conhece bem, mesmo que só tenha visto uma vez, traça: Você confia em mim?

Ela se senta no bosque, sozinha.

Ela confia.

Red confia nela até os ossos, a ponto de ter que pensar por um longo tempo para se dar conta do que desconfiar implicaria — o que essas sementes podem ser, o que podem fazer a Red, se estiver errada.

Ela come as três primeiras sementes uma a uma. Deveria se sentar debaixo de um baobá, mas em vez disso afunda sob uma castanheira, rodeada de seus frutos espinhosos.

Quando cada carta se abre em sua mente, ela a enquadra no palácio da memória. Ela tece as palavras em cobalto e lápis-lazúli, unindo-as ao manto de Maria nos afrescos de São Marcos, à tinta sobre porcelana, à cor de uma rachadura em uma geleira. Recusa-se a deixá-la escapar.

A terceira semente, com sua terceira carta, faz Red desfalecer.

Ela acorda com o farfalhar de castanhas secas para descobrir as últimas três sementes ainda em sua mão fechada, mas a bolsa de couro desaparecida. Ela ouve passos no bosque e os persegue: uma sombra dispara lá na frente, sempre fora de alcance, e então some, e ela cai ofegante de joelhos no bosque vazio.
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