sábado, 23 de outubro de 2021
O 'charlatão' Bolsonaro tem pouco a temer por enquanto
Mais de 600 mil brasileiros morreram na pandemia até agora. Apenas nos EUA o número de vítimas foi maior. Em seu relatório final apresentado na quarta-feira (20/10), a CPI da Pandemia acusa o presidente Jair Bolsonaro de dez crimes durante a execução das suas políticas sanitárias fracassadas. As acusações incluem charlatanismo, Infração de medida sanitária preventiva, incitação ao crime e crimes contra a humanidade.
Graves acusações também foram apresentas contra 65 outras pessoas, incluindo três filhos do presidente, quatro ministros e duas empresas.
O presidente Bolsonaro reagiu da mesma maneira de sempre. "Nada produziram a não ser o ódio e o rancor", disse o presidente em um evento que aconteceu paralelamente à leitura do relatório. Mais uma vez, ele defendeu o uso de medicamentos antimaláricos e vermífugos comprovadamente ineficazes para combater a covid-19, usando o subterfúgio da defesa da autonomia dos médicos para administrar os remédios.
O presidente sabe que juridicamente tem pouco a temer em relação ao relatório final de quase 1.200 páginas. Por um lado, o relatório ainda é um rascunho. Na próxima semana, o texto será votado pela CPI e poderá sofrer alterações. Depois disso, é certo que deve ser aprovado pela maioria dos 11 membros da comissão.
A exclusão de dois trechos controversos na noite de terça-feira mostrou que ainda há muita margem de manobra para novas alterações. As acusações contra Bolsonaro por homicídio e genocídio da população indígena foram deixadas de lado após pressão de senadores. Não havia base legal para essas imputações, argumentou-se, e foi levantado o risco de que essas acusações prejudicassem a credibilidade do relatório como um todo.
Mas mesmo que as principais acusações permaneçam na versão final e aprovada do relatório, isso em princípio não acarretará consequências jurídicas para o presidente. Em última instância, cabe ao Ministério Público verificar se existem de fato evidências ou mesmo provas sólidas sobre os crimes imputados. Os procuradores são livres para descartar acusações individuais ou adicionar novas. Não há vinculação obrigatória entre o relatório da CPI e as investigações do Ministério Público.
Além disso, Bolsonaro tem um grande trunfo na manga. Cabe ao procurador-geral da República, Augusto Aras, decidir se os pedidos de indiciamento contra o presidente devem avançar. Aras, nomeado por Bolsonaro em 2019, vem provando até o momento ser um protetor do presidente. O fato de que ele espera ser nomeado para uma vaga no Supremo Tribunal Federal por Bolsonaro deve aumentar ainda mais sua lealdade pretoriana.
Não se espera que Aras indicie Bolsonaro. Em vez disso, é mais provável que Aras simplesmente ignore o relatório da comissão, deixando-o "mofar na gaveta". Há discussões se o STF poderia forçar Aras a aceitar dar andamentos às acusações, mas essa é uma questão controversa entre juristas.
A oposição, que conta com maioria na CPI, está ciente de tudo isso, é claro. Então ela espera pelo menos desgastar Bolsonaro politicamente. Daqui a um ano, os brasileiros elegerão um novo presidente. A CPI reuniu muito material para a campanha eleitoral da oposição. As audiências que somam 370 horas acabaram sendo usadas para expor o fracasso da política governamental de combate à pandemia.
Não foi difícil. Foram explícitas a incompetência do governo em lidar com a pandemia e a clara indisposição de Bolsonaro em agir. O presidente não se importa com quantas pessoas morrem e não tem medo de dizer isso abertamente. É ainda mais surpreendente quantos brasileiros ainda são leais a Bolsonaro. Eles acreditam na narrativa do presidente de que se trata apenas de uma campanha de vingança da oposição.
E elas têm boas razões para isso. As comissões parlamentares de inquérito são uma ferramenta política utilizada pela oposição para questionar o governo. Na história do Brasil, quase sempre foram usadas para pirotecnia política. Muito barulho por nada, um show puramente político-partidário sem consequências reais e investigações sérias. Nesse sentido, a CPI da Pandemia é um ponto de inflexão histórico, pois 9 terabytes - ou seja, 9.000 gigabytes - de documentos foram coletados e analisados por advogados especializados. Uma conquista histórica única.
A CPI merece crédito por revelar detalhes até então desconhecidos do fracasso do governo. A rede de corrupção que se formou em torno da compra de vacinas e remédios foi exposta, revelando a atuação ilegal de políticos pró-governo, funcionários e empresários. Esses peixes pequenos são provavelmente os que mais têm a temer o Judiciário. Eles provavelmente serão usados como bois de piranha.
E os peixes grandes? O mais provável é que ele estejam temerosos com a reação dos eleitores. Porque, uma vez sem mandatos, Bolsonaro e companhia poderão ser processados pelas instâncias inferiores da Justiça. É possível prever várias ações judiciais movidas por famílias de vítimas contra os responsáveis pela política para a pandemia. Em seguida, serão expostos novamente os responsáveis pela falta de oxigênio nos hospitais amazônicos e pelas centenas de pacientes que morreram nessas unidades.
Graves acusações também foram apresentas contra 65 outras pessoas, incluindo três filhos do presidente, quatro ministros e duas empresas.
O presidente Bolsonaro reagiu da mesma maneira de sempre. "Nada produziram a não ser o ódio e o rancor", disse o presidente em um evento que aconteceu paralelamente à leitura do relatório. Mais uma vez, ele defendeu o uso de medicamentos antimaláricos e vermífugos comprovadamente ineficazes para combater a covid-19, usando o subterfúgio da defesa da autonomia dos médicos para administrar os remédios.
O presidente sabe que juridicamente tem pouco a temer em relação ao relatório final de quase 1.200 páginas. Por um lado, o relatório ainda é um rascunho. Na próxima semana, o texto será votado pela CPI e poderá sofrer alterações. Depois disso, é certo que deve ser aprovado pela maioria dos 11 membros da comissão.
A exclusão de dois trechos controversos na noite de terça-feira mostrou que ainda há muita margem de manobra para novas alterações. As acusações contra Bolsonaro por homicídio e genocídio da população indígena foram deixadas de lado após pressão de senadores. Não havia base legal para essas imputações, argumentou-se, e foi levantado o risco de que essas acusações prejudicassem a credibilidade do relatório como um todo.
Mas mesmo que as principais acusações permaneçam na versão final e aprovada do relatório, isso em princípio não acarretará consequências jurídicas para o presidente. Em última instância, cabe ao Ministério Público verificar se existem de fato evidências ou mesmo provas sólidas sobre os crimes imputados. Os procuradores são livres para descartar acusações individuais ou adicionar novas. Não há vinculação obrigatória entre o relatório da CPI e as investigações do Ministério Público.
Além disso, Bolsonaro tem um grande trunfo na manga. Cabe ao procurador-geral da República, Augusto Aras, decidir se os pedidos de indiciamento contra o presidente devem avançar. Aras, nomeado por Bolsonaro em 2019, vem provando até o momento ser um protetor do presidente. O fato de que ele espera ser nomeado para uma vaga no Supremo Tribunal Federal por Bolsonaro deve aumentar ainda mais sua lealdade pretoriana.
Não se espera que Aras indicie Bolsonaro. Em vez disso, é mais provável que Aras simplesmente ignore o relatório da comissão, deixando-o "mofar na gaveta". Há discussões se o STF poderia forçar Aras a aceitar dar andamentos às acusações, mas essa é uma questão controversa entre juristas.
A oposição, que conta com maioria na CPI, está ciente de tudo isso, é claro. Então ela espera pelo menos desgastar Bolsonaro politicamente. Daqui a um ano, os brasileiros elegerão um novo presidente. A CPI reuniu muito material para a campanha eleitoral da oposição. As audiências que somam 370 horas acabaram sendo usadas para expor o fracasso da política governamental de combate à pandemia.
Não foi difícil. Foram explícitas a incompetência do governo em lidar com a pandemia e a clara indisposição de Bolsonaro em agir. O presidente não se importa com quantas pessoas morrem e não tem medo de dizer isso abertamente. É ainda mais surpreendente quantos brasileiros ainda são leais a Bolsonaro. Eles acreditam na narrativa do presidente de que se trata apenas de uma campanha de vingança da oposição.
E elas têm boas razões para isso. As comissões parlamentares de inquérito são uma ferramenta política utilizada pela oposição para questionar o governo. Na história do Brasil, quase sempre foram usadas para pirotecnia política. Muito barulho por nada, um show puramente político-partidário sem consequências reais e investigações sérias. Nesse sentido, a CPI da Pandemia é um ponto de inflexão histórico, pois 9 terabytes - ou seja, 9.000 gigabytes - de documentos foram coletados e analisados por advogados especializados. Uma conquista histórica única.
A CPI merece crédito por revelar detalhes até então desconhecidos do fracasso do governo. A rede de corrupção que se formou em torno da compra de vacinas e remédios foi exposta, revelando a atuação ilegal de políticos pró-governo, funcionários e empresários. Esses peixes pequenos são provavelmente os que mais têm a temer o Judiciário. Eles provavelmente serão usados como bois de piranha.
E os peixes grandes? O mais provável é que ele estejam temerosos com a reação dos eleitores. Porque, uma vez sem mandatos, Bolsonaro e companhia poderão ser processados pelas instâncias inferiores da Justiça. É possível prever várias ações judiciais movidas por famílias de vítimas contra os responsáveis pela política para a pandemia. Em seguida, serão expostos novamente os responsáveis pela falta de oxigênio nos hospitais amazônicos e pelas centenas de pacientes que morreram nessas unidades.
O nazismo na América do Sul
Cada dia fica mais claro porque os restos do nazismo que vieram da Europa renderam tantos frutos na América Latina, sobretudo no Brasil, no Chile e na Argentina. Desde o final dos anos 50 que uma corrente migratória de criminosos de guerra ou simpatizantes do nazismo se formou em direção ao nosso continente. Alguns fizeram escala na Espanha, que vivia ainda o auge do regime franquista de extrema direita. Na Argentina se escondeu Adolf Heichmann, um dos executores dos planos de extermínio de Hitler que foi sequestrado e levado para Israel pelos então caçadores de nazistas. O Brasil abriu as portas para alguns e durante a ditadura militar fechou os olhos para a permanência deles por aqui. Mengele, médico e assassino e Franz Wagner, oficial da SS que viveram anos no Brasil sem ser incomodados foram alguns deles. Fazia sentido o olho fechado dos militares sul americanos a esses criminosos. A doutrina se parecia.
Agora, acabei de assistir na Netflix uma série documental de 6 capítulos chamada "Colônia Dignidade" que conta a história de um subproduto deste nazismo que proliferou por aqui. No caso, aconteceu no Chile dos anos 60 até 2010 quando o alemão Paul Schäfer morreu com mais de 80 anos. Durante décadas ele comandou a famosa Colônia Dignidade, numa zona ao sul de Santiago com a anuência dos chilenos, depois dos militares de Pinochet, quando serviu também de centro de torturas e por fim sob o governo neoliberal que veio a seguir.
Precisou que um alemão, que chegou por lá ainda criança, revelasse as atrocidades e a pedofilia perversa de Schäfer depois de fugir para a Alemanha junto com um também jovem chileno. Aí, o mundo escutou e as autoridades correram para prendê-lo. A essa altura, ele já estava na Argentina, mas isso não impediu que fosse preso e condenado a 20 anos de cadeia por pedofilia. Os crimes contra a humanidade, a colaboração com a tortura de Pinochet e o desaparecimento de vários prisioneiros que passaram por lá ficou para ser contado pela História.
Schäfer era, claramente, um pós-nazista. Saiu da Alemanha no inicio dos anos 60, também acusado de pedofilia e fugiu para o Chile onde recebeu como presente uma área enorme para construir sua colônia.
Aparentemente a ideia era receber as populações pobres chilenas, oferecer educação, saúde e moradia além dos próprios alemães que foram para lá com ele e que mantinham a corrente migratória funcionando. Só que Schäfer era um pedófilo, nazista, perverso e cruel. Tirava as crianças de suas famílias, tanto as chilenas quanto as alemãs, até mesmo sequestrando-as. Eliminava os sobrenomes e as entregava à guarda das chamadas tias.
Ele abusava, literalmente, das crianças e conseguia manter seu poder através da imposição violenta da sua doutrina aos cidadãos comportados e temerosos. A colônia cresceu, construíram alojamentos, moradias, escola e hospital. Mas tudo como um estado dentro de outro estado que permitia esse poder paralelo.
O moralismo era exacerbado, a religião, imposta e a única diversão que tinham era a ginástica e os cânticos. Impressionante como os regimes autoritários enaltecem a ginástica. É uma atividade física que não favorece o raciocínio. Os cânticos tem o mesmo efeito inebriante e evangelizador. Era disso que ele vivia acrescentando o lado cruel da pedofilia ao seu descontrole autoritário.
Quando Pinochet subiu ao poder num golpe de estado sangrento Schäfer foi o primeiro a respirar aliviado. As ameaças que surgiram durante o governo Allende de revelar o verdadeiro lado da Colônia e o difundido medo do comunismo que ele mesmo espalhava acabaram cedendo lugar a uma colaboração explícita entre a ditadura e Schäfer. Os alemães podiam importar armas sem fiscalização e através do grupo Pátria e Liberdade, que depois se revoltou contra Pinochet, ajudou abertamente o golpe. Além do centro de torturas, foram achadas, anos depois, várias ossadas. Mesmo assim depois que Pinochet saiu do poder os políticos não levaram a sério o que se revelava.
Agora, acabei de assistir na Netflix uma série documental de 6 capítulos chamada "Colônia Dignidade" que conta a história de um subproduto deste nazismo que proliferou por aqui. No caso, aconteceu no Chile dos anos 60 até 2010 quando o alemão Paul Schäfer morreu com mais de 80 anos. Durante décadas ele comandou a famosa Colônia Dignidade, numa zona ao sul de Santiago com a anuência dos chilenos, depois dos militares de Pinochet, quando serviu também de centro de torturas e por fim sob o governo neoliberal que veio a seguir.
Precisou que um alemão, que chegou por lá ainda criança, revelasse as atrocidades e a pedofilia perversa de Schäfer depois de fugir para a Alemanha junto com um também jovem chileno. Aí, o mundo escutou e as autoridades correram para prendê-lo. A essa altura, ele já estava na Argentina, mas isso não impediu que fosse preso e condenado a 20 anos de cadeia por pedofilia. Os crimes contra a humanidade, a colaboração com a tortura de Pinochet e o desaparecimento de vários prisioneiros que passaram por lá ficou para ser contado pela História.
Schäfer era, claramente, um pós-nazista. Saiu da Alemanha no inicio dos anos 60, também acusado de pedofilia e fugiu para o Chile onde recebeu como presente uma área enorme para construir sua colônia.
Aparentemente a ideia era receber as populações pobres chilenas, oferecer educação, saúde e moradia além dos próprios alemães que foram para lá com ele e que mantinham a corrente migratória funcionando. Só que Schäfer era um pedófilo, nazista, perverso e cruel. Tirava as crianças de suas famílias, tanto as chilenas quanto as alemãs, até mesmo sequestrando-as. Eliminava os sobrenomes e as entregava à guarda das chamadas tias.
Ele abusava, literalmente, das crianças e conseguia manter seu poder através da imposição violenta da sua doutrina aos cidadãos comportados e temerosos. A colônia cresceu, construíram alojamentos, moradias, escola e hospital. Mas tudo como um estado dentro de outro estado que permitia esse poder paralelo.
O moralismo era exacerbado, a religião, imposta e a única diversão que tinham era a ginástica e os cânticos. Impressionante como os regimes autoritários enaltecem a ginástica. É uma atividade física que não favorece o raciocínio. Os cânticos tem o mesmo efeito inebriante e evangelizador. Era disso que ele vivia acrescentando o lado cruel da pedofilia ao seu descontrole autoritário.
Quando Pinochet subiu ao poder num golpe de estado sangrento Schäfer foi o primeiro a respirar aliviado. As ameaças que surgiram durante o governo Allende de revelar o verdadeiro lado da Colônia e o difundido medo do comunismo que ele mesmo espalhava acabaram cedendo lugar a uma colaboração explícita entre a ditadura e Schäfer. Os alemães podiam importar armas sem fiscalização e através do grupo Pátria e Liberdade, que depois se revoltou contra Pinochet, ajudou abertamente o golpe. Além do centro de torturas, foram achadas, anos depois, várias ossadas. Mesmo assim depois que Pinochet saiu do poder os políticos não levaram a sério o que se revelava.
O que o preço da carne de pescoço diz sobre a política brasileira
No supermercado da fome, o dos restos e resíduos de comestíveis, carne de pescoço de galinha, ossos de boi, espinhas de peixe, comidas de desvalidos que, no noticiário, revelam o que é a inventiva estratégia de sobrevivência dos milhões de famintos no Brasil. São componentes da visibilidade turva da melancólica situação social brasileira.
Há uma certa hipocrisia política em atribuir essa tragédia à pandemia. A pandemia apenas agravou o que já era grave. Tampouco se trata de algo restrito à incompetência de um governo irresponsável, embora lhe deva muitíssimo.
A coisa nos vem da imprudência de tentar fazer de conta que o Brasil é um país emergente, quase de primeiro mundo, e deixar a economia correr.
Os teóricos do capitalismo de marginalização social “chutam”: basta copiar o modelo econômico dos países ricos para que todos os problemas sociais sejam resolvidos automaticamente e este também se torne rico. Mesmo que esteja se tornando cada vez mais pobre.
O Estado brasileiro entregou-se politicamente à possessão diabólica das leis econômicas. O preço da carne de pescoço, que se tornou alimento emergencial dos miseráveis e famintos, subiu. Ou seja, a fome e a economia dos pobres foram capturadas pela voracidade do lucro amoral e cego do sistema econômico socialmente insensível, de regras feitas unicamente para aumentar o muito dos que já têm tudo.
Os pobres são personagens invisíveis da bolsa de valores e do mercado financeiro. Por incrível que pareça, são lucrativos porque suas carências se traduzem em valorização do que não vale nada. Deveriam dar um Prêmio Nobel de Economia a quem explicasse o fato de que o preço da carne de pescoço, do cardápio dos pobres, baseado em itens praticamente do lixo, também sobe quando o dólar sobe. O estômago do pobre fica mais vazio enquanto bolsos ficam mais cheios.
É estranhíssimo que pobres e ricos não enxerguem isso, não façam comparações, não as traduzam em consciência e ação políticas em favor do bem comum. Entre os pobres, a fome e o abandono matam o espírito ao privá-lo de seu alimento primordial que é a esperança.
A política não foi inventada para ser cúmplice da economia nem do economismo. A política foi inventada para trazer a economia e o poder ao redil da civilização, controlar e regular suas tendências economicamente irracionais e socialmente destrutivas.
É a ordem social e seus valores que devem regular a ordem econômica. Quando isso não acontece, e não está acontecendo, a nação inteira se converte num país de párias, de sem destino, de famintos, de desabrigados. A falta de coragem, de responsabilidade e de competência dos políticos que podem acionar os mecanismos de correção da economia é indicativa de que estamos abandonados e órfãos.
Todos se lembram, certamente, do espetáculo de menoridade política que foi a reunião do governo de 22 de abril de 2020. E nela da afirmação imponente do ministro da Economia contra suposta tendência keynesiana nas propostas e ações de um dos ministros. Se tivéssemos um Keynes no Brasil, e sua teoria de renda e do emprego, certamente o país estaria longe da barbárie da situação atual. Livre do peso morto de gente que manda como capataz dos tempos da escravidão.
Os jornais garimpam, todos os dias, nas ruínas do país as novidades medonhas da miséria. Na esperança de que se desenvolva entre nós a consciência crítica de nossos problemas, de nossa vulnerabilidade social, do abismo que nos espera.
O cardápio de carne de pescoço se desdobra na forma que vai adquirindo a situação habitacional. Análise de Fernando Canzian na “Folha de S. Paulo” mostra que, em uma década, o número de favelas saltou de 6.329 para 13.151.
Em 1960, Carolina Maria de Jesus, que vivia na Favela do Canindé, lançou seu primeiro livro, “Quarto de Despejo”, graças ao empenho do jornalista e escritor Audálio Dantas. Carolina era personagem de uma humanidade invisível. Seu livro gritou por ela. Nele, São Paulo e o Brasil ficaram nus.
Hoje 24,5 milhões de pessoas passam fome no país. Não é fome de comer pouco. É fome de comer o insuficiente ou de não comer nada. Outros 74 milhões estão chegando perto dessa situação. São cerca de 100 milhões de mãos e braços que, sem trabalho e na incerteza da marginalização social, estão à espera de um novo corpo político e social chamado multidão.
Creio que seria muito mais prudente mobilizar a população para fazer uma profunda e radical reforma econômica e social, com gente capaz de fazê-la, com base no primado dos direitos sociais e da dignidade da pessoa. O Brasil precisa revolucionar suas estruturas fundamentais. Essa seria uma boa oportunidade para Deus aderir e confirmar que é mesmo brasileiro.
Há uma certa hipocrisia política em atribuir essa tragédia à pandemia. A pandemia apenas agravou o que já era grave. Tampouco se trata de algo restrito à incompetência de um governo irresponsável, embora lhe deva muitíssimo.
A coisa nos vem da imprudência de tentar fazer de conta que o Brasil é um país emergente, quase de primeiro mundo, e deixar a economia correr.
Os teóricos do capitalismo de marginalização social “chutam”: basta copiar o modelo econômico dos países ricos para que todos os problemas sociais sejam resolvidos automaticamente e este também se torne rico. Mesmo que esteja se tornando cada vez mais pobre.
O Estado brasileiro entregou-se politicamente à possessão diabólica das leis econômicas. O preço da carne de pescoço, que se tornou alimento emergencial dos miseráveis e famintos, subiu. Ou seja, a fome e a economia dos pobres foram capturadas pela voracidade do lucro amoral e cego do sistema econômico socialmente insensível, de regras feitas unicamente para aumentar o muito dos que já têm tudo.
Os pobres são personagens invisíveis da bolsa de valores e do mercado financeiro. Por incrível que pareça, são lucrativos porque suas carências se traduzem em valorização do que não vale nada. Deveriam dar um Prêmio Nobel de Economia a quem explicasse o fato de que o preço da carne de pescoço, do cardápio dos pobres, baseado em itens praticamente do lixo, também sobe quando o dólar sobe. O estômago do pobre fica mais vazio enquanto bolsos ficam mais cheios.
É estranhíssimo que pobres e ricos não enxerguem isso, não façam comparações, não as traduzam em consciência e ação políticas em favor do bem comum. Entre os pobres, a fome e o abandono matam o espírito ao privá-lo de seu alimento primordial que é a esperança.
A política não foi inventada para ser cúmplice da economia nem do economismo. A política foi inventada para trazer a economia e o poder ao redil da civilização, controlar e regular suas tendências economicamente irracionais e socialmente destrutivas.
É a ordem social e seus valores que devem regular a ordem econômica. Quando isso não acontece, e não está acontecendo, a nação inteira se converte num país de párias, de sem destino, de famintos, de desabrigados. A falta de coragem, de responsabilidade e de competência dos políticos que podem acionar os mecanismos de correção da economia é indicativa de que estamos abandonados e órfãos.
Todos se lembram, certamente, do espetáculo de menoridade política que foi a reunião do governo de 22 de abril de 2020. E nela da afirmação imponente do ministro da Economia contra suposta tendência keynesiana nas propostas e ações de um dos ministros. Se tivéssemos um Keynes no Brasil, e sua teoria de renda e do emprego, certamente o país estaria longe da barbárie da situação atual. Livre do peso morto de gente que manda como capataz dos tempos da escravidão.
Os jornais garimpam, todos os dias, nas ruínas do país as novidades medonhas da miséria. Na esperança de que se desenvolva entre nós a consciência crítica de nossos problemas, de nossa vulnerabilidade social, do abismo que nos espera.
O cardápio de carne de pescoço se desdobra na forma que vai adquirindo a situação habitacional. Análise de Fernando Canzian na “Folha de S. Paulo” mostra que, em uma década, o número de favelas saltou de 6.329 para 13.151.
Em 1960, Carolina Maria de Jesus, que vivia na Favela do Canindé, lançou seu primeiro livro, “Quarto de Despejo”, graças ao empenho do jornalista e escritor Audálio Dantas. Carolina era personagem de uma humanidade invisível. Seu livro gritou por ela. Nele, São Paulo e o Brasil ficaram nus.
Hoje 24,5 milhões de pessoas passam fome no país. Não é fome de comer pouco. É fome de comer o insuficiente ou de não comer nada. Outros 74 milhões estão chegando perto dessa situação. São cerca de 100 milhões de mãos e braços que, sem trabalho e na incerteza da marginalização social, estão à espera de um novo corpo político e social chamado multidão.
Creio que seria muito mais prudente mobilizar a população para fazer uma profunda e radical reforma econômica e social, com gente capaz de fazê-la, com base no primado dos direitos sociais e da dignidade da pessoa. O Brasil precisa revolucionar suas estruturas fundamentais. Essa seria uma boa oportunidade para Deus aderir e confirmar que é mesmo brasileiro.
Por que chora o Jair?
Jair sempre reclamou que dorme mal, muito mal. Acorda várias vezes. Tem um revólver na cabeceira ao alcance da mão, se levanta exausto. Agora confessa que chora no chuveiro, escondido da mulher. A água descendo sobre o corpo e se misturando às lágrimas e soluços de um machão que se acreditava inchorável. Que cena! Mas os mitos também choram, qual é o problema? Clint Eastwood já provou como pode ser nobre e bonito o choro de um machão. Jair ainda se envergonha e se esconde, mas ao menos confessa o que seria mais uma “fraquejada”, como ter gerado uma filha. Talvez imagine que sua mulher poderia achá-lo menos másculo se o visse chorando. E não que ela viesse apoiá-lo e consolá-lo como se espera de uma companheira cristã. Ele ainda vive no tempo em que segurar o choro era sinal de macheza e virilidade. Embora a ciência prove que, embora chore mais, a mulher é muito mais resistente à dor física. Que homem suportaria um parto?
Chorar faz bem, exterioriza e alivia a dor, é um aplicativo da natureza desenhado como uma válvula de escape para os humanos sofredores. Embora muitas vezes seja usado como demagogia ou arma de chantagem emocional, falso como lágrimas de crocodilo, o choro também pode ser nobre, ao contrário do chororô, que rebaixa o sofrimento a queixumes acovardados.
Chorar faz bem, exterioriza e alivia a dor, é um aplicativo da natureza desenhado como uma válvula de escape para os humanos sofredores. Embora muitas vezes seja usado como demagogia ou arma de chantagem emocional, falso como lágrimas de crocodilo, o choro também pode ser nobre, ao contrário do chororô, que rebaixa o sofrimento a queixumes acovardados.
O bem chorar exige um mínimo de humildade e reconhecimento de nossa fraqueza e impotência diante das dores da vida. Mas nem toda lágrima é de tristeza, é preciso celebrar o choro de prazer ou de intensa emoção que, às vezes, o amor proporciona somando os dois. Explode coração. Lágrimas de todos os sexos são bem-vindas.
O grande mistério é: por que chora o Jair?
Certamente não é pelas vítimas da Covid ou por ter sabotado as vacinas e nomeado Pazzuelo ministro da Saúde. Chora pela cloroquina derramada ? Ou chora por ele mesmo, ao constatar a impotência de sua autoridade para resolver problemas complexos com soluções toscas, que não pode fazer o que quiser e atropelar e ofender as instituições? Talvez chore de medo de ver seus filhos presos, qualquer pai choraria.
Talvez chore de arrependimento, por ter tentado nomear o filho Bananinha embaixador em Washington, por ter acreditado em suas próprias lorotas de combater a corrupção, de liberalizar a economia, de tentar instituir o voto em papel com contagem manual para poder denunciar fraudes caso perca as eleições. Por ter acreditado em Olavo de Carvalho.</p>
Talvez chore de solidão, já que não há nada mais solitário do que estar cercado de puxa-sacos o dia inteiro, de só contar mesmo com a família e o Queiroz para o que der e vier. E o que vier pode não ser bonito.
Talvez chore de solidão, já que não há nada mais solitário do que estar cercado de puxa-sacos o dia inteiro, de só contar mesmo com a família e o Queiroz para o que der e vier. E o que vier pode não ser bonito.
É possível até que chore pelo Brasil, por sua impotência para resolver todos os problemas com sua Bic e culpar as gestões petistas. Ou pelo medo de perder o apoio do Centrão. Pelo pavor de perder as eleições. E eventualmente ser julgado, condenado e preso.
Não faltam motivos, mas, afinal, por que chora o Jair ?
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