sábado, 31 de outubro de 2015
A hora e a vez dos primatas
Política é uma atividade que, mais que qualquer outra, se move em torno de símbolos. E nada simboliza mais a decadência de um partido que o perfil moral e intelectual de suas lideranças.
Nesses termos, nada traduz melhor a decadência moral e intelectual do PT – e de seu projeto revolucionário - do que a figura de seu líder na Câmara, deputado Sibá Machado.
Até quarta-feira passada, era visto apenas como uma figura folclórica, inofensiva em sua nulidade. Eis, porém, que de repente põe as unhas de fora e revela sem qualquer pudor a plenitude de sua índole primata e antidemocrática.
Vira-se para a galeria da Câmara, onde estavam integrantes de movimentos de rua, defensores do impeachment da presidente da República, e, após chamá-los repetidamente de “safados”, ameaça-os com pancadaria, que se consumaria momentos depois, por meio de milícias do MST e do MTST, nos gramados do Congresso.
Em circunstâncias normais – algo que há muito o país não conhece -, Sibá perderia a condição de líder e seria enquadrado penalmente por incitação à violência. Não foi, nem será. E seria injusto que o fosse, dado que não é o primeiro, nem o mais ilustre, a transgredir regras e padrões elementares de decência.
Bem ao contrário, ao transgredi-los, apenas seguiu o exemplo de seus superiores mais ilustres. Antes de seu gesto boçal, Lula, por exemplo, havia confessado nada menos que dois crimes, sem demonstrar qualquer consciência da gravidade do que admitia.
Admitiu, inicialmente, que de fato Dilma havia cometido as pedaladas fiscais, que embasam o pedido de impeachment. Mas argumentou que, embora tenha infringido a lei, o fez por uma boa causa, já que em defesa de programas sociais.
Ainda que o fosse – e isso foi desmentido no dia seguinte, quando se constatou que a infração beneficiara também grandes proprietários rurais -, não deixaria de ser crime de responsabilidade. Não há crime do bem. Crime é crime – e não é de direita ou de esquerda. Lula, pelo visto, não sabe disso.
Na sequência, admitiu com a maior naturalidade o estelionato eleitoral de Dilma. Disse que ela, de fato, prometeu coisas que não fez (e nem fará) e fez (e faz) coisas que jurou que não faria. O arrocho econômico que atribuiu às intenções do adversário foi posto em cena já no dia seguinte ao de sua reeleição.
Não por acaso, viu sua popularidade ruir já nos primeiros dias de seu novo mandato, fato inédito na história da república. Aliás, este novo mandato é uma coleção de ineditismos, a começar pela escala da roubalheira que a Lava Jato não se cansa de revelar.
E aí Lula volta a exibir sua índole transgressora. Reclama do ministro da Justiça, Eduardo Cardoso, por permitir que a Polícia Federal (imaginem!) cumpra sua missão investigativa.
Acha um absurdo que a presidente nada faça para enquadrá-lo – e pede sua demissão, que, aliás, seria bem-vinda, mas não pela negligência que Lula lhe atribui, mas por razão exatamente oposta.
É o mesmo Lula que, até há pouco, procurava justificar o festival de escândalos não como sinal de que os governos do PT fizeram da corrupção método administrativo, mas, ao contrário, por “permitirem” que os órgãos que a combatem – Polícia Federal, Ministério Público e Judiciário – atuassem com plena liberdade.
Bastou, porém que essa “plena liberdade”, garantida pela Constituição e não pelo PT, encontrasse as digitais do ex-presidente e de seus filhos em algumas falcatruas para que Lula cobrasse sua supressão. Se Dilma ou o ministro da Justiça pudessem conter a Lava Jato, já o teriam feito. Lula está sendo injusto com ambos.
A democracia está longe de ser um regime perfeito. É o pior deles, já dizia Churchill, excetuadas as demais alternativas. Permite, por exemplo, que projetos autoritários, como os do PT, dela se sirvam como rito de passagem, para destruí-la.
Socialismo, fascismo e nazismo – ideologias com genoma comum (convém não esquecer que nazismo é abreviatura de nacional-socialismo) - assim o fizeram. E está claro que o PT pretendia o mesmo, mas foi atropelado pela conjunção de fracasso na economia e roubalheira em escala inusitada.
Os benefícios sociais que supostamente trouxe ao país, a crise encarrega-se de desfazê-los, um a um. Pecaram contra a sustentabilidade, a lógica e a responsabilidade fiscal. Os que teriam ascendido à classe média – que o partido garante, sem nem remotamente o comprovar, que foram mais de 30 milhões – já fizeram o caminho de volta. O que a aceleração do desemprego põe em cena é o inverso: a proletarização da classe média.
O Bolsa-Família, que está sem reajuste há 17 meses, corre o risco de cortes substantivos. As pesquisas mostram o fim do mito Lula e a rejeição ao PT. A crise é grave e complexa – e exige cérebros sofisticados para equacioná-las. Mas o que há é Lula, Dilma e Sibá Machado; crise gigante, líderes anões. Na ausência de ideias, milícias, agressões e palavrões. Numa palavra, Sibá Machado.
Nesses termos, nada traduz melhor a decadência moral e intelectual do PT – e de seu projeto revolucionário - do que a figura de seu líder na Câmara, deputado Sibá Machado.
Até quarta-feira passada, era visto apenas como uma figura folclórica, inofensiva em sua nulidade. Eis, porém, que de repente põe as unhas de fora e revela sem qualquer pudor a plenitude de sua índole primata e antidemocrática.
Vira-se para a galeria da Câmara, onde estavam integrantes de movimentos de rua, defensores do impeachment da presidente da República, e, após chamá-los repetidamente de “safados”, ameaça-os com pancadaria, que se consumaria momentos depois, por meio de milícias do MST e do MTST, nos gramados do Congresso.
Em circunstâncias normais – algo que há muito o país não conhece -, Sibá perderia a condição de líder e seria enquadrado penalmente por incitação à violência. Não foi, nem será. E seria injusto que o fosse, dado que não é o primeiro, nem o mais ilustre, a transgredir regras e padrões elementares de decência.
Bem ao contrário, ao transgredi-los, apenas seguiu o exemplo de seus superiores mais ilustres. Antes de seu gesto boçal, Lula, por exemplo, havia confessado nada menos que dois crimes, sem demonstrar qualquer consciência da gravidade do que admitia.
Admitiu, inicialmente, que de fato Dilma havia cometido as pedaladas fiscais, que embasam o pedido de impeachment. Mas argumentou que, embora tenha infringido a lei, o fez por uma boa causa, já que em defesa de programas sociais.
Ainda que o fosse – e isso foi desmentido no dia seguinte, quando se constatou que a infração beneficiara também grandes proprietários rurais -, não deixaria de ser crime de responsabilidade. Não há crime do bem. Crime é crime – e não é de direita ou de esquerda. Lula, pelo visto, não sabe disso.
Na sequência, admitiu com a maior naturalidade o estelionato eleitoral de Dilma. Disse que ela, de fato, prometeu coisas que não fez (e nem fará) e fez (e faz) coisas que jurou que não faria. O arrocho econômico que atribuiu às intenções do adversário foi posto em cena já no dia seguinte ao de sua reeleição.
Não por acaso, viu sua popularidade ruir já nos primeiros dias de seu novo mandato, fato inédito na história da república. Aliás, este novo mandato é uma coleção de ineditismos, a começar pela escala da roubalheira que a Lava Jato não se cansa de revelar.
E aí Lula volta a exibir sua índole transgressora. Reclama do ministro da Justiça, Eduardo Cardoso, por permitir que a Polícia Federal (imaginem!) cumpra sua missão investigativa.
Acha um absurdo que a presidente nada faça para enquadrá-lo – e pede sua demissão, que, aliás, seria bem-vinda, mas não pela negligência que Lula lhe atribui, mas por razão exatamente oposta.
É o mesmo Lula que, até há pouco, procurava justificar o festival de escândalos não como sinal de que os governos do PT fizeram da corrupção método administrativo, mas, ao contrário, por “permitirem” que os órgãos que a combatem – Polícia Federal, Ministério Público e Judiciário – atuassem com plena liberdade.
Bastou, porém que essa “plena liberdade”, garantida pela Constituição e não pelo PT, encontrasse as digitais do ex-presidente e de seus filhos em algumas falcatruas para que Lula cobrasse sua supressão. Se Dilma ou o ministro da Justiça pudessem conter a Lava Jato, já o teriam feito. Lula está sendo injusto com ambos.
A democracia está longe de ser um regime perfeito. É o pior deles, já dizia Churchill, excetuadas as demais alternativas. Permite, por exemplo, que projetos autoritários, como os do PT, dela se sirvam como rito de passagem, para destruí-la.
Socialismo, fascismo e nazismo – ideologias com genoma comum (convém não esquecer que nazismo é abreviatura de nacional-socialismo) - assim o fizeram. E está claro que o PT pretendia o mesmo, mas foi atropelado pela conjunção de fracasso na economia e roubalheira em escala inusitada.
Os benefícios sociais que supostamente trouxe ao país, a crise encarrega-se de desfazê-los, um a um. Pecaram contra a sustentabilidade, a lógica e a responsabilidade fiscal. Os que teriam ascendido à classe média – que o partido garante, sem nem remotamente o comprovar, que foram mais de 30 milhões – já fizeram o caminho de volta. O que a aceleração do desemprego põe em cena é o inverso: a proletarização da classe média.
O Bolsa-Família, que está sem reajuste há 17 meses, corre o risco de cortes substantivos. As pesquisas mostram o fim do mito Lula e a rejeição ao PT. A crise é grave e complexa – e exige cérebros sofisticados para equacioná-las. Mas o que há é Lula, Dilma e Sibá Machado; crise gigante, líderes anões. Na ausência de ideias, milícias, agressões e palavrões. Numa palavra, Sibá Machado.
Lula, Dilma e o PT conseguiram desmoralizar as esquerdas T
Não é novidade a informação de que o metalúrgico Luiz Inácio da Silva foi trabalhado pelo criativo líder militar Golbery do Coutto e Silva para dividir as esquerdas e impedir que Leonel Brizola chegasse a Presidência da República. As informações a este respeito foram se somando nos últimos anos e se fortaleceram com o livro do delegado federal Romeu Tuma Jr., no qual relata que o líder sindical costumava dormir no sofá da sala da casa de seu pai. Na época, o velho Tuma era superintendente da Polícia Federal em São Paulo, Lula tinha o codinome “Barba” e era informante das autoridades da ditadura militar.
O serviço foi bem feito, Brizola jamais conseguiu chegar à Presidência, mas Lula e o PT foram se fortalecendo e enfim conseguiram chegar lá, em nome de uma falsa esquerda, que protege os interesses dos banqueiros e das multinacionais, enquanto tenta se justificar politicamente com o incremento do assistencialismo social, que funciona maravilhosamente em termos de imagem e ainda rende bons votos.
Mas a casa desabou, hoje já se sabe a verdade sobre o novo rico Lula e seus negócios milionários, fazendo lobbies nacionais e internacionais para empresários, com a família inteira prosperando a olhos vistos e aproveitando oportunidades de ouro, como a cobertura triplex à beira-mar comprada por d. Marisa Letícia por modestos R$ 47,5 mil e depois luxuosamente reformada pela empreiteira OAS, que até elevador privativo instalou, sem cobrar um centavo, vejam a que ponto chegam essas relações entre governantes espertos e empreendedores generosos.
Lula nunca foi de esquerda. Para ganhar força política e chegar ao poder, oportunisticamente ele se comportava como tal, criticava a todo momento os banqueiros e grandes empresários, vendia uma falsa imagem com objetivos político-eleitorais. Na verdade, sempre foi um líder sindical da inteira confiança das montadoras multinacionais, conforme o relato do empresário Mário Garnero, em seu livro autobiográfico “Jogo Duro”, que contém informações depreciativas que Lula jamais tentou desmentir.
O fato é que a incompetência e a corrupção que hoje caracterizam Lula, Dilma e o PT conseguiram desmoralizar as esquerdas no Brasil. Mas o que significa ser de esquerda, nos dias de hoje?
A meu ver, ser esquerdista é defender mudanças sociais, como a adoção de um regime educacional nos moldes de países desenvolvidos como a Finlândia, onde o filho do lixeiro estuda na mesma escola do filho do grande empresário, para terem oportunidades iguais.
Ser esquerdista é também lutar pela reforma do sistema financeiro, de modo a evitar a situação do Brasil, onde são praticados os mais escorchantes juros mundiais; é defender que o sistema de saúde seja igual para todos, como ocorre na Grã-Bretanha e no Uruguai, por exemplo; é pugnar pela moralização do serviço público, exigindo que sejam extintos os penduricalhos que elevam às alturas as remunerações das elites do funcionalismo; é sonhar que as autoridades sejam pessoas simples, sem mordomias nem privilégios, como já ocorre na Suécia e em outros países em estágio mais avançado de civilização.
Da mesma forma, ser esquerdista é lutar pela redução da abusiva disparidade entre os maiores salários e os menores, é defender a diminuição do número de cargos comissionados, é exigir a extinção do cartão corporativo e dos carros chapa-branca a serviço das autoridades, e por aí em diante.
Por fim, ser esquerdista é agir democraticamente, respeitar os direitos, os interesses e as opiniões de quem lhe seja adverso; é ser caridoso, compreensivo e humano.
Se você também pensa assim, mas não se julga esquerdista, não fique preocupado, porque as paralelas sempre hão de se encontrar, nem que seja no infinito da miséria humana, porque os rótulos políticos-ideológicos já de nada servem. Atualmente, a única função deles é separar pessoas que na verdade são iguais e têm os mesmos objetivos.
O serviço foi bem feito, Brizola jamais conseguiu chegar à Presidência, mas Lula e o PT foram se fortalecendo e enfim conseguiram chegar lá, em nome de uma falsa esquerda, que protege os interesses dos banqueiros e das multinacionais, enquanto tenta se justificar politicamente com o incremento do assistencialismo social, que funciona maravilhosamente em termos de imagem e ainda rende bons votos.
Lula nunca foi de esquerda. Para ganhar força política e chegar ao poder, oportunisticamente ele se comportava como tal, criticava a todo momento os banqueiros e grandes empresários, vendia uma falsa imagem com objetivos político-eleitorais. Na verdade, sempre foi um líder sindical da inteira confiança das montadoras multinacionais, conforme o relato do empresário Mário Garnero, em seu livro autobiográfico “Jogo Duro”, que contém informações depreciativas que Lula jamais tentou desmentir.
O fato é que a incompetência e a corrupção que hoje caracterizam Lula, Dilma e o PT conseguiram desmoralizar as esquerdas no Brasil. Mas o que significa ser de esquerda, nos dias de hoje?
A meu ver, ser esquerdista é defender mudanças sociais, como a adoção de um regime educacional nos moldes de países desenvolvidos como a Finlândia, onde o filho do lixeiro estuda na mesma escola do filho do grande empresário, para terem oportunidades iguais.
Ser esquerdista é também lutar pela reforma do sistema financeiro, de modo a evitar a situação do Brasil, onde são praticados os mais escorchantes juros mundiais; é defender que o sistema de saúde seja igual para todos, como ocorre na Grã-Bretanha e no Uruguai, por exemplo; é pugnar pela moralização do serviço público, exigindo que sejam extintos os penduricalhos que elevam às alturas as remunerações das elites do funcionalismo; é sonhar que as autoridades sejam pessoas simples, sem mordomias nem privilégios, como já ocorre na Suécia e em outros países em estágio mais avançado de civilização.
Da mesma forma, ser esquerdista é lutar pela redução da abusiva disparidade entre os maiores salários e os menores, é defender a diminuição do número de cargos comissionados, é exigir a extinção do cartão corporativo e dos carros chapa-branca a serviço das autoridades, e por aí em diante.
Por fim, ser esquerdista é agir democraticamente, respeitar os direitos, os interesses e as opiniões de quem lhe seja adverso; é ser caridoso, compreensivo e humano.
Se você também pensa assim, mas não se julga esquerdista, não fique preocupado, porque as paralelas sempre hão de se encontrar, nem que seja no infinito da miséria humana, porque os rótulos políticos-ideológicos já de nada servem. Atualmente, a única função deles é separar pessoas que na verdade são iguais e têm os mesmos objetivos.
Aposta na confusão moral
Quando era o partido que se dizia campeão da ética, o PT especializou-se em moer reputações alheias, para surgir como alternativa a “tudo o que está aí”. Agora, usa sua expertise para nivelar a tudo e a todos ao rés do chão, para que no final ninguém consiga diferenciar criminosos de inocentes. Felizmente, como têm demonstrado a Justiça e a polícia desde o escândalo do mensalão, as instituições do País são plenamente capazes de colocar as coisas em seu devido lugarEstadão, "PT aposta na confusão moral"
Lula aos 70: labirinto, sobrevivência e temor
“Porque el tiempo passa/ Nos vamos poniendo viejos/ Y el amorFotografia produzida e distribuída, pelo Instituto Lula, depois da festinha comemorativa dos 70 anos do ex-presidente Lula, em São Paulo, terça-feira (27) à noite - com a presença da atual ocupante do Palácio do Planalto, Dilma Rousseff -, é emblemática do vendaval que sopra na vida do fundador e maior líder do PT, nestes dias tormentosos de fim de outubro .
(Porque o tempo passa/ nós vamos ficando velhos/ E o amor)
No lo reflejo como ayer/ En cada conversación/ Cada beso cada abrazo
(não o reflete como ontem/ Em cada conversação/ Cada beijo, cada abraço)
Se impone siempre un pedazo/ De temor”
(se impõe sempre um pedaço/ De temor)Versos da letra de Años, música composta pelo artista cubano Pablo Milanês, sucesso no Brasil e na América Latina nos anos 70/80
Imagem significativa pelo que expõe, mas, principalmente, pelo que fica oculto ou mal disfarçado. Retrato irretocável de melancolia do poder em desalinho. Reflexo evidente do inferno astral e do labirinto pessoal e político enfrentado na semana do seu aniversário, por Luís Inácio Lula da Silva. Até bem pouco tempo um dos líderes mais aclamados e acatados (temido também por muitos adversários) de seu País e da América Latina).
Habitualmente tido e visto na condição de um quase intocável, Lula agora tropeça, bambeia e acusa os golpes. Isso ficou claro na quinta-feira (29), nas palavras e gestos do seu discurso na abertura da reunião do diretório nacional do PT, em Brasília. Três dias depois de ter ingressado no clube "dos setentinhas", para usar a expressão de Chico Buarque de Holanda no vídeo de parabéns, gravado com açúcar e com afeto, que ofertou ao líder e amigo em tempo de dissabor.
A imagem produzida na casa de festejos nas vizinhanças do Instituto que leva o nome do homenageado, seu entorno e circunstâncias, mal conseguem disfarçar a realidade inexorável de "Sua Excelência o Fato", no dizer de Charles de Gaulle. São simbolicamente expressivas as palmas contidas de Dilma (posta à distância do homenageado, na composição do registro fotográfico); o sorriso enigmático da ex-primeira-dama, Marisa Letícia; e o abatimento do próprio Lula, segurando o netinho de braços abertos em frente do bolo com a vela alusiva aos 70 anos.
A foto deixa a estranha impressão de que, na festa, pairava no ar a sombra "do pedaço de temor”, de que fala a famosa canção de Pablo Milanês. Soube-se mais tarde que, depois da comemoração, na saída da casa de festejos paulistana, às 23h, Luís Claudio Lula da Silva, um dos filhos do ex-presidente, foi abordado por agentes da Polícia Federal.
De um deles, Luís Cláudio recebeu a intimação para prestar depoimento na PF, semana que vem. O filho de Lula é investigado pela Operação Zelotes e sua empresa de materiais esportivos foi um dos alvos, entre os vários mandados de busca e apreensão cumpridos pela PF, por suspeitas de atividades ilegais. Uma nora do aniversariante foi acusada, também, por um delator da Lava Jato, de receber propina.
Neste ponto, provavelmente, a razão principal da faca nos dentes de Lula, durante o seu discurso de anteontem, em Brasília: "É tudo muito incerto no país. Tem 19 pedidos de impeachment, denúncia contra o presidente da Câmara, denúncia contra o presidente do Senado, contra o filho de Lula . Eu tenho ainda mais três filhos que não foram denunciados e sete netos. Porra, não vai parar nunca isso. E ainda tenho uma nora que está grávida”, disse o ex-presidente em trecho do discurso reproduzido no El País.
No fim, por coragem ou por bravata, disse estar preparado para apanhar mais, nos próximos três anos. "Vou sobreviver”, avisou em recado a quem interessar possa. A conferir. Ainda assim, quanta diferença de outros aniversários de Lula, quando ele festejava comendo bolo com os vizinhos e amigos no ABC e agendas superlotadas.
Ou daquele 27 de outubro de 2002, quando disse, logo após votar no segundo turno da eleição que o tornaria presidente do Brasil: "Este é o momento mais feliz da minha vida". Lula fazia então 57 anos. Chefes de estados e grandes empresários ligando sem parar. O cantor, compositor e então futuro ministro de seu governo, Gilberto Gil, telefonava, direto de Paris, dando parabéns e votos de sucesso e longa vida. Esta semana, aos setentinha, os vídeos de Dilma Rousseff e de Chico Buarque e as velas sopradas na tensa festinha foram os destaques. E, pela imagem divulgada, os "pedaços de temor", da canção cubana, em volta da mesa.
Ministro prevaricou ao defender sala vip para filho de Lula
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo solicitou “esclarecimentos imediato
s” ao diretor-geral da Polícia Federal (PF), Leandro Daiello, sobre a intimação para o filho mais novo do ex-presidente Lula, Luís Cláudio Lula da Silva, prestar depoimento à corporação.
O comunicado divulgado pela assessoria do Ministério da Justiça afirma que o Cardozo quer apurar se Luís Cláudio foi intimado “fora do procedimento usual”.
Lembrando: na segunda-feira, a PF cumpriu mandado de busca e apreensão nas empresas de Luís Cláudio, em São Paulo, por ordem da juíza Celia Regina Bernardes. No despacho que ordenou as buscas, a magistrada ressaltou que a LFT – uma das empresas do filho de Lula – recebeu, em 2014, R$ 1,5 milhão do escritório do vice-presidente da Anfavea, Mauro Marcondes.
O Ministério Público avalia como suspeito o fato de a LFT – uma empresa de marketing esportivo – estar recebendo um valor expressivo de uma empresa especializada em atuar com a administração pública.
Em agosto de 2014, O ex-secretário nacional de Justiça Romeu Tuma Júnior acusou a Polícia Federal de tentar detê-lo para prestar depoimento em São Paulo.
Ele é autor do livro "Assassinato de Reputações — Um Crime de Estado", em que narra bastidores do período em que ocupou o cargo durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
De acordo com Tuma Junior, quatro agentes chegaram ao seu escritório de advocacia por volta das 10h30m e disseram que tinham uma ordem para conduzi-lo coercitivamente para prestar depoimento na sede da PF. O ex-secretário teria se recusado, e teria ocorrido bate-boca.
– Não aceitei e fui por minha conta. É uma abuso. Para ser conduzido coercitivamente, é necessário ter sido intimado várias vezes, o que não aconteceu – disse Tuma Júnior.
José Eduardo Martins Cardozo, ministro da Justiça, só se tornou o vereador mais votado da história de São Paulo por uma questão: sob a prefeitura de Celso Pitta , Tuma Junior lhe passava todas as suas investigações sobre a chamada máfia dos fiscais.
Lembrando: o governo de Celso Pitta na prefeitura de São Paulo (1997-2001) esteve envolvido em um dos maiores esquemas de corrupção na administração pública brasileira. Funcionários da prefeitura cobravam propinas para não denunciar irregularidades no comércio, nas construções e em outras áreas que desobedeciam as normas municipais.
O ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, é (era) amigo pessoal de Tuma Jr. Quando a PF lhe fez uma intimação nos moldes da do filho de Lula, Cardozo, já ministro da Justiça, se calou.
Por quê?
Porque o PT inovou: além de ter transferido a capital do Brasil para Curitiba, o partido inventou um novo item para os operadores do direito: a Intimação Sala Vip.
Resta saber se todos os brasileiros vão ter esse mesmo direito: o de terem um ministro da Justiça para defendê-los da PF.
Salas VIP assim só ocorrem em países ditatoriais africanos.
O sul africano presidente Jacob Zuma, por exemplo, meteu US$ 27 milhões de dinheiro público em reformas de sua casa privada. Quem fazia a segurança das reformas? Policiais federais, a mando do ministério da Justiça.
Será que Dilma vai criar um programa de horário comercial para agenda intimações??
Dilma vai criar um Programa de Proteção a Prejudicados pela PF?
O termo desvio de função normalmente está associado ao servidor ou empregado concursado ou contratado para uma função que exerce outra. Cardozo se desvio da função.
Cardozo cometeu improbidade administrativa: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8429.htm
Todo o brasileiro que se sente prejudicado pela PF, a partir de agora, tem de ser defendido pelo Cardozo, não?
Deus da lama
O ex-presidente Lula é um ex-presidente. Ele precisa dar o exemplo. Um ex-presidente da República deve ser um farol para os brasileiros. Será que podemos tomar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como um norte para os cidadãos? Tenho minhas dúvidas. Ele não é um semideus. A não ser os programas sociais, que aumentaram para se corrigir as desigualdades, eu não vejo outros atos do ex-presidente Lula que mereçam elogios.Marco Aurélio Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal
A fortuna suspeita das estrelas do PT
Há duas semanas, analistas do Conselho de Controle de Atividades Financeiras, mais conhecido pela sigla Coaf, terminaram o trabalho mais difícil que já fizeram. O Coaf, subordinado oficialmente ao Ministério da Fazenda, é a agência do governo responsável por combater a lavagem de dinheiro no Brasil. Reúne, analisa e compartilha com o Ministério Público e a Polícia Federal informações sobre operações financeiras com suspeita de irregularidades. Naquela sexta-feira, dia 23 de outubro, os analistas do Coaf entregavam à chefia o Relatório de Inteligência Financeira 18.340. Em 32 páginas, eles apresentaram o que lhes foi pedido: todas as transações bancárias, com indícios de irregularidades, envolvendo, entre outros, os quatro principais chefes petistas sob investigação da PF, do Ministério Público e do Congresso.
Eis o quarteto que estrela o relatório: Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente da República, líder máximo do PT e hoje lobista; Antonio Palocci, ministro da Casa Civil no primeiro mandato de Dilma Rousseff, operador da campanha presidencial de 2010 e hoje lobista; Erenice Guerra, ministra da Casa Civil no segundo mandato de Lula, amiga de Dilma e hoje lobista; e, por fim, Fernando Pimentel, ministro na primeira gestão Dilma, também operador da campanha presidencial de 2010, hoje governador de Minas Gerais. O Relatório 18.340, ao qual ÉPOCA teve acesso, foi enviado à CPI do BNDES. As informações contidas nele ajudarão, também, investigadores da Receita, da PF e do MP a avançar nas apurações dos esquemas multimilionários descobertos nas três operações que sacodem o Brasil: Lava Jato, Acrônimo e Zelotes. Essas investigações, aparentemente díspares entre si, têm muito em comum. Envolvem políticos da aliança que governa o país e grandes empresários. No caso da CPI do BNDES, os parlamentares investigam as suspeitas de que os líderes petistas tenham se locupletado com as operações de financiamento do banco, sobretudo as que beneficiaram o cartel de empreiteiras do petrolão.
Bandidos
Qual a diferença entre o coletor de impostos e o mafioso, já que ambos forçam o pobre do cidadão a pagar por "serviços" que ele não necessariamente deseja contratar? É claro, que, para os libertários radicais, a resposta é "nenhuma", mas, se formos um pouco menos intransigentes, vamos encontrar algumas ideias interessantes.
Destaco aqui a teoria do economista Mancur Olson, que traça uma distinção bacana entre bandidos itinerantes e estacionários. Ambos querem tirar o nosso dinheiro, mas são animais distintos tanto pelos incentivos que os movem como pelos métodos de que se valem. O ladrão itinerante, típico de situações de anarquia, se limita a tomar aquilo que deseja e saltar para o próximo povoado. Para tornar suas ameaças mais críveis e seu nome mais temido, não hesita em matar e destruir.
Já o bandido estacionário é, como o nome diz, um ladrão que não circula muito. Está sempre roubando as mesmas pessoas repetidas vezes. Se for apenas medianamente inteligente, ele vai concluir que ficará mais rico se permitir que suas vítimas habituais sobrevivam e experimentem algum sucesso econômico. O bandido estacionário, que é um outro nome para tirano, acabará aos poucos promovendo atividades típicas de governo, como oferecer proteção contra os bandidos itinerantes e favorecer a produção, o comércio etc. Segundo Olson, é na transição dos bandidos itinerantes para os estacionários que encontramos as sementes da civilização que, em etapas posteriores, desembocarão na democracia institucional.
Algo deu muito errado com o Brasil nos últimos meses, já que, em vez de assistir à germinação das sementes civilizacionais de Olson, como seria de esperar, estamos às voltas com a degeneração de nossos políticos, que parecem estar regredindo de bandidos estacionários para bandidos itinerantes. Assim, acabarão matando a galinha dos ovos de ouro.
Algo deu muito errado com o Brasil nos últimos meses, já que, em vez de assistir à germinação das sementes civilizacionais de Olson, como seria de esperar, estamos às voltas com a degeneração de nossos políticos, que parecem estar regredindo de bandidos estacionários para bandidos itinerantes. Assim, acabarão matando a galinha dos ovos de ouro.
Brasil: A difícil construção do futuro
No penoso e desajeitado esforço para superar o seu atraso secular de país colonial, escravocrata e patrimonialista, o Brasil moveu-se à frente sempre que animado por um ou mais “projetos” de modernização. Estes só se tornaram de fato democráticos a partir do fim do regime militar. Na Constituição de 1988 o País projetou a aspiração de construir um moderno Estado democrático, assegurador dos direitos civis e políticos e comprometido com a universalização dos direitos sociais. De olho no futuro, elevou o meio ambiente à condição de bem público a ser protegido. Com um pé no passado, consagrou monopólios estatais anacrônicos. Por isso, antes mesmo de completar dez anos, a nova Carta teve de ser reformada, não para desfigurá-la, mas para permitir ao Brasil navegar nos mares da globalização.
No primeiro mandato de FHC se criaram agências reguladoras com independência técnica e financeira para impedir a sua captura por interesses políticos clientelistas e para evitar que monopólios privados viessem a substituir os monopólios estatais. No segundo mandato, a Constituição foi complementada pela Lei de Responsabilidade Fiscal, com o objetivo de assegurar que os governos respondessem às demandas da sociedade sem sacrificar o equilíbrio estrutural das contas públicas, pedra angular da estabilidade econômica propiciada pelo Plano Real. Essa construção institucional se fez juntamente com a implantação de um amplo leque de programas de Estado e do aumento dos gastos na área social. Como não há almoço grátis, a carga tributária passou de 26% a 34% do PIB em oito anos. O segundo mandato terminou com uma alternância real de poder, feita em moldes civilizados, marca de uma democracia madura.
Tais avanços se deram concomitantemente à permanência de elementos do atraso: o clientelismo, fenômeno com origens na Velha República, presente nas relações entre o Executivo e o Congresso; e o corporativismo, herança do Estado Novo, que inscreveu seus privilégios na Constituição “cidadã” em favor de determinadas categorias das burocracias estatal e sindical, de patrões e empregados. Esses elementos seguiram vigentes, mas enfraquecidos, pela modernização do Estado e da economia. Pelas mesmas razões se tornou menor a influência desproporcional de um punhado de empresas sobre o processo decisório.
Na transição para o governo Lula e no curso dos anos iniciais do seu primeiro mandato, pareceu que o “projeto de modernização” impulsionado no período FHC teria continuidade pelas mãos de um partido de esquerda convertido à social-democracia e de um líder com uma trajetória individual e política que simbolizava as maiores aspirações da Constituição de 1988. Prefigurava-se a consolidação de um sistema político estruturado em torno de duas forças social-democratas, uma mais à esquerda e outra mais liberal, representativas dos setores mais modernos da sociedade brasileira. Ledo engano.
Como ficou claro a partir do escândalo do mensalão, sob o verniz de um partido de esquerda aggiornato se encontrava o PT velho de guerra. É verdade que não mais aquele condomínio confuso de tendências, em grande parte sectárias, mas uma organização burocrática comandada operacionalmente por José Dirceu e liderada pelo carisma de Lula. O partido havia se tornado pragmático, disposto a fazer alianças à sua direita, mas suas práticas e mentalidades seguiam presas à matriz sindical e às tradições da esquerda latino-americana, nostálgica do castrismo e seduzida pelo “socialismo do século 21”. Para não falar de apetites mais mundanos.
Hoje só mesmo a cegueira ideológica impede enxergar que o PT perdeu a capacidade de liderar qualquer projeto de modernização e Lula já não simboliza as aspirações de um Brasil desenvolvido, democrático e justo. O partido monetizou o clientelismo e soldou o corporativismo estatal, empresarial e sindical à base de recursos públicos e da corrupção sistêmica. E tem se revelado inteiramente incapaz de autocrítica diante dos malfeitos praticados.
O drama é que tampouco o principal partido da oposição, o PSDB, se mostra à altura do desafio de retomar o bastão da liderança e reencaminhar o projeto de modernização do Brasil.
Ao contrário do senso comum corrente, as agendas do ajuste fiscal estrutural, da eficiência e da produtividade, de um lado, e a da distribuição de renda, do combate à pobreza e do desenvolvimento social, de outro, podem e devem se reforçar mutuamente. Na teoria não é difícil desenhar uma agenda que compatibilize esses objetivos no médio e no longo prazos. Implementá-la está longe de ser impossível, em que pesem as tensões que inevitavelmente surgirão na execução de seus objetivos durante o percurso, sobretudo ao início, dada a gravidade da crise.
Falta, porém, uma aliança de atores políticos e sociais que recrie uma nova perspectiva de futuro. Esta deverá ter a Constituição como guia, pois suas aspirações continuam válidas, embora os meios para concretizá-las devam ser ajustados, o que implica reformas constitucionais.
A safra de líderes não é brilhante, o sistema de partido está desorganizado, os velhos movimentos sociais estão cooptados, os novos correm à margem das instituições, a sociedade está perplexa e polarizada. De positivo, apenas o Judiciário e as instituições de controle, frutos maduros da Constituição de 1988. Mas a Justiça não pode nem deve substituir a política.
Nessa esfera, falta liderança em toda parte. Na Presidência ela é dramática. Dilma até pode se segurar na cadeira presidencial, amparada em argumentos jurídicos contra o impeachment e comerciando apoios com a “base aliada”. A questão que interessa, porém, é outra: pode e merece o Brasil esperar mais três anos para começar a construir uma nova perspectiva de futuro?
Lição de anatomia
Você pode interpretá-las como um material indiciário: nexos e chaves para investigações policiais. Mas, nas declarações recentes de quatro personagens, descortina-se um rico material sociológico: os contornos da estrutura e organização de um sistema de poder.
Dilma Rousseff justificou as "pedaladas fiscais" pelo imperativo de preservar os programas sociais. A Folha evidenciou a inverdade: as "pedaladas" financiaram, principalmente, grandes grupos econômicos. A mentira oficial, um método de governo, não passa de notícia velha. O fato relevante encontra-se na segunda justificativa, oferecida por Jaques Wagner, ministro da Casa Civil: "Cada empresa dessa para a qual foi oferecida uma taxa de juros compatível gerou riqueza e emprego".
Lição de anatomia, parte 1: no capitalismo de Estado, o Orçamento nacional é uma peça de ficção, o nome de um tesouro distribuído seletivamente pelo governo à alta burguesia. A santa aliança entre os donos do poder e os donos do capital legitima-se por gerar "riqueza e emprego". Odebrecht, JBS e Eike Batista, filhos diletos do BNDES, são os instrumentos do desenvolvimento do país.
Do poderoso ministro a um especial ex-ministro, Gilberto Carvalho, o mais íntimo assessor de Lula. Depondo à Polícia Federal no âmbito da Operação Zelotes, que apura o "comércio" de medidas provisórias em benefício do setor automotivo, Carvalho reconheceu a proximidade entre Lula e Mauro Marcondes, preso sob acusação de "negociar" a MP 471, editada pelo ex-presidente. Depois, produziu uma tese singular sobre as relações entre governantes e lobistas: "A malandragem é deles [lobistas] que, na hora de vender para as empresas podem falar que precisaram pagar propinas. Quando você recebe as pessoas, não sabe o que elas vão fazer com aquilo".
Lição de anatomia, parte 2: o capitalismo de Estado é um capitalismo de máfias. A porta do palácio está sempre aberta aos lobistas, que são antigos conhecidos dos governantes e, em certos casos, como o de Marcondes, parceiros de negócios de um filho do ex-presidente. Mas, nessa interação, oculta-se uma desigualdade de natureza moral: as autoridades políticas miram o bem da nação, enquanto seus interlocutores, os lobistas, concentram-se no vil metal. Lula, o bom selvagem, é puro, casto e tolo. Marcondes, lobo em pele de cordeiro, é infame, astuto e safo.
Amigo é coisa pra se guardar debaixo de sete chaves. O Instituto Lula negou que o ex-presidente tenha atuado como intermediário de empresas, "antes, durante ou depois de seu governo". O delator Fernando Baiano afirmou que pagou propina a José Carlos Bumlai pela intermediação de uma visita do presidente da Sete Brasil a Lula consagrada à inclusão da OSX num negócio com a Petrobras. Bumlai, "amigo de festa, de almoço, de aniversários" do ex-presidente, confirmou o encontro e, claro, desmentiu a propina. Calúnia: Baiano, que ele conhecia apenas superficialmente, "fiquei até surpreso", transferiu-lhe R$ 1,5 milhão, mas como empréstimo, contabilizado na pessoa física, usado para despesas da pessoa jurídica e jamais quitado.
Lição de anatomia, parte 3: o capitalismo de Estado é um capitalismo de favores e privilégios. No seu universo de amigos, acasos e almoços, os comensais são empresários ou lobistas, ou empresários-lobistas, inclusive os filhos do operário-presidente, que aprenderam as artes burguesas do empreendedorismo.
Rui Falcão, presidente do PT, qualificou a operação policial no escritório de Luis Cláudio, filho de Lula, como "perseguição" contra Lula conduzida em caviloso conluio do Ministério Público, do Judiciário, da Polícia Federal e de "setores da mídia". Lição de anatomia, conclusão: o capitalismo de Estado não convive bem com as instituições da democracia. Na hora da crise, precisa da couraça protetora de um regime autoritário.
Dilma Rousseff justificou as "pedaladas fiscais" pelo imperativo de preservar os programas sociais. A Folha evidenciou a inverdade: as "pedaladas" financiaram, principalmente, grandes grupos econômicos. A mentira oficial, um método de governo, não passa de notícia velha. O fato relevante encontra-se na segunda justificativa, oferecida por Jaques Wagner, ministro da Casa Civil: "Cada empresa dessa para a qual foi oferecida uma taxa de juros compatível gerou riqueza e emprego".
Lição de anatomia, parte 1: no capitalismo de Estado, o Orçamento nacional é uma peça de ficção, o nome de um tesouro distribuído seletivamente pelo governo à alta burguesia. A santa aliança entre os donos do poder e os donos do capital legitima-se por gerar "riqueza e emprego". Odebrecht, JBS e Eike Batista, filhos diletos do BNDES, são os instrumentos do desenvolvimento do país.
Do poderoso ministro a um especial ex-ministro, Gilberto Carvalho, o mais íntimo assessor de Lula. Depondo à Polícia Federal no âmbito da Operação Zelotes, que apura o "comércio" de medidas provisórias em benefício do setor automotivo, Carvalho reconheceu a proximidade entre Lula e Mauro Marcondes, preso sob acusação de "negociar" a MP 471, editada pelo ex-presidente. Depois, produziu uma tese singular sobre as relações entre governantes e lobistas: "A malandragem é deles [lobistas] que, na hora de vender para as empresas podem falar que precisaram pagar propinas. Quando você recebe as pessoas, não sabe o que elas vão fazer com aquilo".
Lição de anatomia, parte 2: o capitalismo de Estado é um capitalismo de máfias. A porta do palácio está sempre aberta aos lobistas, que são antigos conhecidos dos governantes e, em certos casos, como o de Marcondes, parceiros de negócios de um filho do ex-presidente. Mas, nessa interação, oculta-se uma desigualdade de natureza moral: as autoridades políticas miram o bem da nação, enquanto seus interlocutores, os lobistas, concentram-se no vil metal. Lula, o bom selvagem, é puro, casto e tolo. Marcondes, lobo em pele de cordeiro, é infame, astuto e safo.
Amigo é coisa pra se guardar debaixo de sete chaves. O Instituto Lula negou que o ex-presidente tenha atuado como intermediário de empresas, "antes, durante ou depois de seu governo". O delator Fernando Baiano afirmou que pagou propina a José Carlos Bumlai pela intermediação de uma visita do presidente da Sete Brasil a Lula consagrada à inclusão da OSX num negócio com a Petrobras. Bumlai, "amigo de festa, de almoço, de aniversários" do ex-presidente, confirmou o encontro e, claro, desmentiu a propina. Calúnia: Baiano, que ele conhecia apenas superficialmente, "fiquei até surpreso", transferiu-lhe R$ 1,5 milhão, mas como empréstimo, contabilizado na pessoa física, usado para despesas da pessoa jurídica e jamais quitado.
Lição de anatomia, parte 3: o capitalismo de Estado é um capitalismo de favores e privilégios. No seu universo de amigos, acasos e almoços, os comensais são empresários ou lobistas, ou empresários-lobistas, inclusive os filhos do operário-presidente, que aprenderam as artes burguesas do empreendedorismo.
Rui Falcão, presidente do PT, qualificou a operação policial no escritório de Luis Cláudio, filho de Lula, como "perseguição" contra Lula conduzida em caviloso conluio do Ministério Público, do Judiciário, da Polícia Federal e de "setores da mídia". Lição de anatomia, conclusão: o capitalismo de Estado não convive bem com as instituições da democracia. Na hora da crise, precisa da couraça protetora de um regime autoritário.
Dez meses de estagnação
Amanhã se completam dez meses do segundo governo de Dilma Rousseff. São mais de 300 dias de pura letargia, em um ambiente nacional assombrosamente infrutífero. Parece que a criatividade e até a “ginga” dos brasileiros na hora de resolver problemas se foram. Não há quem consiga passar um dia sem falar de uma crise que devasta empregos, reduz produção e recria a instabilidade que, desde o Plano Real, não se via por aqui.
O governo não reage, e, talvez por isso, o setor produtivo se afunda. A desesperança cresce. As substituições de ministros não estão servindo para nada. Tecnicamente, elas foram trágicas; politicamente, amorfas. Dilma fica entre a cruz e a espada, entre Cunha e seu criador, Lula; entre exercer a Presidência e a sobrever na política, entre assumir riscos e se render a chantagens.
Lula, acuado pelas denúncias que batem a sua porta e envolvem, com mais exatidão, os seus filhos, faz discursos para petistas desolados. Fala de perseguição das elites, mas se esquece, ou faz questão de se esquecer, de que são ex-aliados que o colocam contra a parede. Seu discurso não tem chegado às massas, pois a defesa que faz está comprometida por evidências.
Poderá falar que nada tem a ver com a vida pessoal e financeira de parentes. Dirá novamente que nada sabia? Sim, é provável. Mas, desta vez, não se descolará de um amigo, como fez com José Dirceu, mas de seus filhos. Também se mostra confuso: ora parte para o ataque, ora recua em relação ao governo. A impressão é que a história não se repetirá.
O encanto acabou? Ainda não se sabe, mas o poderoso criador do PT está se reduzindo a um político isolado e até malquisto. A comemoração de seu aniversário mostrou um pouco dessa insolvência, sustentando-se em invenções abestalhadas, como #Lula70. Antigos e importantes “companheiros” não estavam lá. Pior: estão agora nas fileiras daqueles que querem ver o seu fim.
Assim como Dilma, Lula está entre a cruz e a espada, entre Cunha e seu criatura; entre ser um ex-presidente e se manter na batalha, correndo o risco de ver seu legado ser arrasado, não por Dilma, como deu a entender, mas por sua própria postura de deixar um rastro que levará a polícia e a Justiça ao seu calcanhar.
A 60 dias do fim deste ano, presidente e ex-presidente estão no mesmo barco, mas não sabem que direção eles darão a ele. É difícil imaginar um impeachment ainda em 2015, mas ele se torna mais realizável para os meados do ano que vem. O PMDB está com a bocarra escancarada.
Porém, ainda há saída mais honrosa: Dilma faz pacto direto com a nação, negocia a sua saída diretamente com os brasileiros e condiciona sua retirada à aprovação, no Congresso, de ampla e profunda reforma pela qual o país tanto clama.
O governo não reage, e, talvez por isso, o setor produtivo se afunda. A desesperança cresce. As substituições de ministros não estão servindo para nada. Tecnicamente, elas foram trágicas; politicamente, amorfas. Dilma fica entre a cruz e a espada, entre Cunha e seu criador, Lula; entre exercer a Presidência e a sobrever na política, entre assumir riscos e se render a chantagens.
Lula, acuado pelas denúncias que batem a sua porta e envolvem, com mais exatidão, os seus filhos, faz discursos para petistas desolados. Fala de perseguição das elites, mas se esquece, ou faz questão de se esquecer, de que são ex-aliados que o colocam contra a parede. Seu discurso não tem chegado às massas, pois a defesa que faz está comprometida por evidências.
Poderá falar que nada tem a ver com a vida pessoal e financeira de parentes. Dirá novamente que nada sabia? Sim, é provável. Mas, desta vez, não se descolará de um amigo, como fez com José Dirceu, mas de seus filhos. Também se mostra confuso: ora parte para o ataque, ora recua em relação ao governo. A impressão é que a história não se repetirá.
O encanto acabou? Ainda não se sabe, mas o poderoso criador do PT está se reduzindo a um político isolado e até malquisto. A comemoração de seu aniversário mostrou um pouco dessa insolvência, sustentando-se em invenções abestalhadas, como #Lula70. Antigos e importantes “companheiros” não estavam lá. Pior: estão agora nas fileiras daqueles que querem ver o seu fim.
Assim como Dilma, Lula está entre a cruz e a espada, entre Cunha e seu criatura; entre ser um ex-presidente e se manter na batalha, correndo o risco de ver seu legado ser arrasado, não por Dilma, como deu a entender, mas por sua própria postura de deixar um rastro que levará a polícia e a Justiça ao seu calcanhar.
A 60 dias do fim deste ano, presidente e ex-presidente estão no mesmo barco, mas não sabem que direção eles darão a ele. É difícil imaginar um impeachment ainda em 2015, mas ele se torna mais realizável para os meados do ano que vem. O PMDB está com a bocarra escancarada.
Porém, ainda há saída mais honrosa: Dilma faz pacto direto com a nação, negocia a sua saída diretamente com os brasileiros e condiciona sua retirada à aprovação, no Congresso, de ampla e profunda reforma pela qual o país tanto clama.
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