segunda-feira, 29 de julho de 2024

Pensamento do Dia

 


A ilusão brasileia

O país onde se nasce enseja uma visão utópica. Não há isenção na hora de defini-lo. Abordo o Brasil com cuidados. Acerto e me equivoco. Mas pouco importa. Quem acertaria lidando com um país que ostenta tal magnitude, com um território que ao sobrevoá-lo corre-se o risco de se pensar no Caribe, mas ainda se está dentro de suas fronteiras. E que a despeito desta desmedida, não sofre turbulências linguísticas. Com o privilégio de ser mestiço. No corpo e na memória sincrética. Uma mestiçagem que vai além dos corpos, pois tingiu a alma e devora as entranhas da sua cultura, que é insidiosa e esplêndida, como deve ser.

O Brasil é um amálgama de todos seres e saberes. Entre tantas etnias, somos fundamentalmente ibéricos, filhos da imaginação portuguesa e espanhola. Herdeiros de um universo impregnado de ficção, do faz-de-conta, de peculiar noção de realidade. De uma realidade que, concebida como uma invenção pessoal, cada qual narra segundo seus desígnios. Propensos nós, por conta de uma vocação individualista, a opor-se aos projetos coletivos, às organizações sociais programadas para durar. Com exceção talvez da construção acelerada da capital Brasília, que corresponde às pirâmides do Egito.

O realismo átrio é pautado em geral por forte dose de fantasia. Assim, inventar como fantasiar fazem parte da índole social. Daí agradar-nos aparentar o que não somos, exibir o que nos falta, simular a posse de bens que não temos; pedimos emprestados ao vizinho. Como consequência, proclamamos, eufóricos, que somos amigos do rei, do presidente, comensal do prefeito da cidade. E para ostentar um valor que não temos, tiramos com facilidade do bolso do colete um nome famoso, insinuando intimidade com ele.

Esta dança de aparência e exibição há muito instalou-se entre nós. Somos cortesãos com gosto. O poder é o mel das nossas vidas. Originou-se de variadas etnias, mas especialmente da península ibérica, e prosperou na alma brasileira antes de existirmos como nação. Um comportamento social que nos leva a inquirir sobre a nossa gênese.

Até mesmo os intérpretes brasileiros, que se aventuraram a definir nossa índole brasileira, que tão bem espelha a nossa conduta pública e privada, não puderam assegurar-nos de que linhagem originamo-nos, e o que nos une e nos separa. Ou excursionar com as mãos apalpando o horizonte o que é puramente do âmbito do mistério. Ou mesmo dizerem com exatidão onde se resguarda a matriz do nosso ser. Dizerem por meio das vozes canônicas e populares o que significava ser brasileiro ao longo do século XIX ou não se reconhecer brasileiro nas turbulências do século XXI.

Acaso ser brasileiro, um desígnio que cobre o território nacional, do norte ao sul, portanto oito milhões de quilômetros quadrados, é simplesmente nascer dentro deste território, ou mesmo a beira do oceano Atlântico, já que somos donos das duzentas milhas marítimas? É nascer em um lugar molhado ou seco, que não se vê no mapa nem com lupa? Uma aldeia à margem da civilização, que a mãe, após parir o filho, inventou para assegurar-lhe que embora tivesse vindo ao mundo em um grotão era um brasileiro? Enquanto enchia-lhe a cabeça com devaneios, lendas, narrativas, afim de garantir-lhe certidão de nascimento e humanidade.

Ser brasileiro então é termos epiderme e alma mestiças, resultantes das andanças humanas pelo mundo? Apresentar-se às autoridades municiado do documentos onde está consignada a filiação? Como nome dos pais, data de nascimento, dados enfim que se incorporam a estatística e controlam a cidadania? De que etnia procede seu cabelo, se é fino, encrespado, enquanto o nariz tem narinas dilatadas, de origem bantu, e outros o apêndice curvado para indicar procedência semítica. Etnias que de nada servem aos brasileiros, vale mesmo é ser parte de todas as tribos, proclamar-se filho das andanças humanas pelo mundo.

Acaso ser brasileiro é ter idiossincrasias similares, paixões que se igualam, temperamentos que acenam com a mesma bandeira nacional onde está inscrito o dístico Ordem e Progresso? Nordestinos que padecem da sede e sulistas que se perdem nos pampas, tomando chimarrão como se fossem argentinos?
É-se brasileiro pela língua que se fala no lar, na cama, na via pública? Independente do sotaque que cada região ostenta. Um anasalado, outro mais gutural, outro mais afunilado. Mas cada sotaque soando como música aos ouvidos de quem se emociona com a fragmentação das características. Uma língua vinda de Portugal há mais de quinhentos anos. E que se tornou a língua dos quebrantos, dos desejos eróticos, da eloquência parlamentar, dos sentimentos recônditos. A língua dos amantes e da poesia. Mas também dos guerreiros, dos corruptos que hoje são tantos no território nacional, sobretudo na capital do país, dos ditadores que foram expulsos a partir da implantação democrática em 1988, dos vândalos, dos supliciados de outrora e dos que ainda padecem nas mãos dos que têm poder. Também dos astuciosos, mentirosos, dos falsos donos das palavras, dos doutrinários inescrupulosos que nos tempos atuais, da tribuna da capital, nos ludibriam a pretexto de nos servir. A língua dos vencedores, dos pecadores. Dos que pedem perdão sabendo que incorrerão de novo na mesma culpa.

Há tantas maneiras de ser brasileiro. É rir confrontado com o ridículo que atribuímos ao vizinho como causador da situação constrangedora. Rir para que apreciem o nosso humor. É chorar quando a dor é pública e o nosso pranto prova a excelência do nosso caráter, como somos sensíveis diante da dor alheia. É abraçar quem sofre como se a manifestação de pesar assegurasse ao outro que seríamos eternamente solidários.

Ser brasileiro é dilacerar as cordas vocais na hora do gol, como modo de levarmos a ilusão para casa e com ela enfrentar a semana entrante a despeito do transporte, das dívidas que se acumulam, da educação precária dos filhos, da moradia que um temporal derruba matando dois ou três familiares. É beber a cerveja que o vulgo e a emoção chamam de loura gelada, como se estivessem se referindo quem sabe à loira Marilyn Monroe, criando com a garrafa um vínculo erótico. De forma que busquemos similitudes em torno da mesa e transfiramos para mais tarde as divergências que nos apartem. Já que convém esquecer que são escassos os recursos que nos une. É dizer piadas que atraiam a plateia de vizinhos, tendo como sujeito da nossa crueldade alguém que era necessário castigar. Um gay, por exemplo, um travesti, uma prostituta. Não há piedade em qualquer nação.

Aparentamos, então, ser cervantinos, somos brasileiros como quando abraçamos quem está próximo, o vizinho na hora do gol que decide a partida, fortalecidos pela esperança de vencer os embates da semana entrante. Como quando, emotivos e vulgares, sorvemos a cerveja que cristaliza similitudes em torno da mesa e transfere para o futuro as divergências que ora nos apartam.

Ser brasileiro é aceitar o mistério, convencido de que sendo Deus brasileiro, cabe-lhe solucionar os nossos conflitos. É saber que o Brasil é nossa morada e alojamento dos nossos mortos, e que nada nos faltará. Nem teto, nem a sopa fumegante. A vida supre-nos com sol, sal, alegria e a esperança dos dias vindouros.

Afinal, nos trópicos brasileiros as colheitas se multiplicam como nas bodas de Canaã. É a terra que Pero Vaz de Caminha, em 1500, assegurou ao rei Dom Manuel, em Lisboa, que aqui o que se plantasse, vingaria. Assim nasceram as bananas da infância junto com o fausto do verbo da língua lusa portuguesa. Para nós, cidadãos, é uma espécie de paraíso que bonifica a memória tanto com lembranças como com o esquecimento. Pois temos a propriedade de esquecer o que convém apagar. Também a transcendência, a despeito dos cultos sincréticos, e Deus estar em todos os lugares, não prospera e o enigma não é respeitado. Não há, pois, vocação filosófica, como os alemães. E por conta da força da intriga e da iminência da metáfora, somos voltados para a ficção e para a poesia.

A memória, contudo, que os brasileiros cultivam, corresponde à matéria que guardamos do mundo. Como consequência, para sermos brasileiro, somos gregos, romanos, árabes, hebreus, africanos, orientais. Somos parte essencial das civilizações que aportaram nesta terra onde afloram a abundância, a alegria, a traição, a ingenuidade, o triunfo do bem e do mal, a ilusão, a melancolia. Atributos todos nutridos pelo feijão preto bem temperado, o arroz soltinho, o bolo de fubá, o bife acebolado, e os anjos feitos de açúcar e gema de ovo que enfeitam a paisagem atlântica e sertaneja.

No Brasil, ao longo dos séculos, surgiram narrativas astutas e mentirosas que pautam a nossa história. Heróis e malfeitores, de estirpes emaranhadas. Outrora abominados, hoje reverenciados. Quem se interessa pelo julgamento da história? Mas personagens afinados com as torpezas e as inquietudes do seu tempo. Acomodados à sombra da mangueira que resiste aos anos, enquanto dedilhavam as cordas do violão e do coração.

Berço de heróis e marinheiros, neste litoral os saveiros da imaginação cruzaram os mares, instalaram culturas feitas das sobras alheias. Quem aqui nasceu, ou aqui aportou, fincou no peito brasileiro bandeiras, hábitos, linguagem, loucas demências.

É necessário, portanto, que ao viajar para o Brasil, o estrangeiro se apresse em dominar sua história, suas leis que, conquanto promulgadas, dão margem a interpretações múltiplas, coteje se o tema do seu interesse se harmoniza entre os diversos poderes públicos de Brasília. Se de verdade é o paraíso fiscal em que sonhou investir seu capital volátil, uma pretensão que contraria nossos interesses associados ao real desenvolvimento econômico do país. Sobretudo convém auscultar os sentimentos do brasileiro, sua simpatia, sua astúcia, a vocação com que altera as regras da vida e do mercado econômico. De como no meio de qualquer processo altera leis e diretrizes. De como ganha um tempo que, para o investidor, constitui um prejuízo, mesmo que as autoridades não saibam o que fazer com o tempo que guardou. Convém, sim, sondar o coração do brasileiro, que se reparte entre a família e os amores clandestinos, através da leitura dos intérpretes da pátria, dos ficcionistas, dos poetas. Deles emana a leitura que lhes dará o detalhe, a medida, as substâncias do ser brasileiro. A exegeses que vai fundo a genealogia dos afetos. Que tentou chegar perto deste coração brasileiro. Talvez se deslumbre com este povo singular, que trata o cotidiano com admirável leveza. E que a despeito de carnavalizar a realidade, também ostenta sintomas de melancolia.

É necessário saber e levar em conta, diariamente, de que nasceu no Rio de Janeiro em 1828, durante o Segundo Reinado, o escritor Machado de Assis, com nome de batismo Joaquim, cujo determinismo falhou ao não prever a própria grandeza. E de cuja obra surge o verbo que nos define e concede à nação um destino solar e a alvorada de cada dia.

Amigos, sejam todos bem-vindos a esta terra amada.
Nélida Piñon

‘Pós-judeus’, identidade e trauma

Em novo livro, intelectuais judeus buscam resgatar um sentido emancipatório da judaicidade, cada vez mais silenciado por um Estado israelense militarizado que se coloca como guardião de uma história secular de perseguição. A partir desse caso dramático, "O Judeu Pós-judeu" reflete sobre os limites e os riscos de perspectivas que recorrem às noções de identidade e trauma social para lidar politicamente com legados de opressão

"Em certos momentos, face a acontecimentos públicos, sabemos que devemos recusar [...]. Há uma razão que não aceitamos, há uma aparência de razoabilidade que nos causa horror, há uma oferta de acordo e de conciliação que não mais escutaremos."

Essa é uma afirmação de Maurice Blanchot que abre "O Judeu Pós-judeu: Judaicidade e Etnocracia" (n-1 edições), de Bentzi Laor e Peter Pál Pelbart. Ela expressa nitidamente a natureza desse livro recém-lançado, tão singular quanto necessário.

A escrita da obra nasce de uma recusa. Dois intelectuais judeus, um morando no Brasil —conhecido como um dos grandes nomes da filosofia nacional, leitor rigoroso de Deleuze, Foucault, Nietzsche, editor com intervenções políticas maiores nesses últimos anos— e outro morando em Israel —dividindo seu tempo como engenheiro com atuação no setor de alta tecnologia e ativista ligado a ONGs de defesa de palestinos.

Dois intelectuais que decidem usar sua capacidade analítica e sua memória histórica para recusar o horror de ver o nome de seu pertencimento comunitário usado para nomear a indiferença à violência do massacre.


O livro, nesse sentido, não é apenas fruto de um gesto de recusa. Ele também nasce de um desejo de resgatar um sentido emancipatório da experiência da judaicidade, presente nessa impressionante tradição messiânica herética que vai de Franz Rosenzweig a Walter Benjamin e Jacques Derrida, entre outros, mas que aparece atualmente cada vez mais distante e silenciada. Tema esse também presente em trabalhos maiores de outro intelectual vinculado a tal messianismo herético: Michael Löwy.

Daí o par presente no subtítulo do livro, "judaicidade e etnocracia". Ele expressa o desejo de se compreender como legatário de uma história de "sofrimento, perseguição, exílio, fuga, sobrevivência" sem que tal legado se consolide na defesa de uma etnocracia que usará a experiência do trauma social para justificar a militarização da sociedade e práticas de apartheid, além da violência contra palestinos e palestinas descrita, perante a Corte Internacional de Justiça, como genocidária.

Há semanas, vimos países como a França escaparem por pouco de serem, neste exato momento, governados por um partido de extrema direita com vínculos orgânicos com o colaboracionismo da República de Vichy, com o colonialismo e com discursos e práticas abertamente racistas, xenófobas e supremacistas.

Não será um sintoma menor ver esse mesmo partido mobilizar o discurso do antissemitismo contra seus adversários de esquerda, em larga medida simplesmente comprometidos com a causa palestina, e receber apoio aberto de setores expressivos da comunidade judaica de seu país. Como se, para esses setores, estivéssemos diante de um "mal menor".

Haverá, contudo, quem se pergunte como foi possível essa inversão que faz da extrema direita mundial aliada objetiva das políticas hegemônicas na sociedade israelense contemporânea, seja ela figurada em Marine Le Pen, Donald Trump ou Jair Bolsonaro. Aqueles que lerem o livro de Laor e Pelbart, em vez de seguir esse caminho macabro que vemos em analistas políticos brasileiros que procuram normalizar a extrema direita, podem encontrar uma importante reflexão a esse respeito.

A tese dos autores é que o risco desse alinhamento com a extrema direita era uma possibilidade sempre presente no projeto de constituição do Estado de Israel e sua permeabilidade a acordos com forças teológico-políticas que visavam consolidar um horizonte de etnocracia por meio daquilo que o livro chama de "combinação explosiva entre halachá (a lei religiosa) e o Estado".

Forças essas que voltam hoje como operadores centrais do jogo político, o que coloca questões importantes sobre a permeabilidade de nossas "democracias ocidentais" ao horizonte teológico-político.

No entanto, longe de apenas servir para a descrição de um caso específico e dramático, o livro aponta para um problema ainda mais estrutural que diz respeito aos riscos e limites dos usos de noções como identidade e trauma social no campo da política contemporânea, principalmente quando esses usos são mobilizados para a justificação da existência de um Estado.

Por isso, o livro de Laor e Pelbart é um documento fundamental para refletirmos sobre outras perspectivas políticas que, a partir da experiência concreta da opressão, creem encontrar refúgio e horizonte de luta mobilizando continuamente a identidade e a fidelidade ao trauma irreparável.

De fato, a afirmação da identidade pode inicialmente aparecer como modo de defesa contra experiências de violência e vulnerabilidade. Ela permite a consolidação da partilha da memória dos traumas sofridos, a construção de espaços de identificação e de luto.

A identidade, porém tem dois tempos. Há sempre o risco de ela paulatinamente se tornar um dispositivo de imunização, principalmente quando gerida pela figura de um Estado que se coloca como guardião do trauma coletivo. Pois, nesse caso, tudo se passa como se o Estado começasse a dizer: "Fomos violentados uma vez, ninguém velou por nós, temos pois todo o direito de utilizar o que for necessário para garantir nossa inviolabilidade e segurança contra todos os que apareçam colocando novamente em risco nossa integridade".

Pode-se dizer que essa é uma premissa que constitui o direito de defesa próprio a todo e qualquer Estado no mundo, mas seria o caso de lembrar, no caso da história recente israelense, que nenhum direito de defesa significa direito de massacre, que há um elemento importante a ser levado em conta quando a experiência do massacre sistemático do outro produz em mim apenas a pura indiferença e insensibilidade, além do desejo de definir quem irá ocupar minhas fronteiras.

Seria também o caso de se perguntar se o argumento do direito de defesa continua a valer quando recebo reações vindas de um território que ocupei ilegalmente durante mais de 50 anos, ignorando de forma soberana toda e qualquer lei internacional que me obriga à desocupação imediata.

Daí uma colocação tão central como esta que encontramos no livro: "Coabitar não é uma escolha, mas sim uma condição da vida política. Os eventos posteriores a 7 de outubro indicam que Israel quer decidir qual população não deve lhe fazer fronteira, e já está em curso um movimento que reivindica a remoção da população de Gaza [...]. Isso nada tem a ver com defesa, mas com despossessão".

Ou seja, a transformação do Estado em guardião do trauma social impede a consolidação de uma disposição genérica que aponte para uma solidariedade indiscriminada com toda situação de violência semelhante àquela sofrida, independentemente de quem seja agora o oprimido. Ela impede a compreensão de que o sujeito capaz de guardar o trauma social não é o Estado, mas algo como uma comunidade por vir, cujos limites ignoram as fronteiras e permitem um verdadeiro internacionalismo monádico capaz de se implicar de forma real com a alteridade e com a multiplicidade das vozes de suas dores.

Nesse sentido, o que "O Judeu Pós-judeu" mostra é como situações históricas concretas fornecem a oportunidade para a realização de horizontes de criação política. Criação daquilo que não estamos dispostos a abandonar, mesmo que apareça no presente como mera utopia.

A condição diaspórica e nômade da judaicidade, sua errância e desterritorialização históricas são transformadas pelos autores, seguindo reflexões de Hannah Arendt e Judith Butler, em armas contra a consolidação de uma identidade guerreira e militarizada, cada vez mais forte entre nós.

Elas são a potência a ser recuperada para a consolidação de uma política pós-identitária que ansiamos, que sentimos como uma latência dramática, continuamente silenciada por aqueles que aprenderam a mobilizar os medos sociais no interior de uma sociedade capitalista em crise profunda e que tenta sobreviver alimentando a ideia de que devemos aceitar que não há lugar para todos, que melhor vale lutar para ser o grupo restrito que irá atravessar o dilúvio.

A noção de um judeu pós-judeu mostra como a reflexão, vivenciada dramaticamente pela subjetividade, sobre o desconforto diante das desventuras da identidade, mas também sobre a fidelidade ao pertencimento a uma história soterrada pelo presente é uma força de abertura de futuros.

A mesma força que já levou um dia Isaac Deutscher a afirmar: "Religião? Sou ateu. Nacionalismo judaico? Sou um internacionalista. Em nenhum sentido, portanto, sou judeu. Contudo, sou judeu pela força de minha solidariedade incondicional com os perseguidos e exterminados. Sou judeu porque sinto a tragédia judaica como minha tragédia; porque sinto o pulso da história judaica".

Como lembram os autores, essa é uma força utópica que extrapola o destino singular de um povo.

Certidão de nascimento da Democracia


A maioria dos que até este momento pronunciaram discursos neste lugar fez o elogio deste costume antigo de honrar, ante o povo, aqueles soldados que morreram na guerra, mas a mim parece-me que as solenes exéquias que publicamente celebramos hoje são o maior elogio daqueles que, pelo seu heroísmo, as mereceram.

E também me parece que não se deva deixar à palavra de um só homem falar das virtudes e do heroísmo de tão bons soldados, nem tampouco acreditar no que se diga, quer seja um bom ou mau orador, pois é difícil expressar-se com justiça e moderar os elogios ao referir coisas das quais se pode ter apenas uma ligeira sombra da verdade.

Porque, se o que ouve foi testemunha dos acontecimentos e quer bem àquele de quem se fala, sempre acredita que o elogio é insuficiente em razão do que ele deseja e do que sabe, ao contrário, ao que o desconhece, impulsionado pela inveja, parece que há exagero no que supera a sua própria natureza.

Os elogios pronunciados em favor de outro podem ser suportados somente na medida em que se crê a si mesmo capaz de realizar das mesmas ações. O que nos supera excita a inveja e, além disso, a desconfiança.

Entretanto, já que os nossos antepassados admitiram e aprovaram este costume, eu devo também submeter-me a ele e tratar de satisfazer da melhor maneira possível os desejos e sentimentos de cada um de vós.

Começarei, pois, a elogiar os nossos antepassados. Pois é justo e equitativo render homenagem à recordação.

Esta região, habitada sem interrupção por gente da mesma raça, passou de mão em mão até hoje, guardando sempre a sua liberdade, graças ao seu esforço. E se aqueles antepassados merecem o nosso elogio, muito mais o merecem os nossos pais. À herança que receberam juntaram, ao preço do seu trabalho e dos seus desvelos, o poder que possuímos, que nos legaram. Nós o aumentamos. E no vigor da idade ainda alargamos esse domínio, abastecendo a cidade de todas as coisas necessárias, tanto na paz como na guerra.

Nada direi das proezas e façanhas guerreiras que nos permitiram alcançar a situação presente, nem da valentia que nós e os nossos antepassados demonstramos defendendo-nos dos ataques dos bárbaros ou dos gregos. Todos as conheceis e por isso não vos vou falar delas. Mas a prudência e arte que nos possibilitaram chegar a esse resultado, a natureza das instituições políticas e os costumes que nos trouxeram este prestígio, é necessário que sejam ressalvados antes de tudo. Depois, continuarei com o elogio aos nossos mortos.

Porque me parece que nas atuais circunstâncias é oportuno trazer â memória estas coisas e que será proveitoso que as ouçam tanto os cidadãos como os forasteiros que se reuniram, hoje, aqui.

A nossa constituição política não segue as leis de outras cidades, antes lhes serve de exemplo. O nosso governo chama-se democracia, porque a administração serve aos interesses da maioria e não de uma minoria.

De acordo com as nossas leis, somos todos iguais no que se refere aos negócios privados. Quanto à participação na sua vida pública, porém, cada qual obtém a consideração de acordo com os seus méritos e mais importante é o valor pessoal que a classe a que se pertence; isto quer dizer que ninguém sente o obstáculo da sua pobreza ou da condição social inferior, quando o seu valor o capacite a prestar serviços à cidade.

No que corresponde à República, pois, governamos livremente e, ainda, nas relações que mantemos diariamente com os nossos aliados e vizinhos, não nos irritamos porque ajam à sua maneira, nem consideramos como uma humilhação os seus prazeres e alegrias que, apesar de não nos produzir danos materiais, nos causam pesar e tristeza, ainda que sempre tratemos de dissimulá-los.

Ao mesmo tempo em que não temos receio nas nossas relações particulares, domina-nos o temor de infringir as leis da República; obedecemos aos magistrados e às regras que defendem os oprimidos e mesmo que não estejam editadas, a todas aquelas que atraem sobre quem as viola o desprezo de todos.

Para amenizar o trabalho, procuramos muitos recreios para a alma; instituímos jogos e festas que se sucedem a cada ano; e diversões que diariamente nos proporcionam deleite e diminuem a tristeza. A grandeza e a importância da nossa cidade atraem os tesouros de outras terras, de modo que não só desfrutamos dos nossos produtos como daqueles do universo inteiro.

No que se refere à guerra, somos muito diferentes dos nossos inimigos porque permitimos que a nossa cidade esteja aberta a todas as gentes e nações, sem vedar nem proibir a qualquer pessoa que adquira informes e conhecimentos, ainda que a sua revelação possa ser proveitosa aos nossos adversários; pois confiamos tanto em preparativos e estratégias como no nosso ânimo e vigor na ação.

Outros, no que se refere à educação, acostumam, mediante um treino fatigante desde criança, a sua potência viril; nós, apesar da nossa forma de viver, não somos menos ousados e valentes para afrontar o perigo quando a necessidade o exige. Boa prova disso é que os lacedemónios [espartanos] jamais se atreveram a entrar na nossa terra sem que estejam acompanhados de todos os aliados; enquanto nós, sem ajuda nenhuma, fizemos incursões no território dos nossos vizinhos e muitas vezes, sem grandes dificuldades, derrotamos em país estrangeiro adversários que defendiam os seus próprios lares.

Nenhum dos nossos inimigos se atreveu a atacar-nos quando reunimos todas as nossas forças, tanto por causa da nossa experiência nas coisas do mar, como pelos muitos destacamentos que temos em diversos lugares do nosso território.

Se por acaso os nossos inimigos derrotam alguma vez um destacamento dos nossos, se jactam de nos haver vencido a todos e se, pelo contrário, os derrota uma parte das nossas tropas, dizem que foram atacados por todo o nosso exército.

E efetivamente preferimos o repouso e o sossego quando não estamos obrigados, por necessidade, ao exercício de trabalhos penosos e, também, ao exercício dos bons costumes, a viver sempre com o temor das leis; de forma que não nos expomos ao perigo quando podemos viver tranquilos e seguros, preferindo a força da lei ao ardor da valentia.

Temos a vantagem de não nos preocupar com as contrariedades futuras. Quando chegam estas, enfrentamo-las com boa têmpera, como os que sempre estiveram acostumados com elas.

Por estas razões e muitas mais ainda, a nossa cidade é digna de admiração. Ao mesmo tempo em que amamos simplesmente a beleza, temos uma forte predileção pelo estudo. Usamos a riqueza para a acção, mais que como motivo de orgulho, e não nos importa confessar a pobreza, somente considerando vergonhoso não tratar de evitá-la.

Por outro lado, todos nos preocupamos de igual modo com os assuntos privados e públicos da pátria, que se referem ao bem comum ou privado, e gentes de diferentes ofícios se preocupam também com as coisas públicas.

Nós consideramos o cidadão que se mostra estranho ou indiferente à política como um inútil à sociedade e à República.

Decidimos por nós mesmos todos os assuntos sobre os quais fazemos, antes, um estudo exato: não acreditamos que o discurso entrave a acção; o que nos parece prejudicial é que as questões não se esclareçam, antecipadamente, pela discussão.

Por isto nos distinguimos, porque sabemos empreender as coisas juntando a audácia à reflexão, mais que qualquer outro povo.

Os demais, algumas vezes por ignorância, são mais ousados do que o que requer a razão, e alguns, por querer fundamentar tudo em raciocínios, são lentos na execução.

Seria justo ter por valorosos aqueles que, ainda conhecendo exactamente as dificuldades e vantagens da vida, não recusam o perigo.

No que se refere à generosidade, também somos diferentes dos demais, porque procuramos fazer amigos, dispensando-lhes benefícios ao invés de recebê-los, pois o que faz um favor a outro está em melhor condição do que quem o recebe para conservar a sua amizade e benevolência, enquanto o favorecido sabe que há-de devolver o favor, não como se fizesse um benefício mas como se pagasse uma dívida. Também somos os únicos em usar a magnificência e liberalidade com os nossos amigos e não tanto por cálculo da conveniência como pela confiança que a liberdade dá.

Numa palavra, afirmo que a nossa cidade é, em conjunto, a escola da Grécia, e creio que os cidadãos são capazes de conseguir uma completa personalidade para administrar e dirigir perfeitamente outras gentes, em qualquer aspecto.

E tudo isto não é um exagero retórico, ditado pelas circunstâncias, mas a verdade mesma; o poderio que conquistamos com estas qualidades o demonstra.

Atenas possui mais fama que as demais. É a única cidade que não dá motivos de rancor aos seus inimigos pelos danos que lhes inflige, nem desprezo aos seus súbditos pela indignidade dos seus governantes. Esta grandeza é demonstrada por importantes testemunhos é de uma maneira definitiva para nós e para os nossos descendentes. Eles terão uma grande admiração por nós sem que tenhamos necessidade dos elogios de um Homero, nem de qualquer outro, para adornar os nossos feitos com elogios poéticos, capazes de seduzir mas cuja ficção contradiz a realidade das coisas.

É sabido que, graças ao nosso esforço e ousadia, conseguimos que aterra e o mar por inteiro fossem acessíveis à nossa audácia, deixando em toda a parte monumentos eternos das derrotas infligidas aos nossos inimigos e das nossas vitórias.

Esta é a cidade, pois, que com razão estes homens não quiseram deixar que fosse manchada e pela qual morreram valorosamente no combate; os nossos descendentes estão dispostos a sofrer tudo para assegurar a sua defesa.

Por estas razões me estendi a falar da nossa cidade já que queria demonstrar-lhes que não lutamos pelo mesmo que os outros, mas por algo tão grande que nada o iguala, e também para que o elogio dos homens objecto do nosso discurso fosse claro e veraz. Terminei, já, com a parte principal. A glória da República deve-se ao valor desses soldados e de outros homens semelhantes. Os seus actos estão à altura da sua reputação e existem poucos gregos dos quais se possa dizer o mesmo.

No meu entender, nada demonstra melhor o valor de um homem que este final, que entre os jovens é um indício e uma confirmação entre os velhos.

Com efeito, aqueles que não podem prestar outro serviço à República é justo que se mostrem valorosos na guerra, pois apagaram o mal com o bem e os seus serviços públicos compensaram de sobra os equívocos da sua vida privada. Nenhum deles se deixou seduzir pelas riquezas ao ponto de preferir os defeitos ao seu dever, nem tão-pouco nenhum deixou de se expor ao perigo com a esperança de escapar da pobreza e fazer-se rico, convencidos de que era preciso o castigo do inimigo ao gozo destes bens, e visando este risco como o mais admirável, quiseram afrontá-lo para castigar o inimigo e fazer-se dignos destas honras.

Tiveram confiança neles mesmos no momento da batalha e ao encontrar-se ante o perigo, sustentados pela esperança ante a incerteza do êxito. Preferiram buscar a sua salvação na destruição do inimigo, e antes na morte que no covarde abandono; assim escaparam à desonra e perderam a vida.

No azar de um instante nos deixaram, alcançando o mais alto cume da glória e não a baixa recordação do seu medo.

Dessa forma é que se mostraram filhos dignos da cidade. Os sobreviventes devem fazer todo o possível para conseguir uma melhor sorte, mas devem-se mostrar ao mesmo tempo intrépidos contra os seus inimigos, considerando que não se podem limitar às palavras de um discurso toda a utilidade e proveito.

Também seria ocioso enumerar diante de gente tão perfeitamente informada, como o sois vós, todos os esforços dirigidos à defesa do país. Quanto maior lhes pareça o poder da cidade, mais deveis pensar que existiram homens valorosos, que souberam praticar a audácia como sentimento de um dever e se conduzir com honra durante toda a vida.

E se bem que o sucesso nem sempre tenha correspondido aos seus esforços, não quiseram privar Atenas do seu valor e sacrificaram a sua virtude como o mais nobre tributo, fazendo o sacrifício da sua vida e adquirindo, cada um por sua parte, uma glória imortal que lhes deu a sepultura com honra.

E esta terra onde agora descansam não é tanto como a recordação imortal sempre renovada e enfocada em discursos e comemorações. Os homens eminentes têm por túmulo a terra inteira.

O que atrai a atenção para eles não são somente as inscrições funerárias gravadas na pedra; quer na sua pátria, quer nos países mais longínquos, a sua memória persiste, apesar dos epitáfios, conservada no pensamento e não nos monumentos.

Invejai, pois, a sua sorte, dizei que a liberdade se confunde com a felicidade e o valor com a liberdade e não olheis com desprezo os perigos da guerra. Não penseis que os maus e os covardes, que não têm esperança de melhor sorte, são mais razoáveis em guardar a sua vida que aqueles cuja existência está exposta ao perigo e que se aventurara? a passar da boa à má fortuna e que, se fracassam, verão a sua sorte completamente transformada. Pois para um homem sábio e prudente é mais doloroso a covardia que uma morte enfrentada com valor e animada pela esperança comum.

Assim, não me compadeço pela sorte dos pais que estão presentes, limitar-me-ei a consolá-los. Eles sabem, eles que cresceram entre as vicissitudes da vida, que a ventura só é para os que obtêm, como seus filhos, ó fim o mais glorioso ou, como eles, o luto o mais honroso e para os quais o termo da vida é a medida da felicidade.

Sei muito bem o quanto é difícil persuadir-vos. Ante a felicidade dos demais, felicidade de que haveis gozado, chegareis em muitos momentos a recordar a memória dos vossos desaparecidos. Sofremos menos quando nos privamos de bens dos quais não aproveitamos do que com a perda daqueles aos quais estamos habituados. É preciso, pois, sofrer pacientemente e se consolar com a esperança de ter outros filhos, vós aos quais a idade ainda o permite. Os novos filhos substituirão na família os que não existem mais; e a cidade ganhará uma vantagem dupla: a sua população não diminuirá e a segurança estará garantida, pois os que entregam seus filhos ao perigo pelo bem da República, como o fizeram os que perderam os seus nesta guerra, inspiram mais confiança que os que não fazem.

Agora, cumpre que cada um se retire, uma vez que chorou na hora dos desaparecidos.

Os que não têm esta esperança, recordem a sorte que tiveram gozando de uma vida que na sua maior parte foi feliz; o resto será curto; que a glória dos vossos console a vossa dor; só o amor da glória não envelhece e, com o passar da idade, o prazer não consiste, como pretendem alguns, em amontoar riquezas, mas em inspirar respeito.

E vós, filhos e irmãos destes mortos, pensai a que vos obriga o seu valor e heroísmo. Não há homem que não elogie a virtude e o esforço dos que morreram. A vós, apesar dos vossos méritos, será muito difícil alcançar o seu mesmo nível, e não digamos superá-lo. Porque entre os vivos, o desejo da emulação provoca sempre a inveja, enquanto todos elogiam e honram os que morrem.

Também farei menção às mulheres que ficaram viúvas, expressando o meu pensamento numa breve exortação: toda a sua glória consiste em não mostrar-se inferiores à sua natureza e que se fale delas o menos possível entre as gentes, tanto no seu bem como no seu mal.

Terminarei. Conforme as leis, as minhas palavras expressaram o que me pareceu útil. Quanto às honras reais, foram elas rendidas em parte aos que aqui jazem, mais honrados pelas suas obras do que pelas minhas frases.

Doravante, os seus filhos, se são menores, serão educados até à adolescência, correndo os gastos a cargo da República. Uma coroa é oferecida pela cidade a fim de homenagear as vítimas destas batalhas e seus sobreviventes, pois os povos que recompensam a virtude com magníficos prémios obtêm também os melhores cidadãos.
Péricles (Atenas, 430 a C.)

Que inveja de Maduro não deve estar sentindo Bolsonaro

À época, deputado federal pela segunda vez, Jair Messias Bolsonaro, afastado do Exército por indisciplina e conduta antiética, celebrou a eleição para presidente da Venezuela do coronel Hugo Chávez, que governaria o país por 14 anos, de 1999 até sua morte em 2013.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Bolsonaro disse:

“Chávez é uma esperança para a América Latina e gostaria muito que essa filosofia chegasse ao Brasil. Acho ele ímpar. Pretendo ir à Venezuela e tentar conhecê-lo. Ele não é anticomunista e eu também não sou. Na verdade, não tem nada mais próximo do comunismo do que o meio militar”.

Também disse que Chávez remetia a Castelo Branco, primeiro presidente do Brasil durante a ditadura militar, entre 1964 e 1967: “Acho que ele vai fazer o que os militares fizeram no Brasil em 1964, com muito mais força. Só espero que a oposição não descambe para a guerrilha, como fez aqui”.


A esta hora, que inveja Bolsonaro não deve estar sentindo de Nicolás Maduro, que sucedeu a Chávez, governa a Venezuela há 11 anos, e que no início da madrugada de hoje, com 80% dos votos apurados por um Conselho Eleitoral sob seu controle, foi declarado reeleito para um novo mandato de seis anos.

Não governa: com o apoio dos militares, Maduro desgoverna a Venezuela que já perdeu 20% de sua população, em fuga por falta de empregos, remédios e de condições mínimas para levar uma vida decente. Bolsonaro bem que tentou, mas não conseguiu se eternizar no poder como Maduro. Daí a inveja.

A levar-se em conta o que apontaram as pesquisas de intenção de voto realizadas até sábado, Maduro seria derrotado com folga pelo candidato da oposição, o diplomata Edmundo González Urrutia. As pesquisas subestimaram a força da máquina do chavismo especializada em repressão e fraudes.

Há duas maneiras de contar votos na Venezuela: uma digital, executada pelo órgão eleitoral do país liderado por um aliado de Maduro; e a outra em papel impresso feita por cada máquina de votação nos locais de votação. A contagem em papel serve para certificar se a contagem digital está correta.

Mas este ano, em zonas eleitorais-chave, seus responsáveis se recusaram a entregar as contagens em papel aos fiscais de partidos. Este foi o caso em uma das maiores estações de votação em Caracas, a escola Rafael Napoleon Baute, e na segunda maior cidade da Venezuela, Maracaibo.

Quando os apoiadores do candidato da oposição no Liceo Andrés Bello, em Caracas, reclamaram de terem sido impedidos de acessar a contagem de votos em papel, uma gangue de pelo menos 150 apoiadores de Maduro, em motocicletas, chegou gritando cânticos pró-governo.

Um repórter do Washington Post viu os homens, encapuzados e vestidos de preto, começarem a socar e chutar aqueles do lado de fora do centro de votação, ferindo várias pessoas. “Viva Nicolás”, eles gritaram. Episódios como esse se repetiram em vários pontos do país e foram relatados por testemunhas.

“O fascismo na Venezuela, terra de Bolívar e Chávez, não passará. Nem hoje nem nunca”, assegurou Maduro no primeiro pronunciamento após o anúncio de sua vitória. Os presidentes de Cuba, Nicarágua, Bolívia e Honduras, ligados ao chavismo, logo se apressaram em parabenizá-lo.

O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, não: cobrou a apresentação dos relatórios de contagens dos votos em papel. Até o momento em que escrevo, o governo brasileiro segue calado.