sábado, 19 de março de 2016

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Acelera-se a queda do governo

No melhor dos últimos dez dias para o governo, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) decidiu apoiar o impeachment; o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu Lula da função de ministro-chefe da Casa Civil da presidência; e o jornal mais importante do mundo, o The New York Times, publicou duro editorial com críticas a Dilma.

Mesmo assim, o dia poderia ter sido pior para Dilma, Lula e o PT. E se tivessem fracassado as manifestações convocadas de apoio aos três? Elas até que não fizeram feio nas atuais circunstâncias.

A de São Paulo foi a maior, atraindo a participação de 80 mil pessoas, segundo a Polícia Militar. Ou 95 mil, segundo o Datafolha. Ou 380 mil, segundo seus organizadores.

Houve manifestações em 55 cidades dos 26 Estados e no Distrito Federal. O público total foi estimado em 1,2 milhão, segundo os organizadores. Ou 269 mil, segundo as polícias militares.

Lula discursou na manifestação na capital paulista, sendo ovacionado. Disse que entrou no governo para ajudar Dilma. E anunciou a ressurreição do “Lulinha paz e amor”.

Há quinze dias, quando foi levado para ser ouvido pela Lava-Jato, Lula dissera que naquele dia o “Lulinha paz e amor” acabara de morrer. Fez um discurso incendiário prometendo percorrer o país no combate ao”golpe” que está em marcha para derrubar Dilma.
Lula escondido debaixo da saia de Dilma assume ministerio Casa Civil escapa de moro puxando perna foro priviligiado D

O medo de ser preso, por fim, empurrou-o para a posição menos desconfortável de ministro do governo.

A sensação compartilhada por políticos de todos os partidos, empresários, banqueiros e até mesmo ministros de Estado é de queda iminente do governo.

Naturalmente, se por iminente entender-se que algo dramático como isso poderá estar consumado dentro de 60 a 80 dias. Ou antes, a depender de Dilma. Ela poderá renunciar para não ser deposta.

Auxiliares de Dilma confidenciam que ela chegou a admitir a hipótese da renuncia quando Lula ainda não decidira virar ministro para escapar das garras de Moro.

A hipótese se reapresentará novamente. Talvez quando ela concluir que a Comissão Especial do Impeachment, formada por 65 deputados, recomendará a cassação do seu mandato.

A verdade é que a revelação de conversas de Lula ao telefone provocou estrago irreparável na imagem dele. E também a maneira desastrosa como ele entrou no governo para ser ministro.

Dilma está rouca de tanto repetir que o grampo foi ilegal. Só que foi legal, sim, por ter sido autorizado pelo juiz Moro. Dilma parece uma barata tonta desde então.

Lula vira a página na Avenida Paulista. Para trás!

Quando Dilma aceitou levar Lula de volta para o Planalto, os brasileiros ficaram autorizados a concluir que ela se deu conta da sua própria ineficiência e decidiu devolver o poder a um verdadeiro chefe de Estado. O PT e seus satélites no sindicalismo e nos movimentos sociais viram a retomada da Presidência por Lula como as coisas finalmente voltando aos seus devidos lugares.


A presidência acidental de Lula ainda está sub judice. Mas o morubixaba do PT ofereceu na noite passada um gostinho do que será o Brasil se ele não for preso e se o STF autorizar o início do seu terceiro mandato. As coisas ficaram claras com o discurso feito por Lula na manifestação contra o impeachment, na Avenida Paulista.

“Eu não vou lá para brigar”, bradou Lula. Seu plano de governo consiste em ajudar a fazer as coisas que precisam ser feitas. “Não vou lá achando que aqueles que não gostam de nós são menos brasileiros do que nós”, afirmou, antes de realçar as características que fazem de “nós” algo bem melhor do que “eles”.

“Eles vestem roupa amarela e verde para dizer que são mais brasileiros do que nós. Corte uma veia deles para ver se o sangue deles é verde e amarelo. É vermelho que nem o nosso, é vermelho como se fosse o sangue de Jesus Cristo.”

Lula prosseguiu: “Eles não são mais brasileiros do que nós, porque, na verdade, eles são um tipo de brasileiro que gostaria de ir para Miami fazer compra todo dia. E nós compramos na 25 de Março. Nós compramos na cidade que a gente mora. E a gente compra fiado. A gente não reclama que o dólar suba, porque fica caro viajar para Miami. Eu viajo para Garanhuns, para o Rio Grande do Norte, para a Bahia…”

“Precisamos recuperar o humor desse país, precisamos recuperar o orgulho de ser brasileiro, precisamos recuperar a auto-estima”, disse Lula a alturas tantas. O orgulho e a auto-estima não serão recuperados facilmente. Mas o humor está de volta.

Deve-se louvar o esforço retórico que o sucessor de Dilma realiza para reaproximar o PT dos brasileiros mais humildes. Não é fácil para Lula esbravejar contra a elite endinheirada. Uma voz incômoda deve soar nos fundões de sua consciência: “Farsante”.

Palestrante milionário, amigo de poderosos que reformam à sua revelia os imóveis que frequenta, Lula deve se divertir sozinho ao verificar, na hora de escovar os dentes toda manhã, que a elite agora mora no espelho da cobertura de São Bernardo.

Uma das caractererísticas fundamentais da deficiência de julgamento de um povo é ter que ouvir uma pessoa durante vários anos para chegar à conclusão de que ela não tem nada dizer. Lula atingiu esse estágio. Seu discurso tornou-se um latifúndio improdutivo. Apenas os devotos que o seguem desejam compartilhar.

Lula já não exibe a pele de jararaca que vestira em 4 de março, quando a Polícia Federal o levou para prestar depoimento, sob vara. “Ao aceitar ir para o governo, veja o que aconteceu comigo: eu virei outra vez o Lulinha Paz e Amor”, disse ele, no miolo de um discurso recheado de ataques.

“Não quero que quem votou no Aécio vote em mim, não quero que ele exija que quem votou na Dilma vote nele. O que eu quero é que a gente aprenda a conviver de forma civilizada com as nossas diferenças.” Civilizadamente, Lula bateu nos rivais: “Faz um ano e três meses que eles estão atrapalhando a presidenta Dilma a governar esse país.”

Habituado a superestimar seus talentos, Lula subestima as deficiências de Dilma. Madame se desgovernou sozinha, sem o auxílio da oposição. Por sorte, Lula, que vinha sendo o poder de fato no Brasil desde que deixou a Presidência, em 2010, aceitou reassumir o trono.

O discurso de Lula na Paulista introduz no cenário político um clima de novidade burlesca. Percebe-se nas entrelinhas que Lula virou a página. Para trás!

O ministério do tempo de Lula

Na série espanhola El Ministerio del Tiempo uma instituição secreta guarda as portas que conduzem ao passado. Seu objetivo é garantir que a história não seja modificada, pois poderia reduzir o poder do Estado no presente. “Nossa história não foi a melhor, mas poderia ter sido pior”, escutamos o Subsecretário do Tempo, Salvador Martí, falar no primeiro capítulo.

A série não é ficção histórica. Os fatos são como lemos nos livros. Por isso também na tela a Espanha perde a Guerra da Sucessão Espanhola e triunfa na guerra contra a França napoleônica, para citar dois exemplos. Cada porta que se abre leva a um tempo diferente e a uma cena que o captura. É uma foto que o recria, não que o modifica.

Desse passado o ministério recruta seus agentes, verdadeiros guardiães do tempo. Até Diego Velázquez é selecionado, visto desenhando o retrato falado de dois agentes franceses infiltrados em Madri para mudar aquela vitória pela derrota, notem. Uma subutilização imperdoável de tanta genialidade – o grande Velázquez colocado para desenhar kits de identidade de suspeitos! – mas assim é a TV. Pelo menos permitiram que terminasse As Meninas antes de trazê-lo para o século XXI.

É que a arte de Velázquez detrás de uma porta evoca outra porta: a da abóbada de Lula em uma agência do Banco do Brasil em São Paulo. Esta pela qual, quando aberta, Lula também nos leva ao barroco, mas de um crucifixo do século XVI indevidamente apropriado. Tinha desaparecido misteriosamente durante a transferência de poder para Rousseff.

Na série, as portas conduzem ao passado e permitem voltar dele, mas nunca levam ao futuro. “O tempo é o que é”, diz o Subsecretário. É uma boa metáfora da América Latina, pelas semelhanças, assim como pelas diferenças. Aqui e agora o tempo também é a variável central da narrativa, mas neste lado do Atlântico é acompanhada pela intenção deliberada de controlá-lo como um objeto, esticá-lo, resistir a seu desgaste implacável. Tentativa estéril, é a ficção do poder eterno.

Para Lula, as portas do seu ministério devem conduzir ao futuro obrigatoriamente, uma fuga para frente com o objetivo de alcançar uma sobrevivência improvável. É a tragédia da perpetuação que o arrasta para baixo. Por trás da perpetuação – seja de uma pessoa, um casal, uma família ou um partido político, como no Brasil do PT – sempre se oculta a inevitável necessidade de controlar o tempo, de torná-lo indefinido. É como aquele monumento a Chávez com a inscrição 1954-∞.

Na relação íntima entre o tempo eterno e o poder, reside a corrupção. O PT não é o único caso, mas o ilustra bem: a corrupção é muito mais do que a apropriação de bens públicos. É um regime político, o componente central da dominação. É a corrupção que seleciona dirigentes, organiza a competição eleitoral, exerce a representação e o controle essencial do território.

Claro que também financia campanhas eleitorais. O Brasil é o exemplo mais acabado disso. Tudo era bem conhecido e há muito tempo, lembremos de Dirceu e o Mensalão, só que então a economia estava crescendo e a oposição não estava organizada. As duas condições mudaram, além do cansaço crescente da sociedade.

O problema é que a corrupção reforça a busca da eternidade, não por ideologia, tantas vezes declamada, mas por sua sobrevivência. Fora do poder, os riscos são muito altos. O desafio para a reconstrução democrática da América Latina é tirar a corrupção da política. Não será tarefa simples.

E, no final, aí aparece Lula buscando imunidade como Chefe de Gabinete de Dilma, o mesmo cargo de Dirceu em sua própria presidência. Forçado a alongar a sombra do futuro o máximo possível, na verdade Lula está no comando do ministério do tempo. Isto em um pacto no qual ambos decidiram encadear seus destinos à âncora desse navio à deriva chamado PT. Se a âncora cair no mar, terminarão aí, tão juntos como conceberam esta estrutura de poder hegemônico.

Nesse caso, terá sido um pacto suicida entre a presidente e seu ministro do tempo.

Parido ministro para sobreviver como presidente, Lula morrerá politicamente como presidiário

A nomeação escarnecedora do criador odioso a ministro numa série de crimes de Dilma Rousseff que, entre a renúncia e a vergonha, terá as duas, efetivaria o “delenda Curitiba est”, equivalente a um “o Brasil precisa ser destruído”. Parido ministro para sobreviver como presidente, morrerá politicamente como presidiário acompanhado pela desonra e pela família detestável.

Na noite que antecedeu o golpe, convoquei minha mãe para ficar com a neta e fui para a Paulista, onde permaneci até o começo da madrugada. Este é o relato de uma cidadã comum, apenas uma mulher latino-americana, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vinda do interior das ruas nas quais também marchou contra a ditadura militar, pois não é em nenhum refúgio que nos descobriremos: é na rua, na cidade, no meio da multidão, coisa entre as coisas, homem entre homens, segundo Sartre. E são os cidadãos comuns assim ou nem tanto, mas todos autônomos e reunidos para civilizar o país, que estão se descobrindo donos da história que tem surpreendido o cotidiano.

Mas como explicar que pessoas de bem ainda defendam os patronos do esbulho material e moral, preferindo ser crédulas ou indiferentes na barbárie a ser protagonistas na civilização do país? Não sei. Desnecessário gostar de FHC ou da Rede Globo; basta gostar da perspectiva de o país ter a chance de se civilizar. A nitidez dos diálogos sórdidos de Lula e Dilma tramando submeter a ele todos os Poderes da República deveria eliminar dúvidas residuais de que essa perspectiva inexiste sob o PT. Chegando à Paulista, adentrei a República de Curitiba, a Berlim onde ainda há juízes expandida por todo o Brasil, que o déspota repugnante quer destruir em pânico pela ineficácia dos ataques a um juiz federal seguro e sereno.

Depois de ouvir um Lula encharcado de vulgaridade e de potência só realizada no primitivismo cultivado em torno de si pela subserviência dos comparsas e pelo ódio aos desobedientes, enlouquecido na pretensão de intimidar os onze do Supremo, orgulhoso do primarismo que julga ser inteligência política de um cabra da peste, tão à vontade na imundície que, mesmo sabendo do possível grampo, chamou de “meu sítio” o sítio que diz não ter, cheguei à Paulista me sentindo suja e entristecida. Suja da voz roufenha colonizada também por ofensas às mulheres; entristecida na certeza de ainda termos de lidar com tanta sujeira por algum tempo porque a presidente tosca preferiu renunciar não em favor da nação, mas do criador miserável.

Na cerimônia da posse revogada, os farsantes tentaram um golpe a céu aberto acusando de golpista quem os vencerá no mais limpo dos combates – o de cidadãos comuns, livres, amparados na legalidade e fortalecidos na indignação. É nesse combate que me vejo limpa outra vez e, de volta para casa, a tristeza capitula quando beijo minha mãe e minha filha que acorda, a quem conto baixinho: durma, minha flor, sonhe porque Curitiba non delenda est.

Corrupção de resultados

Atribui-se ao falecido Adhemar de Barros, precursor político de Paulo Maluf, o adágio “rouba, mas faz” – a corrupção de resultados. Contrapunha às acusações de ladroagem, que não desmentia, a compensação de obras e realizações, que, de dever de ofício, transmutavam-se em benevolência governamental.

Aparentemente, funcionou, já que governou São Paulo por três vezes (uma como interventor no Estado Novo, duas eleito), foi prefeito da capital e candidato à presidência da República, além de manda-chuva da política paulista entre as décadas de 30 e 60.

Foi cassado três vezes, a última e definitiva após o golpe de 64, que apoiou. Mas essa é outra história. Importa notar que, se o fato de “fazer” anulava o de “roubar”, e lhe garantia destaque, é porque havia coisa pior: a turma que roubava e não fazia.

Outro personagem histórico já falecido, o ex-ministro Mário Simonsen, dizia que essa modalidade – o do “rouba e não faz” -, ao contrário, era menos nociva. Segundo ele, algumas obras, de tão caras e inúteis, melhor seria não fazê-las, calculá-las e pagar por elas uma propina hipotética.


O PT, ao que parece, levou a blague a sério: parte substantiva do que a Lava-Jato tem revelado são obras inconclusas, embora caríssimas, com o custo inicial (e a respectiva propina) várias vezes aumentado. Entre outras, a refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, as do Maranhão, Ceará, Duque de Caxias (RJ) e a emblemática de Pasadena, EUA.

O PT, porém, além de incorporar ambas as vertentes – a do roubo de resultados e o sem resultados -, inaugurou uma nova: a dos que roubam, fazem, mas fazem tudo errado, sendo esta, de todas, a pior, por seus efeitos colaterais e duradouros.

O resultado é a crise que aí está, a maior das últimas quatro décadas, a que não faltaram crises. Pior: não está convencido do que fez, o que põe em cena o dito do Barão de Itararé, crítico mordaz da ditadura Vargas, segundo quem “o problema do governo não é a falta de persistência, mas a persistência na falta”.

Ao celebrar, seus 36 anos, há pouco mais de duas semanas – o que, diante da vertiginosa sucessão de denúncias da Lava Jato parece uma eternidade -, o partido divulgou, em tom triunfal, o seu Programa Nacional de Emergência, com a autoridade de quem, no fim das contas, criou a emergência.

Já então cogitava da volta de Lula. Houve quem, na sua espessa ingenuidade, acreditasse que, sendo o partido o autor da crise, poderia dispor do remédio para erradicá-la. Só que, em vez de propor cura, receita ao doente uma eutanásia.

A tanto equivale o Programa. Entre outras coisas, propõe o uso de parte das reservas internacionais para a criação de um Fundo Nacional de Desenvolvimento e Emprego, a “radicalização” dos mecanismos de distribuição de renda (o que será isso?), a taxação das grandes fortunas, a redução “drástica” da taxa de juros e a volta da CPMF, compartilhada entre União, estados e municípios (para tentar atrair o apoio de prefeitos e governadores).

Em resumo, a mesma receita que gerou a crise, só que elevada ao cubo, oposta à que o governo, com os cofres vazios, e ainda com um resto de bom senso, estava a sustentar.
Reforma da Previdência? Nem pensar. Contenção do consumo? Ora, ora, a crise é invenção das elites.

Havia, porém, um problema: o partido não confiava em Dilma – nem ela nele - e queria a cabeça da equipe econômica, além de um ministro da Justiça que controlasse a Polícia Federal.

A solução mágica foi chamar Lula, matando assim dois coelhos numa só cajadada: reanimar a militância e garantir asilo ao ex-presidente, neste momento às voltas com a Polícia Federal e o Código Penal. Nem uma coisa, nem outra banirá a crise.

A reação popular à nomeação de Lula turbinou o processo de impeachment e devolveu a população às ruas. O país não está dividido, conforme mostram as pesquisas, em que mais de 90% pedem o fim do governo. Está, pois, unido – e contra.

O PT – e haja persistência na falta – insiste em que o povo não compareceu às manifestações, só “as elites”. No documento em que convocou a militância à manifestação de ontem, diz isso.

E explicita: “Solicitamos que os diretórios estaduais convoquem em caráter de urgência para o dia 18 de março todos os sindicatos, militância e, se necessário, convoquem militantes nas periferias, de preferência negros e pardos, sendo que foi autorizado o transporte, alimentação e o repasse de R$ 30,00 (trinta reais) para auxílio aos militantes”.

Trata-se de documento autoexplicativo que resume uma Era de abjeções e fracassos.

Judiciário faz a diferença


A longo prazo, acredito que o Brasil mereça uma avaliação de risco mais favorável. Quantos países emergentes têm um Judiciário razoavelmente independente capaz de permitir uma mudança real? Instituições independentes. Essas são vantagens cruciais que o Brasil possui
Ian Bremmer , especialista em países emergentes e presidente do Eurasia Group, uma das maiores consultorias de risco político do mundo

A outra corrupção

Os julgamentos por suspeitas de corrupção têm impedido a avaliação do governo Lula/Dilma na transformação da estrutura socioeconômica do Brasil. Nenhum governo chegou ao poder com tantas promessas de mudar a realidade brasileira e nenhum esteve tanto tempo à frente da nação, à exceção de Vargas.

Mas, ao olhar ao redor, a avaliação não é positiva.

O Bolsa Família, iniciado no governo anterior com o nome de Bolsa Escola, distribuindo anualmente 0,5% do PIB, deve ser aplaudido por seu caráter de rara generosidade das elites governantes, mas não tem sido um programa transformador. A transformação seria emancipar o povo da necessidade de bolsa, e o governo Lula/Dilma não avançou neste propósito.

Em um país com a memória da escravidão, o governo Lula/Dilma fez o gesto louvável de criar instrumentos para incluir pobres e descendentes de escravos no ensino superior, com cotas, Prouni, Fies, além de abrir mais 14 universidades federais. Criar mecanismos para que os filhos de alguns pedreiros ingressem na universidade é um gesto positivo, mas não tem, em si, caráter transformador da estrutura social. A transformação viria de reformas no sistema educacional, para fazer com que todos os filhos de todos os pedreiros tivessem condições de disputar vaga no vestibular com a mesma chance que os filhos de seus patrões.

O governo Lula/Dilma não fez avançar a consciência cívica e política: acomodou as massas e cooptou os movimentos sociais, como CUT e UNE; abriu as portas das lojas para grupos que antes estavam marginalizados, mas não os abrigou como cidadãos plenos; aumentou o número de consumidores, não de cidadãos. Ao abandonarem propostas transformadoras, os partidos progressistas e os movimentos sociais agem como ex-abolicionistas que, ao chegar ao poder, contentam-se em emancipar alguns escravos e reduzir o sofrimento dos outros, sem fazer a Abolição.

No futuro, além da nódoa ética sobre o PT e demais partidos da base de apoio e suas avaliações dos 13% de século do governo Lula/Dilma mostrarão a perda de uma grande oportunidade histórica, um partido com propostas transformadoras chegar ao poder, com um líder carismático de origem popular, vencer quatro eleições seguidas, e abandonar o pudor e o vigor transformador.

O governo Lula/Dilma encontrou um país dividido, social e politicamente, agravou a divisão política e, no lugar de derrubar o muro que nos divide socialmente, apenas jogou algumas migalhas para os excluídos, e não cumpriu as promessas de realizar as reformas estruturais.

O perigo é que as forças do pós-Lula/Dilma não façam o que eles não fizeram; porque juízes prendem políticos e limpam a política por um período, mas não derrubam a “cortina de ouro” que divide o Brasil; julgam a corrupção no comportamento dos políticos, mas não a corrupção nas prioridades das políticas.

O bando fora da lei invoca a proteção da lei para planejar em sigilo mais pontapés na lei

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As conversas grampeadas pela Polícia Federal acrescentaram ao prontuário de Dilma Rousseff o crime de obstrução da Justiça, praticado para livrar Lula da cadeia. Se lhe restasse alguma vergonha, se não tivesse começado a mentir antes de aprender a falar “mamãe”, a presidente que nada preside já teria caído fora do gabinete onde sonha com a salvação que não virá. Mas a governante desgovernada prefere fingir que o vilão é o juiz Sérgio Moro, que teria ignorado uma das prerrogativas do cargo que ela não para de desonrar.

“Grampo na Presidência da República ou para qualquer um de vocês não é algo lícito, é algo ilícito, e é previsto como crime na legislação”, reincidiu em dilmês erudito nesta sexta-feira. Conversa de 171. Nenhum dos celulares e telefones fixos que afilhada utiliza foi alvo de escuta. Os aparelhos grampeados foram os aparelhos usados pelo padrinho homiziado no Instituto Lula. A voz da criatura só entrou no coral da Lava Jato porque ligou para um celular que o criador julgava secreto. Deu no que deu: os brasileiros agora sabem que Dilma participou da conjura armada para afastar Lula do camburão, ouviu sem dar um pio insultos ao Supremo e engoliu palavrões que deixariam ruborizada até uma reencarnação de Messalina.

As gravações também provaram que Lula chefiou a repulsiva conspiração contra o Estado de Direito e a ofensiva infamante contra Sérgio Moro. Para escapar de uma segunda e conclusiva visita da Polícia Federal, também ele decidiu fazer de conta que os bandidos devem ser procurados na república de Curitiba. Resumo da ópera-bufa: o bando fora da lei invoca a proteção da lei para continuar atropelando a lei ─ em sigilo. Para os comandantes da organização criminosa, esse desrespeito à privacidade dos meliantes é muito mais grave que a maior roubalheira da história.

“Minha intimidade, de minha esposa e meus filhos, dos meus companheiros de trabalho tem sido violentada por meio de vazamentos ilegais de informações que deveriam estar sob a guarda da Justiça”, mentiu Lula na carta aberta que divulgou nesta quinta-feira. Submetido ao calvário de chanchada, o marido amantíssimo e pai extremoso acabou exonerando a proverbial sobriedade. “Nesta situação extrema, em que me foram subtraídos direitos fundamentais por agentes do estado, externei minha inconformidade em conversas pessoais, que jamais teriam ultrapassado os limites da confidencialidade, se não fossem expostas publicamente por uma decisão judicial que ofende a lei e o direito”.

Não tem nada de mais, portanto, qualificar de covardes os ministros do Supremo, debochar de ministros de Estado, exigir que o ministro da Justiça mantenha o camburão distante do chefe supremo, tratar a presidente da República como gerente do bordel federal onde reina há mais de 13 anos. Na cabeça dos criminosos, crime é divulgar conversas que mostram uma quadrilha planejando atropelamentos do Código Penal. Talvez mudem de opinião quando começarem a trocar ideias na mesma cela de cadeia.

Pelo conteúdo da mensagem e pela linguagem, Lula se inviabilizou

O ex-presidente Lula inviabilizou a si mesmo no veloz episódio de sua nomeação para ministro-chefe da Casa Civil, em decorrência do conteúdo de suas mensagens e pelos absurdos da linguagem a qual recorreu ao longo do desenrolar dos fatos. Não percebeu o que estava praticando de fato e, nos seus tropeços políticos, arrastou consigo a própria presidente Dilma Rousseff. Claro. Fez renascer o processo de impeachment, que se encontrava adormecido pela força da inércia. Um dos motivos do adormecimento foram as contradições no PSDB entre Aécio Neves, José Serra e Geraldo Alckmin, cada qual com um projeto próprio para ascensão ao poder. Prevalecia o calendário para 2018, sucessão a ser decidida pelas urnas. O PMDB igualmente encontrava-se dividido, sobretudo em face de ocupar seis ministérios no governo, parcela à qual se adicionou mais um com a nomeação do sétimo representante.

Mas a entrada em cena de Lula, ao som do hino nacional, excepcionalmente tocado numa posse de chefe da Casa Civil, toldou o panorama e fez desencadear nova tempestade. O quadro nacional mudou de rumo, principalmente em reflexo da reportagem de Thiago Herdy, Sílvia Amorim e Cleide Carvalho, destacando a frase do ex-presidente de que o Supremo Tribunal Federal encontra-se acovardado. Situação que inclusive estendeu ao Superior Tribunal de Justiça. Resultado: o ministro Celso de Mello respondeu de forma aberta e direta, em nome da Corte Suprema, e o ministro João Otávio de Noronha pelo STJ. E Lula ainda agrediu o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Os recursos contra sua investidura se avolumaram e foram exatamente parar no Supremo, tendo o ministro Gilmar Mendes sido sorteado relator. A posse de Lula permanece suspensa, a estabilidade de Dilma Rousseff ingressa num plano de queda.

Vejam só os leitores como é a política. O que parecia representar uma descompressão (a investidura de Lula) transformou-se na realidade em um fator de pressão contrária ainda maior contra o governo. Não adianta usar argumentos contra as gravações dos diálogos mantidos pelo ex-presidente, quando mais importante do que tal prática é o estarrecedor conteúdo das matérias. Uma delas, inclusive, também publicada pelo O Globo, o telefonema de Lula ao ministro Nelson Barbosa para que tentasse influir na Receita Federal para livrar de investigações fiscais o Instituto que leva seu nome.

A tentativa de influir junto a ministra Rosa Weber para que em seu despacho relativo a recurso apresentado por Lula para que as investigações da Polícia Federal e do Ministério Público fossem suspensas está na outra face da perplexidade que conduz à interpretação de que ele, Lula, pudesse ter rompido até com a lógica.

Uma fuga da razão, a busca de um escapismo inútil. Os que condenam a liberação das gravações pelo juiz Sérgio Moro fogem do debate quanto à predominância do conteúdo. Pois este conteúdo, ele sim, é que coloca ou colocava em risco a essência do regime democrático.

Basta imaginar as consequências caso as solicitações ilegais e passionais fossem atendidas por Dilma (quanto a Rosa Weber) e Nelson Barbosa (quanto ao Instituto Lula). Seria uma subversão de valores contidos na legislação brasileira.

Este o desenho de um panorama que se aproxima de um desfecho. Se Dilma Rousseff não se afastar da ideia chamada Lula, seu impedimento revela-se próximo. Só um milagre poderá salvá-la. E só outro milagre, este ainda maior, salvará o Brasil.

Não vai ter golpe

Diferentemente de 1964, não há forças políticas pregando o golpe. As manifestações vão pavimentar o caminho para uma solução constitucional. O caminho será constitucional. Não há golpe à vista. O caminho será duro, mas mesmo o impeachment é previsto na Constituição
Francisco de Oliveira, sociólogo fundador do PT e crítico contundente dos governos petistas

Venderam o país à companheirada

Dilma cava a cada dia a cova para jogar os restos do Brasil. A presidente legitimamente eleita, em nome da permanência petista no trono do Planalto - agora com dois mandatários: o legítimo e foragido da Justiça - renega os votos democráticos em troca de um governo de partido. Dilma não governa o país, se deixa levar pelos fatos políticos e joga para a galera mercenária rompantes de ignorância e mentira.

Um país desgovernado há 15 meses não resiste muito à instabilidade e ainda mais à falta de governabilidade. Se o preço dos mandatos petistas é astronômico, cresce geometricamente o custo desses meses de Dilma.2. E não há expectativa de paralisação desse crescimento negativo.

A "posse" de Lula, agora revelada como uma descarada manipulação para obstrução da Justiça, jogou fogo no que resta do país. Acendeu o incêndio entre os militantes, contratados a R$ 30, e os cidadãos que vão às ruas reclamar seus direitos e cobrar os deveres de uma presidente.

Com a cartilha petista debaixo do braço, Dilma vai desfilando em inaugurações do programa Minha Casa Minha Vida, esbravejando o surrado discurso de dona da verdade, quando reconhecidamente é mentirosa de carteirinha.

Ao esbravejar de sua majestade, não se contrapõem as ações. O desastre econômico, provocado justamente por sua "nova matriz", merece apenas curativos eleitoreiros. É muito pouco, insignificante, até mesmo para os atendidos pelos programas sociais, que hoje pagam bem mais impostos para sobreviver.

A transferência dos programas sociais para a esfera da Casa Civil, que está para ser arregimentada como tábua de salvação, só provocará o incremento de uma secessão em nome da defesa de um descarado bandido.

O país não pode sustentar seus algozes no governo ao preço do sofrimento de tantos pobres iludidos e tantos trabalhadores espoliados em seus salários e empregos.

A farsa de Lula Deus caiu há anos por terra. O que se vê defendendo-se da Justiça é um velho pelego, o que nunca deixou de ser. Dilma não poderia oferecer qualquer tipo de proteção a um foragido, se tornando cúmplice e pondo em risco a estabilidade de uma democracia que tanto preza em defender, sob uma cadeia de mentiras.

Dilma, com o patrocínio do PT, "vendeu" o Brasil para os interesses de uma companheirada de vagabundos.

Quem paga a manifestação da CUT pró-Lula?

Alguns números: todos os 41,3 milhões de trabalhadores brasileiros com carteira assinada terão desconto na folha de pagamento deste mês de março, compulsoriamente, do valor de um dia de trabalho como contribuição sindical. É este dinheiro que sustenta os sindicatos no Brasil. No ano passado, a arrecadação foi de R$ 3,2 bilhões, rateados entre os 15.315 sindicatos – uma alta de 13% frente a 2012. Os próprios sindicalistas admitem que muitos são criados apenas para garantir os repasses das verbas do imposto sindical.

A cobrança foi criada em 1943, pela ditadura de Getúlio Vargas. Do total arrecadado, 60% são repassados aos sindicatos, 15% às federações, 5% às confederações e 20% ficam com o Ministério do Trabalho, para financiar programas como o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que custeia o seguro-desemprego e o PIS.


Em 2008, o então presidente Lula determinou que, do total repassado ao FAT, 10% deveriam ser destinados às centrais sindicais. De lá para cá, as centrais já receberam cerca de R$ 530 milhões, valor que não precisa ter nenhuma prestação de contas.

CUT e Força Sindical ficam com as maiores parcelas do imposto, R$ 44,5 milhões e R$ 40 milhões, respectivamente. Apesar de se declarar formalmente contra a cobrança, a CUT não devolve o dinheiro aos trabalhadores.

Vamos a um extrato da mídia.
Todos os 41,3 milhões de trabalhadores brasileiros com carteira assinada terão desconto, compulsoriamente, na folha de pagamento deste mês de março, do valor de um dia de trabalho como contribuição sindical. É este dinheiro que sustenta os sindicatos no Brasil. No ano passado, a arrecadação foi de R$ 3,2 bilhões, rateados entre os 15.315 sindicatos. Uma alta de 13% frente a 2012. E neste ano, podem ser financiados também os 2.100 novos sindicatos que estão em fase de criação. Os próprios sindicalistas admitem que muitos são criados apenas para garantir os repasses das verbas do imposto sindical.
— São sindicatos de gaveta, abertos sem qualquer organização social e política. Em muitos casos, o trabalhador nem sabe que o sindicato existe. Todos por conta do imposto sindical — denuncia Wagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), principal central sindical do país.
O secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Manoel Messias, confirma que grande parte dos sindicatos em processo de legalização no ministério está de olho apenas na contribuição sindical.(
Trecho do Globo de março de 2014:
Quanto desse dinheiro levou gente à avenida Paulista neste dia 18 de março?

Protesto contra quem?

O Brasil convive com excessiva naturalidade com alguns conceitos que gerariam guerras civis, cismas religiosos e separação entre famílias e países em outros lugares. Se o cisma que gerou a Igreja Ortodoxa Copta aconteceu por não aceitar a dualidade divina e humana de Cristo (algo bem difícil para os leigos), aqui se convive bem com um conceito horrendo, o “protesto a favor”, de maneira que ultrapassa as raias da histeria coletiva.

Acompanhar os protestos das últimas semanas exige nervos de aço e um conhecimento quase filosófico de contradições que é capaz de enlouquecer qualquer um. Como já enlouqueceu. Enquanto alguns tentam vender os “protestos a favor” do PT, todos devidamente feitos por pessoas com camiseta dos órgãos que geraram o PT (CUT, MST, UNE, Ubes, Apeoesp, CTB e sabe-se lá mais quantos sindicatos devidamente uniformizados), a população fica atônita não só para verificar números e causas, como para acompanhar análises e opiniões as mais desbaratadas sobre as manifestações e os desdobramentos jurídicos das operações policiais. Só entender se Lula é ministro ou futuro prisioneiro já é um paradoxo mais difícil, ou ao menos mais patético, que o do Gato de Schrödiger.


Isso significa que não houve “revolta com a classe política em geral”, e sim com políticos de esquerda, ou ao menos aqueles que não cobraram o impeachment, causa popular já antes da reeleição de Dilma. Por mais que se tente vender a bazófia de ser este um impeachment “de Cunha”, quem quer o impeachment sabe que o presidente da Câmara engavetou mais de 30 pedidos antes de aceitar o de Janaína Paschoal, Hélio Bicudo e Miguel Reale Jr.Por fim, há a propaganda, vendida como “notícia” ou “análise”. Tentaram vender a tese, no protesto de domingo passado (13 de março, a maior mobilização popular da história da América Latina), de que figuras da oposição, como Aécio Neves e Geraldo Alckmin, que resolveram fazer parte da manifestação, tinham sido hostilizadas e, portanto, haveria um sentimento “contra a classe política em geral”, como disseram alguns veículos de comunicação.

Aécio e Alckmin foram vaiados, sim. E muito. Ao notá-los ali, o povo passou a vaiá-los tanto que os dois não conseguiram senão atravessar a rua e picar a mula da manifestação, sob palavras impublicáveis. Para um país que pensa com o bolso (Lula, com o mensalão, praticamente deu um golpe totalitário ao usar um poder para comprar o outro e também legislar, mas ninguém o chama de “tirano”, e sim de “ladrão”), o significado é enorme: Aécio, implicado no Banco Rural (o mesmíssimo mensalão de Lula) e em Furnas, ouviu muito mais que “ladrão”, o xingamento típico a políticos: ele ouviu duas palavras em destaque: “oportunista” e “traidor”.

Tanto é assim que políticos que sempre se posicionaram a favor do impeachment e batem de frente com o PT foram ovacionados pelo povo. Ronaldo Caiado e Eduardo Bolsonaro, em São Paulo, mal conseguiam discursar diante de tantos aplausos, sem falar em João Dionisio Amoedo (do Novo) e Jair Bolsonaro, no Rio.

Querem dissolver tudo num substantivo abstrato ou genérico, mas apenas se vê que quem perdeu a história é apenas quem recusa o fim do PT e de tudo o que ele representa.

Flavio Morgenstern

A cor de cada um

Na República do Espicha-Encolhe cogitava-se de organizar partidos políticos por meio de cores.

Uns optaram pelo partido rosa, outros pelo azul, houve quem preferisse o amarelo, mas vermelho não podia ser. Também era permitido escolher o roxo, o preto com bolinhas e finalmente o branco.

– Esse é o melhor – proclamaram uns tantos. – Sendo resumo de todas as cores, é cor sem cor, e a gente fica mais à vontade.




Alguns hesitavam. Se houvesse o duas-cores, hem? Furta-cor também não seria mau. Idem, o arco-íris. Havia arrependidos de uma cor, que procuravam passar para outra. E os que negociavam: só adotariam uma cor se recebessem antes 100 metros de tecido da mesma cor, que não desbotasse nunca.

– Justamente o ideal é a cor que desbota – sentenciou aquele ali. – Quando o Governo vai chegando ao fim, a fazenda empalidece. e pode-se pintá-la da cor do sol nascente.

Este sábio foi eleito por unanimidade Presidente do Partido de Qualquer Cor.

Carlos Drummond de Andrade

O golpe do golpe

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Ao invés de esticar a sobrevida do moribundo governo Dilma, afrontar a compostura do senso comum dos cidadãos, se jogar no salto mortal dessa empreitada furada de superministro articulador, e achar que pode dar a volta nas instituições judiciárias do país, Lula poderia admitir tão simplesmente que o projeto de Brasil que ele tinha em mente deu errado. Simplesmente isto: deu errado. E que, depois das megamanifestações do dia 13 de março não dá mais pra tentar justificar com os velhos chavões esquerdistas do golpismo das zelites o que ele próprio está a responder com outro golpe. Pois o verdadeiro golpista é sempre o último, o do contragolpe que, por antecipação, justifica seu golpe com a suposição do golpe adversário. Como diz o provérbio, “duzentos não podem estar errados”. Quanto mais 6 milhões! Com a prisão do seu marqueteiro, a verdadeira face de Lula reaparece na grande mídia. Basta olhar pra sua foto que circulou em toda a imprensa por ocasião do discurso do sindicato dos bancários na semana passada, que se pode constatar que a imagem do “Lulinha, paz e amor”, da campanha de 2002, voltou a ser a imagem de ódio e rancor dos tempos incendiários da agitação sindicalista.

Diante de jogadas de tanto casuísmo e falsa esperteza, com a autoridade de um cidadão brasileiro que valoriza a paz social e a tradição de fraternidade de nosso povo, venho lembrar ao “nosso guia” que está se esgotando a sua última chance de admitir os erros e tentar salvar a sua biografia. De assumir publicamente sua responsabilidade política pelos descaminhos do PT e pedir desculpas ao povo brasileiro, ao invés de insistir no erro, procrastinar o inevitável processo, acirrar os ânimos e incitar conflitos entre cidadãos do mesmo sangue. Seria um gesto de grandeza incomparável que suplantaria todas as demais delações havidas e que, com a autoridade inquestionável de ex-supremo magistrado, passaria definitivamente o país a limpo.

Admita, Lula, sua responsabilidade agora, antes que se avolumem ações e investigações no seu novo foro privilegiado. Ou que se precipite de vez as ameaças do “março de sangue” dos agitadores que te cercam. Porque, por mais rancor que você tenha em ter de admitir, a política que você escolheu para realizar o projeto de um Brasil justo deu errado. Além do que esta é sua última chance de salvar para a história a sua promessa maior de fazer com que todo cidadão brasileiro possa ter três refeições por dia. Lembra? Como diz outro provérbio: perca esta batalha da Lava Jato agora para manter seu sonho, a esperança dos brasileiros e ganhar a guerra mais adiante. Peça desculpas aos milhões de cidadãos que acreditaram em você. Até por que, Lula, este projeto socialista ou esquerdista de tentar determinar o rumo da história e fazer “justiça social” a qualquer preço, não tem dado certo em todos os países que tentaram. Todas as vezes em que se tentou, em prol da igualdade social, sacrificar a liberdade, só se conseguiu criar privilégios para as classes dirigentes, restringindo as liberdades de todo o povo por força de totalitarismos, sem se criar riqueza ou mesmo distribuir uma renda digna para todos.

Você já deve ter percebido que o Brasil não é Cuba, nem tampouco uma Venezuela. Que o Brasil é muito maior e não cabe nesse estreito projeto de ditadura social-populista latino-americana. Ou nacional-socialista de colocar estatais como Petrobras e BNDES acima da nação. Que o Brasil não vai sacrificar a sua tradição de Libertas quae sera tamen por uma promessa delirante e romântica de igualitarismo social a qualquer custo. Tenha a hombridade de admitir isto publicamente e, quem sabe, seus eleitores não o perdoam? Mas o que você não pode de jeito algum é prolongar ainda mais esta agonia da ingovernabilidade, a paralisia dos empreendedores, quanto mais apelando para uma hipotética luta de classes por dar ouvidos aos maus conselheiros do vale-tudo para manter o poder. Você não conseguirá convencer os cidadãos brasileiros a fazer do Brasil uma Cuba ou uma Venezuela. Admita que tentou, mas simplesmente não conseguiu. Pois a política escolhida estava errada.

Você estará em boa companhia. Vários líderes sociais da história do Brasil e da humanidade já tentaram e não conseguiram. Proponho, inclusive, que você tire uma semana de férias de seus asseclas esquerdistas e vá com dona Mariza ver o filme “O quarto de Jack”, cuja atriz acaba de ganhar o Oscar, e interpreta magistralmente uma das mais sublimes alegorias sobre o valor da liberdade no mundo contemporâneo. Como o ser humano pode sacrificar a própria vida pela liberdade. Pois bem, Lula, entenda que hoje no Brasil, os cidadãos brasileiros, “somos todos Jack!”. Que nos juntamos em milhões para fugir deste quarto estreito em que o PT nos meteu. Deste quarto escuro de desbunde fiscal e crise de confiança, resultantes desta besteira de nova matriz econômica de que o estado pode tudo. Até por que ainda acredito que você também foi vítima desta ilusão totalitária, deste projeto esquerdista de poder que aniquilou os ideais de fundação do próprio partido. Por que você mesmo foi vítima do mito que seus asseclas criaram de seu poder voluntarista.

Somos todos Jack, Lula! Fingindo de mortos, vamos acabar fugindo desta prisão maior da mentalidade retrógrada de direitos sociais ilimitados para quase nenhum dever cívico que os demagogos esquerdistas e anarco-sindicalistas inventaram desde 1988. Os símbolos nacionais do Brasil carregam o estigma da liberdade. Estamos mais para Macri do que para Maduro. Admita, Lula, em canal aberto de televisão, que você errou. Peça desculpas ao povo. Admita a fraude da campanha de 2014, aproveite sua nova prerrogativa de foro e conte tudo ao Ministério Público Federal. Não sacrifique milhões de cidadãos brasileiros na pior crise da recessão e desemprego de nossa história por causa de 25 mil boquinhas de cargos comissionados. Tenha a grandeza de dividir de fato o projeto de um novo Brasil com outros protagonistas, que até mesmo FHC já reconheceu que você é um legitimo líder popular. Escolha ser líder de uma nação e não chefe de um governo moribundo. Salve a sua biografia e reconcilie o Brasil.

Jorge Maranhão