sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017
No fio da navalha
O Espírito Santo já teve mais presença na mídia nacional. No passado havia correspondentes como Rogério Medeiros, do Jornal do Brasil, que fez inúmeras reportagens sobre a histórica devastação da Mata Atlântica no Espírito Santo. E revelou grandes personagens, como Augusto Ruschi, o homem que amava o beija-flor, e o lendário desmatador Rainor Greco, que depois de devastar a Mata Atlântica levou seu know-how para a Amazônia.
No fim de semana as notícias sobre a greve da Polícia Militar (PM) me inquietaram. Na segunda-feira, no rádio, avaliei que esse poderia ser o tema mais importante da semana. Anexei uma preocupação: o fechamento das escolas e dos postos de vacinação. Acabara de voltar do Espírito Santo, onde a morte dos macacos se ampliava e os primeiros casos de febre amarela já se registravam na zona rural de Colatina. O Espírito Santo, dos Estados limítrofes de Minas Gerais, é o mais vulnerável à febre amarela, por ter menos gente vacinada.
Mas a onda de violência tornou-se algo mais assustador do que a febre amarela. Assassinatos, saques, assaltos, tiroteio, tudo isso nos relembra de como é tênue o limite para a barbárie, como é delicado o equilíbrio em que nos movemos no Brasil, inclusive com nosso mundo político vivendo em outro planeta.
Sempre defendi a ideia de que se investisse em segurança, reconhecendo como é caro esse esforço, mesmo com algumas reduções de custos que o uso da tecnologia possa trazer. A ideia é ter uma polícia bem treinada, bem paga e respeitada pela sociedade. Até mesmo reverenciada quando um policial morre em confronto com criminosos, algo que os movimentos de direitos humanos ainda não interiorizaram.
A greve da Polícia Militar (PM) capixaba não foi a primeira. Uso a palavra greve porque a encenação das famílias na porta dos quartéis era apenas para construir uma realidade alternativa, como está em moda atualmente. Houve greves em Pernambuco e na Bahia e a cada vez que elas ocorrem enfraquecem os argumentos dos que gostariam de vê-los em melhor situação.
Todo policial militar, mesmo que não conheça a Constituição no seu todo, é ensinado, ao ser admitido, sobre o que ela proíbe que ele faça. O caos que o movimento dos policiais provocou no Espírito Santo é tão grave que, em circunstâncias menos dramáticas que aquelas em que vivemos, valeria considerá-los desertores e construir uma nova Polícia Militar.
Um dos efeitos negativos é a propagação. Em Minas Gerais, já se anunciou na noite de terça-feira o boato de uma greve de PMs e bombeiros. Se vingar, já é uma novidade não só inquietante, mas desapontadora: os bombeiros são muito bem vistos pelo povo.
No Rio de Janeiro, os PMs estão em luta contra o governo Pezão, que é um remanescente do grupo que assaltou e quebrou o Estado. Nesse sentido, têm todo o respeito. Mas uma coisa é lutar contra o governo e outra, contra a sociedade, desrespeitando a Constituição e expondo as cidades à barbárie.
No Espírito Santo, um plano de austeridade econômica equilibrou as contas, mas não teve a sensibilidade política que um planejamento desse tipo precisa ter. Os PMs estão há quase quatro anos sem reajuste salarial. E ali sua tarefa não é fácil. A quantidade de bandidos que tomou as ruas é uma evidência da aspereza da missão.
No Rio de Janeiro o problema também é muito sério. O famoso resgate econômico do governo federal está fazendo água, com negativas da Caixa Econômica, do Banco do Brasil e da Advocacia-Geral da União. Falta também aprová-lo na Assembleia Legislativa.
Há uma possibilidade de o governo não resistir à crise. Mas aí coloco a segunda questão: uma simples troca de governo aquietaria os protestos?
Num cenário tão confuso, em todas as áreas, em que as PMs estão prestes a cruzar os braços, uma saída para a sociedade é a autodefesa. Não me refiro a armas, mas a smartphones. Já começam a surgir aplicativos mapeando tiroteios, indicando zonas perigosas. O próprio Exército, que tem sido uma espécie de último recurso, talvez possa avançar nesse caminho. Uma coisa é patrulhar uma cidade, outra é patrulhar conectado por milhares de cidadãos também preocupados com a segurança. Os movimentos tornam-se mais econômicos e precisos.
Da mesma forma, como no combate ao terrorismo na Europa, as autoridades podem informar as pessoas por seus celulares, estabelecer um novo patamar de segurança por meio da comunicação.
Se os acontecimentos do Espírito Santo ganharem maior dimensão, o caminho da autodefesa é inevitável. Com a superação mais aguda da crise, a experiência de se autodefender por meio da comunicação será muito importante. Ela contribui para economizar custos num momento em que é preciso, mais do que nunca, investir na segurança, mas, lamentavelmente, estamos falidos.
Na verdade, eu nem iria escrever sobre isso. O tema original eram as primeiras semanas de Donald Trump e os limites que a democracia americana está impondo a ele. O que houve no Espírito Santo reviveu um certo instinto, um faro, de que estamos mais perto do caos do que imaginamos.
Os acontecimentos têm sido muito surpreendentes e nos arrastam como uma enxurrada de verão. Mas nunca resolvi a dúvida: os acontecimentos são mesmo tão surpreendentes ou o que mudou foi a nossa capacidade de prever?
Num país onde isso tudo acontece e o ministro da Justiça pede demissão para se preparar para uma sabatina no Senado, realmente, vivemos em múltiplas realidades paralelas.
Recebi uma mensagem assim: momento estranho que vivemos aqui e no mundo. Respondi: é preciso recuperar a racionalidade, não completamente, porque um pouco de loucura sempre tem o seu lugar.
Nos últimos tempos, as proporções estão invertidas: a balança pendeu para a loucura.
No fim de semana as notícias sobre a greve da Polícia Militar (PM) me inquietaram. Na segunda-feira, no rádio, avaliei que esse poderia ser o tema mais importante da semana. Anexei uma preocupação: o fechamento das escolas e dos postos de vacinação. Acabara de voltar do Espírito Santo, onde a morte dos macacos se ampliava e os primeiros casos de febre amarela já se registravam na zona rural de Colatina. O Espírito Santo, dos Estados limítrofes de Minas Gerais, é o mais vulnerável à febre amarela, por ter menos gente vacinada.
Sempre defendi a ideia de que se investisse em segurança, reconhecendo como é caro esse esforço, mesmo com algumas reduções de custos que o uso da tecnologia possa trazer. A ideia é ter uma polícia bem treinada, bem paga e respeitada pela sociedade. Até mesmo reverenciada quando um policial morre em confronto com criminosos, algo que os movimentos de direitos humanos ainda não interiorizaram.
A greve da Polícia Militar (PM) capixaba não foi a primeira. Uso a palavra greve porque a encenação das famílias na porta dos quartéis era apenas para construir uma realidade alternativa, como está em moda atualmente. Houve greves em Pernambuco e na Bahia e a cada vez que elas ocorrem enfraquecem os argumentos dos que gostariam de vê-los em melhor situação.
Todo policial militar, mesmo que não conheça a Constituição no seu todo, é ensinado, ao ser admitido, sobre o que ela proíbe que ele faça. O caos que o movimento dos policiais provocou no Espírito Santo é tão grave que, em circunstâncias menos dramáticas que aquelas em que vivemos, valeria considerá-los desertores e construir uma nova Polícia Militar.
Um dos efeitos negativos é a propagação. Em Minas Gerais, já se anunciou na noite de terça-feira o boato de uma greve de PMs e bombeiros. Se vingar, já é uma novidade não só inquietante, mas desapontadora: os bombeiros são muito bem vistos pelo povo.
No Rio de Janeiro, os PMs estão em luta contra o governo Pezão, que é um remanescente do grupo que assaltou e quebrou o Estado. Nesse sentido, têm todo o respeito. Mas uma coisa é lutar contra o governo e outra, contra a sociedade, desrespeitando a Constituição e expondo as cidades à barbárie.
No Espírito Santo, um plano de austeridade econômica equilibrou as contas, mas não teve a sensibilidade política que um planejamento desse tipo precisa ter. Os PMs estão há quase quatro anos sem reajuste salarial. E ali sua tarefa não é fácil. A quantidade de bandidos que tomou as ruas é uma evidência da aspereza da missão.
No Rio de Janeiro o problema também é muito sério. O famoso resgate econômico do governo federal está fazendo água, com negativas da Caixa Econômica, do Banco do Brasil e da Advocacia-Geral da União. Falta também aprová-lo na Assembleia Legislativa.
Há uma possibilidade de o governo não resistir à crise. Mas aí coloco a segunda questão: uma simples troca de governo aquietaria os protestos?
Num cenário tão confuso, em todas as áreas, em que as PMs estão prestes a cruzar os braços, uma saída para a sociedade é a autodefesa. Não me refiro a armas, mas a smartphones. Já começam a surgir aplicativos mapeando tiroteios, indicando zonas perigosas. O próprio Exército, que tem sido uma espécie de último recurso, talvez possa avançar nesse caminho. Uma coisa é patrulhar uma cidade, outra é patrulhar conectado por milhares de cidadãos também preocupados com a segurança. Os movimentos tornam-se mais econômicos e precisos.
Da mesma forma, como no combate ao terrorismo na Europa, as autoridades podem informar as pessoas por seus celulares, estabelecer um novo patamar de segurança por meio da comunicação.
Se os acontecimentos do Espírito Santo ganharem maior dimensão, o caminho da autodefesa é inevitável. Com a superação mais aguda da crise, a experiência de se autodefender por meio da comunicação será muito importante. Ela contribui para economizar custos num momento em que é preciso, mais do que nunca, investir na segurança, mas, lamentavelmente, estamos falidos.
Na verdade, eu nem iria escrever sobre isso. O tema original eram as primeiras semanas de Donald Trump e os limites que a democracia americana está impondo a ele. O que houve no Espírito Santo reviveu um certo instinto, um faro, de que estamos mais perto do caos do que imaginamos.
Os acontecimentos têm sido muito surpreendentes e nos arrastam como uma enxurrada de verão. Mas nunca resolvi a dúvida: os acontecimentos são mesmo tão surpreendentes ou o que mudou foi a nossa capacidade de prever?
Num país onde isso tudo acontece e o ministro da Justiça pede demissão para se preparar para uma sabatina no Senado, realmente, vivemos em múltiplas realidades paralelas.
Recebi uma mensagem assim: momento estranho que vivemos aqui e no mundo. Respondi: é preciso recuperar a racionalidade, não completamente, porque um pouco de loucura sempre tem o seu lugar.
Nos últimos tempos, as proporções estão invertidas: a balança pendeu para a loucura.
No Congresso, Lava Jato é crime que compensa
Vai começar tudo de novo. Num instante em que Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara, aguarda na fila por sua primeira condenação na Lava Jato, Rodrigo Maia, que acaba de ser reeleito presidente da Câmara, foi formalmente acomodado pela Polícia Federal no rol dos suspeitos. Em relatório enviado ao Supremo Tribunal Federal, a PF diz ter reunido indícios de que Rodrigo Maia recebeu propinas da construtora OAS. Coisa de R$ 1 milhão. O deputado nega que se trate de propina.
Rodrigo Maia logo será alvejado por um pedido de abertura de inquérito, a ser enviado ao Supremo pela Procuradoria-Geral da República. Terá a oportunidade de se defender. Mas é curioso notar o seguinte: há na Câmara 513 deputados federais. E esse colegiado enorme decidiu manter na poltrona de presidente um deputado que todos sabiam que se tornaria protagonista de processos judiciais.
Prolifera no Congresso um fenômeno curioso. Além de Rodrigo Maia, são delatados, indiciados ou investigados na Lava Jato: o novo presidente do Senado, Eunício Oliveira; o novo líder do PMDB, Renan Calheiros; a nova líder do PT, Gleisi Hoffmann; o novo líder do governo no Congresso, Romero Jucá; e o novo presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Edison Lobão.
No Brasil real, se o sujeito deixa de pagar um crediário, fica com o nome sujo na praça. E não consegue emprego nem de porteiro no serviço público. Mas no Congresso, quanto mais encrencado for o personagem, maior o seu prestígio. Dizem que o crime não compensa. Bobagem. O problema é que quando ele compensa, muda de nome. Chama-se influência política.
Um país sem governo
O país está exasperado. Cada classe social e cada indivíduo levam ao máximo o limite de sua indignação e tentam, por todos os meios a seu dispor, adotar iniciativas exageradas, diante do horror que surge diante de seus direitos e prerrogativas. Combate-se fogo com fogo, coisa que pode não dar certo.
Saber quem tem razão sobre quem nasceu primeiro, se o ovo ou a galinha, fica por conta dos filósofos, mas, para o conjunto da sociedade, trata-se de um mergulho no precipício.
Tomara que os juízes de primeira instância deixem de entusiasmar-se pela letra da lei e se acoplem à natureza das coisas. Um deles acaba de tornar nula a nomeação de um ministro por um presidente da República, acusado de atingir objetivos espúrios com a natural designação de suas prerrogativas? Tinha ou não o presidente Michel Temer direito de nomear Moreira Franco seu secretário da Presidência? Como um juiz de primeira instância poderia anular a nomeação com base em simples analogia com um episódio verificado entre Dilma Rousseff e o Lula, em torno da chefia da Casa Civil?
São variados os casos em que juízes novatos se precipitam, impulsionados pela intenção de salvar o país ou sem experiência nos fatos, mais do que na jurisprudência.
Mesmo assim, o fenômeno deve-se ao tempo em que vivemos. É corrupção para todos os lados, aproveitamento de agentes públicos em favor de seus próprios interesses e, acima de tudo, descrença da opinião pública diante de nossas instituições.
Tirar dos que nada tem, em favor dos que tem tudo, passou a diretriz fundamental dos detentores do poder. As consequências já se fazem sentir. Sem polícia, a população começa a defender-se. Sem justiça, melhor a Lei do Talião. Sem governo, a opção de cada um defender-se como puder.
Saber quem tem razão sobre quem nasceu primeiro, se o ovo ou a galinha, fica por conta dos filósofos, mas, para o conjunto da sociedade, trata-se de um mergulho no precipício.
Tomara que os juízes de primeira instância deixem de entusiasmar-se pela letra da lei e se acoplem à natureza das coisas. Um deles acaba de tornar nula a nomeação de um ministro por um presidente da República, acusado de atingir objetivos espúrios com a natural designação de suas prerrogativas? Tinha ou não o presidente Michel Temer direito de nomear Moreira Franco seu secretário da Presidência? Como um juiz de primeira instância poderia anular a nomeação com base em simples analogia com um episódio verificado entre Dilma Rousseff e o Lula, em torno da chefia da Casa Civil?
Mesmo assim, o fenômeno deve-se ao tempo em que vivemos. É corrupção para todos os lados, aproveitamento de agentes públicos em favor de seus próprios interesses e, acima de tudo, descrença da opinião pública diante de nossas instituições.
Tirar dos que nada tem, em favor dos que tem tudo, passou a diretriz fundamental dos detentores do poder. As consequências já se fazem sentir. Sem polícia, a população começa a defender-se. Sem justiça, melhor a Lei do Talião. Sem governo, a opção de cada um defender-se como puder.
A glória de ser medíocre
Cada vez mais gostamos de ser medíocres no Brasil. Sofremos uma absurda atração pela cultura da mediocridade e a elevamos a objetivo nacional. Estamos conseguindo, e com que brilho! Caminhamos para a liderança mundial em muitos quesitos. Consulte os índices de qualidade de vida, de desenvolvimento humano, de educação, de violência, de saúde pública, de saneamento, de habitação. Percorra nossas estradas, nossos portos e aeroportos, nossas escolas. Visite os estádios superfaturados e abandonados neste país que ainda usa o futebol como ópio do povo.
A atração fatal pela mediocridade se espalha em todos os níveis da sociedade. Alguns exemplos: quem acha que nosso Congresso é composto por mentes brilhantes? Quem acha que pessoas capazes ocupam nossos ministérios? Como Eike Batista chegou tão longe e acabou em Bangu? Seria apenas pela aliança com um governador que levou 16 milhões de dólares dele para o exterior? Por que tantos turistas compulsórios visitam Curitiba tendo a PF como cicerone? Onde foi que um presidente afirmou que nunca tinha lido um livro – e não lhe fez falta? Por que tantos?
Se você acha que a cultura da mediocridade para aí, está enganado. Escute com atenção as músicas que fizeram maior sucesso em 2016, curta a riqueza das letras e das melodias, encante-se com a mesmice e o ridículo. Veja um programa na televisão, desses que arrancam dinheiro do espectador a cada minuto, eleve-se ao nível da danação intelectual ou caia no fundo do poço da exploração humana. Sintonize a grade das tvs abertas e delicie-se com o vazio que elas nos impingem travestido de entretenimento. Leia também os best-sellers, mergulhe na profundidade de suas páginas, repare quanta sabedoria eles lhe trazem, quanta novidade divulgam, quanta sede de escrever diários de bananas eles propagam. Não se esqueça de ver os filmes nacionais de maior bilheteria: como são inteligentes, criativos, nem um pouco machistas e, cá entre nós, que humor. Que humor requintado! Gaste oito ou dez horas por dia, como nossos jovens, enfrentando os games e seus inspiradores combates, ache-se mais esperto, mais genial, com neurônios mais rápidos, longe da alienação e do vício.
Observe bem as propagandas nas mídias, admire os estereótipos tão maravilhosamente engendrados pelas mentes sedutoras das agências, tão sedutoras que a crise passa longe dos produtos que anunciam. Mergulhe de cabeça nos posts inovadores do Facebook ou nas mensagens do “zapzap” e sinta-se pronto para conquistar o Vale do Silício, depois do implante de um cilício mental.
A lista não tem fim. Estamos conseguindo, a passo acelerado, a mediocridade. Viva! Como é bom ser medíocre, a grande mania nacional! Deixemos que outros pensem por nós. O melhor é que a opção pela mediocridade é nossa, o gosto é nosso, as consequências cairão em nossas cabeças. Viva! Quem sabe, em 2018, para coroar o ano, não elegemos o brilhante Donald Trump nosso presidente?
Luís Giffoni
Escola ou presídio?
É exaustiva a leitura diária sobre violência no Brasil e constrangedor o cinismo dos políticos e “gestores”, que insistem em apresentar as mais mirabolantes soluções para contê-la, sem praticar atos efetivos que a minimize.
É plenamente possível reduzi-la, desde que haja seriedade ao enfrentar suas raízes, exigindo um choque de gestão envolvendo União, estados e municípios. Primeiro, contratando professores capacitados e bem remunerados para manter alunos na escola, ministrando-lhes ensinamentos básicos, no ensino fundamental, e propiciando-lhes amadurecimento emocional, através do esporte e de atividades artísticas, desviando-lhes, assim, do acesso exagerado a jogos interativos e programas inapropriados na televisão. Necessário, ainda, horário integral e o fornecimento de cinco refeições diárias. Estariam eles, então, ocupados, dando oportunidade ao desenvolvimento intelecto-físico-emocional para viabilizar a formação de cidadãos conscientes e responsáveis.
No ensino médio, onde a evasão escolar é absurda e crescente, principalmente nas classes sociais menos favorecidas, conveniente aplicar modelo bem-sucedido no Primeiro Mundo, direcionando o aluno para sua área de vocação, técnica, esportiva ou artística. Disciplinas mais complexas seriam apresentadas a todos, porém mais exigidas aos que demonstrassem maior aptidão por elas.
Um adolescente com vocação esportiva, trancafiado em uma sala de aula, sem praticar a atividade que o seduz, jamais permanecerá na escola.
Crueldade equivalente é impor a quem tem facilidade para idiomas e/ou atividades artísticas conviver com os caminhos da Aritmética. Ary Quintela sempre foi prazer para poucos!
O embrião dessa ideia, salvo melhor juízo, germinou com o professor Darcy Ribeiro, que idealizou os Cieps, os quais foram objeto de exploração por empresários e políticos maledicentes, erradicando aquele ideal de atrair crianças e adolescentes para uma vida saudável e com esperança.
Nesses espaços, digo eu, seriam oferecidos, ainda, serviços médicos, odontológicos, sociais, psicológicos e de orientação jurídica para alunos e responsáveis. Manter crianças e adolescentes na escola é um bom começo para vislumbrar seu afastamento do presídio.
Tais medidas são um início. Porém, imperioso imprimir outras que, a médio e longo prazo, revolucionariam a nação, atingindo todas as classes sociais, pois crianças saudáveis, com boa formação e amadurecimento emocional, tornam-se adultos propensos a gerirem eficazmente suas próprias vidas, gerando riquezas lícitas e constituindo famílias saudáveis, com menos ônus para o Estado, até por conta de um natural controle da natalidade, acarretando na desoneração de programas como Bolsa Família e Fome Zero.
As políticas públicas que vivenciamos hoje criam um círculo vicioso, na medida em que vêm desacompanhadas de mudanças estruturais necessárias para que os benefícios atendam toda a coletividade.
Crianças crescendo nas condições subumanas, como se tem visto por todos os recantos do país, se constitui inaceitável violação a direito humano fundamental e convite para a criminalidade.
Os prisioneiros de hoje não são o futuro do amanhã, mas as crianças e adolescentes de hoje merecem a chance de um futuro longe do presídio. Já tarda a decisão: escola ou presídio?
Que Deus nos proteja, ilumine políticos e gestores a agirem, e que a imprensa não os deixe esquecer suas responsabilidades, sendo imperioso que a sociedade cobre, diuturnamente, para haver esperança de um futuro menos sombrio.
Benedicto Abicair
É plenamente possível reduzi-la, desde que haja seriedade ao enfrentar suas raízes, exigindo um choque de gestão envolvendo União, estados e municípios. Primeiro, contratando professores capacitados e bem remunerados para manter alunos na escola, ministrando-lhes ensinamentos básicos, no ensino fundamental, e propiciando-lhes amadurecimento emocional, através do esporte e de atividades artísticas, desviando-lhes, assim, do acesso exagerado a jogos interativos e programas inapropriados na televisão. Necessário, ainda, horário integral e o fornecimento de cinco refeições diárias. Estariam eles, então, ocupados, dando oportunidade ao desenvolvimento intelecto-físico-emocional para viabilizar a formação de cidadãos conscientes e responsáveis.
Um adolescente com vocação esportiva, trancafiado em uma sala de aula, sem praticar a atividade que o seduz, jamais permanecerá na escola.
Crueldade equivalente é impor a quem tem facilidade para idiomas e/ou atividades artísticas conviver com os caminhos da Aritmética. Ary Quintela sempre foi prazer para poucos!
O embrião dessa ideia, salvo melhor juízo, germinou com o professor Darcy Ribeiro, que idealizou os Cieps, os quais foram objeto de exploração por empresários e políticos maledicentes, erradicando aquele ideal de atrair crianças e adolescentes para uma vida saudável e com esperança.
Nesses espaços, digo eu, seriam oferecidos, ainda, serviços médicos, odontológicos, sociais, psicológicos e de orientação jurídica para alunos e responsáveis. Manter crianças e adolescentes na escola é um bom começo para vislumbrar seu afastamento do presídio.
Tais medidas são um início. Porém, imperioso imprimir outras que, a médio e longo prazo, revolucionariam a nação, atingindo todas as classes sociais, pois crianças saudáveis, com boa formação e amadurecimento emocional, tornam-se adultos propensos a gerirem eficazmente suas próprias vidas, gerando riquezas lícitas e constituindo famílias saudáveis, com menos ônus para o Estado, até por conta de um natural controle da natalidade, acarretando na desoneração de programas como Bolsa Família e Fome Zero.
As políticas públicas que vivenciamos hoje criam um círculo vicioso, na medida em que vêm desacompanhadas de mudanças estruturais necessárias para que os benefícios atendam toda a coletividade.
Crianças crescendo nas condições subumanas, como se tem visto por todos os recantos do país, se constitui inaceitável violação a direito humano fundamental e convite para a criminalidade.
Os prisioneiros de hoje não são o futuro do amanhã, mas as crianças e adolescentes de hoje merecem a chance de um futuro longe do presídio. Já tarda a decisão: escola ou presídio?
Que Deus nos proteja, ilumine políticos e gestores a agirem, e que a imprensa não os deixe esquecer suas responsabilidades, sendo imperioso que a sociedade cobre, diuturnamente, para haver esperança de um futuro menos sombrio.
Benedicto Abicair
Temer não quer. Mas talvez se veja obrigado a intervir no Rio
Se depender do governo do presidente Michel Temer, não haverá intervenção federal no Rio de Janeiro. Primeiro porque ainda não há razões para isso. Depois porque Temer sequer cogita em arranjar mais um problema para lhe atanazar a vida – bastam os que Dilma lhe deixou.
Mas Temer acompanha com crescente preocupação o agravamento da situação do Rio e troca ideias a respeito diariamente com seus principais ministros – do Gabinete Institucional, da Defesa, da Fazenda e da Casa Civil. Daí também sua pressa para escolher o novo ministro da Justiça.
Se a intervenção se tornar inevitável, Temer sacará da gaveta pelo menos dois planos que estão sendo aperfeiçoados. Um de caráter econômico. Outro que contempla as medidas emergenciais de segurança a serem tomadas. Esse é o que está mais adiantado.
Os militares não dormem em serviço – jamais dormiram. Melhor que tivessem dormido em certas ocasiões... Eles têm montados cenários para tudo. E já estudaram a fundo como deverão operar no Rio caso o governo estadual não consiga mais dar conta do serviço.
O Rio atravessa a crise mais séria de sua história recente. Do ponto de vista financeiro, quebrou. Do ponto de vista da segurança pública, nunca foi tãos vulnerável. Do ponto de vista político, seus líderes mais conhecidos estão presos ou ameaçados de ser.
Até onde a vista alcança, Cabral não sairá da cadeia – a não ser quando tiver cumprido parte da pena que lhe for reservada. Eduardo Cunha poderá ser solto. A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal pretende soltá-lo. Mas cadê coragem para tal? Por ora não há. E nada mudaria.
O governador Pezão e seu vice, Francisco Dornelles, foram cassados pelo Tribunal Regional Eleitoral. A cassação será derrubada. Mas enquanto não for o desgaste deles continuará ladeira a cima. Pezão está enrolado com a Lava Jato – e ainda se enrolará mais quando vierem à luz novas delações.
Se a Assembleia Legislativa rejeitar o que Pezão pediu para enfrentar a falência do Estado, como ele conseguirá seguir governando? Será uma espécie de deposição branca, um impeachment não declarado, que poderá dar vez a um impeachment a ser chamado por esse nome.
Por sua idade avançada, o vice de Pezão teria dificuldades de substitui-lo. O presidente da Assembleia, o segundo na linha direta da sucessão, é a figurinha carimbada conhecida, alvo de denúncias cabeludas, e também da curiosidade inesgotável da Lava Jato.
O presidente da Câmara dos Deputados é do Rio, um legítimo carioca. Alcançado, porém, por suspeitas de mau comportamento. Assim como Eduardo Paes, ex-prefeito da capital. Quem sobraria para falar pelo Rio neste momento? A quem os cariocas dariam ouvidos?
Estamos diante de um impasse. Ou de um “ímpasse” – como nos anos 50 do século passado. em Fortaleza, um vereador se referiu a um impasse sem solução. Triste Rio!
Mas Temer acompanha com crescente preocupação o agravamento da situação do Rio e troca ideias a respeito diariamente com seus principais ministros – do Gabinete Institucional, da Defesa, da Fazenda e da Casa Civil. Daí também sua pressa para escolher o novo ministro da Justiça.
Se a intervenção se tornar inevitável, Temer sacará da gaveta pelo menos dois planos que estão sendo aperfeiçoados. Um de caráter econômico. Outro que contempla as medidas emergenciais de segurança a serem tomadas. Esse é o que está mais adiantado.
O Rio atravessa a crise mais séria de sua história recente. Do ponto de vista financeiro, quebrou. Do ponto de vista da segurança pública, nunca foi tãos vulnerável. Do ponto de vista político, seus líderes mais conhecidos estão presos ou ameaçados de ser.
Até onde a vista alcança, Cabral não sairá da cadeia – a não ser quando tiver cumprido parte da pena que lhe for reservada. Eduardo Cunha poderá ser solto. A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal pretende soltá-lo. Mas cadê coragem para tal? Por ora não há. E nada mudaria.
O governador Pezão e seu vice, Francisco Dornelles, foram cassados pelo Tribunal Regional Eleitoral. A cassação será derrubada. Mas enquanto não for o desgaste deles continuará ladeira a cima. Pezão está enrolado com a Lava Jato – e ainda se enrolará mais quando vierem à luz novas delações.
Se a Assembleia Legislativa rejeitar o que Pezão pediu para enfrentar a falência do Estado, como ele conseguirá seguir governando? Será uma espécie de deposição branca, um impeachment não declarado, que poderá dar vez a um impeachment a ser chamado por esse nome.
Por sua idade avançada, o vice de Pezão teria dificuldades de substitui-lo. O presidente da Assembleia, o segundo na linha direta da sucessão, é a figurinha carimbada conhecida, alvo de denúncias cabeludas, e também da curiosidade inesgotável da Lava Jato.
O presidente da Câmara dos Deputados é do Rio, um legítimo carioca. Alcançado, porém, por suspeitas de mau comportamento. Assim como Eduardo Paes, ex-prefeito da capital. Quem sobraria para falar pelo Rio neste momento? A quem os cariocas dariam ouvidos?
Estamos diante de um impasse. Ou de um “ímpasse” – como nos anos 50 do século passado. em Fortaleza, um vereador se referiu a um impasse sem solução. Triste Rio!
Assim já é demais
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado virou uma espécie de bunker dos políticos enrolados na Operação Lava-Jato. Dos seus 27 titulares e 27 suplentes, 10 são investigados no escândalo da Petrobras e brigaram por uma vaga na mais poderosa comissão da Casa, que tem, entre as tarefas mais importantes, a atribuição de sabatinar os indicados pelo presidente da República para compor o Supremo Tribunal Federal (STF), caso agora do ministro da Justiça licenciado, Alexandre de Moraes.
Nada mais emblemático da situação do que a indicação do senador Edison Lobão (PMDB-MA) para presidir a CCJ, pelo líder da bancada do PMDB, Renan Calheiros (PMDB-AL), ele próprio na mira da força-tarefa da Lava-Jato. Questionado quanto a isso, Lobão não precisou de óleo de peroba para dar entrevista e dizer que acha a coisa mais natural ser investigado pela força-tarefa. Ex-ministro de Minas e Energia do governo Dilma Rousseff, Lobão já foi citado em delações premiadas. É investigado no âmbito da Lava-Jato por irregularidades na Eletrobras. O senador nega envolvimento no esquema de corrupção.
Segundo o dono da construtora UTC, Ricardo Pessoa, em troca de ingerência política em favor dos interesses do consórcio responsável pelas obras de Angra 3, Lobão teria recebido R$ 1 milhão em propina. O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa afirmou também que senador teria recebido R$ 1 milhão em dinheiro desviado da estatal, mas esse processo foi arquivado no STF. Questionado nesta quarta-feira sobre se sentir “constrangido” em ser investigado e, ao mesmo tempo, presidir a CCJ, Lobão respondeu: “A investigação não deve causar constrangimento a ninguém. É uma forma, inclusive, de o alegado poder demonstrar que não é responsável por tais alegações caluniosas. É o que aconteceu com dois inquéritos que foram arquivados”.
Só faltou Lobão cantar um velho samba de Nélson Sargento, eternizado na voz de Clementina de Jesus: “Assim também já é demais/ eu não consigo viver em paz/ ainda existe um porém/ por que, meu bem/ não me meto na vida de ninguém/ fazem de mim papel reclame/ sem pensar no vexame que me possa ferir/ ó Deus, castigais os infames/ que falam da vida dos outros por aí”. Mesmo que haja uma articulação entre senadores insatisfeitos para eleger outro senador, será difícil impedir a eleição de Lobão.
O ex-ministro de Minas e Energia de Dilma Rousseff conta com a solidariedade de outros investigados, todos cardeais do Senado: Jader Barbalho (PMDB-PA), Valdir Raupp (PMDB-RO), Benedito de Lira (PP-AL) e Lindbergh Farias (PT-RJ). O time de suplentes também é da pesada: Romero Jucá (PMDB-RR), Renan Calheiros (PMDB-AL), Fernando Collor (PTC-AL), Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Humberto Costa (PT-PE).
A CCJ tem muito poder, um senador sozinho pode infernizar a vida do governo, basta pedir vista de uma matéria, atravessar uma emenda marota ou votar contra a aprovação de um indicado para uma agência reguladora ou mesmo uma embaixada do Brasil no chamado “Circuito Elizabeth Arden” (Roma, Paris, Londres e Washington), menção à ex-enfermeira que começou criando cremes para queimaduras e se tornou mundialmente famosa por seus produtos de beleza.
O Artigo 101 do regimento Interno do Senado lhe dá superpoderes: “Opinar sobre a constitucionalidade, juridicidade e regimentalidade das matérias que lhe forem submetidas por deliberação do plenário, por despacho da Presidência, por consulta de qualquer comissão, ou, quando em virtude desses aspectos, houver recurso de decisão terminativa de comissão para o plenário”. A CCJ emite parecer quanto ao mérito, por exemplo, do estado de defesa, do estado de sítio e da intervenção federal; de requisições civis e da anistia; da perda de mandato de senador; e sobre a escolha de ministros do Supremo Tribunal Federal, dos tribunais superiores e de governador de território; além disso, delibera sobre a escolha e destituição do procurador-geral da República. Suas decisões unânimes quanto ao arquivamento de matérias são definitivas.
A indicação de Lobão é parte de uma resistência encarniçada à Operação Lava-Jato que se articula no Senado, a partir do grupo historicamente ligado ao ex-presidente José Sarney. Denunciado na segunda-feira pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, mesmo sem mandato, o ex-presidente da República articulou a indicação. Estrategista e grande articulador, quem encabeça a reação à força-tarefa da Operação Lava-Jato é o líder do PMDB, Renan Calheiros. Sem seu apoio, Alexandre de Moraes jamais será ministro do Supremo; ou qualquer outro que fosse indicado, como já aconteceu, por exemplo, com o novo relator da Operação Lava-Jato, ministro Édson Fachin. Quem quiser que se iluda quanto a isso. Somente um político tem mais poder do que Renan no Senado, seu novo presidente, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), que também faz parte do grupo.
Nada mais emblemático da situação do que a indicação do senador Edison Lobão (PMDB-MA) para presidir a CCJ, pelo líder da bancada do PMDB, Renan Calheiros (PMDB-AL), ele próprio na mira da força-tarefa da Lava-Jato. Questionado quanto a isso, Lobão não precisou de óleo de peroba para dar entrevista e dizer que acha a coisa mais natural ser investigado pela força-tarefa. Ex-ministro de Minas e Energia do governo Dilma Rousseff, Lobão já foi citado em delações premiadas. É investigado no âmbito da Lava-Jato por irregularidades na Eletrobras. O senador nega envolvimento no esquema de corrupção.
Só faltou Lobão cantar um velho samba de Nélson Sargento, eternizado na voz de Clementina de Jesus: “Assim também já é demais/ eu não consigo viver em paz/ ainda existe um porém/ por que, meu bem/ não me meto na vida de ninguém/ fazem de mim papel reclame/ sem pensar no vexame que me possa ferir/ ó Deus, castigais os infames/ que falam da vida dos outros por aí”. Mesmo que haja uma articulação entre senadores insatisfeitos para eleger outro senador, será difícil impedir a eleição de Lobão.
O ex-ministro de Minas e Energia de Dilma Rousseff conta com a solidariedade de outros investigados, todos cardeais do Senado: Jader Barbalho (PMDB-PA), Valdir Raupp (PMDB-RO), Benedito de Lira (PP-AL) e Lindbergh Farias (PT-RJ). O time de suplentes também é da pesada: Romero Jucá (PMDB-RR), Renan Calheiros (PMDB-AL), Fernando Collor (PTC-AL), Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Humberto Costa (PT-PE).
A CCJ tem muito poder, um senador sozinho pode infernizar a vida do governo, basta pedir vista de uma matéria, atravessar uma emenda marota ou votar contra a aprovação de um indicado para uma agência reguladora ou mesmo uma embaixada do Brasil no chamado “Circuito Elizabeth Arden” (Roma, Paris, Londres e Washington), menção à ex-enfermeira que começou criando cremes para queimaduras e se tornou mundialmente famosa por seus produtos de beleza.
O Artigo 101 do regimento Interno do Senado lhe dá superpoderes: “Opinar sobre a constitucionalidade, juridicidade e regimentalidade das matérias que lhe forem submetidas por deliberação do plenário, por despacho da Presidência, por consulta de qualquer comissão, ou, quando em virtude desses aspectos, houver recurso de decisão terminativa de comissão para o plenário”. A CCJ emite parecer quanto ao mérito, por exemplo, do estado de defesa, do estado de sítio e da intervenção federal; de requisições civis e da anistia; da perda de mandato de senador; e sobre a escolha de ministros do Supremo Tribunal Federal, dos tribunais superiores e de governador de território; além disso, delibera sobre a escolha e destituição do procurador-geral da República. Suas decisões unânimes quanto ao arquivamento de matérias são definitivas.
A indicação de Lobão é parte de uma resistência encarniçada à Operação Lava-Jato que se articula no Senado, a partir do grupo historicamente ligado ao ex-presidente José Sarney. Denunciado na segunda-feira pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, mesmo sem mandato, o ex-presidente da República articulou a indicação. Estrategista e grande articulador, quem encabeça a reação à força-tarefa da Operação Lava-Jato é o líder do PMDB, Renan Calheiros. Sem seu apoio, Alexandre de Moraes jamais será ministro do Supremo; ou qualquer outro que fosse indicado, como já aconteceu, por exemplo, com o novo relator da Operação Lava-Jato, ministro Édson Fachin. Quem quiser que se iluda quanto a isso. Somente um político tem mais poder do que Renan no Senado, seu novo presidente, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), que também faz parte do grupo.
Quem pagará pelo prejuízo?
Quem tenha o hábito de ler – e com atenção – o noticiário de jornais ao fim do dia certamente se sentirá cansado, perplexo com a capacidade humana de complicar e complexificar a vida, de torná-la aflitiva, perigosa mesmo, submetida a ações de terceiros que causam prejuízos graves ao próximo, por intermédio do poder público ou diretamente. Podem ser também ações ilegais de poderosos que com frequência desprezam direitos de cidadãos comuns – e a maior parte disso parece decorrer do desprezo mais amplo pelos direitos do próximo, encarados com sorrisos na boca, como se não existissem. Pelo outro lado surpreende a ingenuidade real ou simulada das vítimas.
Pode-se começar, por exemplo, por um caso de Sinop, em Mato Grosso, onde polícia e Justiça Federal proibiram que o ex-gerente do Ibama continuasse a fornecer (www/mpfpa, 3/2) informações privilegiadas a um grupo de pessoas para que as utilizassem em processos que resultariam no “maior desmatamento já detectado na Amazônia” (www/mpf,mp 3/2/2007) – e com a ajuda de funcionários públicos.
Será que os condenados não sabiam que se tratava de patrimônio público, tão valioso que está inscrito até na Constituição da República? Com que se surpreenderam os leitores de jornais? O esquema – segundo publicado – conseguiu movimentar R$ 1,92 bilhão, na derrubada em Altamira de 320 quilômetros quadrados de Floresta Amazônica entre 2012 e 2015 – uma área equivalente aos municípios de Belo Horizonte ou Recife. Ninguém sabia de que se tratava, nenhuma advertência, nenhum cartaz, nenhuma placa, nenhuma fiscalização humana, nada? Ninguém, fiscal ou não, notou que havia ali trabalhadores em condições de escravos, operários sem receber direitos? Que havia ali pessoas provocando incêndios? E evidência de corrupção ativa e passiva, formação de organização criminosa, improbidade administrativa, responsabilidade por danos ambientais?
Agora, entre as várias recomendações feitas aos investigadores dos negócios de carne bovina no episódio, está a de analisar transações entre alguns dos maiores negociadores do produto, incluído o Grupo JBS, o maior processador de carne bovina no mundo.
Em outro episódio próximo no tempo, o governo de Minas Gerais decidiu ([BOLD]Estado[/BOLD], 4/2) “alterar as regras de licenciamento ambiental no Estado, com o propósito de eliminar o grande passivo de autorizações que passou a acumular”. Como o governo federal não consegue chegar a um consenso para emplacar no Congresso Nacional a nova proposta de Lei Geral de Licenciamento, o Estado “fez mudanças profundas em seu processo no ambiente”. E, pior, fez, “por sua conta e risco” (4/2), com consequências indesejáveis.
Como assinalou este jornal, há duas semanas um decreto estadual passou a permitir que um empreendimento obtenha, de uma só vez, a construção liberada automaticamente – a licença prévia e a licença de instalação. Se o impacto e o risco associados ao projeto não forem tão altos – observa André Borges, autor do texto –, poderá até receber a licença de operação, com os três documentos entregues em uma única fase. O grupo de desmatadores recebia também informação privilegiada a respeito das fiscalizações e atuava para livrar-se, de acordo com esses alertas.
Em outro processo o Ministério Público denunciou mais quatro desmatadores por ações desse tipo e corrupção. Tratores, correntões e combustível foram apreendidos pela fiscalização numa empresa que trabalhava para o mesmo grupo, sem sequer ser registrada pela fiscalização.
Não é indispensável que haja fraude ou desonestidade de agentes em episódios que volta e meia são objeto de denúncias ou desconfianças, como, por exemplo, no setor da reforma agrária, em que mais de 1 milhão de famílias vivem em 9.332 assentamentos espalhados pelo País – e a agricultura familiar responde por quase 38% do valor bruto da produção agropecuária, mantém 74,4% dos postos de trabalho no meio rural e produz quase metade dos alimentos da cesta básica.
Os acontecimentos nesse setor, portanto, vão refletir diretamente na alimentação dos setores de menor renda, aquele milhão de famílias, fora os consumidores. O problema pode estar em desídia ou incompetência de agentes públicos. Por isso é preciso saber por que o governo federal anterior deixou de promover a regularização fundiária nos 12 anos (2003 a 2015) em que entregou apenas 22.729 títulos. Como seria possível fazer reforma agrária com esses recursos – ínfimos, diante da extensão das necessidades? Agora se afirma que com alterações nessas leis de reforma agrária serão emitidos 750 mil títulos de propriedade (diz o engenheiro agrônomo José Ricardo R. Roseno, secretário especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário).
É esperar para ver – de olhos bem abertos para a notícia recente deste jornal de que quase metade dos imóveis destinados ao público mais carente do programa Minha Casa, Minha Vida, construídos entre 2011 e 2014 e com subsídios de até 90%, apresentam algum problema ou incompatibilidade em relação ao projeto, identificados pela fiscalização do Ministério da Transparência. Os imóveis, hoje habitados em mais de dez Estados por famílias que ganham até R$ 1,8 mil, exigiram investimento de R$ 8,3 bilhões. O ministério deu prazo de 180 dias para que as falhas sejam resolvidas. Mas quem pagará pelos custos? E a quem eles são devidos?
Esse é também um dos mecanismos – pouco observados e reprimidos – da concentração de renda no País. As pessoas já menos favorecidas não recebem sequer tudo aquilo a que deveriam ter direito ou pelo que pagaram. E o poder público tem de completar, sacrificando direitos de outros, estranhos, que nada têm que ver com o episódio.
Pode-se começar, por exemplo, por um caso de Sinop, em Mato Grosso, onde polícia e Justiça Federal proibiram que o ex-gerente do Ibama continuasse a fornecer (www/mpfpa, 3/2) informações privilegiadas a um grupo de pessoas para que as utilizassem em processos que resultariam no “maior desmatamento já detectado na Amazônia” (www/mpf,mp 3/2/2007) – e com a ajuda de funcionários públicos.
Agora, entre as várias recomendações feitas aos investigadores dos negócios de carne bovina no episódio, está a de analisar transações entre alguns dos maiores negociadores do produto, incluído o Grupo JBS, o maior processador de carne bovina no mundo.
Em outro episódio próximo no tempo, o governo de Minas Gerais decidiu ([BOLD]Estado[/BOLD], 4/2) “alterar as regras de licenciamento ambiental no Estado, com o propósito de eliminar o grande passivo de autorizações que passou a acumular”. Como o governo federal não consegue chegar a um consenso para emplacar no Congresso Nacional a nova proposta de Lei Geral de Licenciamento, o Estado “fez mudanças profundas em seu processo no ambiente”. E, pior, fez, “por sua conta e risco” (4/2), com consequências indesejáveis.
Como assinalou este jornal, há duas semanas um decreto estadual passou a permitir que um empreendimento obtenha, de uma só vez, a construção liberada automaticamente – a licença prévia e a licença de instalação. Se o impacto e o risco associados ao projeto não forem tão altos – observa André Borges, autor do texto –, poderá até receber a licença de operação, com os três documentos entregues em uma única fase. O grupo de desmatadores recebia também informação privilegiada a respeito das fiscalizações e atuava para livrar-se, de acordo com esses alertas.
Em outro processo o Ministério Público denunciou mais quatro desmatadores por ações desse tipo e corrupção. Tratores, correntões e combustível foram apreendidos pela fiscalização numa empresa que trabalhava para o mesmo grupo, sem sequer ser registrada pela fiscalização.
Não é indispensável que haja fraude ou desonestidade de agentes em episódios que volta e meia são objeto de denúncias ou desconfianças, como, por exemplo, no setor da reforma agrária, em que mais de 1 milhão de famílias vivem em 9.332 assentamentos espalhados pelo País – e a agricultura familiar responde por quase 38% do valor bruto da produção agropecuária, mantém 74,4% dos postos de trabalho no meio rural e produz quase metade dos alimentos da cesta básica.
Os acontecimentos nesse setor, portanto, vão refletir diretamente na alimentação dos setores de menor renda, aquele milhão de famílias, fora os consumidores. O problema pode estar em desídia ou incompetência de agentes públicos. Por isso é preciso saber por que o governo federal anterior deixou de promover a regularização fundiária nos 12 anos (2003 a 2015) em que entregou apenas 22.729 títulos. Como seria possível fazer reforma agrária com esses recursos – ínfimos, diante da extensão das necessidades? Agora se afirma que com alterações nessas leis de reforma agrária serão emitidos 750 mil títulos de propriedade (diz o engenheiro agrônomo José Ricardo R. Roseno, secretário especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário).
É esperar para ver – de olhos bem abertos para a notícia recente deste jornal de que quase metade dos imóveis destinados ao público mais carente do programa Minha Casa, Minha Vida, construídos entre 2011 e 2014 e com subsídios de até 90%, apresentam algum problema ou incompatibilidade em relação ao projeto, identificados pela fiscalização do Ministério da Transparência. Os imóveis, hoje habitados em mais de dez Estados por famílias que ganham até R$ 1,8 mil, exigiram investimento de R$ 8,3 bilhões. O ministério deu prazo de 180 dias para que as falhas sejam resolvidas. Mas quem pagará pelos custos? E a quem eles são devidos?
Esse é também um dos mecanismos – pouco observados e reprimidos – da concentração de renda no País. As pessoas já menos favorecidas não recebem sequer tudo aquilo a que deveriam ter direito ou pelo que pagaram. E o poder público tem de completar, sacrificando direitos de outros, estranhos, que nada têm que ver com o episódio.
Assinar:
Postagens (Atom)