segunda-feira, 10 de outubro de 2016
Não basta ter razão
Não tem cabimento demonizar o populismo, ainda que ele contenha inevitavelmente contradições que podem levá-lo ao impasse. É inegável, porém, que ele parte da constatação de que a sociedade é, sem dúvida alguma, desigual.
Há uma minoria rica, uma classe média de alguns recursos e –particularmente em países com o nosso– uma maioria que vive ao nível da necessidade, mal tendo como sustentar e educar os filhos.
Eleger como objetivo de governo a melhoria das condições de vida dos mais pobres é indiscutivelmente um propósito louvável. Mas não basta ter razão para estar certo.
O problema é que esse populismo é ideológico e, por isso, faz do propósito de ajuda aos mais pobres um projeto de governo. Ao contar com o apoio dessa maioria carente, transforma-se em um modo de permanecer indefinidamente no poder.
Hugo Chávez, por exemplo, chegou a fazer aprovar uma lei que permitiria que ele fosse reeleito indefinidamente pelo resto da vida. Para enganar o povo, inventou um outro que daria à maioria o direito de depor o governante se ele traísse o interesse popular.
Se digo que o populismo latino-americano é ideológico, é que ele surgiu em decorrência da revolução cubana –que provocou um surto de guerrilhas no continente– como alternativa, após o fim dos regimes comunistas em quase todo o mundo.
De qualquer modo, o sonho da revolução proletária se desfez. O populismo troca a luta de operários contra a burguesia pela luta de pobres contra ricos. Assim, se o populismo não se assume comunista, procura em compensação se apresentar como anticapitalista.
Como não nasce de uma revolução que elimina da sociedade a classe capitalista, vale-se do governo para usar os recursos públicos na tarefa de dar casa, comida, escola e outros confortos até então fora de seu alcance, para assim, ao mesmo tempo, conquistar os votos dessa maioria da população.
Mas, para fazer isso, tem que contar com o apoio do capitalismo, como ocorreu na Argentina, na Venezuela e no Brasil.
Essa aliança inevitável compromete, de certo modo, o caráter anticapitalista que o populismo necessita ostentar. Para superar a contradição, é levado a adotar medidas e atitudes que aparentem sua hostilidade ao capitalismo, como dificultar as relações políticas com os norte-americanos e adotar exigências nos contratos com grandes empresas. Isso termina por reduzir –como no caso do Brasil– o comércio exterior e, internamente, leva ao fracasso projetos econômicos que necessitam de capital privado.
Somado isso às despesas com os programas sociais que beneficiam milhões de pessoas, é inevitável que a crise econômica termine por se instalar no país.
Para que se veja com clareza a diferença entre um governo não populista e um governo populista, tomo como exemplo os programas sociais do governo Fernando Henrique Cardoso e o do governo Lula.
FHC criou os programas Bolsa Escola, Bolsa Alimentação e Luz no Campo, que Lula criticou, acusando o presidente do PSDB de estar dando esmola aos trabalhadores e a suas famílias.
Quando assumiu o governo, porém, adotou os mesmos programas, trocando os nomes para Bolsa Família e Luz para Todos, aumentando em vários milhões o número dos beneficiados.
O resultado foi que a fusão dos programas e esse aumento de milhões de pessoas tornaram quase impossível a sua fiscalização, o que induziu muita gente a largar seu emprego para viver da ajuda do governo. Há mesmo exemplo de pequenos municípios em que quase todos vivem do Bolsa Família.
É que o populismo, na melhor das intenções, parte de que o problema da desigualdade social se resolve com o dispêndio do dinheiro público. Trata-se de uma ilusão. Não há mágica capaz de resolver problema tão complexo, do dia para a noite, às custas do Tesouro Nacional.
A solução efetiva desse problema exige que os mais pobres tenham condições efetivas de criarem seus filhos, educá-los e dar-lhes qualificação profissional. E temos que tomar isso a peito, sem demagogia.
Há uma minoria rica, uma classe média de alguns recursos e –particularmente em países com o nosso– uma maioria que vive ao nível da necessidade, mal tendo como sustentar e educar os filhos.
Eleger como objetivo de governo a melhoria das condições de vida dos mais pobres é indiscutivelmente um propósito louvável. Mas não basta ter razão para estar certo.
Hugo Chávez, por exemplo, chegou a fazer aprovar uma lei que permitiria que ele fosse reeleito indefinidamente pelo resto da vida. Para enganar o povo, inventou um outro que daria à maioria o direito de depor o governante se ele traísse o interesse popular.
Se digo que o populismo latino-americano é ideológico, é que ele surgiu em decorrência da revolução cubana –que provocou um surto de guerrilhas no continente– como alternativa, após o fim dos regimes comunistas em quase todo o mundo.
De qualquer modo, o sonho da revolução proletária se desfez. O populismo troca a luta de operários contra a burguesia pela luta de pobres contra ricos. Assim, se o populismo não se assume comunista, procura em compensação se apresentar como anticapitalista.
Como não nasce de uma revolução que elimina da sociedade a classe capitalista, vale-se do governo para usar os recursos públicos na tarefa de dar casa, comida, escola e outros confortos até então fora de seu alcance, para assim, ao mesmo tempo, conquistar os votos dessa maioria da população.
Mas, para fazer isso, tem que contar com o apoio do capitalismo, como ocorreu na Argentina, na Venezuela e no Brasil.
Essa aliança inevitável compromete, de certo modo, o caráter anticapitalista que o populismo necessita ostentar. Para superar a contradição, é levado a adotar medidas e atitudes que aparentem sua hostilidade ao capitalismo, como dificultar as relações políticas com os norte-americanos e adotar exigências nos contratos com grandes empresas. Isso termina por reduzir –como no caso do Brasil– o comércio exterior e, internamente, leva ao fracasso projetos econômicos que necessitam de capital privado.
Somado isso às despesas com os programas sociais que beneficiam milhões de pessoas, é inevitável que a crise econômica termine por se instalar no país.
Para que se veja com clareza a diferença entre um governo não populista e um governo populista, tomo como exemplo os programas sociais do governo Fernando Henrique Cardoso e o do governo Lula.
FHC criou os programas Bolsa Escola, Bolsa Alimentação e Luz no Campo, que Lula criticou, acusando o presidente do PSDB de estar dando esmola aos trabalhadores e a suas famílias.
Quando assumiu o governo, porém, adotou os mesmos programas, trocando os nomes para Bolsa Família e Luz para Todos, aumentando em vários milhões o número dos beneficiados.
O resultado foi que a fusão dos programas e esse aumento de milhões de pessoas tornaram quase impossível a sua fiscalização, o que induziu muita gente a largar seu emprego para viver da ajuda do governo. Há mesmo exemplo de pequenos municípios em que quase todos vivem do Bolsa Família.
É que o populismo, na melhor das intenções, parte de que o problema da desigualdade social se resolve com o dispêndio do dinheiro público. Trata-se de uma ilusão. Não há mágica capaz de resolver problema tão complexo, do dia para a noite, às custas do Tesouro Nacional.
A solução efetiva desse problema exige que os mais pobres tenham condições efetivas de criarem seus filhos, educá-los e dar-lhes qualificação profissional. E temos que tomar isso a peito, sem demagogia.
Nem direita, nem esquerda
Analistas gostam de regras genéricas construídas sob fundamentos já estabelecidos. Tendem a explicar tudo a partir de linhas ideológicas e baseadas em conceitos teóricos definidos. Muitas vezes, talvez até quase sempre, funciona bem. Mas as vezes não.
Explicar resultados de eleição municipal a partir da opção simplesmente ideológica levando em consideração a nacionalização da disputa parece exagerado. Assume que o eleitor não sabe distinguir a função, finalidade e importância de cada nível de governo.
Neste prisma, o eleitor seria ignorante quanto às obrigações e deveres do prefeito. E que, de maneira muito pouco sofisticada, sacrifica os interesses da cidade simplesmente para demonstrar sua posição ideológica nacionalmente. É hipótese difícil de aceitar, convenhamos.
O eleitor mora nas cidades. Sabe perfeitamente que o prefeito tem influencia decisiva no cotidiano dos habitantes do município. Que um bom governante municipal pode significar uma cidade melhor, mais humana. Vida melhor, em resumo.
Talvez se esteja prestando demasiada atenção ao partido ou orientação ideológica do candidato a prefeito. É possível que o eleitor tenha se concentrado nas propostas e ideias e selecionado aquelas que, em sua opinião, possam resultar em melhorias no seu dia a dia.
Neste cenário, o eleitor não seria cidadão preocupado simplesmente em projetar nacionalmente suas preferencias. Seria, isto sim, atento ouvinte de propostas e juiz (rigoroso ou não) de seus méritos.
Muito se diz que o eleitor foi para a direita. Mas talvez, o que tenha acontecido é a percepção de que as agendas dos candidatos de direita sejam respostas mais adequadas (entre as agendas disponíveis, claro) a solução dos problemas encontrados nos municípios.
É visão mais otimista. Possivelmente, o eleitor não tenha escolhido entre esquerda ou direita. Pouco importava. O resultado das eleições mostra a face de um eleitor menos cínico e mais interessado. Desapontado, sim. Mas ao mesmo tempo, sem medo de tentar soluções diferentes.
Diante da inegável e comprovada falência de um conjunto de ideias e pessoas, o eleitor resolveu mudar. Rejeitou a incompetência e os resultados ruins. Não foi nem para a direita nem para a esquerda. Permaneceu onde sempre esteve. Pagou para ver. E preferiu andar para a frente.
Explicar resultados de eleição municipal a partir da opção simplesmente ideológica levando em consideração a nacionalização da disputa parece exagerado. Assume que o eleitor não sabe distinguir a função, finalidade e importância de cada nível de governo.
Neste prisma, o eleitor seria ignorante quanto às obrigações e deveres do prefeito. E que, de maneira muito pouco sofisticada, sacrifica os interesses da cidade simplesmente para demonstrar sua posição ideológica nacionalmente. É hipótese difícil de aceitar, convenhamos.
O eleitor mora nas cidades. Sabe perfeitamente que o prefeito tem influencia decisiva no cotidiano dos habitantes do município. Que um bom governante municipal pode significar uma cidade melhor, mais humana. Vida melhor, em resumo.
Talvez se esteja prestando demasiada atenção ao partido ou orientação ideológica do candidato a prefeito. É possível que o eleitor tenha se concentrado nas propostas e ideias e selecionado aquelas que, em sua opinião, possam resultar em melhorias no seu dia a dia.
Neste cenário, o eleitor não seria cidadão preocupado simplesmente em projetar nacionalmente suas preferencias. Seria, isto sim, atento ouvinte de propostas e juiz (rigoroso ou não) de seus méritos.
Muito se diz que o eleitor foi para a direita. Mas talvez, o que tenha acontecido é a percepção de que as agendas dos candidatos de direita sejam respostas mais adequadas (entre as agendas disponíveis, claro) a solução dos problemas encontrados nos municípios.
É visão mais otimista. Possivelmente, o eleitor não tenha escolhido entre esquerda ou direita. Pouco importava. O resultado das eleições mostra a face de um eleitor menos cínico e mais interessado. Desapontado, sim. Mas ao mesmo tempo, sem medo de tentar soluções diferentes.
Diante da inegável e comprovada falência de um conjunto de ideias e pessoas, o eleitor resolveu mudar. Rejeitou a incompetência e os resultados ruins. Não foi nem para a direita nem para a esquerda. Permaneceu onde sempre esteve. Pagou para ver. E preferiu andar para a frente.
Chororô & Desrazão
A expressão “progressista”, usada para designar de modo genérico forças políticas supostamente “avançadas” (em coordenadas cujo centro seria ocupado por algum socialismo), se cristalizou há tempos em nosso léxico político-partidário.
Mas é muito inadequada. “Progressista” seria o defensor do “progresso” (o que soa esdrúxulo na boca de qualquer ambientalista). Mas não no sentido do desenvolvimento econômico-industrial, que é como o povo a entende. E sim no do avanço político-social, que é como a centro-esquerda e a esquerda a empregam.
Aqui começam já umas confusões. O político de esquerda diz uma coisa e o povo ouve outra. “Progressista”, para as massas, é quem abre estradas, constrói pontes e túneis, implanta ou atrai unidades fabris. Mais para Andreazza e Maluf do que para Jango e Darcy, por exemplo.
Como se não bastasse, vemos os próprios “progressistas” meterem os pés pelas mãos. Constato isso agora nas redes sociais, quando alguns “progressistas”, que também assumem posturas ecológicas, entram em campo para defender a civilização do petróleo e suas consequências ambientalmente catastróficas.
Mais precisamente, para defender o domínio nacional na exploração do pré-sal. E não vejo outro caminho senão perguntar: afinal, com que tipo de personagem estamos lidando? Com o militante progressista eco-petrolífero?
Ecologistas, em princípio, deveriam defender com unhas e dentes (ou de corpo e alma, se preferirem) a preservação e ampliação de uma matriz energética limpa no Brasil. E não o mergulho nacional na produção de petróleo. Na intensificação da geração de energia suja. No caminho dos crimes ambientais que comprometem a biosfera.
Ainda nas redes sociais, vejo “progressistas” repetindo “ipsis litteris” afirmações que condenavam com veemência há pouco tempo atrás. Aqui, refiro-me ao chororô generalizado com as derrotas eleitorais deste mês de outubro. Especialmente, a de Fernando Haddad em São Paulo.
Falam coisas absurdamente preconceituosas com relação a isso. De “brasileiro não sabe votar” a “o pior tipo de gente é pobre que vota em rico”, entre outras pedradas.
Fico me lembrando de que esta mesmíssima espécie progressista quis sacrificar Pelé em praça pública, algumas décadas atrás, pelo fato de ele ter dito, numa entrevista, que o povo não sabia votar.
E é justamente isso o que ouço agora na boca de seus adversários. Pelo visto, também para os “progressistas” a tal da “vontade do povo” só vale, só é soberana, se for a favor deles.
Mas é muito inadequada. “Progressista” seria o defensor do “progresso” (o que soa esdrúxulo na boca de qualquer ambientalista). Mas não no sentido do desenvolvimento econômico-industrial, que é como o povo a entende. E sim no do avanço político-social, que é como a centro-esquerda e a esquerda a empregam.
Aqui começam já umas confusões. O político de esquerda diz uma coisa e o povo ouve outra. “Progressista”, para as massas, é quem abre estradas, constrói pontes e túneis, implanta ou atrai unidades fabris. Mais para Andreazza e Maluf do que para Jango e Darcy, por exemplo.
Como se não bastasse, vemos os próprios “progressistas” meterem os pés pelas mãos. Constato isso agora nas redes sociais, quando alguns “progressistas”, que também assumem posturas ecológicas, entram em campo para defender a civilização do petróleo e suas consequências ambientalmente catastróficas.
Mais precisamente, para defender o domínio nacional na exploração do pré-sal. E não vejo outro caminho senão perguntar: afinal, com que tipo de personagem estamos lidando? Com o militante progressista eco-petrolífero?
Ecologistas, em princípio, deveriam defender com unhas e dentes (ou de corpo e alma, se preferirem) a preservação e ampliação de uma matriz energética limpa no Brasil. E não o mergulho nacional na produção de petróleo. Na intensificação da geração de energia suja. No caminho dos crimes ambientais que comprometem a biosfera.
Ainda nas redes sociais, vejo “progressistas” repetindo “ipsis litteris” afirmações que condenavam com veemência há pouco tempo atrás. Aqui, refiro-me ao chororô generalizado com as derrotas eleitorais deste mês de outubro. Especialmente, a de Fernando Haddad em São Paulo.
Falam coisas absurdamente preconceituosas com relação a isso. De “brasileiro não sabe votar” a “o pior tipo de gente é pobre que vota em rico”, entre outras pedradas.
Fico me lembrando de que esta mesmíssima espécie progressista quis sacrificar Pelé em praça pública, algumas décadas atrás, pelo fato de ele ter dito, numa entrevista, que o povo não sabia votar.
E é justamente isso o que ouço agora na boca de seus adversários. Pelo visto, também para os “progressistas” a tal da “vontade do povo” só vale, só é soberana, se for a favor deles.
Cena de amor para todas as idades
"
"Bella Notte", do clássico do desenho animado
"A dama e o vagabundo!, de Walt Disney (1955)
O Brasil tolera o golpe petista
A entrevista coletiva do prefeito de São Paulo para falar de sua derrota no primeiro turno das eleições municipais honrou as tradições do Partido dos Trabalhadores: uma repórter da Globo News foi hostilizada, acuada e obrigada a se retirar do recinto. Com esse ato revolucionário, os militantes progressistas do PT atingiram dois objetivos ao mesmo tempo: reforçaram sua poética contra a mídia burguesa e deixaram claro, pela enésima vez, que notícia boa é notícia a favor – algo um tanto difícil quando se perde uma eleição.
No dia seguinte, Fernando Haddad (o tal candidato derrotado) pediu desculpas à repórter. E ficou tudo bem. O Brasil é uma mãe.
Uma mãe especialmente boa para os filhos da... outra. Aceita que eles vandalizem a casa, basta dizerem depois que foi sem querer. Quando Dilma (a outra) ganhou a reeleição em 2014, esses rebentos aloprados fizeram um escarcéu no discurso da vitória. Entre outros cânticos de guerra, entoaram a palavra de ordem “abaixo a Rede Globo” – que provocou a seguinte reação da presidente da República: parou seu discurso e fez coro silencioso ao ataque. Isso depois de condenar a depredação da Editora Abril, atentado perpetrado por seus simpatizantes. Enquanto o Brasil tolerar essa malandragem, os progressistas de circo vão continuar espancando a liberdade de expressão e dizendo que ela é linda.
O mais perfeito retrato da tal democratização dos meios de comunicação, bandeira cifrada do PT e seus genéricos, é o caso Mídia Ninja. A aparição desse movimento – e sua difusão durante os protestos de junho de 2013 – parecia uma boa novidade. Um jornalismo de guerrilha, absolutamente independente, engajado na missão obstinada de cobrir tudo o que a grande imprensa não mostrasse. É assim mesmo que se faz democracia – com a pluralidade das vozes impedindo os monopólios da verdade.
A boa novidade começou a não parecer tão boa quando alguns grandes veículos começaram a ser acusados – especialmente em São Paulo e no Rio de Janeiro – de estar distorcendo a cobertura dos protestos em favor da polícia. Qualquer cobertura jornalística terá suas falhas eventuais, mas havia um problema mais sério com essa versão espalhada pela Mídia Ninja: ela não era verdadeira. Não houve e não há nenhum registro de cobertura tendenciosa pró-polícia pelos principais veículos de comunicação do país em junho de 2013. Ao contrário, o noticiário até tendeu a superestimar os propósitos dos manifestantes – atribuindo uma grandiosidade aos atos que eles, percebeu-se depois, nem sempre tinham.
E passou a surgir outro ingrediente incômodo no front dos protestos: a mídia que não era ninja começou a ser recebida com hostilidade nas ruas, frequentemente cercada e violentamente agredida. Essa prática boçal se tornou corriqueira e teve, entre seus legados, a morte do cinegrafista Santiago Andrade, da Band – atingido por um rojão na cabeça.
Os responsáveis pela morte de Santiago irão finalmente a júri popular. Mas os políticos que os incentivaram e incentivam seus coleguinhas bestiais estão concorrendo alegremente nas eleições municipais, com discurso de direitos humanos. E a Mídia Ninja foi contratada pelo finado (e obsceno) governo Dilma Rousseff.
O episódio da expulsão da repórter Andrea Sadi da coletiva de Haddad mostra que o Brasil ainda convive bem com a falta de democracia – desde que o ato autoritário parta do pessoal fantasiado de esquerda. É a enésima agressão à liberdade de expressão por parte de um grupo político que já tentou de tudo para transformar a mídia em panfleto particular – inclusive torrando milhões de reais do contribuinte para sustentar blogs de aluguel. Quando o governo Temer tenta mostrar as feridas institucionais deixadas por 13 anos dessas manobras obscuras, surgem vozes na própria grande imprensa denunciando a contrapropaganda... Só rindo.
O que aconteceu na coletiva de Haddad é muito grave e tem a ver com a narrativa do golpe. É a defesa de um sistema de crenças em bandeiras aparentemente belas, que servem a uma prática autoritária de subsistência política, cultural e moral (sic). São os gigolôs da bondade. A impressionante tolerância nacional para com essas figuras explica que Lula, depois de tudo o que fez, ainda possa andar por aí com cara de coitado.
No dia seguinte, Fernando Haddad (o tal candidato derrotado) pediu desculpas à repórter. E ficou tudo bem. O Brasil é uma mãe.
O mais perfeito retrato da tal democratização dos meios de comunicação, bandeira cifrada do PT e seus genéricos, é o caso Mídia Ninja. A aparição desse movimento – e sua difusão durante os protestos de junho de 2013 – parecia uma boa novidade. Um jornalismo de guerrilha, absolutamente independente, engajado na missão obstinada de cobrir tudo o que a grande imprensa não mostrasse. É assim mesmo que se faz democracia – com a pluralidade das vozes impedindo os monopólios da verdade.
A boa novidade começou a não parecer tão boa quando alguns grandes veículos começaram a ser acusados – especialmente em São Paulo e no Rio de Janeiro – de estar distorcendo a cobertura dos protestos em favor da polícia. Qualquer cobertura jornalística terá suas falhas eventuais, mas havia um problema mais sério com essa versão espalhada pela Mídia Ninja: ela não era verdadeira. Não houve e não há nenhum registro de cobertura tendenciosa pró-polícia pelos principais veículos de comunicação do país em junho de 2013. Ao contrário, o noticiário até tendeu a superestimar os propósitos dos manifestantes – atribuindo uma grandiosidade aos atos que eles, percebeu-se depois, nem sempre tinham.
E passou a surgir outro ingrediente incômodo no front dos protestos: a mídia que não era ninja começou a ser recebida com hostilidade nas ruas, frequentemente cercada e violentamente agredida. Essa prática boçal se tornou corriqueira e teve, entre seus legados, a morte do cinegrafista Santiago Andrade, da Band – atingido por um rojão na cabeça.
Os responsáveis pela morte de Santiago irão finalmente a júri popular. Mas os políticos que os incentivaram e incentivam seus coleguinhas bestiais estão concorrendo alegremente nas eleições municipais, com discurso de direitos humanos. E a Mídia Ninja foi contratada pelo finado (e obsceno) governo Dilma Rousseff.
O episódio da expulsão da repórter Andrea Sadi da coletiva de Haddad mostra que o Brasil ainda convive bem com a falta de democracia – desde que o ato autoritário parta do pessoal fantasiado de esquerda. É a enésima agressão à liberdade de expressão por parte de um grupo político que já tentou de tudo para transformar a mídia em panfleto particular – inclusive torrando milhões de reais do contribuinte para sustentar blogs de aluguel. Quando o governo Temer tenta mostrar as feridas institucionais deixadas por 13 anos dessas manobras obscuras, surgem vozes na própria grande imprensa denunciando a contrapropaganda... Só rindo.
O que aconteceu na coletiva de Haddad é muito grave e tem a ver com a narrativa do golpe. É a defesa de um sistema de crenças em bandeiras aparentemente belas, que servem a uma prática autoritária de subsistência política, cultural e moral (sic). São os gigolôs da bondade. A impressionante tolerância nacional para com essas figuras explica que Lula, depois de tudo o que fez, ainda possa andar por aí com cara de coitado.
As lições do pleito
O pleito de domingo passado fecha o ciclo do PT como protagonista principal da vida política brasileira. A passagem do 3º lugar para o 10º lugar no arco partidário, tendo obtido apenas 4,39% dos votos do país, é uma leitura que abriga outras: não houve golpe no impeachment de Dilma; Lula deixou de ser o bicho papão do palanque brasileiro; o petismo leva uma tremenda surra nos centros mais desenvolvidos e na própria região Nordeste, onde imperava. Mas o recado maior dos 118 milhões que compareceram às urnas foi este: esqueçam a lengalenga petista de anos a fio – “nós e eles”, responsável pelo apartheid que dividiu o Brasil em duas bandas: uma, a dos mocinhos, que o PT reivindicava como sua, e outra, que dizia ser ocupada pelas “elites e imprensa burguesa”.
Ao destamparem os dutos da corrupção, o mensalão, do governo Lula, e o petrolão, do governo Dilma, redefiniram os limites do céu e do inferno, jogando neste a cúpula petista que se julgava dona dos espaços celestiais. O rombo nas contas públicas e a devastação na paisagem social acabaram se juntando à trama da roubalheira para dar a mais contundente resposta social do eleitor a um partido político. A cabeça, o corpo e os braços do PT foram estraçalhados pela má condução da economia e pela corrupção. E por que outros partidos flagrados na boca da botija não foram punidos com tanta veemência pelos eleitores? Porque o PT foi o partido que vestiu o manto da ética. Recebeu o troco das urnas com juros e correção monetária.
Pawel Kuczynski |
Os maiores vencedores foram o PSDB, que obteve 26,81% dos votos, e o PMDB, com 17,38% dos votos. Os tucanos fizeram 791 prefeitos; já os peemedebistas continuam com o maior número de prefeituras, 1029, oito a mais do que o número alcançado em 2012, o que lhe dá a condição de partido mais capilar do Brasil. Os partidos que formam a base do governo ganharam 4.930 prefeituras entre as 5.568 existentes. Portanto, forma-se um gigantesco bloco de centro, com uma vertente mais forte, à direita, e um braço poderoso à esquerda, juntando ao lado do PSDB e do PMDB partidos médios como o PSD, PSB, DEM, PR, PRB, PDT e PTB. O PSOL, à esquerda, tem chances de elevar a cotação com a eventual vitória de Marcelo Freixo, no RJ.
A curiosidade faz perguntas: o PT será tragado? Não. Transforma-se em um partido dos grotões, pois dos 241 prefeitos que elegeu, mais da metade se localiza em enclaves de menos de 10 mil eleitores. O partido, que entra em profunda depressão, começa a fazer seu balanço, indicando mudanças na cúpula, no discurso e nas formas de operação. Se Lula voltar a comandar a sigla, isso não será proveitoso. Começa a ser contestado. Tarso Genro, da corrente Mensagem ao Partido, prega profunda mudança no PT, com a atração de jovens, a busca de movimentos sociais e a formação de um vasto bloco de esquerda. Para chegar ao porte de antes, deverá percorrer longa trilha.
Sua militância sofrerá as agruras do desemprego. Dos 25 mil cargos comissionados na área federal, os petistas, mesmo se escondendo como ratos nos porões da administração, estão sendo desalojados. Mais um contingente entre 50 mil a 60 mil sairá das hostes municipais com a derrota dos candidatos petistas. Terão menos 389 prefeituras. Mas não apenas o fator eleitoral devasta a nação petista. Lula está indiciado em processos. E, a qualquer hora, após condenação sob a toga da primeira instância do juiz Sérgio Moro, poderá ser apenado na segunda instância. Se receber esta condenação, perde a condição para se candidatar em 2008. Seria mais um tremendo golpe no lulopetismo. Nesse caso, o partido deverá enrolar sua bandeira vermelha e passar longa temporada no limbo, mais próximo ao inferno do que ao céu.
Expulso até do tradicional cinturão vermelho do ABC, onde tem sua origem, Lula não conseguiu eleger nem seu filho adotivo, Marcos, em São Bernardo. Em Osasco, não elegeu nenhum vereador. Mesmo assim, Luiz Inácio continua confiando em seu verbo roto: o PT sairá vencedor mais adiante, pois o governo Temer, segundo ele, não dará certo e, na esteira do caos, voltará aos braços do povo. Lula deve estar anestesiado para ser tão esperançoso. Nesses últimos dias, pode ter conversado muito com Deus.
Mas o maior fenômeno da campanha eleitoral foi João Doria, o tucano que ganhou o pleito na maior metrópole nacional, obtendo mais de 53% dos votos, ou 3, 085 mil votos. João vestiu o manto antipetista, expressou um discurso com foco na gestão, mostrou-se um empresário sem os vícios da velha política, teve a maior mídia eleitoral – em função da parceria entre PSDB e 12 partidos. De cara limpa, discurso apropriado, agenda que incluiu 9 meses de corrida intensa pelos 93 sub-distritos de São Paulo, passou a ser amplamente conhecido e angariou o voto útil contra o PT. Quando o eleitorado percebeu que poderia despachar Fernando Haddad logo no primeiro turno, o fez. Essa corrente se formou em dois dias – sábado e domingo da eleição.
Quem sobe com a vitória inesperada de João é o governador Geraldo Alckmin, que patrocinou sua candidatura. Alckmin apostou na candidatura do empresário e jornalista. João fez um bom programa de TV e rádio, escolheu Haddad como foco, mas foi educado. Não usou linguagem capenga. Saiu-se muito bem nos debates. A lógica da política eleitoral apontava para seu crescimento. Em 3 meses, subiu de 6% para 53,03% dos votos em São Paulo. Alckmin ganha fôlego para caminhar na direção de 2018. São Paulo é o maior colégio eleitoral do país com os seus 33 milhões de votos, o dobro de Minas Gerais.
Mas o Não Voto merece também destaque. Na média, abstenções, brancos e nulos chegam a 32,5% nas capitais. Só em São Paulo, os votos nulos, brancos e as abstenções somaram 3,096 milhões de votos. No Rio, este índice superou os 38%. Em Ribeirão Preto, chegou a 45%. E em mais de 10 cidades do país, ultrapassou a casa dos 50%. Infere-se, portanto, que este foi também o pleito da contrariedade, da indignação. Daí o recado: urge reformar a política.
Garantir terras para indígenas na Amazônia pode render US$ 1 trilhão ao Brasil
Garantir aos indígenas de países da Amazônia a posse de suas terras poderia gerar benefícios econômicos que, só no Brasil, ultrapassariam US$ 1 trilhão em 20 anos, de acordo com um novo estudo realizado pelo World Resources Institute (WRI), um "think tank" da área ambiental sediado em Washington, nos Estados Unidos.
A pesquisa, divulgada nesta sexta-feira, na capital norte-americana, foi realizada no Brasil, na Colômbia e na Bolívia e revelou que nas áreas indígenas onde a posse da terra é garantida, o desmatamento é consideravelmente reduzido. Entre 2000 e 2012, nessas áreas, a devastação foi 40% menor no Brasil, 50% menor na Colômbia e 35% menor na Bolívia.
A partir dessa análise comparativa, os autores calcularam o custo-benefício do investimento na proteção de terras indígenas, considerando a economia que seria feita com a redução das emissões de carbono e com a preservação de serviços de conservação do ecossistema, como água limpa, retenção do solo, polinização, biodiversidade, controle de inundações e rendimentos das comunidades com turismo e recreação.
De acordo com Juan Carlos Altamirano, economista do WRI que coordenou o estudo, a análise concluiu que proteger a posse das áreas indígenas é um investimento de baixo custo com altíssimo retorno. Os benefícios econômicos estimados em um período de 20 anos são: de US$ 523 bilhões a US$ 1,1 trilhão para o Brasil, de US$ 123 bilhões a US$ 277 bilhões para a Colômbia, e de US$ 54 bilhões a US$ 119 bilhões para a Bolívia. Os custos chegam ao máximo de 1% dos benefícios totais, segundo o estudo.
"A maior parte desses benefícios econômicos estão relacionados à conservação dos ecossistemas, como controle do clima e da água, polinização e preservação de espécies importantes. Esses benefícios têm imensos impactos nas atividades produtivas - que são muito mais onerosas sem os serviços fornecidos pelos ecossistemas", disse Altamirano.
De acordo com ele, embora os valores estimados pareçam altos, é possível que eles estejam até mesmo subestimados. Os pesquisadores identificaram três tipos de vantagens com a proteção das áreas florestais indígenas: benefícios sociais para as comunidades locais - como criação de empregos e aprimoramento da assistência médica e educação -, benefícios para as ações coletivas - como solução de conflitos nas comunidades - e benefícios para ecossistemas.
"Só consideramos os benefícios ao ecossistema, porque os benefícios coletivos e sociais são difíceis de quantificar. Ainda assim, quando somamos as vantagens econômicas da captura de carbono que seria proporcionada à disponibilidade de água, polinização e outros serviços ecossistêmicos que reduziriam custos para as atividades produtivas, chegamos a esse valor muito alto", explicou o economista.
A pesquisa, divulgada nesta sexta-feira, na capital norte-americana, foi realizada no Brasil, na Colômbia e na Bolívia e revelou que nas áreas indígenas onde a posse da terra é garantida, o desmatamento é consideravelmente reduzido. Entre 2000 e 2012, nessas áreas, a devastação foi 40% menor no Brasil, 50% menor na Colômbia e 35% menor na Bolívia.
De acordo com Juan Carlos Altamirano, economista do WRI que coordenou o estudo, a análise concluiu que proteger a posse das áreas indígenas é um investimento de baixo custo com altíssimo retorno. Os benefícios econômicos estimados em um período de 20 anos são: de US$ 523 bilhões a US$ 1,1 trilhão para o Brasil, de US$ 123 bilhões a US$ 277 bilhões para a Colômbia, e de US$ 54 bilhões a US$ 119 bilhões para a Bolívia. Os custos chegam ao máximo de 1% dos benefícios totais, segundo o estudo.
"A maior parte desses benefícios econômicos estão relacionados à conservação dos ecossistemas, como controle do clima e da água, polinização e preservação de espécies importantes. Esses benefícios têm imensos impactos nas atividades produtivas - que são muito mais onerosas sem os serviços fornecidos pelos ecossistemas", disse Altamirano.
De acordo com ele, embora os valores estimados pareçam altos, é possível que eles estejam até mesmo subestimados. Os pesquisadores identificaram três tipos de vantagens com a proteção das áreas florestais indígenas: benefícios sociais para as comunidades locais - como criação de empregos e aprimoramento da assistência médica e educação -, benefícios para as ações coletivas - como solução de conflitos nas comunidades - e benefícios para ecossistemas.
"Só consideramos os benefícios ao ecossistema, porque os benefícios coletivos e sociais são difíceis de quantificar. Ainda assim, quando somamos as vantagens econômicas da captura de carbono que seria proporcionada à disponibilidade de água, polinização e outros serviços ecossistêmicos que reduziriam custos para as atividades produtivas, chegamos a esse valor muito alto", explicou o economista.
Pichações, bofetadas na cidade
No dia seguinte ao debate dos candidatos à prefeitura de São Paulo na TV Globo, em que a pichação foi criticada por João Doria (PSDB) e Marta Suplicy (PMDB), o Monumento às Bandeiras, no Ibirapuera, na zona sul, e a Estátua do Borba Gato, em Santo Amaro, na mesma região, amanheceram cobertos de tinta colorida: rosa, verde, amarelo e azul.
A barbárie é ponta do iceberg de algo mais grave: a degradação das cidades e a incompetência arrogante das suas autoridades. A reação do prefeito Fernando Haddad (PT) foi emblemática. Em campanha na zona leste, Haddad disse achar que as pichações podem ser fruto da radicalização criada no debate.
“Acho que tem a ver com o tipo de provocação que foi feito no debate. Quando você instiga as pessoas, desafia as pessoas, como Doria e Marta fizeram, dizendo que ‘não vai acontecer nunca mais’. Não é assim que se fala com as pessoas, se dialoga”, afirmou. Lamentável. É a defesa do diálogo demagógico e transgressor. No episódio, a cidade de São Paulo foi demitida por seu governante.
O centro antigo de São Paulo, por exemplo, está à deriva. Edifícios pichados, prédios invadidos, gente sofrida e abandonada, prostituição a céu aberto, zumbis afundados no crack, uma cidade sem alma e desfigurada pela ausência criminosa do poder público.
Nós, jornalistas, precisamos mostrar a realidade. Não podemos ficar reféns das assessorias de comunicação e das maquiagens que falam de uma revitalização que só existe no papel. Temos o dever de pôr o dedo na chaga. Fazer reportagem. Escancarar as contradições entre o discurso empolado e a realidade cruel. Basta percorrer três quarteirões. As pautas não estão dentro das redações. Elas gritam em cada esquina. É só pôr o pé na rua e a reportagem salta na nossa frente. Os jornais precisam ter cheiro de asfalto.
Jornalismo é isso: mostrar a vida, com suas luzes e suas sombras. São Paulo, a cidade mais rica do País e um dos maiores orçamentos públicos, é um retrato de corpo inteiro da falência do Estado.
Também o Brasil, um país continental, sem conflitos externos, com um povo bom e trabalhador, está na banguela. Os serviços públicos não funcionam. Basta pensar na educação. A competitividade global reclama crescentemente gente bem formada. Quando comparamos a revolução educacional sul-coreana com a desqualificação da nossa educação, dá vontade de chorar. A assustadora falta de mão de obra com formação mínima é um gritante atestado do descalabro da recente “pátria educadora”.
A sociedade está cansada da inconsistência de alguns governantes, de tanto jogo de faz de conta, de tanto cinismo.
As cicatrizes que desfiguram o rosto de São Paulo e do Brasil podem ser superadas. Dinheiro existe, e muito. Falta vergonha na cara, competência e um mínimo de espírito público.
A barbárie é ponta do iceberg de algo mais grave: a degradação das cidades e a incompetência arrogante das suas autoridades. A reação do prefeito Fernando Haddad (PT) foi emblemática. Em campanha na zona leste, Haddad disse achar que as pichações podem ser fruto da radicalização criada no debate.
“Acho que tem a ver com o tipo de provocação que foi feito no debate. Quando você instiga as pessoas, desafia as pessoas, como Doria e Marta fizeram, dizendo que ‘não vai acontecer nunca mais’. Não é assim que se fala com as pessoas, se dialoga”, afirmou. Lamentável. É a defesa do diálogo demagógico e transgressor. No episódio, a cidade de São Paulo foi demitida por seu governante.
O centro antigo de São Paulo, por exemplo, está à deriva. Edifícios pichados, prédios invadidos, gente sofrida e abandonada, prostituição a céu aberto, zumbis afundados no crack, uma cidade sem alma e desfigurada pela ausência criminosa do poder público.
Jornalismo é isso: mostrar a vida, com suas luzes e suas sombras. São Paulo, a cidade mais rica do País e um dos maiores orçamentos públicos, é um retrato de corpo inteiro da falência do Estado.
Também o Brasil, um país continental, sem conflitos externos, com um povo bom e trabalhador, está na banguela. Os serviços públicos não funcionam. Basta pensar na educação. A competitividade global reclama crescentemente gente bem formada. Quando comparamos a revolução educacional sul-coreana com a desqualificação da nossa educação, dá vontade de chorar. A assustadora falta de mão de obra com formação mínima é um gritante atestado do descalabro da recente “pátria educadora”.
A sociedade está cansada da inconsistência de alguns governantes, de tanto jogo de faz de conta, de tanto cinismo.
As cicatrizes que desfiguram o rosto de São Paulo e do Brasil podem ser superadas. Dinheiro existe, e muito. Falta vergonha na cara, competência e um mínimo de espírito público.
Saindo do vermelho
As eleições municipais no Brasil deram uma surra no PT e na esquerda. Foram mais de dez anos de voto de confiança no petismo e, enquanto a população estava no azul ou sonhando com o azul, era fácil votar na “esquerda”. Agora, a conta dos escândalos e da ineficiência chegou e o eleitor não perdoou. Lula tentou minimizar o impacto: “Essa é a beleza da democracia. É a alternância de poder. A troca de pessoas que governam”. Estas eleições foram uma punição, numa “beleza de democracia”.
O voto ideológico e partidário já era. É quase impossível analisar o voto da maioria apenas à luz da lógica ou das redes sociais. Pior ainda é tentar desacreditar a maré conservadora à luz das paixões e militâncias. Analista que faz isso é ingênuo ou de má-fé.
O voto ideológico e partidário já era. É quase impossível analisar o voto da maioria apenas à luz da lógica ou das redes sociais. Pior ainda é tentar desacreditar a maré conservadora à luz das paixões e militâncias. Analista que faz isso é ingênuo ou de má-fé.
A desilusão mundial com os políticos, pela corrupção e pelas mentiras, leva o eleitor a mandar um recado claro, com voto oculto não detectado pelas pesquisas eleitorais. Ele prefere apostar no desconhecido, por mais arriscado que possa ser. O desconhecido ainda não o decepcionou, ainda não roubou bilhões de verba pública, ainda não faliu estatais. O desconhecido com uma história pessoal de sucesso é um chamariz de voto. Não é por acaso que 23 milionários tenham sido eleitos no primeiro turno prefeitos no Brasil.
Para o eleitor comum, a maior bandeira é seu emprego, seu trabalho, sua chance de mobilidade social. Sua família é a maior preocupação. Saúde, segurança e o futuro de seus filhos são o que lhe tira o sono. O futuro do planeta, a ecologia, a paz, nada disso guia a maioria silenciosa na urna. É sua felicidade e a dos muito próximos o que comanda seu voto. Não vivemos tempos de compaixão ou de solidariedade com imigrantes e refugiados, ou com vizinhos de prédio ou de fronteira, ou com menores carentes ou delinquentes. No Brasil, na Colômbia, na Hungria, na Grã-Bretanha, na Espanha, nos Estados Unidos, o panorama é parecido e individualista. Não é elogio nem crítica, mas uma constatação.
Ninguém esperava que um empresário e apresentador de TV ganhasse no primeiro turno a prefeitura de São Paulo. No Rio de Janeiro, o voto maciço em um pastor evangélico da Universal, sobrinho do bispo Edir Macedo, acompanhado por expressivos 14% de votos no filho de Jair Bolsonaro, revelou que o carioca mudou e mandou o PMDB às favas.
Marcelo Freixo, do PSOL do Rio, é a exceção vermelha que comprova a regra. Quem o garantiu no segundo turno foi o eleitor jovem e de curso superior, a Zona Sul afluente. O povão, em nome de quem Freixo promete governar, o rejeita. A primeira pesquisa Datafolha para o segundo turno mostrou que a maior diferença entre os dois candidatos está nos eleitores apenas com ensino fundamental: 52% para Crivella, 21% para Freixo.
A esquerda desmerecerá o voto da massa? Dirá que não é esclarecida? Ou assumirá que os mais pobres foram os mais afetados pelos desmandos do governo Dilma? Admitirá que o povo brasileiro é religioso, tradicional e tem valores próximos aos da direita militarista que vota em Bolsonaro? A maioria rejeita direito ao aborto, descriminalização de drogas, casamento gay, desarmamento civil e acha que bandido bom é bandido morto. Pode fazer referendo. Vai ver. Pelo mundo afora, é a mesma toada conservadora e de desencanto, que impulsiona um voto oculto ou envergonhado, invisível nas pesquisas. Há nuances segundo o país, mas é possível reconhecer um padrão. Abstenções, votos nulos e em branco estão em alta.
Um dos votos mais surpreendentes foi o do referendo na Colômbia. Era dado como certo que o povo colombiano aprovaria o acordo de paz com os guerrilheiros das Farc, depois de mais de 50 anos de guerra civil e 260 mil mortos. Mas o povo disse “não” no referendo. Rejeitou a anistia aos guerrilheiros.
Na Hungria, 95% rejeitaram em referendo abrigar cotas de refugiados de guerra e imigrantes. Na Grã-Bretanha, o povo decidiu pela Brexit, a saída da Europa. Na Espanha, nenhum partido consegue formar maioria em eleições, e o povo está há quase 300 dias sem um governo nacional – e feliz com isso. “Sem governo, sem ladrões”, dizem os espanhóis. Já nos Estados Unidos, Donald Trump é o ídolo dos nacionalistas, um fenômeno absurdo de ódio, racismo, xenofobia, machismo. Inexplicável?
Ao chegar a Nova York na semana passada, peguei no aeroporto um táxi dirigido por um jovem de Bangladesh, que foi com a família há 20 anos para os Estados Unidos. Perguntei em quem votará para presidente. “Ainda não sei”, disse com sotaque forte. “Não gosto de nenhum dos dois. Será um voto difícil [‘tough’]. Mas, no último dia, vou escolher Trump ou Hillary.” Fiquei boquiaberta. Tive a sensação de que o rapaz de Bangladesh já se decidira por Trump. Um voto oculto e envergonhado, como tantos que acabam por decidir uma eleição.
Ruth de Aquino
Para o eleitor comum, a maior bandeira é seu emprego, seu trabalho, sua chance de mobilidade social. Sua família é a maior preocupação. Saúde, segurança e o futuro de seus filhos são o que lhe tira o sono. O futuro do planeta, a ecologia, a paz, nada disso guia a maioria silenciosa na urna. É sua felicidade e a dos muito próximos o que comanda seu voto. Não vivemos tempos de compaixão ou de solidariedade com imigrantes e refugiados, ou com vizinhos de prédio ou de fronteira, ou com menores carentes ou delinquentes. No Brasil, na Colômbia, na Hungria, na Grã-Bretanha, na Espanha, nos Estados Unidos, o panorama é parecido e individualista. Não é elogio nem crítica, mas uma constatação.
Ninguém esperava que um empresário e apresentador de TV ganhasse no primeiro turno a prefeitura de São Paulo. No Rio de Janeiro, o voto maciço em um pastor evangélico da Universal, sobrinho do bispo Edir Macedo, acompanhado por expressivos 14% de votos no filho de Jair Bolsonaro, revelou que o carioca mudou e mandou o PMDB às favas.
Marcelo Freixo, do PSOL do Rio, é a exceção vermelha que comprova a regra. Quem o garantiu no segundo turno foi o eleitor jovem e de curso superior, a Zona Sul afluente. O povão, em nome de quem Freixo promete governar, o rejeita. A primeira pesquisa Datafolha para o segundo turno mostrou que a maior diferença entre os dois candidatos está nos eleitores apenas com ensino fundamental: 52% para Crivella, 21% para Freixo.
A esquerda desmerecerá o voto da massa? Dirá que não é esclarecida? Ou assumirá que os mais pobres foram os mais afetados pelos desmandos do governo Dilma? Admitirá que o povo brasileiro é religioso, tradicional e tem valores próximos aos da direita militarista que vota em Bolsonaro? A maioria rejeita direito ao aborto, descriminalização de drogas, casamento gay, desarmamento civil e acha que bandido bom é bandido morto. Pode fazer referendo. Vai ver. Pelo mundo afora, é a mesma toada conservadora e de desencanto, que impulsiona um voto oculto ou envergonhado, invisível nas pesquisas. Há nuances segundo o país, mas é possível reconhecer um padrão. Abstenções, votos nulos e em branco estão em alta.
Um dos votos mais surpreendentes foi o do referendo na Colômbia. Era dado como certo que o povo colombiano aprovaria o acordo de paz com os guerrilheiros das Farc, depois de mais de 50 anos de guerra civil e 260 mil mortos. Mas o povo disse “não” no referendo. Rejeitou a anistia aos guerrilheiros.
Na Hungria, 95% rejeitaram em referendo abrigar cotas de refugiados de guerra e imigrantes. Na Grã-Bretanha, o povo decidiu pela Brexit, a saída da Europa. Na Espanha, nenhum partido consegue formar maioria em eleições, e o povo está há quase 300 dias sem um governo nacional – e feliz com isso. “Sem governo, sem ladrões”, dizem os espanhóis. Já nos Estados Unidos, Donald Trump é o ídolo dos nacionalistas, um fenômeno absurdo de ódio, racismo, xenofobia, machismo. Inexplicável?
Ao chegar a Nova York na semana passada, peguei no aeroporto um táxi dirigido por um jovem de Bangladesh, que foi com a família há 20 anos para os Estados Unidos. Perguntei em quem votará para presidente. “Ainda não sei”, disse com sotaque forte. “Não gosto de nenhum dos dois. Será um voto difícil [‘tough’]. Mas, no último dia, vou escolher Trump ou Hillary.” Fiquei boquiaberta. Tive a sensação de que o rapaz de Bangladesh já se decidira por Trump. Um voto oculto e envergonhado, como tantos que acabam por decidir uma eleição.
Ruth de Aquino
Do mundo nada se leva. Muito menos imposto
Dirigido por Frank Capra (1938), "Do mundo nada se leva" ("You Can't Take It with You"), é um clássico da era Roosevelt com farta crítica ao capitalismo desenfreado. No elenco, Jean Arthur, Lionel Barrymore, James Stewart, Edward Arnold.
O quilombo de Mumbuca
Há meses entreguei um prêmio no Ministério da Educação, em Brasília, para professoras que criaram projetos de incentivo à leitura. Uma das vencedoras me disse, emocionada:
– Comecei a ler por sua causa. E hoje sou professora.
É o tipo de mensagem que faz a vida de um escritor valer a pena! Ela vinha do quilombo de Mumbuca, no Jalapão, Tocantins. Convidou-me para visitá-lo. Aceitei. Escrevia uma novela na época, esperei terminar. Há semanas, parti. Desci em Palmas, capital do Tocantins. De lá, um guia me levou ao Jalapão, parte pouco conhecida do país, belíssima, com montanhas, areais, dunas, cachoeiras. Quando chegamos à pequena cidade de Mateiros, tivemos a notícia. O quilombo estava inacessível. A ponte que o liga ao resto do mundo sofrera um incêndio criminoso. Pior, justamente na época da colheita do capim-dourado. O artesanato com o capim, que só dá na região, é a base econômica do quilombo. Fazem bijuterias, vasos, chapéus, mandalas. Que têm reflexos dourados, daí o nome do capim. Convenci meu guia a botar o 4x4 no rio. Atravessamos o leito cascalhado. Em certo momento, a água quase entrou no motor, mas conseguimos. Ana, a professora que me convidara, já fora prevenida por telefone e me espera. Chego carregado de livros, de minha autoria, para a biblioteca do quilombo. Poucas vezes fui tão bem recebido. Cantam para mim. Mostram os campos de capim-dourado, lindos! Há um quadro com a árvore genealógica dos habitantes. Hoje são umas 60 famílias, que descendem de dois casais de escravos fugitivos. E... surpresa! É um matriarcado, desde sua formação. A grande mentora foi dona Miúda, falecida, que descobriu o uso do capim-dourado no artesanato. Quem nasce lá tem um profundo senso de comunidade. Pode sair, mas sempre volta.
– Comecei a ler por sua causa. E hoje sou professora.
– Moro uma parte do tempo em Palmas, onde trabalho, mas volto para a colheita do capim – conta-me Miriam, uma moça bonita. – Aqui é meu lugar.
Ana fez universidade. Mas voltou para seu quilombo. Um rapaz, Maurício, ótimo cantor, faz apresentações pelo Brasil todo. Mas sua casa é lá. A cada turnê, retorna. Uma senhora magra, de 60 anos e porte aristocrático, me recebe em sua casa de chão de areia – no quilombo o piso é esse, areia. É a Dotora, assim mesmo, sem o u. Faz curas com remédios caseiros, à base de buriti, a palmeira da região. Dá ajuda espiritual. Principalmente conselhos para manter a paz entre os moradores. Dona Santinha e dona Laurinda, a parteira, também contribuem com o bem-estar social. São mulheres fortes, experientes. Referências para os moradores. Observo a Dotora sentada na rede, conversando, gesticulando. Penso:
– Nunca vi mulher tão elegante!
A pobreza da cidade grande, com a qual estamos acostumados, é luxo diante da vida no quilombo. As casas têm paredes de tijolos não caiadas e tetos de folhas de palmeira. A sobrevivência é na base do mínimo. O calor, causticante. Há uma escola, mas, fora Ana, os outros professores não vêm há meses. Posto de saúde, nem pensar. Vivem como provavelmente viveram seus antepassados há 200 anos: da floresta, do rio, de uma pequena agricultura e criação doméstica – há galinhas em todas as casas. Há neles um sentido de comunidade que eu não via havia muito tempo: todos se preocupam com a sobrevivência de todos. As vendas do artesanato, concentradas em um salão da associação local, servem ao bem comum. Existe um grande tesouro: a colmeia da mumbuca, abelha que deu nome ao quilombo. Faz sua colmeia dentro da terra, em forma de cone. Seu mel raro só é extraído para a produção de remédios.
Apesar de toda a alegria com minha chegada, ninguém esconde a preocupação. A falta de ponte afastou os turistas na festa da colheita, o grande momento do ano. A época da cheia logo chegará. Nem um 4x4 conseguirá atravessar o rio. Mumbuca ficará definitivamente isolado. O governo do Tocantins alega falta de verba. A responsabilidade passou para o município de Mateiros. Este, embora viva de turismo e tenha no quilombo uma atração importante, também diz não ter como construir a ponte. O autor do incêndio não foi descoberto. Perguntei a um morador o que achava de tudo isso:
– Ficaremos como antes, há 200 anos. Isolados.
A abolição da escravidão aconteceu há muito tempo. Mas os moradores de Mumbuca continuam a enfrentar circunstâncias ruins, que parecem datadas da época em que seus antepassados fugiram de seus senhores. Estão por si mesmos, sozinhos na luta por sua ponte.
Ana fez universidade. Mas voltou para seu quilombo. Um rapaz, Maurício, ótimo cantor, faz apresentações pelo Brasil todo. Mas sua casa é lá. A cada turnê, retorna. Uma senhora magra, de 60 anos e porte aristocrático, me recebe em sua casa de chão de areia – no quilombo o piso é esse, areia. É a Dotora, assim mesmo, sem o u. Faz curas com remédios caseiros, à base de buriti, a palmeira da região. Dá ajuda espiritual. Principalmente conselhos para manter a paz entre os moradores. Dona Santinha e dona Laurinda, a parteira, também contribuem com o bem-estar social. São mulheres fortes, experientes. Referências para os moradores. Observo a Dotora sentada na rede, conversando, gesticulando. Penso:
– Nunca vi mulher tão elegante!
A pobreza da cidade grande, com a qual estamos acostumados, é luxo diante da vida no quilombo. As casas têm paredes de tijolos não caiadas e tetos de folhas de palmeira. A sobrevivência é na base do mínimo. O calor, causticante. Há uma escola, mas, fora Ana, os outros professores não vêm há meses. Posto de saúde, nem pensar. Vivem como provavelmente viveram seus antepassados há 200 anos: da floresta, do rio, de uma pequena agricultura e criação doméstica – há galinhas em todas as casas. Há neles um sentido de comunidade que eu não via havia muito tempo: todos se preocupam com a sobrevivência de todos. As vendas do artesanato, concentradas em um salão da associação local, servem ao bem comum. Existe um grande tesouro: a colmeia da mumbuca, abelha que deu nome ao quilombo. Faz sua colmeia dentro da terra, em forma de cone. Seu mel raro só é extraído para a produção de remédios.
Apesar de toda a alegria com minha chegada, ninguém esconde a preocupação. A falta de ponte afastou os turistas na festa da colheita, o grande momento do ano. A época da cheia logo chegará. Nem um 4x4 conseguirá atravessar o rio. Mumbuca ficará definitivamente isolado. O governo do Tocantins alega falta de verba. A responsabilidade passou para o município de Mateiros. Este, embora viva de turismo e tenha no quilombo uma atração importante, também diz não ter como construir a ponte. O autor do incêndio não foi descoberto. Perguntei a um morador o que achava de tudo isso:
– Ficaremos como antes, há 200 anos. Isolados.
A abolição da escravidão aconteceu há muito tempo. Mas os moradores de Mumbuca continuam a enfrentar circunstâncias ruins, que parecem datadas da época em que seus antepassados fugiram de seus senhores. Estão por si mesmos, sozinhos na luta por sua ponte.
Temer, governo sem alma e sem vida, que se olha no retrovisor
Bom dia retrovisor. É assim que o Temer parece que vai atuar daqui pra frente. Com aprovação de apenas 14% dos brasileiros, segundo pesquisa recente, os comunicólogos do Palácio do Planalto tiveram a ideia genial de começar uma campanha para falar mal do governo da Dilma como se ela ainda existisse e incomodasse o país. Como é uma publicidade irrelevante, sem nenhum interesse para a nação, o Ministério Público deveria responsabilizar esses iluminados que encheram os jornais de críticas ao governo do PT que, como se sabe, desapareceu do comando do país com o impeachment da Dilma. É, sem dúvida, um dinheiro jogado no lixo.
A campanha diz que Temer pegou o país no vermelho, uma economia destroçada, um déficit de bilhões de reais nas contas públicas e com as obras de infraestrutura desativadas. Até aí nenhuma novidade. Não é novidade nem mesmo para o PMDB, partido do presidente, que durante doze anos governou o país ao lado dos petistas e da Dilma, portanto, não pode negar a sua cumplicidade com a administração caótica do PT da qual fez parte. Ora, o que se espera desse governo é oxigenar o país com boas ideias, reativar as obras de infraestrutura e retomar o crescimento para gerar emprego e renda e diminuir os 12 milhões de desempregados no país. Gastar milhões de reais em publicidade, numa encomia em frangalhos como a nossa, para mostrar a “herança maldita” do PT, é desperdiçar dinheiro público com peças revanchistas sem nenhum interesse público.
A campanha diz que Temer pegou o país no vermelho, uma economia destroçada, um déficit de bilhões de reais nas contas públicas e com as obras de infraestrutura desativadas. Até aí nenhuma novidade. Não é novidade nem mesmo para o PMDB, partido do presidente, que durante doze anos governou o país ao lado dos petistas e da Dilma, portanto, não pode negar a sua cumplicidade com a administração caótica do PT da qual fez parte. Ora, o que se espera desse governo é oxigenar o país com boas ideias, reativar as obras de infraestrutura e retomar o crescimento para gerar emprego e renda e diminuir os 12 milhões de desempregados no país. Gastar milhões de reais em publicidade, numa encomia em frangalhos como a nossa, para mostrar a “herança maldita” do PT, é desperdiçar dinheiro público com peças revanchistas sem nenhum interesse público.
O palácio ainda não divulgou os custos desses anúncios nos jornais, radio e televisão, mas as cifras certamente vão ultrapassar os milhões de reais para alegria das agências que têm no governo boa parte das suas receitas publicitárias e também da mídia em geral que vive na pindaíba com a crise econômica. A Dilma, por exemplo, quando alcançou o recorde de apenas 7% de aprovação, gastou, em 2015, quase 500 milhões de reais para melhorar a imagem enquanto as pessoas morriam nas portas dos hospitais por falta de leitos e medicamentos.
Esse dinheiro usado em publicidade o ano passado é café pequeno em relação ao que o PT gastou com as emissoras de televisão nos doze anos de governo para vender uma imagem falsa, truncada e mentirosa, uma propaganda enganosa que ludibriou os milhões de brasileiros. As principais TVs brasileiras engoliram em publicidade nesse período 11,5 bilhões de reais. Isso mesmo, é o que você acaba de ler: 11,5 bilhões de reais. A Globo sozinha embolsou 6,5 bilhões. O resto do bolo foi distribuído assim: Record R$ 2bi, SBT 1,6 bi, Band 1 bi, Rede TV 408 milhões.
Toda essa dinheirama para nada. O Brasil, nessa década, só andou para trás. Prova disso é o PIB negativo dos últimos anos com a economia em declínio. Mesmo assim, seus governantes – federal, estadual e municipal – continuam gastando milhões para promover seus feitos com uma mídia que persegue aqueles que não rezam na sua cartilha.
Essa nova onda publicitária do governo Temer só mostra uma coisa aos brasileiros: nada mudou, os vícios permanecem os mesmos e a população já desconfia que trocou seis por meia dúzia. Governo criativo, doutor Temer, seria acabar com essa farra publicitária, só anunciar o extremamente o necessário, a exemplo de campanha de vacinação e calamidades ou serviço de utilidade pública. Gastar uma fortuna para administrar olhando para o retrovisor é uma demonstração inequívoca de que esse é um governo sem alma e sem vida que já começou velho.
O Brasil não merece isso, andar a passos de caranguejo.
Eles contra eles
É inegável: constrangido a encaminhar-se até as urnas para eleger novos prefeitos e vereadores, há uma semana o brasileiro não poderia ter sido mais eloquente. Como se aproveitasse o pleito para ratificar suas convicções - repúdio ao aparelhamento do Estado e à roubalheira institucionalizada, bem como o apoio ao afastamento de Dilma Rousseff -, impôs uma derrota histórica ao petismo.
Pois, embora a mensagem tenha sido clara, sustentada que foi por estatísticas, e até mesmo previsível, dado o estrago causado pela administração Dilma e a Operação Lava Jato, não têm sido raros os diagnósticos equivocados a seu respeito. Assim como as ginásticas retóricas visando uma salvaguarda partidária.
Até faz sentido, por exemplo, decifrar a resposta das urnas como sendo um recado ou mesmo uma vitória da direita. Após tantos anos impregnados pela mitológica dicotomia entre montéquios indignos e capuletos magnânimos, beber no tororó da esquerda compreensivelmente extrapola o cacoete.
Faz sentido, mas está errado.
E está errado, acima de tudo, por inflar a falsa narrativa que sugere uma direita relevante neste país. Infelizmente não é o caso. E este meu lamento, diga-se, nada tem a ver com preferências ideológicas - de espantalhos imaginários já me basta o Fluminense -, mas pela ausência de pluralidade no debate político.
O que o cenário apresenta, isto sim, são matizes do vermelho. Uma miríade de legendas que vão do centro à extrema esquerda e nada além. Por esta razão, é fundamentalmente deseducador alardear uma guinada impossível. E nem vale a pena mencionar o boboca terrorismo embutido no discurso.
Como dizia, cambalhotas argumentativas com o intuito de empanar a voz do povo não deixaram de faltar. A mais ecoada delas tratou de jogar luz sobre o alto percentual de abstenções, em uma tola manobra para manter aceso o discurso do “fora todos” e, de quebra, relativizar o fracasso do PT.
Pois a verdade é que o percentual nacional de abstenções manteve-se alto, deixou clara a descrença geral com a classe política, mas sequer chegou perto de bater o recorde. Esteve abaixo, por exemplo, daquele atingido há 2 anos (17,6% contra 19,4%).
Este país foi embalsamado por um discurso ideologicamente parecido durante grande parte do período pós-redemocratização. Precisamente nos últimos 14 anos, diga-se, a condução esteve nas mãos de um mesmo partido, que por sua vez foi assessorado pelos mesmos parceiros. Apelar para adversários fantasmas ou medos empoeirados, como ficou claro desde domingo passado, ganhou contornos de estratégia vencida.
Os pontos de interrogação que hoje assombram a esquerda, de tão maiúsculos, já não parecem sensíveis à manipulação dos fatos e apenas podem ser respondidos por ela própria.
Enquanto isso, para a grande massa de brasileiros alheia à sua crise existencial, a pergunta que interessa não poderia ser outra: até quando seremos acossados pelo negar-sempre-admitir-jamais, adotado a ferro e fogo e diretamente responsável por inviabilizar um debate maduro?
E, já que estamos aqui, assistiremos a um gesto que seja de arrependimento sincero, não apenas por parte do Partido dos Trabalhadores, mas também daqueles que veladamente o apoiaram sob a malandra chancela da oposição crítica?
O futuro nunca foi tão incerto, precisamos admitir, mas não para os recém-libertos.
Pois, embora a mensagem tenha sido clara, sustentada que foi por estatísticas, e até mesmo previsível, dado o estrago causado pela administração Dilma e a Operação Lava Jato, não têm sido raros os diagnósticos equivocados a seu respeito. Assim como as ginásticas retóricas visando uma salvaguarda partidária.
Até faz sentido, por exemplo, decifrar a resposta das urnas como sendo um recado ou mesmo uma vitória da direita. Após tantos anos impregnados pela mitológica dicotomia entre montéquios indignos e capuletos magnânimos, beber no tororó da esquerda compreensivelmente extrapola o cacoete.
Faz sentido, mas está errado.
E está errado, acima de tudo, por inflar a falsa narrativa que sugere uma direita relevante neste país. Infelizmente não é o caso. E este meu lamento, diga-se, nada tem a ver com preferências ideológicas - de espantalhos imaginários já me basta o Fluminense -, mas pela ausência de pluralidade no debate político.
O que o cenário apresenta, isto sim, são matizes do vermelho. Uma miríade de legendas que vão do centro à extrema esquerda e nada além. Por esta razão, é fundamentalmente deseducador alardear uma guinada impossível. E nem vale a pena mencionar o boboca terrorismo embutido no discurso.
Como dizia, cambalhotas argumentativas com o intuito de empanar a voz do povo não deixaram de faltar. A mais ecoada delas tratou de jogar luz sobre o alto percentual de abstenções, em uma tola manobra para manter aceso o discurso do “fora todos” e, de quebra, relativizar o fracasso do PT.
Pois a verdade é que o percentual nacional de abstenções manteve-se alto, deixou clara a descrença geral com a classe política, mas sequer chegou perto de bater o recorde. Esteve abaixo, por exemplo, daquele atingido há 2 anos (17,6% contra 19,4%).
Este país foi embalsamado por um discurso ideologicamente parecido durante grande parte do período pós-redemocratização. Precisamente nos últimos 14 anos, diga-se, a condução esteve nas mãos de um mesmo partido, que por sua vez foi assessorado pelos mesmos parceiros. Apelar para adversários fantasmas ou medos empoeirados, como ficou claro desde domingo passado, ganhou contornos de estratégia vencida.
Os pontos de interrogação que hoje assombram a esquerda, de tão maiúsculos, já não parecem sensíveis à manipulação dos fatos e apenas podem ser respondidos por ela própria.
Enquanto isso, para a grande massa de brasileiros alheia à sua crise existencial, a pergunta que interessa não poderia ser outra: até quando seremos acossados pelo negar-sempre-admitir-jamais, adotado a ferro e fogo e diretamente responsável por inviabilizar um debate maduro?
E, já que estamos aqui, assistiremos a um gesto que seja de arrependimento sincero, não apenas por parte do Partido dos Trabalhadores, mas também daqueles que veladamente o apoiaram sob a malandra chancela da oposição crítica?
O futuro nunca foi tão incerto, precisamos admitir, mas não para os recém-libertos.
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