Décadas atrás, Hollywood fez sucesso com comédia chamada “Deu a louca no mundo”. Hoje, a loucura instalada entre nossos dirigentes não faz rir!
Acelerar um veículo que se dirige a precipício é atitude louca, ou “apenas” suicida? E se o veículo estiver cheio de gente? Então, além de louca e suicida é também assassina. E se antes da borda há fogo e o veículo leva pólvora e outros detonadores muito mais potentes? Além dos adjetivos acima, é também insensatez. É a retomada da marcha da insensatez, o processo, ocorrido tantas vezes na história, que leva dirigentes a tomarem decisões contrárias ao próprio interesse, e também às necessidades dos povos que comandam.
A marcha da insensatez, na história, foi alimentada por noções pré-concebidas, pela negação de evidências, por disputas de egos, pela recusa a buscar alternativas, entre outros fatores, e levou a bilhões de mortes!
Atualmente, a insensatez está potencializada pelos algoritmos que, no fundo, são papagaios que repetem e amplificam o que encontram nos textos com que são treinados. Vale dizer, principalmente o publicado na parte da imprensa considerada “amiga”, assim como nas polarizantes e antissociais Redes Sociais. Textos científicos revisados não estão entre as principais fontes das as “IAs”, mesmo porque são em mínima quantidade (comparativamente aos zilhões de posts leigos na internet)! Não obstante essa falha básica, cresce o poder da IA ou, mais precisamente, daqueles que controlam seu desenvolvimento e seu uso. O estado de Israel, em sua atual fúria assassina, tem usado a IA para identificar e matar aqueles que a própria IA entende como inimigos. Fica a pergunta: com tanta fake news na infosfera, será que os algoritmos conseguem identificá-las e separar o joio do trigo?
O cenário se complica porque não só os que nos dirigem ficaram loucos; também perderam a razão aqueles que sonham substituí-los e seguidores acríticos de ambos. Até o clima amalucou, dizem alguns, com a chuva virando dilúvio e a estiagem se tornando seca excepcional. Estas, segundo o “Monitor das Secas”, levam à “perda de cultura e pastagens excepcionais e generalizadas; escassez de água nos reservatórios, córregos e poços, criando situações de emergência”. E os loucos dirigentes querem continuar acelerando no mesmo rumo que nos leva a este abismo de secas excepcionais e dilúvios bíblicos! A Agência Internacional de Energia recém afirmou que o planeta caminha para 2,4oC de aquecimento!
Há alternativas. A razão, no sentido de ausência de loucura, clama para que sejam preferidas à continuidade da aceleração dos processos que alguns chamam de “desenvolvimento”, mas que, embora nos aproximem cada vez mais do abismo, não conseguem resolver as agruras da maioria. É verdade que tais outros caminhos fazem com que certos grupos poderosos percam poder. Por exemplo, a indústria do petróleo e da alimentação ultraprocessada, entre outras.
Não é desmiolado continuar a subsidiar essas atividades e esquecer os males que causam e, cada vez mais, causarão?
Na ONU, eu entendi que Netanyahu não pretende trazer os reféns de volta. Ele prefere que eles retornem em sacos para cadáveres
Danny Elgarat, cujo irmão Itzhak Elgarat foi sequestrado de sua casa no Kibbutz Nir Oz, está em greve de fome há 17 dias
Israel foi barbaramente atacado e tem direito à sua legítima defesa. Sobre isso, não há dúvida. Mas a legítima defesa não é uma vingança. Tem regras definidas pelo direito internacional. Primeiro, a necessidade e a proporcionalidade da resposta: o uso da força não é ilimitado e deve ser proporcional. E a legitimidade dos objetivos não justifica a desproporcionalidade dos meios.
Ora, a brutalidade da resposta israelita deslegitima a legitimidade da sua autodefesa. Segundo, a retaliação deve concentrar-se sobre os alvos militares e salvaguardar as populações civis. Escolas, hospitais e edifícios residenciais dificilmente podem ser considerados alvos militares. E bombardeios em zonas densamente povoadas e ataques a bairros residenciais não podem deixar de provocar vítimas civis, entre elas muitas crianças. Sabemos que é suposto os militantes das organizações terroristas estarem escondidos nessas zonas, mas haveria certamente outro tipo de operações militares que alvejam os operacionais sem atingir, indiscriminadamente, os civis inocentes.
A destruição militar de uma organização terrorista não pode justificar a punição coletiva de um povo. Em Gaza, como agora no Líbano, a destruição física é devastadora, a crise humanitária é de enormes proporções, há milhões de refugiados e milhares de mortos de civis. No direito internacional, o direito da guerra fixa os limites do uso da força e o direito humanitário o tratamento devido aos não combatentes. Israel não cumpre nem um nem outro. Vive à margem das Convenções de Genebra e, por muito que custe dizê-lo, comporta-se como um “fora-da-lei”. O ataque à operação de paz da ONU no Líbano (UNIFIL) é só mais um episódio desse padrão de comportamento à margem do direito internacional.
A UNIFIL foi estabelecida em 1978, depois da primeira invasão do Líbano por Israel. Era uma força de interposição e tinha um triplo objetivo: confirmar a retirada israelita; ajudar o Governo libanês a restaurar a autoridade na zona; e garantir a segurança e a paz. Em 1982, Israel invade uma segunda vez o Líbano e, até ao termo da invasão, em 1985, a UNIFIL não só fica atrás das linhas israelitas como perde a função de interposição e fica limitada à assistência humanitária. Em 2006, depois da terceira invasão israelita, a resolução 1701 do Conselho de Segurança da ONU não só reforça a força militar como alarga o mandato da missão: manutenção da paz e segurança; confirmação da retirada israelita; assistência no desarmamento e desmobilização das milícias e proteção das populações civis.
Como é óbvio, a UNIFIL não foi um sucesso. Não evitou uma quarta invasão de Israel, como não evitou o reforço político e militar do Hezbollah. Mas tem desempenhado uma função importante de proteção e assistência humanitária às populações.
Na condução das operações militares de invasão, Israel vê a UNIFIL como um empecilho e tem pressionado para a sua retirada. Em tom de poucos amigos, Netanyahu avisou ao secretário-geral da ONU para retirar as suas tropas. Ora, acontece que nem a UNIFIL está ao serviço da estratégia israelita, nem o secretário-geral tem poderes para retirar as tropas. A missão foi estabelecida pelo Conselho de Segurança e só o Conselho de Segurança tem poderes para isso. E, certamente, não o fará. Assim, Israel decidiu remover o empecilho e avançou contra uma base militar da UNIFIL num contexto em que já foram feridos vinte capacetes azuis.
Mas este não é um ato isolado. Faz parte de uma já longa campanha contra as Nações Unidas. E não se trata apenas da violação pura e simples das resoluções da ONU sobre os territórios ocupados. Da UNIFIL ou do Alto Comissariado para os Refugiados. Trata-se dos ataques recorrentes aos órgãos judiciais das Nações Unidas: o Tribunal Internacional de Justiça e o Tribunal Penal Internacional que têm acusado os dirigentes israelitas da ocupação ilegal dos territórios palestinos e da condução da guerra em Gaza. Trata-se do ataque ostensivo e desproporcionado contra o secretário-geral, declarando-o “persona non grata”. Declaração que, aliás, não se lhe aplica, porque a Convenção de Viena que a prevê aplica-se aos Estados, mas não às organizações internacionais.
Trata-se, enfim, de um padrão de comportamento “fora da lei”. Muitas vezes, a pretexto da defesa do Ocidente. Não, não é. Os EUA e a Europa têm de perceber que não se trata da defesa do Ocidente. Pelo contrário, põe em causa a autoridade moral do Ocidente. A que ainda lhe resta.